Mente vazia, oficina do sistema da mídia golpista

Mente vazia, oficina do sistema da mídia golpista

terça-feira, 24 de abril de 2012

FOLHA DE SÃO PAULO "ESTRANHA" A POPULARIDADE DE DILMA


Eles não entenderam nada. E, quando digo “eles”, refiro-me à imprensa golpista. Quando digo “imprensa golpista”, refiro-me a meia dúzia de impérios de comunicação que ajudaram a implantar a ditadura militar que derrubou um governo legitimamente eleito. Quando digo que ajudaram, é porque esses “impérios” chegaram a ceder suas redações para os golpistas se reunirem de forma a tramarem o golpe de Estado de 1964.
E o que é que os golpistas de ontem – pretensos golpistas de hoje – não entenderam? Segundo eles mesmos, a popularidade de Dilma e, mais do que a dela, a de seu padrinho político, o ex-presidente Lula, segundo a última sondagem do instituto Datafolha sobre a popularidade dos dois políticos.
Como sei que não entenderam? Eles mesmos dizem. E o que é mais: não entenderam a pesquisa que eles mesmos fizeram, pois quem diz que não a entendeu foi o veículo que é a cabeça do grupo empresarial de mídia que controla o instituto Datafolha, o jornal Folha de São Paulo, em editorial publicado na última segunda-feira que pretendeu analisar a disparada da aprovação da presidente da República e a de seu antecessor.
Melhor que você leia o texto e, em seguida, comento.
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FOLHA DE SÃO PAULO
23 de abril de 2012
Editorial
Dilma cresce
Aprovação da presidente chega à melhor marca, o que propicia à sucessora emancipar-se em parte de seu criador político, Lula
O governo Dilma Rousseff se aproxima do primeiro ano e meio de exercício com 64% de aprovação popular, conforme a pesquisa Datafolha divulgada ontem.
É a melhor marca desde logo após a posse (47% em março de 2011), índice também superior aos obtidos por Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva no mesmo ponto de seus respectivos mandatos.
Das explicações para esse resultado, a mais persuasiva será a econômica. Apesar da redução no ritmo, o crescimento tem se mantido apreciável, perto de 3% ao ano. O ímpeto inflacionário que se temeu no ano passado foi detido. Como atesta a pesquisa, um tom otimista comanda as expectativas quanto ao poder aquisitivo do entrevistado e ao desempenho da economia.
Ao mesmo tempo, causa estranheza que o governo seja bem avaliado quando o noticiário está de novo repleto de escândalos que atingem situação e oposição, tornando ainda mais generalizada a dedução de que ninguém -ou quase ninguém- se salva.
A presidente conseguiu afastar sua imagem desse pântano. Tratou com alguma dureza os excessos de apetite da imensa base parlamentar incrustada em seu governo. Deixou cair toda uma fileira de ministros, postos sob desconfiança pública por evidências divulgadas pela imprensa.
Não faltou algo de maquiavélico nesta última atitude. As quedas de auxiliares foram propícias para que ela compusesse uma equipe mais à sua imagem e semelhança, enquanto projetavam sua fama de intransigente com “malfeitos” na administração.
A pesquisa mostra que os índices de aprovação cresceram em especial nas camadas associadas a maior renda e melhor acesso à informação, nas quais se presume que temas político-institucionais encontrem mais eco.
Aos poucos, Dilma Rousseff se emancipa de seu criador político. Lula segue favorito para a sucessão de 2014, com 57% das preferências como candidato governista, mas quase um terço do eleitorado optaria hoje pela criatura.
Essa clivagem reflete o desdobrar de interesses que começam a se mostrar díspares, quando não conflitantes. Foi assim no caso da chamada CPI do Cachoeira, que Lula insuflou sob o risco de enviar o incêndio para o lado da sucessora.
É implausível cogitar de rompimento entre criador e criatura, desfecho que seria inconveniente para ambos. Mas há indícios de que a separação de águas tende a deixar o legado populista sob a égide de Lula, enquanto a atual presidente cultiva uma imagem mais voltada a valores de classe média.
Numa coalização governista tão desmesurada, as principais tensões continuarão sendo internas.
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O texto inteiro é repleto de delírios que o paciente que o escreveu percebe como “realidade”. Mas o trecho que destaco a seguir é o mais impressionante ao revelar a confusão mental que assola o editorialista – que, não nos esqueçamos, manifesta-se em nome do jornal:
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Causa estranheza que o governo seja bem avaliado quando o noticiário está de novo repleto de escândalos que atingem situação e oposição, tornando ainda mais generalizada a dedução de que ninguém – ou quase ninguém – se salva.
