Mente vazia, oficina do sistema da mídia golpista

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sexta-feira, 2 de maio de 2014

A miragem mexicana

 

Na última década, o modelo mexicano de abertura liberal, integração com os EUA, e livre comércio teve um desempenho extraordinariamente pior do que o do Brasil.

Poucas pessoas inteligentes – fora da Inglaterra - ainda prestam atenção nas notícias da monarquia inglesa e da sua família real, em pleno século XXI. Mas o mesmo não se pode dizer da City, centro financeiro de Londres, e dos seus dois principais órgãos de  imprensa e divulgação – o Financial Times, e o The Economist – que  seguem tendo importância decisiva na formação das opiniões e dos consensos ideológicos dentro das elites liberais e conservadoras do mundo. 
 
A escolha dos seus temas e o uso de sua linguagem nunca é casual. Como no caso recente do seu entusiasmo pelo México e seu modelo de desenvolvimento liberal e seu ataque cada vez mais estridente, ao “intervencionismo” da economia brasileira. Uma tomada de posição compreensível do ponto de vista ideológico, mas que não vem sendo confirmado pelos fatos.

Em 1994, o México assinou o Tratado de Livre Comercio da América do Norte/ NAFTA, junto com os EUA e  Canadá, e nos últimos 20 anos tem sido absolutamente fiel ao livre-cambismo, incluindo sua adesão a Aliança do Pacífico, e à inciativa norte-americana do TPP. Por outro lado, nesse mesmo período, o México praticou uma política macroeconômica e financeira rigorosamente ortodoxa - em particular na última década - mantendo inflação baixa, cambio flexível,  taxas de juros moderadas e amplo acesso ao crédito. 
 
Mesmo assim, depois de duas décadas, o balanço dessa experiência ultraliberal deixa muito a desejar [1]. Como era de se prever o comercio exterior do país cresceu significativamente no período e passou – em termos absolutos - de U$ 60 bilhões em 1994, para U$ 400 bi em 2013. Mas nesse mesmo período, a economia mexicana teve um  crescimento médio anual pífio, de 2,6%, sendo o crescimento per capita, de apenas 1,2%. O emprego industrial cresceu de forma setorial e vegetativa, e mesmo nas “maquiladoras”, foi de apenas 20%, algo em torno de 700 mil novos postos de trabalho. A participação dos salários na renda permaneceu em trono de 29% da renda nacional, e a pobreza absoluta da população mexicana aumentou significativamente.
 
Por fim, ao contrário do que havia sido previsto, a economia mexicana não se integrou nas “cadeias globais de produção”, a produtividade média da economia praticamente só cresceu de forma segmentada e vegetativa, e o “investimento direto estrangeiro” (o principal “premio” anunciado em troca da abertura da economia) não teve nenhuma alteração significativa.

Esse balanço fica ainda mais decepcionante quando se compara o desempenho do “modelo mexicano”, com o “modelo intervencionista” da economia brasileira, no período entre 2003 e 2012. Segundo  dados publicados pelo Banco Mundial [2], e pelos Ministérios do Trabalho dos dois países, os números e as diferenças são realmente chocantes. Nesse período, a crescimento médio anual do PIB brasileiro, foi de 4,21%, o do México de 2,92%. O crescimento total a economia brasileira foi de 42,17%, o do México, de 29,29 %. As exportações brasileiras cresceram, a uma taxa anual de 6,59%, as do México, a uma taxa de 5,35%. O crescimento total das exportações brasileiras foi de 65.95%, o do México, foi de 53,35%. As importações brasileiras cresceram a uma taxa média anual de 17,33%, e as do México, a uma taxa de 6,75%. O crescimento total das importações no Brasil foi de 173,32%, e no México de apenas 67,54%.
 
Por outro lado, a renda per capita brasileira cresceu a uma taxa anual de 2,84%, e a do México, 1,42%; o crescimento total da renda no Brasil foi de 28,4%, e no México foi de 14,26%; e  a participação dos salários na renda chegou a 45 % , no Brasil, e no México, a 29%. Nesse mesmo período, o Brasil criou 16 milhões de novos empregos formais, e o México 3.500 milhões; e a pobreza absoluta foi reduzida a 15,9%, no Brasil,  e aumentou para 51,3%, no México.
 
