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quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Como o politicamente incorreto chegou de forma perversa ao Brasil

marinho

por Luiz Carlos Azenha

Eu desconfio do politicamente correto. Às vezes imagino que se trata apenas de transpor, para o campo da linguagem, a tentativa neurótica de controlar o discurso em um mundo caótico, governado pelas coincidências.

Admiro o politicamente incorreto, mas nunca a ponto de rejeitar a Nota Fiscal Paulista.

No século passado, quando minhas filhas ainda cresciam em Nova York, um dos grandes sucessos da TV local era o South Park, com suas piadas escatológicas.

Inadvertidamente, dei de presente a elas South Park, o longa metragem, mas a sessão teve de ser interrompida pela metade quando passei pela sala justamente na cena em que Saddam Hussein fumava um cigarro, depois de transar com o diabo.

O sinal mais claro de que foi uma cena perturbadora é que ambas rejeitam, nos dias de hoje, por motivos obscuros, a Nota Fiscal Paulista.

O South Park marcou um momento de inflexão da indústria de entretenimento nos Estados Unidos. Depois dele, abundaram os programas politicamente incorretos.

Nos talk shows, o pioneiro foi Howard Stern, que transformou as multas que recebeu da Federal Communications Comission — por linguagem que transgredia o politicamente correto — no passaporte para novos e lucrativos contratos.

Na escala de valores dos americanos, afinal, o dólar está sempre acima da vaidade.

Na TV, eu estava lá quando surgiu Lou Dobbs, na CNN. Podemos dizer que ele foi um dos predecessores do twitter. Com um cérebro binário, Dobbs investia contra os imigrantes usando frases de efeito com a nuance dos 140 caracteres.

Posso dizer que vi nascer, nos anos 80 e 90, a indústria do politicamente incorreto nos Estados Unidos.

A fórmula era razoavelmente simples: apelo ao senso comum, maniqueísmo e muita estridência.

Boa parte era marquetagem, mas aqui ou ali se via um discurso verdadeiramente desafiador.

Mais tarde, com algumas décadas de atraso, essa indústria se instalou no Brasil, mas com uma peculiaridade: os politicamente incorretos, aqui, zombam exclusivamente dos mais frágeis!

Parafraseando o Chico Buarque, a Sheherazade é desbocada com a Bolívia mas fala fino com os Estados Unidos.

Tudo isso me ocorreu ao ler o texto da blogueira de O Globo que, presumivelmente, tentou fazer uma brincadeira com as manias de doença dos pobres.

Mas, como ela mesma admitiu, os leitores não entenderam o que ela escreveu como “humor cáustico”.

O blog da autora é nomeado “Zona de Desconforto” e um texto do Facebook, atribuído ao jornal O Globo, diz que a escritora é assim mesmo, fala o que pensa, rema contra a corrente, é politicamente incorreta a ponto de achar o papai-mamãe subvalorizado.

Para os que se assustam com o fato de uma jovem como ela merecer um perfil de O Globo, fique registrado o que diz uma de minhas filhas definitivamente lesadas pelo South Park: “Pai, o Brasil é o único país do mundo em que jovem de 30 anos já pensa na própria biografia”.

Se posso colaborar com a promissora carreira da blogueira, sugiro que ela leia A Fogueira das Vaidades,

de Tom Wolfe, que retrata justamente a Nova York dos anos 80.

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A certa altura, Wolfe faz uma descrição magnífica — e politicamente incorreta — de um líder negro que se posicionava milimetricamente para aparecer nas imagens de protestos contra o racismo que apareceriam à noite no noticiário das emissoras de TV da cidade.

Todos sabem que ele se referia a Al Sharpton, que na foto acima aparece na segunda fila, pendurado no ombro de Joe Biden. Não me lembro de ter conhecido melhor papagaio de pirata.

Mas os relativamente “pobres”, como Sharpton, ocupam Wolfe por poucas páginas. A crítica devastadora do autor se volta, acima de tudo, à ambição dos poderosos de Nova York, num período em que a ganância era oficialmente encorajada pelo governo direitista de Ronald Reagan.

Silvia Pilz, o politicamente incorreto só tem graça, mesmo, quando o autor desafia o discurso dominante e zomba de quem se acha.

Chutar pobre desdentado caído na calçada é covardia e, na verdade, nem é original — já que por linhas tortas é ao que se dedicam os seus patrões diuturnamente.

Cáustico de verdade seria você observar, em O Globo, de forma bem humorada, que os bilionários irmãos Marinho demitem trabalhadores num ano em que as Organizações Globo batem recorde de faturamento.

Não precisa escrever como eu, de forma deselegante e sem talento.

Tente fazer como o Tom Wolfe.

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