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Chega a ser incrível que, apesar de ter todos os elementos para dirimir a tal “estranheza”, o editorialista não consiga. Imagino que, no futuro, os historiadores tentarão entender o que provocava esse alheamento tão intenso da realidade que se abateu não apenas sobre esse meio de comunicação, mas sobre vários outros, os maiores desta era no Brasil.
Ora, a resposta está na própria premissa do jornal. Os escândalos atingem uma oposição – a qual o jornal integra segundo a mesma Associação Nacional de Jornais (ANJ) que durante o governo Lula declarou que o papel da mídia seria fazer oposição – que passou oito anos posando de grilo falante e fazendo acusações àquele governo, e que desde 1º de janeiro do ano passado continua fazendo acusações.
Essas acusações, porém, vão de encontro à completa desmoralização de uma oposição que posava de moralista e que já fora flagrada no episódio do ex-governador de Brasília, José Roberto Arruda, cuja prova de corrupção não é do tipo de “prova” que Folha e outros veículos do Partido da Imprensa Golpista alardeiam, mas uma prova provada, inquestionável, irrecorrível: um vídeo mostrando um dos momentos em que o meliante se corrompia.
“Estranheza” por que, se, já em 2006, o país deu uma banana para a Folha e o resto do PIG e reelegeu Lula com votação expressiva? E note-se que, àquela época, a situação do país nem era tão boa, pois mal nos recuperávamos da desastrosa octaetéridade tucana regida pela batuta daquele que hoje é hors-concours em impopularidade, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
Claro que, no conjunto da sociedade, a alta aprovação de Dilma não se deve exclusivamente à desmoralização da oposição político-midiática, ou seja, desse conclave que congrega meios de comunicação e partidos políticos. A maioria da população brasileira nem toma conhecimento do moralismo de quinta da oposição midiática, seja a “de esquerda” ou a de direita.
E nem se deve ao crescimento econômico “perto de 3% ao ano” que o jornal cita, mas à distribuição não só de renda (a maior da história em tão curto período, segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento Humano, o PNUD, apurado via índice de Gini), mas de oportunidades, benefício insuperável que o projeto petista de país vem produzindo.
Aliás, o próprio editorial, no trecho que reproduzo a seguir, deixa ver por que o seu moralismo não “cola” mais nem nos reduzidos setores da sociedade que se interessam por política e que até devem ler aquele e outros tentáculos da imprensa golpista:
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A pesquisa mostra que os índices de aprovação cresceram em especial nas camadas associadas a maior renda e melhor acesso à informação, nas quais se presume que temas político-institucionais encontrem mais eco.
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Há que notar que como esse partido político travestido de imprensa esconde opiniões que não condizem com a sua, parece que o setor politizado da sociedade acredita nas batatadas que esses jornais, revistas, portais de internet, televisões e rádios martelam diariamente. Mas não apenas não acredita como se irrita ao ver sua inteligência ser desprezada.
Só quem acredita na Folha e companhia, em média, é um reduzido contingente de pessoas de idade avançada, de classes média alta ou rica e que não quer ver o país se tornar mais igualitário porque não quer perder os privilégios injustos que auferiu ao longo das incontáveis décadas em que a imprensa elegia governos conservadores para beneficiá-lo.
Em 2010, a votação do candidato conservador José Serra deu à mídia a ilusão de que o país estaria quase dividido entre o despachante das elites que tentava lhe empurrar e a candidata progressista que Lula sugeriu e o povo acolheu.
É bobagem. Serra só conseguiu uma votação melhorzinha porque, com a sua experiência de tantas eleições, disputou com alguém que jamais disputara eleição alguma. Se tivesse disputado com um político mais tarimbado levaria uma surra eleitoral. Isso além do fato de que apelou para a religiosidade intensa que ainda vitima o povo brasileiro, fenômeno que deverá ir diminuindo conforme for aumentando a escolarização média da população.
Apesar disso, a oposição midiática, alheia ao fato de que o seu moralismo fajuto foi posto a nu, continua apostando nele para retomar o poder, como se fosse possível convencer um povo que melhorou tanto de vida a voltar a um tempo em que sofria tanto e no qual não tinha perspectiva alguma de futuro. Eles continuam não entendendo nada, pois. Ainda bem, não é mesmo?

