Sobre o controle social e ético da liberdade de expressão
É um direito de cidadania, mas há limites democráticos
Fátima Oliveira,
Jornal OTEMPO
Médica -
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Das duas, uma, ou nenhuma: sou insana e quem pensa diferente é saudável; ou sou uma “sana” ilhada – cercada de insanos por todos os lados. Como as duas premissas são impossibilidades, decidi filosofar sobre o furdunço polissêmico em que tentam colocar a liberdade de expressão… Ora, liberdade de expressão não comporta polissemias (do grego poli = muitos e sema = significados)!
A presidente Dilma Rousseff, em discurso nos 90 anos da “Folha”, disse: “A multiplicidade de pontos de vista, a abordagem investigativa e sem preconceitos dos grandes temas de interesse nacional constituem requisitos indispensáveis para o pleno usufruto da democracia, mesmo quando são irritantes, mesmo quando nos afetam, mesmo quando nos atingem. E o amadurecimento da consciência cívica da nossa sociedade faz com que nós tenhamos a obrigação de conviver de forma civilizada com as diferenças de opinião, de crença e de propostas” (FSP, 21.2.2011).
A liberdade de expressão é um direito de cidadania. Há limites democráticos, pois democracia não é anarquia, até para falar, sem que seja, a priori, censura, tal como o senso comum crê: um gesto ditatorial. Em tudo que prejudique direitos humanos de um setor social – caso de publicidade e novelas machistas – cabem limites, isto é, civilidade; e também marketing social.
Quem diz o que pensa, o que quer e quando quer, precisa saber que, numa sociedade democrática e plural, é essencial ter em conta as diferentes moralidades, adotando a prática de deferência à alteridade (colocar-se no lugar do “outro”) ao falar, pois cada pessoa – falo o conceito de pessoa, e não o de seres humanos, pois há seres humanos e pessoas… – é totalmente responsável por seus atos e palavras, inclusive a escrita. Eis os limites.
À ampla liberdade de expressão corresponde absoluta responsabilização pelas opiniões emitidas. Todavia, muita gente, equivocadamente, só entende a liberdade de expressão em sua face direito de dizer – falar e agir como bem lhe aprouver, fazendo de conta que a responsabilidade por palavras e atos significa sempre censura descabida.
A censura não se apresenta abstratamente, pois na real é ela e suas circunstâncias. Pelo nosso passado de uma ditadura militar de triste memória, a tendência de quem ama a liberdade, aparentemente, é a mesma dos que a odeiam: achar que o conceito de censura é sempre aquele que a ditadura militar nos impôs. É uma distorção conceitual.
Os amantes da liberdade, porque foi a censura da ditadura quem usurpou suas vozes e até vidas, e os que a odeiam, muitos coparticipantes dos tempos de arbítrio, porque querem esculhambar, acusar e julgar sem provas pessoas e governos; fazer linchamento moral público, só na base de acusações; e não querem ser chamados à responsabilidade, jamais!
Não é um imbróglio. Tem nome: safadeza conservadora autoritária. E tem sido praticada pelas viúvas e os viúvos da ditadura militar de 1964 e seus sequazes, sempre a postos para confundir pessoas incautas. Quem defende as liberdades democráticas nunca fala a mesma língua de quem um dia sufocou-as, até quando usa as mesmas palavras.
É preciso um razoável repertório de malícia, perder a crença nas pedras de sal, para não ser embromado e apreender que o respeito à alteridade é condição indispensável ao fortalecimento da democracia, que não pode prescindir do controle social e ético da liberdade de expressão ao elaborar um novo contrato social que assegure as liberdades democráticas.
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