No sábado, ele chama Guido Mantega de estelionatário. Um bandido capaz de causar inveja em Marcos Valério. No domingo, Dilma Rousseff é a presidente chavista que já arruinou o setor elétrico e estaria prestes a calar a imprensa livre. Parece até "Dudu, o alarmista", personagem criado por Luís Fernando Veríssimo, que só enxergava o pior. Relaxa, Guilherme. Pega uma praia
247 - "Dudu, o alarmista" foi um clássico das tiras em quadrinhos no País. Criado por Luís Fernando Verissimo, o personagem só enxergava o pior. Às vezes, um "pior" que ninguém via, além dele.
O Brasil tem hoje um novo personagem. É "Fiúza, o alarmista". Escritor talentoso, responsável por livros de sucesso como "Meu nome não é Johnny" e, agora, "Giane", Fiúza consegue cativar o leitor por saber enxergar o que as pessoas têm de melhor.
No entanto, ele é também cronista político e econômico. Nesse papel, o Fiúza boa gente encarna um outro personagem. É o crítico amargo que enxerga um desastre após o outro.
No sábado, Guido Mantega, ministro da Fazenda, era um estelionatário (leia mais aqui), no artigo de Fiúza, no Globo. No domingo, Dilma Rousseff é a presidente chavista que acaba de arruinar o setor elétrico brasileiro e que estaria prestes a calar a imprensa livre.
Relaxa, Fiúza. Este não é o melhor dos mundos possíveis, como diria Dr. Pangloss, mas também não é o pior. As pessoas estão trabalhando, o desemprego é o menor em dez anos, o Brasil não está nos braços do FMI, os reservatórios estão enchendo...
Relaxa, Fiúza. Pega uma praia.
Abaixo, o artigo de "Fiúza, o alarmista", neste domingo na revista Época:
No jeitinho venezuelano, a lei é soberana, desde que não contrarie o espírito bolivariano
O Brasil apoiou o adiamento da posse presidencial na Venezuela para esperar um pouco mais por Hugo Chávez. O jeitinho venezuelano de preservar sua democracia na marra tem dessas licenças poéticas. A lei é soberana, desde que não contrarie as conveniências do espírito bolivariano, encarnado no coronel-presidente. Diante desse truque da esquerda bandoleira, o Brasil poderia até ter deixado passar, ter fingido que não viu, ter mudado de assunto. Mas não: ergueu-se a voz do Itamaraty, sacudindo o Barão do Rio Branco nas catacumbas, para anunciar que o governo da companheira Dilma apoia o contrabando político do companheiro Chávez.
A solidariedade é compreensível. São dois projetos - o que governa o Brasil e o que governa a Venezuela - irmanados no mesmo princípio essencial: não largar o osso, custe o que custar. Nunca é demais lembrar que o Itamaraty, na era do governo popular, segue a linha doutrinária de Marco Aurélio Garcia - aquele flagrado comemorando com gestos obscenos (o clássico "top-top") a notícia de que as duas centenas de mortes no acidente da TAM se deveriam a falhas do avião, e não do governo.
A escala de valores dessa turma, como se vê, obedece a códigos humanitários muito especiais. Também ficou na história - ou melhor, não ficou, porque o Brasil esquece tudo - a declaração do então ministro da Previdência e prócer do PT, Ricardo Berzoini, durante uma operação para recadastramento de aposentados do INSS. Depois de insistir em obrigar velhinhos de 90 anos a penar em filas imensas a céu aberto, Berzoini finalmente recuou diante das imagens de idosos desmaiando nas calçadas. E justificou o recuo, placidamente, dizendo que o "desgaste" seria grande. Com aposentados sob tortura nas ruas, o ministro se referia ao desgaste do PT. Eles só pensam naquilo.
É, portanto, absolutamente natural o apoio do Itamaraty ao cambalacho constitucional dos companheiros chavistas. O que importa é manter viva a lenda terceiro-mundista da revanche popular sobre as elites – conto de fadas que alimenta a mais formidável indústria do voto da história das Américas.
Foi sob essa mesma doutrina que Lula trocou carinhos em público com o sanguinário Muammar Khadafi, o falecido (linchado) ditador líbio que brilhava no presépio do antiamericanismo. Com Mahmoud Ahmadinejad, o tarado atômico do Irã, o governo popular foi mais longe, convidando-o para passear de queixo empinado em nossos quintais – como parte da pantomima de resistência contra o império ianque. Sem falar na comparação antológica do lulismo entre bandidos paulistas e presos políticos cubanos – para legitimar o apoio do PT a Fidel Castro.
E tome literatura progressista, com a aliança folclórica entre as "presidentas" Dilma Rousseff e Cristina Kirchner - na qual a brasileira banca ideologicamente os arroubos autoritários da colega argentina, em sua cruzada contra a liberdade de expressão. O mesmo plano de controle da mídia está firme no ideário do PT, e só não foi posto em prática (ainda) porque a imprensa brasileira é mais vigorosa. Mas a demagogia tarifária que apodreceu o setor elétrico argentino já foi devidamente importada, com as conseqüências devastadoras a que o Brasil hoje assiste nas empresas de energia.
