Fim
da hibernação? Dilma reúne-se com centrais sindicais e negocia pauta
comum para preservar e ampliar direitos sociais; Lula articula
mobilizações em resposta ao golpismo, diz colunista Teresa Cruvinel, no
24/7
Procurador Rodrigo Janot laça o tucanato pelo bico: 'Essa sistema (na
Petrobras) vem desde 1987. Passa por todos os Governos. Ainda não sei o
tamanho total da caixa de Pandora' (El País).
Senadores
tucanos montam megaestrutura de análise e informação para tomar de
assalto a opinião pública e construir uma hegemonia que sancione a
desestabilização do governo Dilma (leia a reportagem de Antonio Lassanc.
Datafolha inconsolável: preocupação do brasileiro com a corrupção cai de
14% para 9% de junho a dezembro. Motivo: 46% afirmam que o governo
Dilma é o que mais investigou a corrupção; apenas 1% acha que FHC foi o
que mais puniu os corruptos, contra 40% que atribuem essa qualidade a
Dilma
Carta Maior.
O Conversa Afiada reproduz artigo de Saul Leblon, extraído da Carta Maior:
O pescoço do Brasil
2014 é o melhor ano do emprego nos EUA desde 1999, festeja o Wall Sreet Journal. Por que raios, então, o negro Eric Garner vendia cigarros ilegalmente nas ruas.
por: Saul Leblon
Negros desarmados mortos por policiais brancos compõem um postal da identidade norte-americana.
São standarts, como as freeways, a CIA, a Coca-cola de uma sociedade plasmada pelo capitalismo mais exitoso do planeta.
Nela, o condutor de um carro velho
recebe, por definição, o carimbo de ‘looser’ (perdedor). Pela mesma
razão que um negro pobre é suspeito e passível de ação policial, até
prova em contrário.
O negro Eric Garner, vendedor
ambulante em Nova Iorque, asmático, 43 anos, não teve tempo, nem ar, na
semana passada, para provar quem era.
Garner avisou ao policial que comprimia seu pescoço com uma chave de braço, que não estava conseguindo respirar.
Fez isso 11 vezes.
Até morrer.
Negros formam 13% da população
norte-americana; representam mais de 40% da massa carcerária; algo como
um milhão em um total de 2,5 milhões.
Prisões em massa e mortes, nada disso é novidade para eles nos EUA.
A novidade diante da rotina são os
protestos que ela vem provocando exatamente quando a recuperação
econômica faz de 2014 ‘o melhor ano em termos de criação de empregos
desde 1999’, garante o Wall Sreet Journal, desta 2ª feira.
Por que raios, então, Garner vendia cigarros ilegalmente nas ruas, como suspeitou a batida policial que o levou à morte?
A resposta desnuda um traço
constitutivo do ajuste capitalista conduzido pela lógica dos mercados e
emite uma advertência em relação à chave de braço que alguns querem
aplicar no pescoço na economia brasileira.
Seis anos após o colapso de 2008, a
lucratividade dos bancos norte-americanos registra recordes sobre
recordes, trimestre após o outro.
Em contrapartida, a subutilização
da força de trabalho –indicador que soma emprego parcial e desistência
de buscar vaga, como deve ter sido o caso de Garner – atinge
assustadores 13%.
Na maior economia capitalista da terra, metade das vagas criadas no pós-crise é de tempo parcial, com salários depreciados.
Não é um aquecimento de motores.
É o padrão de uma economia
desossada em suas vértebras produtivas , por obra da desregulação
financeira do ciclo neoliberal iniciado nos anos 80, com Reagan.
A ideia de que um
reposicionamento econômico dentro do capitalismo possa ser terceirizado
ao mercado, como se fosse um freio de arrumação neutro, faz tanto
sentido quanto dar uma chave-de pescoço em um asmático e ficar surpreso
com a sua morte.
O fato de os EUA terem um salário
mínimo congelado há 15 anos, diz muito sobre a natureza dessa chave de
pescoço econômica, que joga milhões de Garners para o submundo dos
loosers.
A decepção de Obama ao constatar
que a tão aguardada ‘recuperação’ pode acontecer associada a uma maior
desigualdade e, portanto, sem revitalizar sua popularidade –como
evidenciou a derrota nas eleições legislativas de novembro– ilustra a
dificuldade de se atribuir ao mercado aquilo que ele não sabe fazer.
