Por: Helena Stephanowitz
Valério teria feito o acordo de poupar o PSDB e atacar Lula em troca de benefícios no cumprimento da pena (Foto: Antônio Cruz. Arquivo Agência Brasil)
Uma reportagem publicada no Novo Jornal de Minas na segunda feira (14) reúne fatos que, analisados em conjunto e pela cronologia, criam um conjunto de circunstâncias que colocam o senador Aécio Neves (PSDB-MG) e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes no domínio do fato (à brasileira, culpados, mesmo sem provas irrefutáveis) sobre a suposta "delação premiada" do publicitário Marcos Valério ao procurador-geral da República, Roberto Gurgel, acusando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A história de "Como e porque Gilmar Mendes e o PSDB mantêm Marcos Valério refém" começa com o Habeas Corpus 97.416, julgado pelo então presidente do STF, Gilmar Mendes, para tirar da cadeia Marcos Valério e Rogério Tolentino em 14 de janeiro de 2009. Eles estavam em prisão provisória desde outubro de 2008 devido à “Operação Avalanche” da Polícia Federal, que nada teve a ver com "mensalão". Eram acusados de participar de suposto grupo criminoso, formado por empresários de uma grande cervejaria e policiais, que praticavam extorsão, fraudes fiscais e corrupção.
Gilmar Mendes concedeu a liberdade em caráter liminar, por decisão monocrática (decidiu sozinho), durante o recesso do STF. Desde janeiro de 2009 este habeas corpus tramita no STF à espera de um julgamento definitivo pela turma de ministros.
A relatora deste HC, após o recesso de janeiro de 2009, passou a ser a ministra Cármen Lúcia. Segundo o Novo Jornal, seu parecer, assim como o do PGR, é por restabelecer a prisão provisória, em decisão oposta à de Gilmar Mendes.
Em 8 de junho de 2010, o HC foi apresentado para julgamento. Passados mais de dois anos e meio, nada de ser julgado.
As coisas ficam mais estranhas quando, em 6 de setembro de 2012 (em pleno julgamento do mensalão), o HC é "retirado de mesa [para julgamento]". Duas semanas depois, no dia 24 de setembro, Marcos Valério prestou depoimento ao procurador-geral da República tentando envolver o nome de Lula – porém não apresentou provas, e sequer foi convincente.
Tudo isso até aqui é fato incontestável, registrado no andamento do habeas corpus de Marcos Valério dentro do STF.
Mas a reportagem continua, dizendo que em junho de 2012, às vésperas do julgamento do mensalão, Marcos Valério se sentia traído por Aécio, pois o PSDB estava pressionando por sua condenação. Por isso escreveu um depoimento que pretendia fazer perante a Procuradoria Geral da República (PGR), entregando documentos que comprovavam como funcionou o esquema no governo Aécio, após 2002. Ainda segundo a reportagem, o dono da R&C Propaganda, Álvaro Rezende, seria o interlocutor de Marcos Valério responsável por levar o depoimento até Aécio. O resultado seria um acordo no qual Valério pouparia o PSDB e atacaria Lula, em troca de benefícios, incluindo regalias no cumprimento da pena de prisão em Minas Gerais.
A R&C Propaganda acompanha Aécio desde o início de sua carreira política e, segundo a reportagem, recebeu um aditivo em um contrato com a Copasa (empresa do governo de Minas) em novembro de 2012, que teria sido repassados a Marcos Valério, como parte do acordo, segundo a reportagem.
O jornal afirma ainda que a fonte é um ex-ministro do STF, que teria recebido, junto com os outros ministros, um "Relatório Reservado" narrando tal acordo. A parte fraca da reportagem é dizer que o relatório é de autoria anônima, mas seria fruto de investigações da Agência Brasileira de Inteligência, que inclusive teria agentes requisitados por Joaquim Barbosa para segurança.
Há pontos da reportagem que carecem de melhor apuração, mas só de levantar a cronologia dos fatos documentados no habeas corpus já tem seu valor.
E, quanto ao suposto acordo, a reportagem parece que só captou a ponta do iceberg até o momento. Nós já antecipamos aqui que Aécio deu sinais de acordo para indultar Valério.