Mente vazia, oficina do sistema da mídia golpista

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quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Após prisões, delegado diz ser impossível acabar com o Neonazismo no RS

Neonazistas pregam o ódio e a discriminação contra negros, judeus e homossexuais. Mulheres também se integram ao movimento e participam das ações violentas.

Conforme a polícia gaúcha, há células neonazistas no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e São Paulo, além de outros locais investigados

Uma briga envolvendo punks, skinheads e ao menos um neonazista no último sábado em um bar de Porto Alegre (RS) ligou o sinal de alerta da polícia para a atuação de grupos que pregam o ódio e a discriminação no Sul do País, inspirados pela ideologia de Adolf Hitler. Responsável pelo indiciamento de 35 neonazistas no Estado nos últimos dez anos, o delegado Paulo César Jardim, da 1ª DP, afirma que está "na gênese" do gaúcho a guarida para movimentos deste tipo.

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"A origem do povo gaúcho é colonial e, além disso, a Argentina, que abrigou oficiais nazistas após a 2ª Guerra Mundial, está aqui do lado e preocupa. Para a consolidação dessa ideologia, deve existir um meio viável, caso do Rio Grande do Sul. O neonazismo é uma coisa que jamais vai acabar. É um sentimento, uma ideologia, e não se pode acabar com ideologias, mas evitar suas consequências e ações", acredita o delegado.

Segundo ele, na pancadaria do último sábado, que envolveu ao menos oito pessoas e deixou um homem negro esfaqueado, a motivação foi uma discussão entre punks e skinheads. Os envolvidos, porém, já possuem uma ficha criminal conhecida por crimes como agressão a homossexuais, judeus e negros, que configuram a ideologia nazista. "Eles seguem a ideia da instituição de uma raça pura através da eliminação dos que não se enquadram nela. No Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e São Paulo, os movimentos neonazistas escolheram pessoas que devem ser eliminadas por pertencerem a uma 'subespécie'", salientou Jardim.

Expansão neonazista

O delegado Paulo Jardim, que se especializou em investigar como esses grupos atuam, viaja constantemente a São Paulo e troca informações com as polícias de outros Estados. Ele está preocupado com a expansão do movimento neonazista no País. "O desafio é conseguir abortar os ataques, como foi feito em 2010, quando foram desmontadas cinco células neonazistas. Apreendemos bombas, munição, e armas, e evitamos a explosão de uma sinagoga e um ataque na Parada Livre de Porto Alegre. As mesmas bombas que nós apreendemos aqui foram usadas em São Paulo, o que comprova a ligação material entre os grupos", disse ele.

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"Estamos trabalhando para prender essas pessoas. A situação deles nos últimos anos está complicada e alguns vão responder, em júri popular, por tentativa de homicídio, formação de quadrilha e corrupção de menores", garantiu o delegado, que também investiga a ligação material entre os grupos, como fornecimento de dinheiro e armas entre os Estados.

Agressividade e humilhação

No código de condutas de um neonazista, um dos requisitos é saber lutar e andar armado, estando sempre pronto para um combate. Além disso, eles costumam tatuar o corpo com diversos símbolos e desenhos que fazem apologia à doutrina de Hitler.

"Eles são de uma agressividade muito grande e seguem uma ideia de que não se deve apenas derrotar o inimigo, mas humilhá-lo, acabar com ele, impor o medo. O seu combustível é o ódio e eles já saem às ruas preparados para briga com soqueiras, facas e outros objetos cortantes. Se as pessoas identificá-los em algum local, é interessante sair de perto, pois eles são sinônimo de confusão", recomenda Jardim.

Histórico de agressões e apologia

Em 2010, um grupo de defesa dos direitos dos travestis no Rio Grande do Sul recebeu ameaças por telefone de um suposto neonazista, que disse preparar uma ação na 14ª Parada Livre. Em edição anterior do evento, cartazes que pregavam a morte de homossexuais foram afixados no bairro Bom Fim, onde ocorre a passeata.

Em novembro do mesmo ano, policiais civis apreenderam material de apologia ao nazismo em uma residência no centro de Porto Alegre. Foram recolhidos fotografias, CDs, camisetas, distintivos, facas, uma soqueira e um laptop, mas ninguém foi preso. Em 2009, apreensões semelhantes ocorreram em Cachoeirinha, Viamão, Porto Alegre e duas cidades da serra gaúcha.

Em 2009, o casal Bernardo Dayrell e Renata Ferreira foram assassinados após uma festa neonazista no Paraná. O crime foi cometido na BR-116, em Quatro Barras, região metropolitana de Curitiba, e teve motivações de disputa entre o grupo neonazista liderado por Dayrell e Ricardo Barollo, apontado pela polícia como o mandante do duplo homicídio. Além dele, Jairo Maciel Fischer, Rodrigo Motta, Gustavo Wendler, Rosana Almeida e João Guilherme Correa foram acusados de participar no crime.

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No dia do assassinato do casal, vários membros do grupo neonazista foram a uma festa em comemoração ao aniversário de Adolf Hitler em uma chácara de Quatro Barras. Conforme a lei 7.716, de 1989, "fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins de divulgação do nazismo" prevê pena de até três anos de reclusão.