Germinal, século 21

Matthieu, um trabalhador da construção civil de 31 anos que vive de contratos temporários, tenta entender porque os líderes europeus parecem estar mais concentrados em proteger as instituições financeiras do que em ajudar pessoas como ele.
A França tem uma imagem linda, afirmou em uma noite recente no estacionamento do Chateau de Vincennes. “Mas não é como nos países anglo-saxões. Lá, se você sabe fazer algo quando chega, você pode progredir. Esse é o sonho americano”, afirmou.
“Você nunca vai ouvir ninguém em nenhum lugar do mundo falando sobre o sonho francês”, acrescentou, observando uma fileira de motorhomes. “Não existem sonhos na França.”

Não leio nada sobre a França parecido a essa matéria do The New York Times desde que  devorei com os olhos o livro  Germinal de Émile Zola.
A ferocidade das minas de carvão é um nada diante da monstruosidade dos mercados financeiros.
O sonho americano demoliu, de fato, o sonho francês.
O liberté, fraternité, egalité foi devorado pela lógica do mercado e a França fraca e uma Inglaterra decrépita entregam a Europa à hegemonia alemã, como descreve o jornalista português Pedro Guerreiro:
A crise financeira reposicionou o poder no chamado eixo franco-alemão. E esse eixo pode agora passar a germano-francês. Pode? Pode. É isso que está escrito nas estrelas. Que a Alemanha mande na Europa pela primeira vez desde a segunda Guerra Mundial. Isso significará a transferência de riqueza dos países prósperos para os aflitos, uma política económica integrada, provavelmente mutualização da dívida: federalismo. É o que andamos a pedir, não é? É. Mas é preciso que os alemães estejam para isso. Que o ressentimento entre povos europeus o permita. E que os demais povos aceitem as regras dos alemães.
Estamos assistindo, 20 anos depois, o resultado da capitulação do pensamento de esquerda europeu à ditadura mental do neoliberalismo que o avassalou.
Os “Estados Unidos da Europa”, como o sonharam, desde o século XIX, os mais humanistas dos pensadores europeus – Victor Hugo à frente – converteram-se na União Europeia, em grande parte, pela ascensão ao poder de uma camada de dirigentes social-democratas (Soares, Mitterrand, González e os precursores Olof Palme e  Willy Brandt).
Mas a União Europeia, hoje, tornou-se um pastiche do que a sonhavam aqueles homens.
Tornou-se uma imperial ditadurado capital, aprisionando os países mais que numa moeda, numa política econômica única. E, como única, um irremovível obstáculo para soluções próprias, nacionais e, sobretudo, populares.
A receita é sempre a mesma e dificimente dela qualquer governo escapará: cortar centenas de milhares de empregos  públicos, aumentar  impostos, abaixar salários para recuperar a competitividade, reduzir aposentadorias, abolir a proteção contra demissões e – ah! – drenar dos países em desenvolvimento – via capital e via empresas – o sangue econômico que já não flui num continente exangue.
É verdade que Nicolas Sarckozy teve uma grande derrota, o primeiro presidente que, no poder, não vence o primeiro turno da reeleição.
Mas nada assegura a vitória de François Hollande, do PS, no segundo turno, ainda mais porque o resultado da extrema-direita vai intimidar o seu enfrentamento em questões como a imigração.
Sobretudo, nada assegura que seja uma vitória para mudar.
Porque não é possível mudar dentro de um contexto onde as imposições do mercado – travestidas de políticas continentais – obriga governantes a serem sempre iguais.
E nada indica que aEuropa, tão cedo, vá deixar a estagnação econômica e a crise social.
Ela é uma panela de pressão, onde as eleições funcionam como uma válvula, apenas.

