Não é apenas o calote da Grécia que assombra os mercados mundiais. A incerteza sopra também na esquina do mundo que deveria ser o ponto de encontro entre capitais ariscos e a segurança, em última instância, para a desordem financeira por eles engendrada : ou seja, a economia norte-americana. Se as ruas da Grécia e da Espanha ardem em protestos pelo custo de uma convalescência que, ao final e ao cabo, materializa-se na supressão de direitos e deslocamento de riquezas das nações para os credores, a verdade é que o bunker norte-americano não inspira mais a confiança absoluta que dele se espera. Os investidores que se deslocavam ontem em busca de um porto seguro para assistir de longe ao incêndio grego, colidiram com o tráfego em sentido contrário de más notícias vindas dos EUA. O que as buzinas anunciavam era o fantasma da estagflação: a inflação americana foi além do que se previa; a economia ficou aquém do que precisava crescer para acalmar os espíritos da incerteza e da obsessão mórbida pela liquidez, como diria Keynes. A variação dos preços na meca capitalista atingiu 3,6% nos últimos 12 meses. É o maior nível desde outubro de 2008. O problema se agrava no contraste com a curva do crescimento, que desliza para baixo. O indicador da produção industrial da região de Nova York, em junho, está negativo em 7,79. Sugere uma ruptura na já lenta, frágil, recuperação esboçada desde o final de 2010. Esses são os fundamentos da notícia comemorada ontem no Brasil, de que o risco-país, pela primeira vez na história, ficou abaixo daquele atribuído à principal cidadela capitalista do planeta. Por fim, cresce a percepção de que corda política da crise esticou ao máximo. De agora em diante será cada vez mais difícil descarregar o ônus da convalescência nas costas de povos e nações endividados. O cenário é de um corner, com janelas que se fecham e pontos de fuga que se estreitam. Um dado resume todos os demais: o PIB mundial é da ordem de US$ 60 tri; o volume de capitais em busca de refúgio --capitais fictícios em grande parte (leia textos inéditos de Luiz Gonzaga Belluzzo nesta pág), ultrapassa US$ 900 tri. Essa espuma busca desesperadamente uma contrapartida (inexistente) na riqueza real que se estreita por conta da recessão e dos calotes em marcha . É a partir dessa dança das cadeiras que o Brasil deve analisar o passo seguinte do seu crescimento e a estratégia diante da invasão de fluxos especulativos na economia. Em artigo recente nesta pág , 'Nuvens Negras no Horizonte' (leia o especial "Desordem Financeira"), o economista da FGV, Amir Khair advertia: 'O melhor para o Brasil é apostar as fichas da saúde econômica e financeira naquilo em que somos bons: alto potencial de mercado interno inexplorado. É bom repensar as políticas do pé no freio, que podem fragilizar o País aos trancos de fora'