Terra

A caça às bruxas na Rede Globo


Por Marco Aurélio Mello, em blog DoLaDoDeLá:

Uma fonte na TV Globo conta que desde sexta-feira começou uma caça às bruxas na emissora. Eles querem saber quem foi que vazou para o Rodrigo Vianna o plano de desqualificar o novo ministro da defesa, Celso Amorim. Como era sigiloso e envolveu não mais do que 20 profissionais de três capitais, eles consideram que fazer o mapeamento e achar o "traidor" é questão de tempo.

Só que eles ignoram que este tipo de segredo é de polichinelo, não dá para ser guardado numa redação. Por uma razão simples: um editor tem sempre outro editor com quem troca confidências. Repórteres, mesmo que tenham sido poucos e confiáveis os acionados, sempre comentam com os cinegrafistas - afinal têm uma amizade muito longa. E, não raro, há alguém que ouve, um auxiliar, um motorista... Portanto, esqueçam, será impossível descobrir de onde partiu a notícia que caiu como uma bomba no colo dos gestores.

Dizem até que o Código de Princípios que estava planejado para ser divulgado depois de um Seminário, com pompa e circunstância, foi antecipado. Os principais apresentadores do Jornal Nacional, Wiliam Bonner e Fátima Bernardes teriam sido convocados para trabalhar no fim de semana, fato raríssimo. Tudo para tentar apagar o incêndio de proporções desastrosas.

Sinal de que há sim um grupo lá dentro muito insatisfeito com o comando do jornalismo. Na Avenida Chucri Zaidan, por exemplo, onde fica a sede da emissora em São Paulo, o clima é de tensão e medo. O vazamento é tratado como crime e ao traidor está reservada a forca, o esfolamento - como na pintura de Michelângelo na Capela Sistina - com consequente exibição de vísceras em praça pública. Ninguém mandou tratar jornalismo como se fosse mercadoria. Jornalismo é informação, sem viés ideológico, sem interesse econômico e político. Simples assim!

JN atropela Código de Ética da Globo

luisnassif

Na chamada das 17hs00 do Jornal Nacional, Fátima Bernardes anunciou que uma das prisões da Polícia Federal – na operação sobre o Ministério do Turismo – seria de Clarice Coppeti.
Clarice foi vice-presidente de TI da Caixa Econômica Federal. Saiu, está de quarentena, preparava uma palestra na UnB quando foi alcançada por telefonemas desesperados de seus familiares.
É tida na CEF como pessoa corretíssima e, mais: jamais trabalhou em qualquer área ou projeto relacionado com o Ministério do Turismo. 
A notícia foi dada sem que os nomes fossem conferidos e os acusados ouvidos.
PS - O Jornal Nacional abriu a matéria pedindo desculpas para a vítima - que está arrebentada, chorando, a mãe velhinha em pânico em Porto Alegre.

Amorim dá um baile na Catanhede


Vou lhe repassar uma pergunta que me foi feita por um oficial: e se fosse um general mandando no Itamaraty, os diplomatas iriam gostar?
Os diplomatas são muito disciplinados, a tradição era que os ministros não fossem da carreira e houve mesmo um que vinha da carreira militar, o general da reserva Juracy Magalhães. Então, o importante é ser patriota, ter humildade para ouvir e capacidade para decidir.
O interrogatório, digo, a entrevista a que foi submetido o Ministro da Defesa, Celso Amorim, pela jornalista Eliane Catanhede, na Folha. Vale a pena ser lida, porque é um festival de dribles de fazer inveja a Mané Garrincha. A entrevistadora vai para cima dele com uma disposição, digamos, de zagueiro russo, e leva várias como essa aí.
Que é um recado para os bons entendedores.
Juracy, como se sabe, é o autor da frase símbolo do capachismo colonial: “o que é bom para os Estados Unidos, é bom para o Brasil”. Mais: foi informante do FBI americano e conspirou contra o seu ex-patrono, Getúlio Vargas.
Foi para a UDN e terminou ministro da “Justiça” do golpe de 1964.
Dona Catenhede precisa comer muita massa cheirosa até poder pretender terçar armas com Celso Amorim.

Entrevista de Celso Amorim na Folha - Amorim rebate crítica e defende general do Exército.

