Mente vazia, oficina do sistema da mídia golpista
sábado, 8 de janeiro de 2011
Wanderley abre a agenda da extrema- direita. Está com Serra
O professor Wanderley Guilherme dos Santos publica extraordinário artigo na Carta Capital que está nas bancas.
“A direita encontra o seu Messias ?”.
“Ao assumir o papel de principal líder do aglomerado conservador, Serra amealhou respeitável portfólio eleitoral”.
Wanderley mostra que os 44% dos votos válidos Padim Pade Cerra (a expressão é do C Af – PHA) foram resultado de uma campanha “acima dos partidos, praticamente sozinho, com um partido de apoio, o DEM, em frangalhos, e outro, o PSDB, batendo em retirada.”
Como foi possível ?
“ … levado à disputa pela campanha de Marina Silva, o obscurantismo adquiriu a tradicional truculência do tucanato serrista …”
A partir daí, Wanderley faz a analise da agenda “da direita explícita” de Cerra.
Enxugamento do Estado.
(O pessoal do Reagan dizia que era preciso reduzir o estado de tal forma que fosse possível afogá-lo numa banheira. É isso aí: “enxugamento”.)
Substancial redução de impostos.
(Plataforma universal da extrema-direita: rico não gosta de pagar imposto. Bush é o herói deles.)
Na política externa, “retorno a belicoso alinhamento ideológico ‘aos valores ocidentais’, com sotaque inglês.”
(Como disse o Chico no Casa Grande : o Cerra é daquela turma que fala grosso com a Bolívia e fininho com os Estados Unidos.)
Cerra ia dar o 13º. ao Bolsa Família.
Isso significava impedir que o programa crescesse e, com isso seria confinado aos atuais beneficiários.
(E depois, como previu político mineiro a este Conversa Afiada: depois o Cerra venderia o Bolsa Família à WalMart.)
Aumentar o salário mínimo exageradamente – outra promessa de campanha – teria o poder de quebrar a Previdência e, portanto, privatizá-la.
Com essa função, Fernando Henrique mandou André Lara Rezende ao Chile para copiar o modelo pinochetista.
Na volta, Rezende procurou alguns “formadores de opinião “ para vender a ideia.
Este ordinário blogueiro mereceu a vista deste importante emissário.
Outro aspecto da agenda oculta do Padim Pade Cerra, que o professor Wanderley expõe à luz do Sol: o voto distrital puro.
O que também é do ideário da Blá Bla Marina.
(Além disso, a Blá Blá se propõe a reavaliar Darwin e incentivar o estudo do Criacionismo, impedir a união de pessoas do mesmo sexo e pesquisas com células-tronco, e êpa !, acabar com divórcio. É a treva soterrada na escuridão !)
O Aécio também gosta do “distrital puro”, lembra o Wanderley.
E o que significa o “voto distrital puro”, segundo Wanderley ?
Simples.
“Essa desinstitucionalização interromperia a importante tarefa de trazer para o leito da política partidária e parlamentar os conflitos sociais e econômicos das grandes periferias metropolitanas e das regiões limítrofes ao território do país…”
Partidos como o PSB, o PR e o PC do B sumiriam do mapa (o PPS, segundo Wanderley, está para se dissolver no PSDB).
Ou seja, o “voto distrital puro” concentraria a tensão política em dois partidos – como nos Estados Unidos e na Inglatera – confortavelmente instalados no centro do espectro político.
E o povão ia para o saco (a expressão não é digna do professor Wanderley).
Nada mais cristalino.
Para responder ao professor Wanderley: sim, a direita tem o seu Messias.
O Padim Pade Cerra.
Que, como diz esse atrevido blog, tem o apoio da Chevron e do Papa.
São apoios de peso !
Em tempo: não deixe de ler na Carta, ali perto do Wanderley, ótima análise do Maurício Dias sobre o PMDB: “Fácil de entender, difícil de usar”. Mauricio lembra que ainda está por definir-se cargo importantíssimo: a presidência de Furnas, “estatal sediada no Rio de Janeiro e guarnecida pelo deputado peemedebista Eduardo Cunha, um nome que dispensa apresentações.”