SE NÃO É AMPULHETA , É EMPULHAÇÃO


Finalmente a Folha, hoje, publica uma informação relevante sobre os prazos de  julgamento do chamado mensalão.
Publica, mas sem ir direto ao ponto: este  caso ser julgado no primeiro semestre deste ano, no segundo, em 2013 ou em 2014 não faz, juridicamente, a menor diferença quanto à prescrição dos crimes alegados.
Leia só o que diz a matéria:
O “prazo prescricional” varia com o tamanho da pena e com o momento em que esse prazo começa a ser contado.
No caso do mensalão, o início é o recebimento da denúncia, em agosto de 2007.
Ou seja, se a pena mínima for maior que um ano e menor ou igual a dois anos, o crime prescreve em quatro anos (agosto de 2011); se for maior que dois anos e menor ou igual a quatro, ocorre após oito anos (agosto de 2015).
É evidente que o caso deve ser julgado, e sem protelações, assim que os trâmites devidos no STF se concluírem. Dentro da lei e do devido processo legal.
Mas alegar que tem de ser ainda este semestre para não prescreverem as penas não passa de uma empulhação grotesca. As prescrições que poderiam acontecer, já aconteceram em agosto do ano passado. Nenhuma outra prescrição haverá até o segundo semestre de 2015.
A tal “Missão Ampulheta” que está sendo promovida pela mídia é uma mistificação.
Os “cidadãos indignados” são integrantes das  redes pelo PSDB, como a senhora aí da foto, D.Henriette Krutman, descrita pela Veja como líder “do movimento Queremos Ética na Política, representando 22 grupos anticorrupção, que reúnem 57 mil integrantes nas redes sociais.”
Dona Henriette, como outros militantes tucanos que organizaram a manifestação “de massa”, têm todo o direito de se manifestarem. E sem repressão nem bombas, como aconteceu em São Paulo, justamente a São Paulo onde o governo é tucano.
Respira-se liberdade no Brasil, mas liberdade combina com verdade.
Usar a “pressa” em julgar o dito mensalão como instrumento para esconder a cumplicidade que se revelou no caso Carlinhos Cachoeira e suas ligações com a mídia é empulhar a opinião pública.
Alegar que o caso Cachoeira serve para protelar um julgamento que só depende dos ministros do Supremo é coloca-los sob pressão política.
E trabalhar para criar um clima de histeria que não condiz com o Estado de Direito.

No divã da Cantanhêde

Agora que não é mais especialista em aviação de caça, com a saída de Nélson Jobim do Ministério da Defesa, a colunista Eliane Cantanhêde, da Folha, dedida-se a um assunto mais estratosférico: a interpretação telepática da mente humana.
Sua coluna de hoje  – leia aqui a transcrição feita pelo Paulo Henrique Amorim – traça um diagnóstico psicológico de “alta precisão” sobre o ex-presidente Lula.
“Dilma tem que administrar um dado político fundamental -o ego do padrinho.”
“Quanto mais Dilma acerta e cresce, mais ele alimenta a paranoia de que tentam “desconstruir a sua imagem”.
“Lula está absolutamente convencido de que foi o melhor presidente da história da humanidade, mas os adversários (entre os quais inclui a imprensa) não reconhecem.”
“Ele não suporta ver a sua criatura se tornando mais admirada do que o criador. Sente-se injustiçado, senão perseguido, e reage com mágoa e rancor.”
Impressionante. Isso é que é objetividade jornalística. Não é preciso um fato, uma declaração sequer, nada. Nem mesmo uma horinha de divã foi necessária para D. Cantanhêde traçar um perfil assim profundo da personalidade ególatra e rancorosa de Luiz Inácio Lula da Silva.
Sigmund Freud não faria melhor. Não sei como Cantanhêde não falou algo sobre D. Lindu, a mãe de Lula, para tornar mais precisa sua patética incursão pela psicanálise.
A colunista da “massa cheirosa” não pode ver em um operário – nem num ex-operário que chegou à Presidência – nada senão mesquinhez e baixeza.
Passa batido pelo fato de que Dilma foi candidata e elegeu-se pela força de Lula – e ninguém mais que a presidenta sabe e valoriza isso. E, muito menos, não percebe o óbvio: que Lula é o maior interessado em que Dilma continue acertando, porque – se resolver ser candidato -  terá a seu favor uma presidenta extremamente bem avaliada pela população, como ela o teve em Lula em 2010.
Mas Cantanhêde vive num mundo povoado por Serras, Jobins  e FHCs, onde a vaidade e a egolatria são os combustíveis de mentes sem compromissos com a massa mal-cheirosa.
E acaba julgando a todos pelos mesmos critérios e pelos critérios que lhe ditam seus próprios sentimentos e conceitos.
É realmente um caso de psicanálise, não de jornalismo político.