Em resposta aos seus críticos militares, o novo ministro da Defesa, ex-chanceler Celso Amorim, provoca: "Você não pode fazer das Forças Armadas uma coisa partidária nem para a esquerda, nem para a direita".
Em entrevista no novo gabinete, Amorim, 69, disse que o comandante do Exército, general Enzo Peri parece uma pessoa "não apenas ilibada, mas até um asceta".
Um relatório do TCU (Tribunal de Contas da União), como a Folha revelou na terça-feira, diz que Enzo favoreceu firmas ligadas a militares ao dispensá-las de licitação entre 2003 e 2007.
Folha - Quem convidou o sr. a presidente Dilma ou o ex-presidente Lula?
Celso Amorim - A presidente Dilma, claro. Fui sendo prevenido aos poucos, ela me ligou poucos minutos antes do anúncio, e eu só falei com o presidente Lula no domingo, depois de conversar pessoalmente com ela.
- O sr. tinha mágoa de não ter sido convidado para nada por ela na troca de governo?
Mágoa nenhuma. Sou a favor da renovação e eu não podia querer me perpetuar num cargo ou disputar outro. Já tinha até alugado apartamento em Brasília para o depois. Essa coisa de que não nos damos bem é do imaginário. Ao contrário, nós nos damos excelentemente bem.
- O seu nome foi cogitado para a Defesa quando o ministro Waldir Pires caiu e depois no início do governo Dilma. O sr. tinha a expectativa de assumir a pasta?
Nunca tive essa expectativa, nem era uma aspiração, mas há uma relação óbvia entre as funções dos ministérios das Relações Exteriores e da Defesa. Eu já considerava minha carreira de homem público completa, esperava ser professor, colunista, palestrante.
- Aliás, o sr. mantém a crítica que fez na revista "Carta Capital" ao voto favorável do governo Dilma a um relator especial da ONU para apurar abusos contra Direitos Humanos no Irã?
Hoje, eu sou parte do governo e tenho de participar solidariamente das decisões do governo, e essa pasta pertence a outro ministro. Como intelectual independente, o que eu escrevi e disse claramente é que, se fosse eu, não teria tomado aquela atitude.
- Uma das mais fortes críticas que oficiais militares fazem ao sr. é justamente a ligação com o Irã.
Nós nunca ficamos amiguinhos do Irã, e o Irã jamais foi uma prioridade da nossa política externa. O que foi uma prioridade, sim, num determinado momento, foi resolver um problema grave para o mundo que, aliás, continua existindo: o problema do programa nuclear do Irã. Como resguardar de um país ter um programa país e ao mesmo tempo resolver as desconfianças que havia? Tentamos viabilizar uma proposta dos países do Ocidente, a começar dos Estados Unidos, que depois mudaram de posição e acharam que não era mais assim. Mas a verdade é que tivemos estímulo deles. Ou seja: nunca houve uma aventura iraniana, como alguns querem fazer crer. Houve uma atitude independente e transparente nossa.
- O sr. é "esquerdista"?
Esses rótulos, é melhor deixar os outros colocarem. Uns dizem que fui colocado pela presidente Dilma por ser nacionalista, o que agrada aos militares. Outros, que foi porque sou esquerdista, o que não agrada a eles. Mas, no Brasil, nacionalismo não é confundido com esquerdismo?
- A presidente disse que o sr. é patriota. Como o sr. define esse conceito?
Nossa ideologia é a pátria e a Constituição. Fui sempre um profissional do interesse nacional. Uma coisa é você ficar trancado na sua casa, torcendo para o Brasil num jogo de futebol, o que é muito bom e todos nós fazemos isso. Mas outra é você ser um profissional do interesse nacional. Acho que sempre fui e de várias maneiras, em negociações comerciais, políticas, de segurança nacional. Você não descreve com palavras e sim com atitudes.
- A brincadeira automática, depois que a presidente disse que o sr. é patriota é que o Patriota não é nenhum Amorim... Já disseram até que ele volta na prática a ser secretário-geral do Itamaraty.
Isso não tem nenhum sentido. Eu tenho muito o que aprender aqui na minha pasta, nem vou ter tempo para olhar para a dos outros. Eu e o Patriota trabalhamos juntos quinze anos e, desse susto, nem ele nem vocês morrem.
- O sr. vai trazer diplomatas?
Não estou pensando nisso.
- Vai trocar eventualmente algum comandante militar?
Não é minha intenção nem recebi nenhuma orientação nesse sentido, ao contrário.
- Num dos seus artigos, o sr. também escreveu que não são satisfatórias as relações entre o poder civil e os militares e a responsabilidade por atos cometidos na ditadura. Como pretende avançar nos dois casos?
Não me recordo exatamente das palavras que usei nesse artigo, que era sobre como o Brasil pode ajudar na transição dos países árabes e comento o que ocorreu no Brasil, inclusive sobre as relações de civis e militares. Não é que eu disse que não são satisfatórias, mas que talvez algumas pessoas não vejam como satisfatórias. É uma constatação de um fato, mais do que um juízo de valor. Mas sei que a subordinação das Forças Armadas ao poder civil é clara e que a presidente Dilma exerce esse comando obviamente, e o ministro da Defesa é um instrumento dessa hierarquia.