Por fim, (pasme-se), entre 2002 e 2012, o “investimento direto estrangeiro” no Brasil,  cresceu de U$ 16.590 milhões, para U$ 76.110 milhões de dólares, e no México,  caiu de U$ 23. 932 milhões, em 2002, para U$ 15.4553 milhões, em 2012 ! Só para encerrar a comparação, em 2103 a economia brasileira cresceu 2,3%, em  ( uma das maiores taxas entre as grandes economias do mundo) enquanto  a economia mexicana cresceu 1,1%.

Foreign direct investment, net inflows (BoP, current US$)

Fonte: International Monetary Fund, Balance of Payments database, supplemented by data from the United Nations Conference on Trade and Development and official national sources.Catalog Sources World Development Indicators. Disponível em: http://data.worldbank.org/indicator/BX.KLT.DINV.CD.WD/countries/BR-MX?display=graph em 27/04/2014
    
Isto posto, o elogio do México deve ser considerado um caso de má fé,  fundamentalismo ideológico, ou estratégia internacional ? As três coisas ao mesmo tempo. Mas o que importa é o que dizem os números, e a conclusão é uma só: na última década, o “modelo mexicano” de abertura liberal, integração com os EUA, e livre comércio teve um desempenho extraordinariamente pior do que o “modelo intervencionista”, “heterodoxo” e “fechado”(apud FT e TE) da economia brasileira, junto com seu projeto de integração do Mercosul.
 
Notas
[1] Vide  artigo  do ex-ministro de Relações Exteriores do México,  Jorge Castañeda: “NAFTA´s  mixed  record”,  publicado no numero da Revista Foreign Affairs,. de janeiro/fevereiro de 2014.

[2] www.data.worldbank.org

sexta-feira, 25 de abril de 2014

O cerco


 

Método eficaz: sob intensa pressão de dois mil manifestantes dos movimentos sociais, Plano Diretor de SP é aprovado na Comissão de Política Urbana da Câmara; expectativa do prefeito Haddad é de aprovação definitiva em 30 dias.

Petrobras terá CPI exclusiva: Rosa Weber concede ao conservadorismo um palanque nacional para atacar o governo em pleno processo eleitoral.

Tim Berners-Lee, criador da web, em discurso na NETMundial: peço a todos os países que sigam o exemplo do Brasil ( e adotem um marco civil semelhante para a rede

 

A vitoriosa construção do Marco Civil da Internet deveria servir de referência para uma mudança de postura que já tarda. É hora de estender o método.

por: Saul Leblon


Arquivo
   
Replicados com disciplinado zelo pela emissão conservadora,  disparos regulares da mídia internacional defendem a rendição inapelável do Brasil aos ditames da restauração neoliberal.

O tom é de ‘basta!’.

Explica-se: a dissidência brasileira na crise afrontou com sucesso o sopro de morte da austeridade optando por políticas contracílicas baseadas em crédito estatal, investimentos públicos (PAC 2),  fomento à habitação, valorização do poder de compra do salário mínimo e geração de empregos.

O saldo gerou uma inércia de demanda e geração de empregos que resiste até hoje como uma gigantesca costela de pirarucu entalada na garganta dos mercados.
Se isso funciona, como é que fica a restauração neoliberal aqui e na América Latina?

É preciso desqualificar um passado que pode ser usado para credenciar novas heterodoxias no futuro  e, sobretudo, nas urnas.

Chegou a hora de colocar as cordas, os pescoços e as agendas nos devidos lugares, diz o jogral que nunca desafina.

Ponto número um: o Brasil é um grandioso caso de desastre intervencionista.

Ou não é isso o que  reafirma o caso da refinaria de Pasadena, agora brindado com a obsequiosa decisão da juíza Rosa Weber de criação de um palanque nacional para a mídia e seus candidatos execrarem a Petrobras em plena campanha sucessória?

Ponto número dois: o país deve aceitar os termos da rendição incondicional que a emissão conservadora local e foranea   advoga diuturnamente.

A  saber: fim da intervenção estatal na agenda do desenvolvimento; choque de juros ‘para trazer a inflação à meta’  --conduzido por um BC ‘independente’ (das urnas); esvaziamento do BNDES, privatização do pré-sal (tese que ganha agora uma corneta de difusão eleitoral, graças à CPI); cambio livre, arrocho na ‘gastança social’ etc.

O tom imperativo da ofensiva estrangeira remete ao jornalismo da ‘guerra fria’ contra governos não alinhados, nos anos 50/60.

