Eles não entenderam nada. E, quando digo “eles”, refiro-me à imprensa golpista. Quando digo “imprensa golpista”, refiro-me a meia dúzia de impérios de comunicação que ajudaram a implantar a ditadura militar que derrubou um governo legitimamente eleito. Quando digo que ajudaram, é porque esses “impérios” chegaram a ceder suas redações para os golpistas se reunirem de forma a tramarem o golpe de Estado de 1964.
E o que é que os golpistas de ontem – pretensos golpistas de hoje – não entenderam? Segundo eles mesmos, a popularidade de Dilma e, mais do que a dela, a de seu padrinho político, o ex-presidente Lula, segundo a última sondagem do instituto Datafolha sobre a popularidade dos dois políticos.
Como sei que não entenderam? Eles mesmos dizem. E o que é mais: não entenderam a pesquisa que eles mesmos fizeram, pois quem diz que não a entendeu foi o veículo que é a cabeça do grupo empresarial de mídia que controla o instituto Datafolha, o jornal Folha de São Paulo, em editorial publicado na última segunda-feira que pretendeu analisar a disparada da aprovação da presidente da República e a de seu antecessor.
Melhor que você leia o texto e, em seguida, comento.
—–
FOLHA DE SÃO PAULO
23 de abril de 2012
Editorial
Dilma cresce
Aprovação da presidente chega à melhor marca, o que propicia à sucessora emancipar-se em parte de seu criador político, Lula
O governo Dilma Rousseff se aproxima do primeiro ano e meio de exercício com 64% de aprovação popular, conforme a pesquisa Datafolha divulgada ontem.
É a melhor marca desde logo após a posse (47% em março de 2011), índice também superior aos obtidos por Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva no mesmo ponto de seus respectivos mandatos.
Das explicações para esse resultado, a mais persuasiva será a econômica. Apesar da redução no ritmo, o crescimento tem se mantido apreciável, perto de 3% ao ano. O ímpeto inflacionário que se temeu no ano passado foi detido. Como atesta a pesquisa, um tom otimista comanda as expectativas quanto ao poder aquisitivo do entrevistado e ao desempenho da economia.
Ao mesmo tempo, causa estranheza que o governo seja bem avaliado quando o noticiário está de novo repleto de escândalos que atingem situação e oposição, tornando ainda mais generalizada a dedução de que ninguém -ou quase ninguém- se salva.
A presidente conseguiu afastar sua imagem desse pântano. Tratou com alguma dureza os excessos de apetite da imensa base parlamentar incrustada em seu governo. Deixou cair toda uma fileira de ministros, postos sob desconfiança pública por evidências divulgadas pela imprensa.
Não faltou algo de maquiavélico nesta última atitude. As quedas de auxiliares foram propícias para que ela compusesse uma equipe mais à sua imagem e semelhança, enquanto projetavam sua fama de intransigente com “malfeitos” na administração.
A pesquisa mostra que os índices de aprovação cresceram em especial nas camadas associadas a maior renda e melhor acesso à informação, nas quais se presume que temas político-institucionais encontrem mais eco.
Aos poucos, Dilma Rousseff se emancipa de seu criador político. Lula segue favorito para a sucessão de 2014, com 57% das preferências como candidato governista, mas quase um terço do eleitorado optaria hoje pela criatura.
Essa clivagem reflete o desdobrar de interesses que começam a se mostrar díspares, quando não conflitantes. Foi assim no caso da chamada CPI do Cachoeira, que Lula insuflou sob o risco de enviar o incêndio para o lado da sucessora.
É implausível cogitar de rompimento entre criador e criatura, desfecho que seria inconveniente para ambos. Mas há indícios de que a separação de águas tende a deixar o legado populista sob a égide de Lula, enquanto a atual presidente cultiva uma imagem mais voltada a valores de classe média.
Numa coalização governista tão desmesurada, as principais tensões continuarão sendo internas.
—–
O texto inteiro é repleto de delírios que o paciente que o escreveu percebe como “realidade”. Mas o trecho que destaco a seguir é o mais impressionante ao revelar a confusão mental que assola o editorialista – que, não nos esqueçamos, manifesta-se em nome do jornal:
—–
Causa estranheza que o governo seja bem avaliado quando o noticiário está de novo repleto de escândalos que atingem situação e oposição, tornando ainda mais generalizada a dedução de que ninguém – ou quase ninguém – se salva.