- Por que o sr. não fez nenhuma referência no seu discurso à Comissão da Verdade negociada entre civis e militares?
Fiz referências a Direitos Humanos, e acho que esse assunto, da Comissão da Verdade, está bem encaminhado. Acabei de chegar, hoje é meu primeiro dia de trabalho, e não tenho todas as respostas, mas tenho grande esperança de que a Comissão da Verdade possa ajudar a resolver essas questões. Vai ter algum reclamo de um lado e de outro? Não sei, mas sei que é uma boa base para aplainar a questão no futuro.
- O sr. defende a responsabilização dos militares por atos cometidos na ditadura, como houve na Argentina, no Uruguai, no Chile?
Nem as situações que geraram os fatos nem as soluções foram idênticas. O mais importante é o restabelecimento da verdade. Acho que esse assunto está bem encaminhado. Se houver bom senso de todos os lados e uma boa articulação política, que cabe ao ministro da Justiça [José Eduardo Cardozo, do PT], nós chegaremos a uma boa conclusão.
- O general Augusto Heleno...
A quem aprecio, pelo bom trabalho que fez no Haiti e que eu acompanhei, porque nós trabalhamos juntos...
-... disse que o comprometimento ideológico tem repercussão altamente negativa entre os militares. O sr. concorda?
Acho que você não pode fazer das Forças Armadas uma coisa partidária, mas acho que nem para a esquerda, nem para a direita, nem para o centro. Agora, patriotismo é patriotismo. Cada um interpreta a seu modo, e para isso nós temos a presidente da República, que é quem escolhe, quem decide e quem foi eleita pelo provo brasileiro.
- E as reações de setores militares contra a escolha de um novo diplomata, depois da passagem do embaixador José Viegas pela Defesa?
Não fui escolhido por ser um diplomata. Fui ministro por nove anos e meio, no governo Itamar e nos oito anos do presidente Lula, e ministro é um cargo político. Estou assumindo um lugar novo que tem muitos desafios para mim, como teria para qualquer outro. Mas a gente aprende, se trabalhar com afinco e souber ouvir.
- Vou lhe repassar uma pergunta que me foi feita por um oficial: e se fosse um general mandando no Itamaraty, os diplomatas iriam gostar?
Os diplomatas são muito disciplinados, a tradição era que os ministros não fossem da carreira e houve mesmo um que vinha da carreira militar, o general da reserva Juracy Magalhães. Então, o importante é ser patriota, ter humildade para ouvir e capacidade para decidir.
- Se a gente somar tudo o que o sr. disse no seu discurso de posse sobre soldos, equipamentos, investimentos, o sr. vai precisar de muitos bilhões de reais, mas os tempos não são justamente de corte?
Bem, eu não vou resolver isso sozinho. O que eu disse é que vou me empenhar e que percebo uma sensibilidade grande da presidente para a Defesa.
- Ela deu algum sinal de que vai descontingenciar recursos para facilitar sua chegada?
Acho que não seria correto eu falar sobre isso, mas certamente vou falar com os ministros da área econômica. Qual a solução? Quando será a solução? Não sei. Vamos ver. E a questão do investimento na indústria de defesa faz parte da solução, não do problema. Nos EUA, a empresa privada é responsável pelos investimentos em ciência e tecnologia, mas, ora, tudo por encomenda do Pentágono. Isso mostra a importância que a Defesa tem para a indústria, para o desenvolvimento, para os empregos, para a tecnologia de ponta. A aviação brasileira nasceu dessa forma.
- E o outro lado da moeda? Boa parte, ou a maior parte, da responsabilidade da crise norte-americana é justamente pelos gastos na área militar.
Mas ninguém fala que vamos nos envolver em aventuras militares como os EUA se envolveram. Eles estão com duas a três guerras ao mesmo tempo.
- No domingo, antes mesmo da sua posse, mulheres de militares fizeram manifestação por aumento de soldos. Os comandantes lhe pediram isso na reunião do fim de semana?
Foi mais geral. Vamos esperar um pouquinho.
- E os caças, vêm ou não vêm?
Os caças terão que vir. Achava isso como ministro das Relações Exteriores e continuo achando agora como ministro da Defesa. Mas o momento exato ainda não dá para dizer.
- Nisso, o sr. e o ministro Jobim combinam? Ambos querem os Rafale franceses?
Havia um problema de preços e toda uma discussão sobre transferência de tecnologia. Naquela época, no governo Lula, parecia que o que tinha mais condições de fazer essa transferência era o francês. Se ainda é, não sei, porque não acompanhei o desenrolar das discussões sobre isso e sobre uma renegociação de preços.
- Naquele momento, o recuo não foi por causa de cortes no Orçamento, mas sim a chateação do presidente Lula porque o Sarkozy tirou o tapete do Brasil na discussão sobre Irã na ONU?
O presidente Lula disse isso para você? Para mim não disse...
- Como fazer com o programa nuclear da Marinha, se não há dinheiro para mais nada?
A última visita interna que fiz como chanceler foi justamente a Aramar, até porque sempre fui um entusiasta do programa nuclear da Marinha. O Brasil tem de ter independência nessa área, ter capacidade de dominar o ciclo completo. Acho que vai ter recursos, sim. A presidente é nacionalista, patriota e sabe da importância de proteger os nossos recursos, principalmente agora com o pré-sal.