Paulo Henrique Amorim
Passaportes dos filhos de Lula são legais
Nos últimos dias, a “dobradinha” entre mídia e oposição a que se referiu , em dezembro, o então ministro da Comunicação Social do governo Lula, Franklin Martins, apareceu de novo, provavelmente como prenúncio dos tempos que virão de continuidade das eternas picuinhas da mídia contra o agora ex-presidente petista, fantasma que esses veículos de comunicação aliados ao PSDB e aos seus satélites partidários julgam que precisam exorcizar até 2014.
Como dissera Martins, a mídia “levanta a bola” e a oposição “corta”. Foi assim no caso da RENOVAÇÃO dos passaportes diplomáticos de familiares do ex-presidente Lula. A mídia inventou uma ilegalidade qualquer na medida do Itamaraty, em uma conduta hipócrita que será explicada mais adiante, construiu uma manchete propícia à “escandalização do nada” e a oposição já veio “cortando”, dando declarações difamantes contra o ex-presidente da República e sua família.
Em seguida, cumprindo o bom e velho script de guerra a Lula que vige desde 1989 na mídia, o indefectível Ophir Cavalcante, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, sempre disposto a oferecer teses “legais” para a dobradinha tucano-midiática, faz uma “ameaça” aos filhos de Lula, de que se não devolverem os passaportes diplomáticos que têm desde que o pai se tornou presidente pela primeira vez, em 2003, serão “denunciados”.
A principal tese da mídia é a de que o Itamaraty não poderia ter “concedido” – e o correto seria dizer “renovado” – o passaporte diplomático a Marcos Cláudio Lula da Silva, de 39 anos, e a Luiz Cláudio Lula da Silva, de 25 anos, porque são maiores de 21 anos e esta faixa etária seria o limite para concessão desse documento a que têm direito o ex-presidente da República e seus dependentes. Estes, contudo, só teriam esse direito até essa idade.
Só agora a mídia transformou em escândalo um fato que vigeu durante os oito anos do governo Lula. Por que não “denunciou” antes que ao menos o filho de 39 anos de Lula tem passaporte diplomático? Simples, porque está começando uma campanha difamatória contra o ex-presidente que fará a que se viu durante o seu mandato parecer uma prolongada declaração de amor.
O PSDB, por meio de Globos, Folhas, Vejas e Estadões, bem como dos seus babados, está se dedicando a transformar em escândalo uma prática que vige há muito tempo e que beneficia a um espectro amplo de pessoas, incluindo gente da oposição tucano-midiática, como revela boa matéria do jornal O Estado de São Paulo sobre o assunto.
A concessão de passaportes diplomáticos no Brasil, no entanto, é muito mais comum do que se pensa, tendo até uma página do Itamaraty na internet em que é possível obter as informações necessárias para a concessão de um documento que o Estado brasileiro concede a qualquer um que considere que deve recebê-lo, pois decreto da Casa Civil da Presidência da República dá à autoridade competente a prerrogativa de tomar tais decisões.
A questão de idade dos dependentes dos beneficiados por passaportes diplomáticos é, também, passível da subjetividade do ministro das Relações Exteriores, em última instância. Não é por outra razão que o Itamaraty oficializou, em maio do ano passado, a concessão de passaportes diplomáticos a parceiros gays de servidores que trabalham nas representações do Brasil no exterior, conforme matéria do portal R7 que pode ser lida aqui.
A mídia está usando a decisão de Marcos Cláudio Lula da Silva de devolver um passaporte que afirma que nunca usou como “prova” de que estaria se beneficiando de uma ilegalidade, da qual só abre mão por ter sido “denunciado”. Será uma pena se Marcos fizer isso, pois, apesar da “ameaça” do tucanérrimo Ophir Cavalcante, não existe a menor possibilidade de um processo dessa natureza prosperar sem que venha a tona que há muito gato gordo do setor privado – inclusive da mídia – beneficiado por passaporte diplomático.
Na verdade, o passaporte diplomático não importa em qualquer ônus para a sociedade. Apenas dá regalias àqueles que o Ministério das Relações Exteriores considera que, por projeção social, política, econômica ou cultural, entre outras, devem ter.
As regalias são de trâmites mais rápidos e isentos de maiores constrangimentos nos setores de imigração de outros países. Os passaportes diplomáticos não geram custo de qualquer espécie para os cofres públicos. A concessão deles, historicamente comum no Brasil, só poderia ser questionada com chance de sucesso se um cidadão como qualquer outro o recebesse sem uma explicação tão boa quanto a de ser filho de um ex-presidente da República.