O alinhamento do Itamaraty com mais esse golpe da democracia privatizada venezuelana não é só um ato vergonhoso, para enriquecer o folclore de um governo que fala com o mundo por meio do sectarismo obsceno de um Marco Aurélio Garcia. Esse gesto expressa a inequívoca tentação chavista do regime liderado pelo PT, que está há dez anos manobrando para subjugar o Estado brasileiro pelo aparelhamento político. O mensalão nada mais foi do que o capítulo mais escandaloso dessa doutrina.
Mas os brasileiros não se importam com a implantação desse parasitismo institucionalizado, e marcham para dar-lhe o quarto mandato presidencial consecutivo, visando ao aperfeiçoamento da obra.
O Itamaraty pode apoiar todos os golpes chavistas, assim como pode dar passaporte diplomático para Valdemiro e Franciléa, líderes da Igreja Mundial do Poder de Deus, alegando que isso seja de interesse nacional. Deve ser mesmo. Os interesses da nação têm obedecido a crenças que até Deus duvida.
FOLHA ESCALA MAIS UM PARA DESANCAR DILMA
Agora é Vinícius Torres Freire, que tenta reduzir a pó o governo Dilma. Segundo ele, a presidente não entende de economia, não tem ministros competentes, só construiu puxadinhos de papelão e toma atitudes que "não fazem lé com cré". Ele reclama até do aumento do salário mínimo. E tudo isso num só artigo
247 - Aparentemente, o comando na Barão de Limeira, em São Paulo, onde funciona a sede da Folha de S. Paulo, é apontar todos os canhões na direção da presidente Dilma. Agora é Vinícius Torres Freire, colunista de economia que, até recentemente, era percebido como um nome mais à esquerda no jornal quem tenta reduzir a pó o governo Dilma. Num só artigo, ele reclama de tudo – até do aumento do salário mínimo – e reclama da "escassa noção de macroeconomia" da presidente. Leia abaixo:
FOLHA DE SP - 20/01
Dilma promete crescimento 3S, "sério, sustentável e sistemático", mas dedica-se a maquiagens
DILMA ROUSSEFF construiu uns puxadinhos no primeiro ano de governo. Feios, mas talvez apenas uns improvisos provisórios de política econômica. Daí passou a erguer barracos e ora se muda para umas caixas de papelão na calçada.
Barraco de papelão, ou simplesmente papelão, é o que parecem os remendos nas contas do governo, maquiadas no final do ano passado com uns artifícios que não enganariam ninguém nem resolveriam problema concreto algum.
Em seguida, Dilma mendigou uns adiamentos de reajustes de ônibus e metrô com governos de São Paulo e Rio. Queria evitar a impressão de descontrole, uma alta de preços que estourasse a meta nos próximos meses, o que deixaria o governo ainda mais mal falado. Mas, para usar uma frase original, a emenda piorou o soneto.
Dilma ameaça desmoralizar a ideia de que existem políticas econômicas alternativas àquelas pregadas por economistas-padrão, mercadistas e viúvas do governo FHC. Remendos e puxadinhos não são alternativas.
Toma atitudes que não fazem lé com cré. Talhar a indecente taxa de juros básica a machadadas poderia ser boa coisa. Mas não funciona se o governo gastar mais, seja diretamente ou por meio de endividamento com o objetivo de turbinar os bancos públicos. Não funciona porque alimenta a inflação, que o governo quer disfarçar. Mais um pouco (de inflação) e os juros vão subir, sem que o país tenha saído do lugar.
O governo gasta mais e mal, de resto, vitaminando o consumo, sem investir mais.
De certo modo, ainda tênue, as medidas econômicas de Dilma lembram bobagens dos governos de esquerda, "populares", da América Latina da segunda metade do século 20, ruins não porque "populares", mas porque destrambelhados e ingênuos. Queriam distribuir renda rapidamente, por vias tortas, o que dava em inflação, a qual tentavam domar com tabelamentos e coisas do gênero, o que dava em escassez.
Somadas, carestias e carências davam em tumulto e, assim, serviam de desculpa para a direita dar golpes.
Estamos, claro, muitíssimo longe disso. Mas Dilma também tenta controlar lucros e preços, fazer "política de rendas" (na Petrobras, em tarifas públicas, com bancos etc.). Mexe em efeitos em vez de tratar das causas. Continuou a aumentar demais o mínimo, para o que ainda houve alguma folga no governo Lula, mas não mais agora. A alta do mínimo ora ajuda a estourar as contas do governo e aduba a inflação.
Dilma não tem ministros capazes; não delega, pois, e se ocupa de muita coisa ao mesmo tempo, em geral de muita coisinha. Se presta a megalomanias (trens-bala) quando seu governo não consegue nem construir postes para transmitir eletricidade de usina que está pronta (quando falta energia no país); o investimento federal caiu desde que assumiu. Acha que pode "destravar" o investimento no país pedindo dicas a uns empresários e dando safanões noutros.
Tem escassa noção de macroeconomia, mas se acredita guia genial da política econômica; não tem planos de médio prazo. Achou que perderia tempo se dedicando a reformas grandes e agora se perde em miudezas. Seu governo parece não ter tempo senão para maquiagens, mas parece descabelado