- Como o Brasil, com uma dimensão continental, com Amazônia, pré-sal e água, não tem satélite até hoje? É possível falar em soberania?
São projetos que continuarão a ser desenvolvidos, em conjunto com o Ministério de Ciência e Tecnologia. Há sensibilidade para isso. Quanto à soberania, o mais importante é a atitude psicológica. Você tem de acreditar que é soberano. Você pode ter satélite, foguete, o que quiser, mas sem atitude sua soberania não vale nada. Se tiver atitude certa, vai ter o satélite certo, mas você pode ter o satélite certo e não ter a atitude certa.
- E o acordo com os EUA para o uso da base de Alcântara, vai avançar?
Foi paralisado no Congresso Nacional e não se trata de questão ideológica. Não tem muito cabimento brasileiros não terem acesso a certos lugares dentro do território nacional. É uma questão de soberania inegociável.
- O ministro Jobim e o sr. estabeleceram uma linha de distanciamento dos EUA, mas o chanceler Patriota faz uma linha de aproximação. Onde o sr. se encaixa agora?
Você faz uma pergunta com várias premissas que comportam discussão. O ministro Jobim até patrocinou, junto conosco, um acordo militar com os EUA... Não percebi nenhum distanciamento enquanto fui ministro. Acho que o ministro Patriota faz jus ao nome, e o ministro Jobim também agiu patrioticamente. O que nós temos que ver é o interesse brasileiro. Às vezes, será interessante fazer acordo com os EUA e, em outras, com outros países. Temos de ter a cabeça aberta. É preciso acabar com essa mania de que o que é a favor do Brasil é contra os EUA.
- Por que o sr. defende a saída do Haiti?
Defendo uma saída gradual do Haiti, pois cumprimos bem nossa missão lá, quero dizer, as Forças Armadas cumpriram. Dizem que democracia é quando um presidente eleito passa o governo para um outro presidente eleito, e foi isso o que ocorreu lá. Então, é hora de discutir uma saída organizada, inclusive com as Nações Unidas, claro. Não sei se em agosto, dezembro, janeiro, não é o que importa. O que importa é como. Uma possibilidade é sair, mas deixando um batalhão de engenharia do Exército lá, por exemplo.
- Por que o sr. citou especificamente a África no seu discurso?
Cabo Branco é o ponto mais oriental do Brasil. Fica mais perto de Dacar e Cabo Verde do que de Porto Velho ou Rio Branco, provavelmente. Então, são nossos vizinhos. As águas territoriais brasileiras e da África ficam muito perto umas das outras, quase se tocam. Então, são vizinhos de Além-Mar, como diziam os militares, e isso exige cooperação.Trabalhamos juntos na área militar com Angola, Guiné Bissau, Namíbia. Mas nossa prioridade era e é a Unasul, para assegurar a paz que gera desenvolvimento.
- Segundo reportagem da Folha, o comandante do Exército, Enzo Péri, é investigado pelo TCU pois, quando diretor do Departamento de Engenharia e Construção da Força, assinou 27 contratos sem licitação com um instituto que subcontratava empresas ligadas a militares. Que providências o sr. vai tomar?
Bom, o próprio general me disse que já há investigações militares e tomadas de conta iniciadas por ele próprio em relação a possíveis.... Não sei nem que termo usar, vamos falar possíveis irregularidades.
Novo ministro da Defesa, Celso Amorin (de gravata)
durante reunião no Palácio do Planalto com
os comandantes militares
- O comandante vai investigar ele próprio?
Essas coisas são muito difíceis de a gente falar, mas é preciso separar o joio do trigo. A minha forte impressão é de que estamos com o trigo. Estou há muito pouco tempo aqui, mal cheguei, mas tenho 50 anos de serviço público e conheço as pessoas pelo olho. Às vezes a gente erra, mas quase sempre. O general Enzo me dá a impressão de uma pessoa não apenas ilibada, mas até de um asceta. Minha impressão é totalmente positiva. O que tiver de ser investigado será investigado, mas é preciso ver isso tudo direito, sem precipitação.
- Como o sr. pretende contribuir para a faxina ética que a presidente determinou em outras áreas?
Moralidade é importante em qualquer governo. As denúncias aparecem e são comprovadas? Têm de ter consequência. A presidente Dilma, me parece, vai aprofundar a inclusão social, o desenvolvimento e a moralidade pública.
- Como foi seu encontro de hoje [ontem] de manhã com o antecessor Jobim?
Fui ao apartamento dele, porque ele está doente, com o rosto inchado, mas tivemos uma boa conversa sobre os projetos que estão em andamento.
- Se houver resistências públicas de oficiais, como já houve nos bastidores, como o sr. pretende agir?
Não fique me colocando alçapões inexistentes...
- Qual sua ambição no Ministério da Defesa? Quando o sr. sair, o que pretende deixar para dizer que a missão foi cumprida?
Ter deixado o Brasil mais capacitado a se defender, ter uma atitude ainda mais altiva, sem abaixar a cabeça.
- O deputado José Genoino vai continuar na Defesa?
Vai. Se quiser, pode botar um ponto de exclamação.