O PT e a presidente Dilma Rousseff cometerão o mesmo erro que cometeram no primeiro turno da campanha eleitoral do ano passado se acharem que podem adotar uma postura fleumática diante dos ataques da mídia confiando em que esses ataques não lhes reverterão em prejuízos políticos. Mas esse é assunto para um outro post, a ser publicado no momento certo.
A crise irlandesa e o fracasso do neoliberalismo
Durante uma década a Irlanda foi chamada de "tigre celta" e apresentada pelos defensores mais fervorosos do capitalismo neoliberal como o modelo a seguir. A liberalização econômica e financeira que visava atrair a qualquer preço os investimentos estrangeiros e as sociedades financeiras transnacionais conduziu a um fracasso completo. Em setembro de 2008, o castelo de cartas ruiu, as bolhas financeiras e imobiliárias explodiram. Empresas começaram a fechar ou deixam o país, o desemprego disparou, passando de 0%, em 2008, para 14% no princípio de 2010. O artigo é de Eric Toussaint.
Eric Toussaint
Durante uma década a Irlanda foi apresentada pelos promotores mais fervorosos do capitalismo neoliberal como o modelo a seguir. O "tigre celta" ostentava uma taxa de crescimento mais elevada do que a média europeia. O taxa de tributação das empresas havia sido reduzida a 12,5% [1] e a taxa efectivamente paga pelas numerosas transnacionais que ali tinham domicílio oscilava entre 3% e 4%: um sonho! Um déficit orçamentário igual a 0 em 2007. Uma taxa de desemprego de 0% em 2008. Um verdadeiro encanto: todo o mundo parecia ali encontrar o seu quinhão.
Os trabalhadores tinham um emprego (é certo que muitas vezes precário), as suas famílias consumiam alegremente, elas desfrutavam do efeito riqueza e os capitalistas, tanto nacionais como estrangeiros, ostentavam resultados extraordinários.
Em outubro de 2008, dois ou três dias antes de o governo salvar da falência os grandes bancos "belgas" (Fortis e Dexia) às expensas dos cidadãos, Bruno Colmant, diretor da Bolsa de Bruxelas e professor de economia, publicou um artigo em Le Soir, o diário belga francófono de referência, no qual afirmava que a Bélgica devia absolutamente seguir o exemplo irlandês e desregulamentar ainda um pouco mais o seu sistema financeiro. Segundo Bruno Colmant, a Bélgica devia modificar o quadro institucional e legal a fim de se tornar uma plataforma do capital internacional como a Irlanda. Algumas semanas mais tarde, o Tigre Celta estava de joelhos.
Na Irlanda, a desregulamentação financeira encorajou uma explosão dos empréstimos às famílias (o endividamento familiar havia atingido 190% do PIB na véspera da crise), nomeadamente no setor imobiliário, o que estimulou a economia (indústria da construção, atividades financeiras, etc). O setor bancário inchou de uma forma exponencial com a instalação de numerosas sociedades estrangeiras [2] e o aumento dos ativos dos bancos irlandeses. Formaram-se bolhas imobiliárias e nas bolsas. O total das capitalizações na bolsa de valores, das emissões de obrigações e dos ativos dos bancos atingiu catorze vezes o PIB do país.
Aquilo que não podia acontecer neste mundo encantador aconteceu então: em setembro-outubro de 2008, o castelo de cartas ruiu, as bolhas financeiras e imobiliárias explodiram. Empresas fecham ou deixam o país, o desemprego sobe em flecha (de 0% em 2008, ele salta para 14% no princípio de 2010). O número de famílias incapazes de pagar os credores cresce muito rapidamente. Todo o sistema bancário irlandês está à beira da falência e o governo, completamente em pânico e cego, garantiu o conjunto dos depósitos bancários com 489 bilhões de euros (cerca de três vezes o PIB irlandês, que se elevava a 168 bilhões de euros). Ele nacionaliza o Allied Irish Bank, principal financiador do setor imobiliário, injetando 48,5 bilhões de euros (cerca de 30% do PIB).
As exportações enfraquecem. As receitas do Estado baixam. O déficit orçamentário salta de 14% do PIB em 2009 para 32% em 2010 (mais da metade é atribuível ao apoio maciço aos bancos: 46 bilhões de injeção de fundos próprios e 31 de compra de ativos de risco).
