Chegou ao fim a era Roberto Gurgel/Sandra Cureau na cúpula do Ministério Público Federal. Pode-se dizer, aliás, que foi um fim melancólico. Ao longo dos últimos anos, a própria instituição Ministério Público do Brasil foi sentindo os efeitos de uma postura autocrática e politicamente partidarizada sobretudo do antigo procurador-geral da República.
A posse do novo procurador-geral, Rodrigo Janot, foi prestigiada pela presidente Dilma Rousseff e, ali, foram vistas declarações da chefe do Poder Executivo e do agora chefe do Ministério Público quanto à questão da “interlocução” do MP com outros Poderes, preservada, obviamente, a independência da instituição.
Muitos não entenderam a razão de a marca daquele diálogo ter sido justamente o relacionamento do Ministério Público com “outros Poderes”, mas tudo decorre do clima estabelecido pelo ex-PGR Roberto Gurgel.
Nesse aspecto, foi sintomático o discurso de Janot em sua posse: “Foi um discurso de pacificação, mostrando claramente quais são as funções institucionais e constitucionais do Ministério Público”, disse a senadora Ana Amélia (PP-RS) ao deixar a cerimônia.
“Pacificação”? Sim, pacificação, porque Gurgel estabeleceu uma linha de confronto político-partidário, aliando-se a meios de comunicação e a partidos políticos de oposição, tornando-se uma “estrela”, sobretudo por conta de acusações de endurecimento com alvos do MPF ligados ao PT e ao governo federal e de amaciamento com oposicionistas.
Durante o julgamento do mensalão, ano passado, Gurgel vivia no Jornal Nacional dando declarações insultantes ao partido do governo, como se fosse um mero oposicionista. E, também, foi acusado formalmente de prevaricação por acobertar o bicheiro Carlinhos Cachoeira e o governador de Goiás, Marconi Perillo.
Não por outra razão, Gurgel foi alvo de críticas, no primeiro semestre, durante debate entre os candidatos a procurador-geral da República. No evento, os quatro subprocuradores-gerais que concorriam à indicação de Dilma reclamaram do “isolamento” dele e defenderam um maior diálogo do Ministério Público Federal com o Congresso Nacional.
Segundo declarações dos então candidatos a PGR Deborah Duprat, Ela Wiecko, Rodrigo Janot e Sandra Cureau, a instituição MPF vive “um momento de hostilidade por parte dos parlamentares, principalmente após a sentença do mensalão”.
Após uma eleição em que 1.200 procuradores da República votaram em um dos candidatos, venceu Rodrigo Janot. E, com ele, segundo suas palavras, teria início um novo relacionamento do MP com os demais poderes. E foi assim que o novo PGR deu seu primeiro passo, na semana que finda, ao dizer que não pedirá a prisão dos réus do julgamento do mensalão antes do fim do processo.
Nos últimos dias, por conta disso, começaram os ataques da mídia. O site da revista Veja “acusou” Janot de ter feito “verdadeira campanha eleitoral” para chegar ao cargo, tendo “contratado assessoria para angariar votos entre procuradores”, e de ter se licenciado do cargo de subprocurador-geral para “dedicar-se à disputa”.
Esse ataque ocorreu na última terça-feira e na sexta, após Janot anunciar que não irá pedir imediatamente a prisão dos réus do mensalão, como querem a mídia e a oposição, sofreu ataque do blogueiro do Grupo Folha (UOL) Josias de Souza, que publicou post dizendo que o novo PGR teve “um péssimo começo”.
Paralelamente, o substituto de Sandra Cureau como vice-procurador-geral-eleitoral, Eugênio Aragão, indicado por Janot, já sofre pressões da mídia por ter negado o registro do partido de Marina Silva caso não apresente as quase 500 mil assinaturas válidas para ser criado.
A mídia vem pressionando a Justiça Eleitoral para que “flexibilize” a lei de modo a que a pré-candidata a presidente possa disputar a sucessão de Dilma, mas Aragão já deu sinais de que não pode fazê-lo sob pena de ter que aceitar que a lei seja “flexibilizada” para todos os partidos que queiram criar, o que é um risco.
Durante a semana que finda, veio a público que outra nova legenda, a exemplo da de Marina Silva, vem fraudando as assinaturas necessárias à criação de partidos. O partido que o sindicalista e deputado Paulo Pereira da Silva, o “Paulinho da Força”, tenta criar, um tal de “Solidariedade”, chegou a falsificar assinatura de chefe de cartório.
A pressão sobre Eugênio Aragão é importante para a mídia oposicionista porque será ele quem fiscalizará as eleições do ano que vem e poderá impor multas, vetar propagandas, enfim, poderá prejudicar muitas candidaturas e, nesse contexto, todos se lembram do desastre Sandra Cureau em 2010, quando atuou como preposta da candidatura José Serra.
Note-se que toda essa pressão sobre a nova cúpula do MP aconteceu em um período de pouquíssimos dias. A mídia está “testando” os estreantes e já promete mover campanha contra eles. Resta saber se vão se deixar intimidar. As informações de que dispõe este Blog é a de que isso não vai ocorrer. Janot e Aragão seriam pessoas da mais alta seriedade.
Apesar dessas informações, porém, todos sabemos do poder de pressão dessa mídia partidarizada que empurra homens públicos para o dilema de cederem aos seus ditames e irem para o céu que habita um Joaquim Barbosa ou para o inferno ao qual ela condenou um Ricardo Lewandowski. Melhor, pois, esperarmos antes de comemorar.