Imperdível - O novo humorístico da Rede Globo

O tempo exausto (1) - Mauro Santayana

Santayana: o preço da sobrevivência é o conflito

Em todos os séculos houve a percepção de que o mundo chegava a seu fim, com a extinção da vida na Terra, como castigo divino ou inevitável cataclismo. Mas a vida, essa inexplicável rebelião da matéria, que encontra sua perfeição e perversão na existência do homem, consegue impor-se. O preço da sobrevivência é o  conflito.  Desde que o registro da vida da espécie existe, a existência tem sido a crônica da resistência contra as forças naturais,  os outros seres biológicos, feras, bactérias e vírus, e, sobretudo, contra parcelas da própria espécie.


Há uma tese, presente em vários pensadores, e de forma difusa, que explica o conflito básico do homem entre o predador e o solidário. O instinto de caça e de destruição, enfim, de canibalismo direto ou sutil, só consegue ser combatido pela inteligência. A inteligência conduziu o homem a se ver como ser frágil e precário que só poderia sobreviver em comunhão com os outros, multiplicando a força individual, certo de que sua proteção dependia da vida do companheiro. Mas houve o momento em que essa mesma inteligência, que indicava a solidariedade como necessária à existência individual e coletiva, passou a servir ao instinto predador.             Ora o homem é o lobo do homem, na definição de Plauto, ora o homem é o anjo do homem, como ocorre, quase todos os dias, no heroísmo de pessoas simples, que chegam a morrer para salvar a vida de outras. Os homens são construtores de sua História. E a História, não obstante a presunção de alguns acadêmicos parvos, como Fukuyama, nunca chegará a seu fim – a menos que o Sol esfrie de repente ou de repente estoure, na impaciência de seus gases comprimidos.


O tempo histórico de vez em quando entra em exaustão. São momentos, que podem durar décadas ou séculos, em que os ritos essenciais da vida são perturbados pelas superestruturas da sociedade, e o indivíduo redescobre a solidariedade, aquele sentimento de que a sua sobrevivência (e sua autonomia como ente, ou aquele que é) só pode ser defendida se contar com o outro. Nesses momentos, para o bem – e, algumas vezes, para o mal – surgem as grandes mudanças, com  novas normas de convivência da espécie. Embora possam identificar-se como religiosas ou étnicas, são necessariamente políticas, porque se referem à vida prática dos seres humanos.


Ontem, Londres entrava em seu terceiro dia de tumultos urbanos. Não é a primeira vez que isso ocorre. Além dos protestos sangrentos de Brixton, de há trinta anos, a cidade conheceu o conflito brutal de 1780, em que centenas de católicos foram massacrados pelos protestantes açulados por Lord George Gordon. Vivendo como cidadãos de segunda classe, desde Henrique VIII, os católicos recuperaram sua cidadania de acordo com o Catholic Relief Act, de 1778. Gordon, um nobre frustrado em sua tentativa de fazer carreira no Almirantado, encontrou sua chance para a demagogia, mobilizando os protestantes contra a lei e os levando a queimar propriedades de católicos e a assassiná-los em plena rua. Antes de ser condenado à prisão por rebeldia, Gordon se converteu ao judaísmo. Acabou morrendo na prisão de Newgate.


Há uma diferença entre as agitações urbanas e as revoluções. Como resumia um autor inconveniente, Lenine, sem teoria revolucionária não há revolução. Jean Tulard, um dos melhores historiadores contemporâneos, é seguro quando afirma que as rebeliões populares podem ser facilmente vencidas, seja pela repressão policial, seja pelo engodo por parte do poder. As revoluções necessitam de um esforço intelectual poderoso, de líderes que pensem uma nova ordem e a imponham no exercício da razão. Esses líderes podem surgir no desenvolvimento natural das rebeliões, como ocorreu na França de 1789, depois da Queda da Bastilha, ou em demoradas e pacientes carreiras políticas.


Londres repete, com a mesma impaciência, o que está ocorrendo em várias partes do mundo, e parece provável que virá a ocorrer nas regiões  ainda preservadas. O tempo, e nele, os homens, parecem exaustos do modelo da sociedade contemporânea, baseado na competitividade, na voracidade do consumo e do lucro. É uma sociedade contraditória. De um lado, a aplicação tecnológica das descobertas científicas torna a vida mais confortável e mais durável, mas não parece que isso responda aos anseios mais profundos da espécie. E, ainda pior: a tecnologia torna a crueldade mais organizada e mais eficaz. O nazismo foi a mais perfeita utilização da tecnologia para o assassinato em massa de toda a História. Os norte-americanos os repetem, desde a Guerra do Golfo, no Oriente Médio.


Como em outras épocas, a civilização se encontra diante de uma ruptura. O sistema econômico, submetido ao domínio do capital financeiro, entra em crises sucessivas, com a criminosa especulação dos operadores no mercado de capitais. Os indignados, com razões maiores ou menores, se multiplicam. A internet substitui – é outra das surpresas da tecnologia – os agitadores de rua, na condução dos protestos. Falta apenas a ideologia, a que se referem, entre outros, Lenine e Tulard.

"PRINCÍPIOS" DA GLOBO CHEGAM AO FIM

No Princípio, eram os Princípios

A Globo divulgou a sua Epístola aos Parvos com os Princípios que guiam seu jornalismo.

Isso foi no sábado.

No domingo, o Fantástico provou que o Nunca Dantes e a Presidenta provocariam um choque de duas aeronaves em pleno vôo, sobre território brasileiro.

Foi uma forma singela de saudar a nomeação de Celso Amorim.

Na segunda-feira, desde o “Bom (?) Dia Brasil” até o jornal nacional, a Globo tratou de destruir o mundo com a crise econômica.

No processo, se bem sucedida, destruiria o Brasil e a própria Globo.

