Em maio do ano passado, logo após o golpe parlamentar contra Dilma Rousseff ter passado no Senado, com o consequente afastamento da então presidente da República, o agora ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, à época ministro da Justiça, deu uma entrevista que deveria fazer dele persona non grata no Ministério Público Federal.
Moraes dissera à Folha de São Paulo que defendia que, quando vencesse o mandato do então Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, o agora presidente Michel Temer não deveria obrigatoriamente nomear para a chefia da Procuradoria-Geral da República o mais votado em uma lista tríplice elaborada por integrantes da carreira, como fizeram todos os governos petistas.
Não nomear o indicado pelo MPF para chefiar a instituição foi uma invenção dos governos “republicanos” do PT, que decidiram dar essa demonstração de “destemor de investigações” deixando que um cargo cujo ocupante pode depor o presidente da República fosse ocupado por qualquer um, inclusive por inimigos políticos.
A ideia de Moraes era retornar ao passado fraudulento, quando o PSDB governava e mantinha a Procuradoria nas mãos de um aliado. Geraldo Brindeiro, primo do vice-presidente do governo Fernando Henrique Cardoso, foi procurador-geral da República durante os oito anos em que o tucano governou o Brasil e barrou TODAS as investigações contra o governo.
A conduta de Brindeiro era tão descarada que o jornalista Elio Gaspari (Folha de São Paulo e o Globo) o apelidou de “engavetador-geral da República”.
A Constituição não prevê a eleição interna na Procuradoria, mas a prática foi adotada nos governos do PT, que indicaram para procurador-geral sempre o primeiro da lista. A conduta era elogiada por membros do Ministério Público por em tese garantir maior autonomia ao órgão.
Moraes, agora ministro do STF, porém, disse à Folha naquela entrevista logo após assumir o Ministério da Justiça que “o poder do Ministério Público é grande, mas não pode ser absoluto”.
Na prática – e não existe um só membro do Ministério Público que irá discordar do que digo –, Moraes estava, com essa proposta, acabando com a possibilidade do Ministério Público de fiscalizar a Presidência da República. Postura como essa deveria colocar a instituição em peso contra si.
Não foi, porém, o que se viu após Moraes ser indicado para o STF.
Antes de prosseguir, vale lembrar o contexto em que o próximo ministro do STF Alexandre de Moraes chega ao cargo. Filiado ao PSDB, braço direito do governador Geraldo Alckmin e depois do presidente Michel Temer, Moraes chega ao Supremo sob suspeita de pretender usar o posto de relator da Lava Jato no STF para proteger aqueles aos quais serviu.
Surpreendentemente, porém, em sua Sabatina no Senado na última terça-feira (21), Moraes anunciou o que até já era de conhecimento de alguns, que estaria chegando ao STF com apoio dos coordenadores da Lava Jato no Ministério Público Federal (?!!).
Ouça a declaração de Moraes durante a sabatina no Senado
Não se sabe muito bem quem são “os dois coordenadores da Lava Jato” que Moraes cita, mas supõe-se que sejam os dois procuradores do MPF que mais falam publicamente, Deltan Dallagnol e Carlos Fernando dos Santos Lima.
Sobre Dallagnol, o mais curioso é que, no início de fevereiro, em entrevista à Folha, ele manifestava “preocupação” com Moraes, um teleguiado por Temer, investigado pela Lava Jato, tornar-se relator da Operação no Supremo.
Alguns dias depois, porém, em entrevista, Dallagnol mudou o discurso radicalmente e passou a defender a nomeação de Moraes. Ouça, abaixo.
Já o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, em entrevista recentíssima ao Estadão, mostrou que sua posição e a de Dallagnol sobre Moraes havia sido afinada. Usou os mesmos termos do colega para apoiar a ida do militante tucano-peemedebista para o Supremo:
“(…) Em relação ao ministro Alexandre de Moraes, temos ele como um jurista capaz, ele veio nos visitar logo no começo da gestão (na pasta da Justiça) mostrando comprometimento. E durante o período no Ministério da Justiça não vi nenhum efetivo problema de intervenção na Lava Jato. Então tenho por ele o maior respeito (…)”, disse Santos Lima.
Ninguém tem dúvida de qual será o comportamento do novo ministro do Supremo. A proposta de Moraes de tirar do Ministério Público o poder que Lula e Dilma lhe deram de a instituição indicar quem a chefia e a proximidade do novo ministro do STF com investigados deveria fazer esses “coordenadores da Lava Jato” se preocuparem, sim.
As declarações dos tais “coordenadores” mostra o que todos sempre soubemos: a Lava Jato não passa de uma iniciativa político-partidária de grupos políticos que não conseguiam chegar ao poder por meio do voto e, assim, usaram o Ministério Público, a Polícia Federal e a Justiça para perseguirem seus adversários políticos e tomarem o poder de assalto.
Simples assim.