Enquanto muitos – eu entre eles – comemoravam uma belíssima vitória do Direito sobre a politicagem ao fim da sessão do STF da última quarta-feira, outros viram menos motivos para comemorar do que para lamentar não o desfecho do embate espantoso que se instalou na instância máxima do Poder Judiciário, mas a mera existência daquele embate.
Ao sopesar o desastre do qual o Brasil acabara de escapar, espantei-me. Eu estava comemorando o que, afinal? Que quase metade de um colegiado com tanto poder tenha se disposto a agir como se fosse participante de em um reality show em que se busca, única e exclusivamente, popularidade?
Dá para comemorar que CINCO ministros do STF tenham dado uma banana para a lei e tido a “coragem” espantosa de negar um direito que só com uma dose cavalar de otimismo é possível acreditar que desconheciam? É como estar em um avião com quatro turbinas e comemorar quando “só” duas param de funcionar em pleno voo.
Não, meus caros leitores, não há motivo para comemoração, mas, sim, para muita preocupação.
Por duas horas inteirinhas, o ministro Celso de Mello explicou, didaticamente, como era absurdo recusar o direito de qualquer um a recurso secular de condenados em ações penais na última instância do Judiciário. E, apesar disso, nenhum dos que votaram daquela forma criminosa pediu para rever seu voto (!?).
O que foi aquele discurso de Gilmar Mendes na semana passada e as declarações dele nesta semana, tanto no Supremo quanto fora dele e para a imprensa?
Mendes fez um discurso quase inacreditável atacando os judiciários de países vizinhos nos quais a democracia vige com tanto vigor quanto aqui. Um discurso cheio de idiossincrasias e com uma baboseira ideológica cabível, sim, em colunas políticas de jornais, mas incabível na Cúpula de um dos Poderes da República.
Você gostaria de ver o Eduardo Guimarães ou o Reinaldo Azevedo levando as suas opiniões de forte cunho político-ideológico para o julgamento de um filho, de um pai ou de um irmão seu ou gostaria que fossem julgados por magistrados serenos, concentrados apenas na letra da lei?
Eu, aliás, não poderia ser eu se fosse um mero juiz de primeira instância, quanto mais se fosse um ministro do Supremo. Teria que reformular minha forma de ser e de pensar. Estaria obrigado a me tornar escravo da Constituição, enfim, escravo de todo o arcabouço legal constituído. Ou não poderia ser juiz.
Não restou a menor dúvida de que os embargos infringentes são legais. Aliás, já não restava desde o primeiro voto sobre esse assunto na semana retrasada.
Mas quando, na noite da última sexta-feira, o site do jornal O Globo publicou matéria relatando que o Congresso já se havia debruçado sobre o tema em 1990 e recusara a supressão do instrumento recursal, não havia mais o que discutir.
Duvido de que os ministros que votaram contra os embargos infringentes não soubessem o que um obscuro repórter de O Globo descobriu e que este blog qualificou como “prova” de que continuavam válidos. Desse modo, um, dois, três, quatro, cinco ministros do STF mentiram, encenaram uma farsa que visou enganar o país.
Li uma tese curiosa do blogueiro Reinaldo Azevedo, tese que um leitor dele postou na caixa de comentários desta página. Vale reproduzir, porque, em parte, concordo com o blogueiro da Veja.
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(…) A menos que os cinco ministros que recusaram os infringentes sejam ogros do direito; a menos que os cinco ministros que disseram “não” ao expediente sejam notáveis cretinos, incapazes de entender o ordenamento jurídico em que vivemos; a menos que os cinco ministros que repudiaram o que lhes pareceu uma excrescência tenham se divorciado da lei, é forçoso constatar que o caminho seguido por Celso de Mello não era o único que se conciliava com as leis (…)
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Concordo, em parte. Ao rejeitarem um recurso que o blogueiro supracitado enrolou, enrolou e não soube dizer por que não é válido, a única conclusão possível é que esses cinco ministros agiram assim porque são, sim, “ogros” e/ou “notáveis cretinos incapazes de entender o ordenamento jurídico em que vivemos”.
Como você se sente, leitor, sabendo que quase metade do comando de um Poder da República ao qual você ainda poderá ter que recorrer – caso nunca tenha recorrido – é composto por “ogros cretinos”? Você eu não sei, mas eu posso lhe garantir que me sinto muito, muito, mas muito mal mesmo. Fortemente preocupado. E algo desalentado.