(O jornal da globo não conta, porque, de todos os jornais do mundo, é o mais matutino.)

Os Princípios da Globo se afogaram irremediavelmente já nesta terça-feira, quando a chamada do jornal nacional decretou a prisão de Clarice Copete, que foi vice-presidente da Caixa para assuntos de tecnologia.

A Globo dentro de seus sacros Princípios, não quis saber da própria encarcerada se ela, de fato, num cárcere estava.

Não ligou nem para o emprego ou para a cozinheira para confirmar o encarceramento.

Afinal, Princípios são Princípios.

No jornal nacional, na maiora cara de pau, a Globo reconheceu a pequena falha do sistema.

Depois de provocar mal irremediável à vítima.

Esse Ali Kamel …


Paulo Henrique Amorim


120 mil pessoas dizem não à educação de Pinochet - Piñera



A bandeira de luta – que se mescla com as dos trabalhadores do setor de mineração do cobre, dos desempregados, dos ecologistas, dos sufocados pelo sistema creditício, entre outros milhares de anônimos cansados dos abusos – é o fim da lógica de mercado no setor, além da volta da gratuidade da educação pública para os setores de menor renda da população. Cerca de 200 mil pessoas saíram tranquilamente às ruas do país para protestar contra um governo de direita que já não os representa. O artigo é de Christian Palma, direto de Santiago de Chile.

Mais de 120 mil pessoas participaram da última marcha convocada pelo movimento estudantil – já foram sete desde que começaram as ocupações e greves em colégios e universidades – que exige uma reforma estrutural no modelo educacional vigente no Chile há mais de 30 anos. A bandeira de luta – que se mescla com as dos trabalhadores do setor de mineração do cobre, dos desempregados, dos ecologistas, dos sufocados pelo sistema creditício, entre outros milhares de anônimos cansados dos abusos – é o fim da lógica de mercado no setor, além da volta da gratuidade da educação pública para os setores de menor renda da população. Cerca de 200 mil pessoas saíram tranquilamente às ruas do país para protestar contra um governo de direita que já não os representa.

A nova mobilização demonstrou a ampliação do apoio aos estudantes e o suporte que sustenta um movimento que já dura dois meses e que se fortaleceu com o apoio de 80% da sociedade às reivindicações estudantis, segundo as pesquisas.

E os números se concretizaram nas ruas. Na manifestação desta terça-feira, participaram também alunos de colégios privados do setor mais acomodado de Santiago, diversos professores, apoderados, trabalhadores públicos e representantes de sindicatos empresariais que aumentaram sua solidariedade com os estudantes, após a feroz repressão do governo de Sebastian Piñera na semana passada. Foram detidos mais de 600 jovens, devido à estratégia das autoridades de não autorizar a marcha para aumentar a raiva e criminalizar o movimento social.

O dia ensolarado de ontem ajudou a criatividade dos estudantes. Jovens disfarçados como o ex-presidente Salvador Allende, simbolizavam o que era o Chile antes do golpe militar de 1973: uma sociedade menos opulenta no consumo de bens e serviços, mas com um sistema educacional grátis para todos. “E vai cair, a educação de Pinochet”, escutava-se em meio à fila interminável de manifestantes”. Algumas quadras além, um avô mostrava com orgulho um cartaz que dizia: “marcho para que meus netos tenham educação gratuita como eu tive”.

O eixo das reivindicações do movimento estudantil é justamente uma demanda estrutural que foi bloqueada por décadas, desde o governo militar, passando pelos governos da Concertação. Por isso, nos desfiles de cada marcha, encontram-se grandes bonecos que são réplicas dos últimos quatro presidentes desde que, em 1990, o Chile retornou à democracia, representando as reformas cosméticas feitas na educação, aprofundando a participação do setor privado em um bem social.

Esse é também um dos motivos pelos quais a paciência dos cidadãos e estudantes está se esgotando: os bancos são os grandes protagonistas na histórica do lucro na educação, porque com o papel subsidiário do Estado, imposto por Pinochet, o setor financeiro privado pode administrar os recursos fiscais aplicados em uniformes para os jovens, mas com a cobrança adicional de juros mensais superiores inclusive aos cobrados sobre créditos imobiliários. Juan, um jovem formado em Direito, afirmava com outro cartaz: “estudei 5 anos e terei que pagar 20”.

Outras jovens universitárias, carregando uma bandeira chilena, reclamavam a mesma coisa: “É a mesma coisa que se eu tivesse comprado uma casa”, dizia uma delas.

Atualmente, mais de 100 mil estudantes encontram-se em situação de inadimplência, com uma dívida média de 2.700.000 milhões de pesos chilenos (mais de US$ 5.000). Em um país em que mais de um milhão de pessoas recebe por mês salários mínimos de US$ 377, é perfeitamente possível entender como os mais pobres ficam fora da universidade, enquanto que as classes medidas ficam empobrecidas por décadas.

O desenvolvimento das chamadas universidades-empresa é a cereja do bolo, uma vez que funcionam por meio de direções privadas que não asseguram a adequada informação de qualidade e transparência. Nelas, a gestão da educação obedece à lógica do baixo custo em salários de professores e material acadêmico, e altas receitas das mensalidades, usufruindo dos subsídios de educação fornecidos pelo Estado.