O conjunto sugere que a presidenta
Dilma terá que analisar detidamente cada medida de aperto fiscal que lhe
for apresentada pela nova equipe econômica.
O risco é o país perder a última
linha de resistência diante de um mercado mundial que estrebucha: o
dinamismo de sua demanda interna.
Os sinais de alarme desta 2ª feira justificam a prontidão.
As exportações chinesas cresceram a
metade do esperado em novembro (4,7% contra 8%); o PIB do Japão caiu
mais que previsto no 2º trimestre e a possante máquina germânica
rasteja tendo registrado uma expansão de apenas 0,2% em outubro. Tudo
isso explica que o barril de petróleo custe hoje 40% menos e que as
cotações das commodities agrícolas exportadas pelo Brasil valham, em
média, 13% abaixo do patamar de 2013.
A sabedoria dos especialistas é
insuficiente para conduzir um país a salvo por esse desfiladeiro
emparedado entre a queda das cotações das commodities, de um lado, e a
sinalização de alta dos juros, do outro.
Em ciclos anteriores, sempre que
essa sobreposição se deu, como em 1810-1930 e 1980, América Latina viveu
solavancos políticos fortes.
Foi o que aconteceu no caso do Brasil, com a declaração da Independência, a ascensão de Vargas e a derrubada da ditadura.
O cerco conservador agora reflete o faro da matilha para um novo ciclo de vulnerabilidade da presa.
O caminho das pedras terá que ser
modulado e ordenado pela mobilização e o engajamento dos principais
interessados na preservação do rumo mais equitativo seguido até aqui: os
sindicatos, os movimentos sociais e os partidos do campo progressista.
Em nenhum lugar do mundo há notícia de que a democracia social tenha se consolidado sem um sujeito histórico correspondente.
Obama não conseguiria ser um ‘Roosevelt’ da crise atual, nem que quisesse.
Faltam-lhe as bases organizadas que
o sindicalismo combativo dos anos 30/40 propiciou ao democrata que
comandou os EUA entre 1933 e 1945.
O Brasil tem forças sociais estruturadas.
Suas centrais sindicais que, finalmente, se reuniram com a Presidenta Dima, nesta 2ª feira, preservam certa capilaridade.
A inteligência progressista dispõem de propostas críveis e sensatas.
Nos últimos doze anos, o país foi dotado de sólidas políticas sociais, ademais de estruturas de Estado para ampliá-las.
O conjunto permite à Presidenta
Dilma negociar rumos e metas do desenvolvimento com a sociedade,
preservando-se o mercado de massa, mesmo em um intermezzo de
reacomodação fiscal.
Há um requisito, porém: o timming das iniciativas de governo – de qualquer governo – faz enorme diferença.
Uma crise tem um tempo certo para
ser derrotada, ou derrotará o governo, a produção, o emprego e os
atores que vacilarem diante dela.
Nisso, sobretudo nisso, Franklin
Roosevelt revelou-se o estadista cuja habilidade ainda tem lições a
oferecer aos seus contemporâneos.
Em apenas uma semana após a sua
posse, em 1933, ele tomou algumas decisões que não exorcizaram todos os
demônios, mas foram afrontá-los em seu próprio campo.
Os tempos são outros; as agendas
precisam ser renovadas, mas nada justifica ofuscar o componente de
coragem do passado para dissimular a tibieza no presente.
Muitos relativizam o alcance das
medidas anti-cíclicas tomadas por Roosevelt nos 11 anos que antecederam o
ingresso dos EUA na guerra de 1944, quando seu potencial produtivo,
finalmente, foi acionado a plena carga.
Mas poucos se lembram de perguntar o
que teria acontecido com o presidente democrata, reeleito quatro vezes
(de 1933 a 1945), se a sua autoridade tivesse fraquejada no primeiro
mandato, na primeira semana ou no primeiro dia de março.
É sobre isso que os chefes de
Estado de hoje deveriam refletir em vez de adiarem decisões à espera de
um auto-ajuste dos mercados.
A calibragem fina entre a barbárie e a emancipação de uma sociedade não está prevista nos manuais de economia.
Esse apanágio pertence à democracia.
Se não dilatar o espaço da política
na condução da economia no seu segundo mandato, a presidenta Dilma
corre o risco de acordar um dia com uma chave de braço atada ao pescoço
do país.
E perder o que já tem.
Sem obter o que a ortodoxia lhe promete entregar.
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