O fim do jornalismo investigativo de araque

Por Leandro Fortes em 24/04/2012 na edição 691
Há oito anos, escrevi um livrete chamado Jornalismo Investigativo, como parte do esforço da Editora Contexto em popularizar o conhecimento básico sobre a atividade jornalística no Brasil. Digo “livrete” sem nenhum desmerecimento, muito menos falsa modéstia, mas para reforçar sua aparência miúda e funcional, um livro curto e conceitual onde plantei uma semente de discussão necessária ao tema, apesar das naturais deficiências de linguagem acadêmica de quem jamais foi além do bacharelado. Quis, ainda assim, formular uma conjuntura de ordem prática para, de início, neutralizar a lengalenga de que todo jornalismo é investigativo, um clichê baseado numa meia verdade que serve para esconder uma mentira inteira.
Primeiro, é preciso que se diga, nem todo jornalismo é investigativo, embora seja fato que tanto a estruturada entrevista jornalística como a mais singela das apurações não deixam de ser, no fim das contas, um tipo de investigação. Como é fato que, pelo prisma dessa lógica reducionista, qualquer atividade ligada à produção de conhecimento também é investigativa.
A consideração a que quero chegar é fruto de minha observação profissional, sobretudo ao longo da última década, período em que a imprensa tornou-se, no Brasil, um bloco quase que monolítico de oposição não somente ao governo federal, a partir da eleição de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002, mas a tudo e a todos vinculados a agendas da esquerda progressista – aí incluídos, principalmente, os movimentos sociais, os grupos de apoio a minorias e os defensores de cotas raciais.
Em todos esses casos, a velha mídia nacional age com atuação estrutural de um partido, empenhada em fazer um discurso conservador quase sempre descolado da realidade, escoltado por um discurso moralista disperso em núcleos de noticiários solidificados, aqui e ali, em matérias, reportagens e editoriais de indignação seletiva.
Determinação da pauta
A solidez – e a eficácia – desse modelo se retroalimenta da defesa permanente do grande capital em detrimento das questões sociais, o que tanto tem garantido um alto grau de financiamento desta estrutura midiática, como tem servido para formar gerações de jornalistas francamente alinhados ao que se convencionou chamar de “economia de mercado”, sem que para tal lhes tenha sido apresentado nenhum mecanismo de crítica ou reflexão.
Essa circunstância tem ditado, por exemplo, o comportamento da imprensa em relação a marchas, atos públicos e manifestações de rua, tratados, no todo, como questões relacionadas a trânsito e segurança pública. Interditados, portanto, em seu fundamento social básico e fundamental, sobre o qual o jornalismo comercial dos oligopólios de comunicação do Brasil só se debruça para descer o pau.
O resultado mais perverso dessa estrutura midiática rica e reacionária é a perpetuação de uma política potencialmente criminosa de assassinato de reputações e intimidação de agentes públicos e privados contrários às linhas editoriais desses veículos. Ou, talvez pior ainda, a capacidade destes em atrair esses mesmos agentes para seu ventre, sob a velha promessa de conciliação, para depois, novamente, estrangulá-los sob a vista do público.
Jornalismo Investigativo, porém, foi escrito anteriormente ao chamado “escândalo do mensalão”, antes, portanto, de a mídia brasileira formar o bloco partidário ora em progresso, tristemente conservador, que se anuncia diuturnamente como guardião das liberdades de expressão e de imprensa – conceitos que mistura de forma deliberada para, justamente, esconder sua real indiferença, tanto por um quanto pelo outro.
Distante, por um breve instante de tempo, da guerra ideológica deflagrada a partir do mensalão, me foi possível escrever um livro essencialmente simples sobre o verdadeiro conceito de jornalismo investigativo, ao qual reputo a condição de elemento de influência transversal, e não um gênero capaz de ser enclausurado em editorias, como o são os jornalismos político, econômico, esportivo, cultural etc.
Jornalismo investigativo é a sistematização de técnicas e conceitos de apuração para a produção de reportagens de fôlego, não necessariamente medidas pelo tamanho, mas pela profundidade de seus temas e, principalmente, pela relevância da notícia que ela, obrigatoriamente, terá que encerrar. Este conceito, portanto, baseado na investigação jornalística, existe para ser utilizado em todos os gêneros de reportagem, em maior ou menor grau, por qualquer repórter. Daí minha implicância com o termo “jornalista investigativo”, ostentado por muitos repórteres brasileiros como uma espécie de distintivo de xerife, quando na verdade a investigação jornalística é determinada pela pauta, não pela vaidade de quem a toca. O mesmo vale para o título de “repórter especial”, normalmente uma maneira de o jornalista contar ao mundo que ganha mais que seus colegas de Redação, ou que ficou velho demais para estar no mesmo posto de focas recém-formados.
Desonestidade perdoada
Para compor o livro editado pela Contexto, chamei alguns jornalistas para colaborar com artigos de fundo, como se dizia antigamente, os quais foram publicados nas últimas páginas do livro. Fui o mais plural possível, em muitos sentidos, inclusive ideológico, embora essa ainda não fosse uma discussão relevante, ou pelo menos estimulante, dentro da imprensa brasileira, à época.
O mais experiente deles, o jornalista Ricardo Noblat, hoje visceralmente identificado ao bloco de oposição conservadora montado na mídia, havia também escrito um livro para a Contexto sobre sua experiência como editor-chefe do Correio Braziliense, principal diário de Brasília que, por um breve período de oito anos (1994-2002), ele transformou de um pasquim provinciano e corrupto em um jornal respeitado em todo o país. Curiosamente, coube a Noblat assinar um artigo intitulado “Todo jornalismo é investigativo” e, assim, reforçar a lengalenga que o livro esforça-se, da primeira à última página, em desmistificar.