Uma estória a parte neste processo de aperta/afrouxa entre a sociedade civil e o governo de direita é a resposta mínima do presidente Piñera às demandas estudantis. Até o momento, foram feitos tíbios anúncios de maiores recursos (US$ 4 bilhões), sem detalhar, porém, como e a forma de financiamento.

Mostrando o figurino da ortodoxia neoliberal da atual administração, os ministros do setor econômico descartaram uma eventual reforma tributária para aumentar os impostos das empresas, o que significou jogar gasolina no fogo dos estudantes.

A jornada desta terça foi marcada por outro elemento que fez lembrar os piores momentos perpetrados pela ditadura de Pinochet: os supostos “infiltrados” da polícia chilena nas mobilizações.

Segundo as lideranças estudantis, em cada marcha há policiais à paisana nas ruas para incendiar os ânimos e agitar as marchas. Essa suspeita se fortaleceu em Valparaíso, cidade-porto onde se localiza o Congresso Nacional. Durante a marcha, um grupo de manifestantes identificou, denunciou e perseguiu um possível policial infiltrado, que escapou, escondendo-se no Congresso. As autoridades do governo garantiram que investigarão este fato a fundo.

Todos esses temas de fundo cruzam cada marcha dos estudantes chilenos, temperadas agora pelos chamados “panelaços” em apoio às mudanças estruturais na educação realizados por milhões de chilenos há uma semana em todas as cidades do país, tal como se fazia nos protestos contra a ditadura de Pinochet nos anos 80. As únicas pessoas que não ouviram essas demandas trabalham no Palácio de La Moneda, onde o presidente Piñera ainda não se pronunciou.

Tradução: Marco Aurélio Weissheimer

O CHILE SE REENCONTRA NAS RUAS

**bolsas européias voltam a cair mesmo com o sinal do BC norte-americano de comprimir os juros por mais dois anos** mercados não acreditam mais na sua própria capacidade de superar a recessão** falta um plano Marshall para a zona do euro e um New Deal para os EUA asfixiados pelo neoliberalismo fiscal do Tea Party.
Mobilização da juventude do Chile por reforma drástica no sistema educacional herdado de Pinochet --a favor da universalização do ensino público totalmente gratuito e de qualidade, põe em xeque a supremacia da lógica de mercado instaurada no país desde o golpe sangrento de 1973.A educação é o ponto de convergência desse reencontro dos chilenos com o debate sobre o seu presente e o seu futuro. Diz respeito não apenas ao destino das novas gerações. Mas à sociedade na qual se deseja viver e aos valores compartilhados sobre os quais ela deve se sustentar. O sistema educacional chileno trazido do pinochetismo diz que o presente e o futuro são mercadorias que devem gerar lucro. Não há exceção à bíblia neoliberal implantada avant la lettre pelos tanques e caças, em 1973: a sorte e o destino da sociedade devem ser modelados pela inexcedível capacidade dos mercados de alocar fatores ao menor custo, com maior eficiência. A democracia é um adereço num mundo autorregulável. A escola é uma peça da engrenagem. A universidade e todo aparato educacional – seus currículos e critérios de acesso-- prestam-se ao propósito de adestrar corações e mentes para a demanda mercantil . Não há pertinência em debater um projeto de país. Tampouco espaço para uma universidade que reflita, pesquise e opine sobre a democracia e o desenvolvimento. No Chile não há universidade pública porque não há soberania democrática sobre o interesse público. As famílias pagam pela mercadoria educacional, assim como foram instadas a privatizar a sorte da velhice e demais instâncias da vida social. Não por acaso, o desinteresse pela vida política só fazia crescer no país. Dos 12,2 milhões de chilenos maiores de 18 anos, só 7,2 milhões votaram no pleito de janeiro de 2010 que elegeu o bilionário direitista Sebástian Pinera. A participação de chilenos com menos de 30 anos de idade no escrutínio foi de apenas 9,2%, contra 35% em 1988. A plataforma dos estudantes vocaliza um sentimento crescente de que a captura da esfera pública pelo lucro privado não serve mais aos chilenos. Desde a semana passada, em bairros de classe média de Santiago, como Nunoa, as noites são de panelaços em apoio aos estudantes. Os mineiros do cobre estão em greve pela participação na renda de um negócio milionário que destina 10% do lucro ao Exército. Há poucos dias, o trânsito de Santiago foi interrompido por um movimento espontâneo de passageiros cansados dos atrasos em um sistema de transportes desregulado. A paradoxal vitória de um Presidente egresso do pinochetismo há pouco mais de 18 meses –saudado pela mídia reacionário brasileira como sintoma de guinada na América Latina, que hoje conta com apenas 26% de apoio na opinião pública-- apenas confirma a percepção de uma ruptura em marcha. Se há tão pouco tempo a sociedade chilena não encontrava alternativa melhor para governa-la hoje esse vácuo foi superado : o Chile se reencontrou nas ruas. Nelas sedimenta um novo rosto e um novo ciclo na sua rica história política. Toda América Latina ganha com isso.
(Carta Maior; 4º feira, 10/08/ 2011)