Três exemplos dos últimos quinze dias:

Financial Times: Nova matriz econômica do Brasil ouve anúncio de morte (07/04/2014)

The Economist: Trabalhador do Brasil é gloriosamente improdutivo (17/04/2014 )

New York Times: Brasil grandioso se desfaz (21/04/2014)

O denominador comum é a incompatibilidade entre ‘dirigismo’ estatal e ‘gastança fiscal’(assim, vinculados, como xipófagos), e redução do juro para a retomada do investimento.

Como na ‘guerra fria’, o silogismo é ilustrado não raro com exemplos grotescos.
Filas no recente Festival de Música Lollapalooza, em São Paulo, abrem a ‘reportagem’ da Economist, por exemplo, para ilustrar a evidência da  improdutividade do trabalhador brasileiro.

Coisas de mercado regulado, naturalmente.

Segundo a bíblia do jornalismo neoliberal, ‘onde o restaurante texano BOS BBQ se destacava pela eficiência, nas outras barracas de comida do evento (as nacionais) as filas se acumulavam de forma ilustrativa.

Isso define um país de ineficientes para a  Economist.

“No momento em que você chega ao Brasil você começa a perder tempo”, dispara, na reportagem transcrita pelo jornal Valor Econômico, o dono do restaurante gringo, Blake Watkins.

Ele chegou aqui  há três anos, após vender um fast food em Nova York.

Parece ter tomado gosto pela ‘perda de tempo’.

O mesmo gosto que leva o capital estrangeiro a maldizer as interferências excessivas do Estado no mercado local.

E a formar filas para ingressar nesse limbo de anancronismo estatizante, cujo segmento de consumo de massa (53% da população), sozinho, representaria hoje a 16ª maior economia do planeta. Com lugar garantido no G-20.

Um punhado de bancos estrangeiros enquadra-se nessa categoria, dos que aguardam  autorização para operar no reduto da improdutividade e do intervencionismo desastrado.

O  governo Dilma autorizou o ingresso médio de quase 8 bancos por ano desde 2011.

Mas  só autoriza  se ficar demonstrado o interesse nacional na operação.
Dilma costuma perguntar, por exemplo,  o que o banco fará pelo financiamento de longo prazo, indispensável a um novo ciclo de desenvolvimento.

A Presidenta faz o que determina o interesse público.

E o que determina o interesse  público incomoda quem se avoca o direito a uma free-way para entrar e sair do país quando quiser, como quiser e com quanto quiser.

A soberba tem o  apoio de um colunismo  ignorante no varejo e prestativo no atacado.

Esse gelatinoso ectoplasma de interesses compartilha de um segredo cuidadosamente mantido a sete chaves, fora do alcance da opinião pública brasileira.

Afinal, o  que acontece exatamente quando uma economia adota  –ou lhe é imposto--  o pacote de medidas às quais a teimosia petista resiste em associar o destino nacional?

 Se a emissão conservadora dedicasse a essa resposta algum vapor de jornalismo isento, o debate em torno da sucessão presidencial certamente ganharia a densidade adequada a um  escrutínio esclarecido sobre o  passo seguinte do desenvolvimento do país.

Um ponto de partida poderia ser a dissecação do que se passa em economias europeias, enredadas em desconcertante combinação de ‘recuperação’  e esfarelamento social.

A Grécia, por exemplo.

Mergulhada no sexto ano de recessão, com um PIB 24% inferior ao de antes da crise, o país é saudada como paradigma de sacrifício bem sucedido.

Em 2013,  a Grécia conseguiu, de fato, um superávit fiscal de 1,2%  do PIB (repita-se, sobre um PIB que perdeu ¼ de sua massa desde 2008).

A que preço?

A taxa de desemprego é de 27%.

Cerca de  2,3 milhões de um total de 2,8 milhões de lares gregos acumulam dívidas tributárias impagáveis, por absoluta insuficiência de renda.

O déficit fiscal não para de crescer e a dívida pública passa de 180% do PIB --bem distante dos 120%  que o generoso FMI definiu como a fronteira da sustentabilidade a ser perseguida por Atenas.

Não só.

A taxa de investimento na Grécia despenca linearmente desde 2008 e o déficit fiscal é de 12% do PIB.

O resto é deduzível.

A Grécia é aquele lugar em que as crianças passam fome na rede pública por falta de merenda escolar. E a extrema direita persegue imigrantes pelas ruas, não raro até a morte.

Na semana passada, esse féretro civilizatório foi ao mercado e conseguiu captar empréstimos nos valor de três bilhões de euros, com uma procura por títulos da dívida grega quase sete vezes superior à oferta.