O plano europeu de ajuda do fim de 2010, com participação do FMI, eleva-se a 85 bilhões de euros de empréstimos (dos quais 22,5 fornecidos pelo FMI) e já se verifica que será insuficiente. Em contrapartida, o remédio de cavalo imposto ao tigre celta é de fato um plano de austeridade drástico que pesa fortemente sobre o poder de compra das famílias, tendo como consequências uma redução do consumo, das despesas públicas nos domínios sociais, dos salários da função pública e na infraestrutura (em proveito do reembolso da dívida) e das receitas fiscais.
As principais medidas do plano de austeridade são terríveis no plano social:
Supressão de 24.750 empregos de funcionários (8% do efetivo, o que equivaleria à supressão de 350 mil empregos na França);
Os novos contratados receberão um salário 10% inferior;
Baixa das transferências sociais com diminuição dos subsídios de desemprego e familiares, redução importante do orçamento da saúde, congelamento das pensões;
Aumento dos impostos pagos principalmente pela maioria da população vítima da crise, nomeadamente alta do IVA de 21 para 23% em 2014; criação de uma taxa imobiliária (afeta a metade das famílias, até então livres de tributação);
Baixa de 1€ do salário horário mínimo (de 8,65 para 7,65 euros, ou seja, -11%).
As taxas dos empréstimos concedidos à Irlanda são muito elevadas: 5,7% para o do FMI e 6,05% para os empréstimos "europeus". Eles servirão para reembolsar os bancos e outras sociedades financeiras que comprarão os títulos da dívida irlandesa — as quais tomam emprestado a uma taxa de 1% junto ao Banco Central Europeu. Um verdadeiro presente dos deuses para os agentes financeiros privados. Segundo a AFP, "o diretor geral do FMI, Dominique Strauss-Kahn, declarou: "Isto vai anda, mas naturalmente é difícil [...] porque é duro para as pessoas' que terão de fazer sacrifícios em nome da austeridade orçamentária".
A oposição na rua e no parlamento foi muito forte. O Dail, câmara baixa, adoptou o plano de ajuda de 85 bilhões de euros apenas por 81 votos contra 75. Longe de abandonar a sua orientação neoliberal, o FMI indicou que colocava dentre as prioridades da Irlanda a adoção das reformas para suprimir "os obstáculos estruturais aos negócios", a fim de "sustentar a competitividade nos próximos anos". O socialista Dominique Strauss-Kahn diz-se convencido de que a chegada de um novo governo após as eleições previstas para o princípio de 2011 nada mudaria: "Estou confiante em que, ainda que os partidos da oposição, o Fine Gael e o trabalhista, critiquem o governo e o programa [...], eles compreendem a necessidade de colocá-lo em execução".
Em suma, a liberalização econômica e financeira que visava atrair a qualquer preço os investimentos estrangeiros e as sociedades financeiras transnacionais conduziu a um fracasso completo. Para aumentar os danos sofridos pela população vítima desta política, o governo e o FMI não encontraram nada melhor do que aprofundar a orientação neoliberal praticada desde há 20 anos e infligir à população, sob a pressão da finança internacional, um programa de ajuste estrutural calcado em medidas impostas há três décadas aos países do terceiro mundo.
Estas três décadas devem ao contrário servir de exemplo daquilo que não se deve fazer. Eis porque é urgente impor uma lógica radicalmente diferente, em favor dos povos e não da finança privada.
Notas
(1) A taxa de tributação dos lucros das empresas eleva-se a 39,5% no Japão, 39,2% na Grã-Bretanha, 34,4% em França, 28% nos Estados Unidos.
(2) As dificuldades do banco alemão Hypo Reale Estate (salvo em 2007 pelo governo de Angela Merckel) e a falência do banco Bear Sterns nos EUA (comprado em Março de 2008 pelo J.P. Morgan com a ajuda da administração Bush) provém nomeadamente dos problemas dos seus fundos especulativos cuja sede era em Dublim.
P.S. Este artigo inspirou-se num Power Point realizado por Pascal Franchet ("Actualité de la dette publique au Nord").
(*) O original encontra-se em http://www.cadtm.org/La-crise-irlandaise-fiasco-complet
(**) Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
Os trabalhadores tinham um emprego (é certo que muitas vezes precário), as suas famílias consumiam alegremente, elas desfrutavam do efeito riqueza e os capitalistas, tanto nacionais como estrangeiros, ostentavam resultados extraordinários.