—–
Chega a ser incrível que, apesar de ter todos os elementos para dirimir a tal “estranheza”, o editorialista não consiga. Imagino que, no futuro, os historiadores tentarão entender o que provocava esse alheamento tão intenso da realidade que se abateu não apenas sobre esse meio de comunicação, mas sobre vários outros, os maiores desta era no Brasil.
Ora, a resposta está na própria premissa do jornal. Os escândalos atingem uma oposição – a qual o jornal integra segundo a mesma Associação Nacional de Jornais (ANJ) que durante o governo Lula declarou que o papel da mídia seria fazer oposição – que passou oito anos posando de grilo falante e fazendo acusações àquele governo, e que desde 1º de janeiro do ano passado continua fazendo acusações.
Essas acusações, porém, vão de encontro à completa desmoralização de uma oposição que posava de moralista e que já fora flagrada no episódio do ex-governador de Brasília, José Roberto Arruda, cuja prova de corrupção não é do tipo de “prova” que Folha e outros veículos do Partido da Imprensa Golpista alardeiam, mas uma prova provada, inquestionável, irrecorrível: um vídeo mostrando um dos momentos em que o meliante se corrompia.
“Estranheza” por que, se, já em 2006, o país deu uma banana para a Folha e o resto do PIG e reelegeu Lula com votação expressiva? E note-se que, àquela época, a situação do país nem era tão boa, pois mal nos recuperávamos da desastrosa octaetéridade tucana regida pela batuta daquele que hoje é hors-concours em impopularidade, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
Claro que, no conjunto da sociedade, a alta aprovação de Dilma não se deve exclusivamente à desmoralização da oposição político-midiática, ou seja, desse conclave que congrega meios de comunicação e partidos políticos. A maioria da população brasileira nem toma conhecimento do moralismo de quinta da oposição midiática, seja a “de esquerda” ou a de direita.
E nem se deve ao crescimento econômico “perto de 3% ao ano” que o jornal cita, mas à distribuição não só de renda (a maior da história em tão curto período, segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento Humano, o PNUD, apurado via índice de Gini), mas de oportunidades, benefício insuperável que o projeto petista de país vem produzindo.
Aliás, o próprio editorial, no trecho que reproduzo a seguir, deixa ver por que o seu moralismo não “cola” mais nem nos reduzidos setores da sociedade que se interessam por política e que até devem ler aquele e outros tentáculos da imprensa golpista:
—–
A pesquisa mostra que os índices de aprovação cresceram em especial nas camadas associadas a maior renda e melhor acesso à informação, nas quais se presume que temas político-institucionais encontrem mais eco.
—–
Há que notar que como esse partido político travestido de imprensa esconde opiniões que não condizem com a sua, parece que o setor politizado da sociedade acredita nas batatadas que esses jornais, revistas, portais de internet, televisões e rádios martelam diariamente. Mas não apenas não acredita como se irrita ao ver sua inteligência ser desprezada.
Só quem acredita na Folha e companhia, em média, é um reduzido contingente de pessoas de idade avançada, de classes média alta ou rica e que não quer ver o país se tornar mais igualitário porque não quer perder os privilégios injustos que auferiu ao longo das incontáveis décadas em que a imprensa elegia governos conservadores para beneficiá-lo.
Em 2010, a votação do candidato conservador José Serra deu à mídia a ilusão de que o país estaria quase dividido entre o despachante das elites que tentava lhe empurrar e a candidata progressista que Lula sugeriu e o povo acolheu.
É bobagem. Serra só conseguiu uma votação melhorzinha porque, com a sua experiência de tantas eleições, disputou com alguém que jamais disputara eleição alguma. Se tivesse disputado com um político mais tarimbado levaria uma surra eleitoral. Isso além do fato de que apelou para a religiosidade intensa que ainda vitima o povo brasileiro, fenômeno que deverá ir diminuindo conforme for aumentando a escolarização média da população.
Apesar disso, a oposição midiática, alheia ao fato de que o seu moralismo fajuto foi posto a nu, continua apostando nele para retomar o poder, como se fosse possível convencer um povo que melhorou tanto de vida a voltar a um tempo em que sofria tanto e no qual não tinha perspectiva alguma de futuro. Eles continuam não entendendo nada, pois. Ainda bem, não é mesmo?