O que leva a festejada racionalidade do mercado a se lambuzar em papéis de uma nação  insolvente, colapsada em seus fundamentos, às voltas com uma sintomática deflação de preços e sem tônus para se reerguer a partir de suas próprias forças produtivas e de consumo?

Antes da Grécia, Portugal e Espanha (esse, outro colosso de recuperação assentada em 26% de desemprego, déficit fiscal de 7% do PIB e dívida pública de 94% do PIB) já haviam tido sucesso semelhante em captações no mercado financeiro internacional.

A resposta ao enigma  ajuda a entender não apenas o que acontece por lá, mas sobretudo a consistência do cerco aqui, em torno do Brasil.

A recuperação grega é uma experiência de laboratório tanto quanto a tese do Brasil aos cacos é uma construção midiática.

 Viabilizar a Grécia ajoelhada aos mercados é tão necessário  quanto acuar um Brasil reticente às exigências de um  ajuste mais duro preconizado pelo interesse rentista local e internacional.

A captação realizada pela Grécia –a exemplo das demais-- na verdade foi um investimento tutelado e garantido por bancos alemães, britânicos e pelo FMI.
Não há vínculo de confiança em relação a Atenas.

Antes, trata-se de uma adesão, sem risco, a uma oferta do sistema financeiro interessado em provar que o austericídio grego deu certo.

A hora escolhida foi cirurgicamente selecionada: há liquidez abundante no mercado internacional. E  limitadas são as opções de risco que permitam sair do círculo vicioso de um rentismo que se ergue, cada vez mais perigosamente, pelos próprios cabelos.

Alternativas  de canibalização de mais valia, como os investimentos em infraestrutura ensejados pela ampliação do mercado interno brasileiro, são raridade no mundo pós-crise.

Num mercado achatado pela desordem neoliberal, o principal déficit ainda é o déficit de demanda. E o maior desafio: devolver às economias a capacidade de gerar  emprego e renda.

Grécia e Brasil ocupam polos opostos nessa tipificação, mas carregam no calendário político uma equação de delicadeza semelhante.

Uma nova vitória do PT no Brasil, em outubro, sancionaria a existência de um dissenso bem sucedido no âmbito da restauração neoliberal em marcha no mundo.

Seus  desdobramentos encorajadores na América Latina são óbvios. E  daí para as demais nações em desenvolvimento, a progressão seria inevitável.

Na Grécia, ao contrário, a direita no poder, encabeçada pela Nova Democracia, tem um encontro com o desalento social dia 25 de maio, nas eleições municipais.

Se derrotada, engrossa o mesmo recado subjacente à reeleição de Dilma, cinco meses depois.

O partido de esquerda grego, o Syriza,  disputa a liderança nas enquetes de intenção de voto.

Uma derrota conservadora em maio abriria uma grande avenida  para o  Syriza   construir alianças que o qualifiquem a disputar como favorito as eleições presidenciais de fevereiro de 2015.

Uma última palavra merece ser dita diante do que  aparenta ser uma  certa prostração do governo e do PT face ao cerco conservador.

A direita politizou definitivamente o debate econômico espetando nos desafios macroeconômicos sua rotulagem ideológica.

‘Intervencionismo, ineficiência e corrupção’ formam o tripé  de um mantra repetido à exaustão pelo dispositivo midiático para qualquer tema ou circunstância.

Será assim também na CPI da Petrobrás.

O tratamento economicista muitas vezes adotado pelo governo nem responde à radicalização do embate, nem elucida a verdadeira natureza dos interesses em conflito.

A vitoriosa construção do Marco Civil da Internet deveria servir de referência para uma mudança de postura que já tarda.

Longe de tecnificar o assunto, o governo neste caso se ancorou em uma ofensiva política interna e externa, democratizou o debate, arregimentou grandes adesões, mobilizou  movimentos sociais e tornou indefensável a defesa do lucro corporativo  contra o interesse da cidadania.

Sobretudo, o governo exibiu neste caso duas qualidades em falta nos demais: unidade de ação e determinação política de não escamotear a colisão de interesses em jogo.

É hora de estender o método a outras esferas. A começar pela defesa da Petrobrás.

terça-feira, 25 de março de 2014

Arrecadação bate recorde e quebra argumento da S&P

Jogral conservador tropeça na língua: bolsa sobe e receita fiscal bate recorde, um dia depois de a Standard & Poor's rebaixar a nota do Brasil.