Tivesse hoje que escrever o mesmo livro, eu teria aberto o leque desses artigos e buscaria opiniões menos fechadas na grande imprensa. Em 2004, quando o livro foi escrito (embora lançado no primeiro semestre de 2005), o fenômeno da blogosfera progressista era ainda incipiente, nem tampouco estava em voga a sanha reacionária dos blogs corporativos da velha mídia. No mais, minha intenção era a de fazer um livro didático o bastante para servir de guia inicial para estudantes de jornalismo. Nesse sentido, o livro teve relativo sucesso. Ao longo desses anos, são raras as palestras e debates dos quais participo, Brasil afora, em que não me apareça ao menos um estudante para comentar a obra ou para me pedir que autografe um exemplar.
Faz-se necessário, agora, voltar ao tema para trazer o mínimo equilíbrio ao recrudescimento dessa discussão na mídia, agora às voltas com uma CPI, dita do Cachoeira, mas que poderá lhe revolver as vísceras, finalmente. Contra a comissão se levantaram os suspeitos de sempre, agora, mais do que nunca, prontos a sacar da algibeira o argumento surrado e cafajeste dos atentados às liberdades de imprensa e de expressão. A alcova de onde brota essa confusão deliberada entre dois conceitos distintos está prestes a tomar a função antes tão cara a certo patriotismo: o de ser o último refúgio dos canalhas.
Veio da revista Veja, semanal da Editora Abril, a reação mais exaltada da velha mídia, a se autodenominar “imprensa livre” sob ataque de fantasmas do autoritarismo, em previsível – e risível – ataque de pânico, às vésperas de um processo no qual terá que explicar as ligações de um quadro orgânico da empresa, o jornalista Policarpo Jr., com a quadrilha do bicheiro Carlinhos Cachoeira. Primeiro, com novos estudos do Santo Sudário, depois, com revelações sobre a superioridade dos seres altos sobre as baixas criaturas, a revista entrou numa espiral escapista pela qual pretende convencer seus leitores de que a CPI que se avizinha é parte de uma vingança do governo cuja consequência maligna será a de embaçar o julgamento do “mensalão”. Pobres leitores da Veja.
Não há, obviamente, nenhum risco à liberdade de imprensa ou de expressão, nem à democracia e ao bem estar social por causa da CPI do Cachoeira. Há, isso sim, um claro constrangimento de setores da mídia com a possibilidade de serem investigados por autoridades às quais dedicou, na última década, tratamento persecutório, preconceituoso e de desqualificação sumária. Sem falar, é claro, nas 200 ligações do diretor da Veja em Brasília para Cachoeira, mentor confesso de todos os furos jornalísticos da revista neste período.
Em recente panfletagem editorial, Veja tentou montar uma defesa prévia a partir de uma tese obtusa pela qual jornalistas e promotores de Justiça obedecem à mesma prática ao visitar o submundo do crime. Daí, a CPI da Cachoeira, ao investigar a associação delituosa entre a Veja e o bicheiro goiano, estaria colocando sob suspeita não os repórteres da semanal da Abril, mas o trabalho de todos os chamados “jornalistas investigativos” do país.
A tese é primária, mas há muita gente no topo da pirâmide social brasileira disposta a acreditar em absurdos, de modo a poder continuar a acreditar nas próprias convicções políticas conservadoras. Caso emblemático é o do atentado da bolinha de papel sofrido pelo tucano José Serra, na campanha eleitoral de 2010. Na época, coube ao Jornal Nacional da TV Globo montar um inesquecível teatro com um perito particular, Ricardo Molina, a fim de dar ao eleitor de Serra um motivo para entrar na fila da urna eleitoral sem a certeza de estar cometendo um ato de desonestidade política. Para tal, fartou-se com a fantasia do rolo-fantasma de fita crepe, gravíssimo pedregulho de plástico e cola a entorpecer as ideias do candidato do PSDB.
Arautos da moralidade
Todos nós, jornalistas, já nos deparamos, em menor ou maior escala, com fontes do submundo. Esta é a verdade que a Veja usa para tentar se safar da CPI. Há, contudo, uma diferença importante entre buscar informação e fazer uso de um crime (no caso, o esquema de espionagem da quadrilha de Cachoeira) como elemento de pauta – até porque, do ponto de vista da ética jornalística, o crime em si, este sim, é que deve ser a pauta. A confissão do bicheiro, captada por um grampo da PF, de que “todos os furos” recentes da Veja se originaram dos afazeres de uma confraria de criminosos, nos deixa diante da complexidade desse terrível zeitgeist, o espírito de um tempo determinado pelos espetáculos de vale tudo nas redações brasileiras.
Foi Cachoeira que deu à Veja, a Policarpo Jr., a fita na qual um ex-diretor dos Correios recebe propina. O material foi produzido pela quadrilha de Cachoeira e serviu para criar o escândalo do mensalão. Sob o comando de Policarpo, um jovem repórter de apenas 24 anos, Gustavo Ribeiro, foi instado a invadir o apartamento do ex-ministro José Dirceu, em um hotel de Brasília. Flagrado por uma camareira, o jornalista acabou investigado pela Polícia Civil do Distrito Federal, mas escapou ileso. Não se sabe, até hoje, o que ele pretendia fazer: plantar ou roubar coisas. A matéria de Ribeiro, capa da Veja, era em cima de imagens roubadas do sistema interno de segurança do hotel, onde apareciam políticos e autoridades que frequentavam o apartamento de Dirceu. A PF desconfia que o roubo (atenção: entre jornalistas de verdade, o roubo seria a pauta) foi levado a cabo pela turma de Cachoeira. A Veja, seria, portanto, receptadora do produto de um crime. Isso se não tiver, ela mesmo, o encomendado.
Por isso, além da podridão política que naturalmente irá vir à tona com a CPI do Cachoeira, o Brasil terá a ótima e rara oportunidade de discutir a ética e os limites do jornalismo a partir de casos concretos. Veremos como irão se comportar, desta feita, os arautos da moralidade da velha mídia, os mesmos que tinham no senador Demóstenes Torres o espelho de suas vontades.
***
[Leandro Fortes é repórter da CartaCapital]