Em outubro de 2008, dois ou três dias antes de o governo salvar da falência os grandes bancos "belgas" (Fortis e Dexia) às expensas dos cidadãos, Bruno Colmant, diretor da Bolsa de Bruxelas e professor de economia, publicou um artigo em Le Soir, o diário belga francófono de referência, no qual afirmava que a Bélgica devia absolutamente seguir o exemplo irlandês e desregulamentar ainda um pouco mais o seu sistema financeiro. Segundo Bruno Colmant, a Bélgica devia modificar o quadro institucional e legal a fim de se tornar uma plataforma do capital internacional como a Irlanda. Algumas semanas mais tarde, o Tigre Celta estava de joelhos.
Na Irlanda, a desregulamentação financeira encorajou uma explosão dos empréstimos às famílias (o endividamento familiar havia atingido 190% do PIB na véspera da crise), nomeadamente no setor imobiliário, o que estimulou a economia (indústria da construção, atividades financeiras, etc). O setor bancário inchou de uma forma exponencial com a instalação de numerosas sociedades estrangeiras [2] e o aumento dos ativos dos bancos irlandeses. Formaram-se bolhas imobiliárias e nas bolsas. O total das capitalizações na bolsa de valores, das emissões de obrigações e dos ativos dos bancos atingiu catorze vezes o PIB do país.
Aquilo que não podia acontecer neste mundo encantador aconteceu então: em setembro-outubro de 2008, o castelo de cartas ruiu, as bolhas financeiras e imobiliárias explodiram. Empresas fecham ou deixam o país, o desemprego sobe em flecha (de 0% em 2008, ele salta para 14% no princípio de 2010). O número de famílias incapazes de pagar os credores cresce muito rapidamente. Todo o sistema bancário irlandês está à beira da falência e o governo, completamente em pânico e cego, garantiu o conjunto dos depósitos bancários com 489 bilhões de euros (cerca de três vezes o PIB irlandês, que se elevava a 168 bilhões de euros). Ele nacionaliza o Allied Irish Bank, principal financiador do setor imobiliário, injetando 48,5 bilhões de euros (cerca de 30% do PIB).
As exportações enfraquecem. As receitas do Estado baixam. O déficit orçamentário salta de 14% do PIB em 2009 para 32% em 2010 (mais da metade é atribuível ao apoio maciço aos bancos: 46 bilhões de injeção de fundos próprios e 31 de compra de ativos de risco).
O plano europeu de ajuda do fim de 2010, com participação do FMI, eleva-se a 85 bilhões de euros de empréstimos (dos quais 22,5 fornecidos pelo FMI) e já se verifica que será insuficiente. Em contrapartida, o remédio de cavalo imposto ao tigre celta é de fato um plano de austeridade drástico que pesa fortemente sobre o poder de compra das famílias, tendo como consequências uma redução do consumo, das despesas públicas nos domínios sociais, dos salários da função pública e na infraestrutura (em proveito do reembolso da dívida) e das receitas fiscais.
As principais medidas do plano de austeridade são terríveis no plano social:
Supressão de 24.750 empregos de funcionários (8% do efetivo, o que equivaleria à supressão de 350 mil empregos na França);
Os novos contratados receberão um salário 10% inferior;
Baixa das transferências sociais com diminuição dos subsídios de desemprego e familiares, redução importante do orçamento da saúde, congelamento das pensões;
Aumento dos impostos pagos principalmente pela maioria da população vítima da crise, nomeadamente alta do IVA de 21 para 23% em 2014; criação de uma taxa imobiliária (afeta a metade das famílias, até então livres de tributação);
Baixa de 1€ do salário horário mínimo (de 8,65 para 7,65 euros, ou seja, -11%).
As taxas dos empréstimos concedidos à Irlanda são muito elevadas: 5,7% para o do FMI e 6,05% para os empréstimos "europeus". Eles servirão para reembolsar os bancos e outras sociedades financeiras que comprarão os títulos da dívida irlandesa — as quais tomam emprestado a uma taxa de 1% junto ao Banco Central Europeu. Um verdadeiro presente dos deuses para os agentes financeiros privados. Segundo a AFP, "o diretor geral do FMI, Dominique Strauss-Kahn, declarou: "Isto vai anda, mas naturalmente é difícil [...] porque é duro para as pessoas' que terão de fazer sacrifícios em nome da austeridade orçamentária".