AÉCIO DEU EMPREGO A PRIMA DE CACHOEIRA. DEMÓSTENES PEDIU

O Conversa Afiada reproduz e-mail do amigo navegante Jorge da Bahia:

Olá PHA

Tudo bem?.

Essa notícia é fresquinha. Tá saindo do forno.  Deu no yahoo.

Um forte abraço,

Jorge da Bahia


Aécio deu emprego à prima de Cachoeira a pedido de Demóstenes


Escutas telefônicas da Polícia Federal revelam que o senador Demóstenes Torres (ex-DEM-GO) intercedeu diretamente junto a seu colega, Aécio Neves (PSDB-MG), e arrumou emprego comissionado no governo de Minas para uma prima de Carlinhos Cachoeira.


No G1, Aécio Never confirma que empregou a pedido de Demóstenes, quando ainda era o Lacerda do PiG (*) contemporâneo, o Catão da Globo:

Aécio confirma nomeação de prima de Cachoeira em MG


Não deixe de ler, por falar em Globo: “Delta operou com Cerra – e agora, Ali Kamel ?”.

Não deixe de ler também sobre os rasgados elogios que Aécio fez a Demóstenes, no dia em que explodiram as gravações do Demostenes com o Cachoeira.


(*) Em nenhuma democracia séria do mundo, jornais conservadores, de baixa qualidade técnica e até sensacionalistas, e uma única rede de televisão têm a importância que têm no Brasil. Eles se transformaram num partido político – o PiG, Partido da Imprensa Golpista.

A ARMAÇÃO - Como preparar uma crise instititucional

 França: 70% dos eleitores da extrema direita vêm das classes populares (leia a análise de Eduardo Febbro, correspondente em Paris)** Lula e as eleições municipais:  Lula quer estabelecer uma nova aderência entre o PT e setores sociais não organizados em sindicados ou movimentos de base (Leia a entrevista do candidato a Prefeito de Campinas,  Márcio Pochman, à editora de Política de Carta Maior, Maria Inês Nassif; nesta pág) ** A ortodoxia na hora da verdade: a mistura de livres mercados e austeridade suicida dá sinais de esgotamento na Europa. A grande lição da crise é que não bastam agências reguladoras: a regulação do capitalismo deve estar inscrita diretamente na engrenagem do sistema econômico. (leia mais aqui)
 
 
 

Um senador corrupto celebrado pela mídia demotucana como símbolo da ética, uma revista fraudulenta, um bicheiro e o então presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes; jutos, quase levaram o país a uma crise institucional, em setembro de 2008, simulando um grampo da PF que não existiu. Do que mais eles seriam (serão) capazes? (leia o artigo de Luis Nassif abaixo)

No dia 1º de setembro de 2008, três ministros do STF (Gilmar Mendes, Cezar Peluso e Carlos Ayres Britto) foram até o presidente Lula exigir, sem apresentar qualquer prova, "apuração e punição" no episódio da suposta conversa grampeada entre Mendes e o senador Demóstenes Torres. O país esteve à beira de uma grave crise institucional devido a uma conspiração envolvendo Demóstenes Torres-Carlinhos Cachoeira, a revista Veja e, direta ou indiretamente, o ministro Gilmar Mendes. O artigo é de Luis Nassif.

(*) Publicado originalmente no Blog do Nassif

No dia 1º de setembro de 2008, os Ministros Gilmar Mendes, Cezar Peluso e Carlos Ayres Britto saíram da sede do STF (Supremo Tribunal Federal) atravessaram a Esplanada dos Ministérios e entraram no Palácio do Planalto para uma reunião com o presidente da República, Luiz Ignácio Lula da Silva.

Foi uma reunião tensa, a respeito da suposta conversa grampeada entre Gilmar e o senador Demóstenes Torres. Os três Ministros chegaram sem nenhuma prova concreta sobre a autoria ou mesmo a existência do tal grampo. Mas atribuíam-no irresponsavelmente à ABIN (Agência Brasileira de Inteligência) e exigiam de Lula providências concretas.

No auge da reunião, Gilmar blasonou: “Não queremos apenas apuração, mas punição”.

Bastaria Lula ter perdido a paciência e endurecido o jogo para criar uma crise institucional sem precedentes, entre o Supremo e o Executivo. Sua habilidade afastou o risco concreto de uma crise institucional, à custa do sacrifício do diretor-geral da ABIN, delegado Paulo Lacerda, afastado enquanto durassem as investigações.

Tanto no Palácio como na Polícia Federal e no Ministério Público Federal sabia-se que o grampo, se existiu, não havia partido da ABIN nem da Operação Satiagraha, já que nenhum dos dois – Demóstenes e Gilmar – eram alvo de investigação.

Foi aberto um inquérito na PF que concluiu pela não existência de qualquer indício, por mínimo que fosse, de que o grampo tivesse existido.

O país esteve à beira da mais grave crise institucional pós-redemocratização devido a uma conspiração envolvendo Demóstenes Torres-Carlinhos Cachoeira, a revista Veja e, direta ou indiretamente, o Ministro Gilmar Mendes.

Pouco antes do episódio, o assessor da presidência, Gilberto Carvalho, foi procurado por repórteres da revista com a informação de que ele também havia sido grampeado. Descreviam diálogos que teria tido com interlocutores.

A intenção era criar um clima de terror, passar ao governo a impressão de que a ABIN e a Satiagraha haviam saído de controle e estavam espionando as próprias autoridades. E, com isso, obter a anulação da operação que ameaçava o banqueiro Daniel Dantas.

É bem possível que os tais diálogos de Gilberto tenham sido gravados pelo mesmo esquema Veja-Cachoeira que forjou um sem-número de dossiês, muitos deles obtidos de forma criminosa e destinados ou a vender revista, impor o medo nos adversários, ou a consolidar o império do crime do bicheiro.

Durante anos e anos foi um festival de assassinatos de reputação, de jogadas pseudo-moralistas visando beneficiar o parceiro Cachoeira.

A revista tentou se justificar, comparando essas jogadas ao instituto da “delação premiada” – pelo qual promotores propõem redução de pena a criminosos dispostos a colaborar com a Justiça. No caso de Cachoeira, suas denúncias serviam apenas para desalojar inimigos e reforçar seu poder e o poder da revista.

Esses episódios mostram o poder devastador do crime, quando associado a veículos de grande penetração.

É um episódio grave demais, para ser varrido para baixo do tapete.