A oposição na rua e no parlamento foi muito forte. O Dail, câmara baixa, adoptou o plano de ajuda de 85 bilhões de euros apenas por 81 votos contra 75. Longe de abandonar a sua orientação neoliberal, o FMI indicou que colocava dentre as prioridades da Irlanda a adoção das reformas para suprimir "os obstáculos estruturais aos negócios", a fim de "sustentar a competitividade nos próximos anos". O socialista Dominique Strauss-Kahn diz-se convencido de que a chegada de um novo governo após as eleições previstas para o princípio de 2011 nada mudaria: "Estou confiante em que, ainda que os partidos da oposição, o Fine Gael e o trabalhista, critiquem o governo e o programa [...], eles compreendem a necessidade de colocá-lo em execução".
Em suma, a liberalização econômica e financeira que visava atrair a qualquer preço os investimentos estrangeiros e as sociedades financeiras transnacionais conduziu a um fracasso completo. Para aumentar os danos sofridos pela população vítima desta política, o governo e o FMI não encontraram nada melhor do que aprofundar a orientação neoliberal praticada desde há 20 anos e infligir à população, sob a pressão da finança internacional, um programa de ajuste estrutural calcado em medidas impostas há três décadas aos países do terceiro mundo.
Estas três décadas devem ao contrário servir de exemplo daquilo que não se deve fazer. Eis porque é urgente impor uma lógica radicalmente diferente, em favor dos povos e não da finança privada.
Notas
(1) A taxa de tributação dos lucros das empresas eleva-se a 39,5% no Japão, 39,2% na Grã-Bretanha, 34,4% em França, 28% nos Estados Unidos.
(2) As dificuldades do banco alemão Hypo Reale Estate (salvo em 2007 pelo governo de Angela Merckel) e a falência do banco Bear Sterns nos EUA (comprado em Março de 2008 pelo J.P. Morgan com a ajuda da administração Bush) provém nomeadamente dos problemas dos seus fundos especulativos cuja sede era em Dublim.
P.S. Este artigo inspirou-se num Power Point realizado por Pascal Franchet ("Actualité de la dette publique au Nord").
(*) O original encontra-se em http://www.cadtm.org/La-crise-irlandaise-fiasco-complet
(**) Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
HORA DE COBRAR VALE PAGA MENOS ROYALTIES QUE A PETROBRAS
O tucano Roger Agnelli, presidente da Vale, está com os dias contados na direção da empresa privatizada por FHC em 1997. Seu mandato termina em março e não será prorrogado. O governo Dilma, através dos fundos de pensão das estatais e do BNDES (sócios da Vale), tem condições de interferir na sucessão. Agnelli travou uma queda de braço com o governo Lula nos últimos anos tornando-se um personagem à altura daquele que foi o mais indecoroso capitulo do processo de privatização realizado pelo PSDB nos anos 90. Vendida quando era a principal estatal brasileira, a Vale rendeu ao Estado a bagatela de R$ 3,3 bi, exatamente a metade do lucro líquido obtido em um único trimestre de 2010 (R$ 6,6 bi entre abril/junho do ano passado). FHC não tremeu a voz ao narrar uma fábula tucana no programa ‘Palavra do Presidente', em 26/11/1996: ‘Vendendo a Vale", justificou, ‘ nosso povo vai ser mais feliz, vai haver mais comida no prato do trabalhador ". Nos últimos anos, Agnelli resistiu aos apelos do Presidente Lula para traduzir ‘a felicidade' prometida por FHC em investimentos que agregassem valor às exportações brasileiras, em vez de simplesmente produzir buracos no país mandando minério bruto para o exterior. Não o fez. Pior que isso, a exemplo de todo o setor de mineração, a Vale paga à sociedade menos royalties do que a Petrobrás: 2% contra 10%. Se reverter o processo de alienação tornou-se difícil, que se obtenha da mineradora, ao menos, uma alíquota dos lucros equivalente à propiciada pela estatal que mais adiciona investimentos à economia. No momento em que o governo da Presidenta Dilma se propõe a erradicar a miséria no país, é hora de cobrar uma contribuição justa de quem há 13 anos usufrui riquezas, sem contrapartida proporcional. Não basta trocar Agnelli, é preciso trocar a lógica da espoliação. (Leia também no 'Valor", "Mineração x petróleo. Os royalties nossos de cada dia", de Luiz Begazo;07/01/2011)
(Carta Maior; Sábado, 08/01/2011
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