A mesma agencia que acha o Brasil inconsistente deu ao banco Lehman Brothers um triplo A em agosto de 2008; em setembro o Lehman Brothers quebrou disparando a maior crise do capitalismo desde 1929.

Investidor estrangeiro despreza alarido ortodoxo e faz investimentos produtivos de US$ 9,2 bi no país no 1º bimestre.

BC projeta déficit externo de US$ 80 bi para 2014; investimentos estrangeiros produtivos devem somar US$ 65 bi no ano.


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Principal justificativa para rebaixamento de rating do Brasil foi o do chamado risco fiscal; mas menos de 24 horas após a Standard & Poor´s divulgar a queda da nota de BBB para BBB-, Receita Federal informa que arrecadação de impostos em fevereiro bateu recorde histórico para este mês do ano; R$ 83,17 bilhões entraram para os cofres do governo; S&P alegou que País deixa dúvidas sobre pagar seus compromissos, porém, entrada de impostos mostra que economia está robusta e País apto a enfrentar seus vencimentos; rebaixamento um dia antes da nova informação da Receita foi apenas coincidência ou incompetência da equipe chefiada por Lisa Schineller?; a propósito: Bolsa de São Paulo abriu o dia subindo 0,77%
25 de Março de 2014 às 10:38
247 – O risco fiscal foi apontado pela agência de classificação de risco Standard & Poor´s, dos Estados Unidos, como principal justificativa para rebaixar, ontem, o rating do Brasil de BBB para BBB-. Mas, menos de 24 horas após a decisão, a economia brasileira acaba de apresentar mais um dado de crescimento – e justamente no quesito fiscal.
A arrecadação de impostos no mês de fevereiro ficou em R$ 83, 17 bilhões, batendo o recorde da Receita Federal para o segundo mês do ano. Em relação a fevereiro de 2013, a alta foi de 3,44%. No bimestre janeiro-fevereiro também houve alta na entrada de recursos de impostos nos cofres do governo de 1, 91% acima da inflação em relação ao mesmo período do ano anterior.
O resultado da arrecadação em fevereiro mostra uma economia que cumpre suas obrigações. Uma economia que está gerando recursos suficientes para quebrar um novo recorde de arrecadação.
No mercado financeiro, as projeções de economistas ouvidos pelo jornal Valor Econômico, das famílias Frias e Marinho, apontavam para uma "deterioração" na arrecadação de fevereiro, mas o que houve, na realidade, foi o contrário. Trabalhando com este tipo de expectativa, a S&P procurou atingir o Brasil, mas a resposta foi imediata.
É claro, porém, que agora isso não importa mais para a S&P. O serviço encomendado à equipe chefiada por Lisa Schineller foi feito. A ponto de, agora, a mesma S&P informar que não pretende fazer novo rebaixamento da nota brasileira.
A propósito: de olho nos números, a Bolsa de Valores de São Paulo abriu o dia em alta de 0,77% sobre a véspera. 
Abaixo, notícia da Agência Brasil a respeito e, em seguida, informação da Agência Reuters sobre a garantia da S&P de que não irá rebaixar o País novamente (ao menos não tão cedo):
Arrecadação de impostos federais fica em R$ 83 bi e bate recorde para o mês
 Brasília
Daniel Lima - Repórter da Agência Brasil 
A arrecadação de impostos e contribuições federais em fevereiro ficou em R$ 83,137 bilhões, resultado recorde para o mês. Corrigida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a alta é de 3,44% ante fevereiro de 2013.
No bimestre, a arrecadação teve crescimento real [corrigido pela inflação] de 1,91% na comparação com o mesmo período do ano passado, com R$ 206,804 bilhões, resultado recorde também para o período.
De acordo com a Receita Federal, o resultado decorreu da redução do recolhimento de impostos apurados com base na estimativa mensal – Imposto de Renda da Pessoa Jurídica e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, ocorrida em fevereiro de um pequeno grupo de empresas.Houve ainda efeito das desonerações tributárias adotadas pelo governo para combater a crise econômica, em especial, folha de pagamento, Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) dos combustíveis, Imposto sobre Produto Industrializado (IPI) dos automóveis e Imposto sobre Operação Financeira (IOF) para crédito à pessoa física.
A arrecadação sofreu impacto também de indicadores macroeconômicos como a produção industrial, com queda de 2,44% em comparação a fevereiro do ano passado. Por outro lado e na mesma base de comparação, houve aumento na venda de bens e serviços (3,46%), na massa salarial (9,33%) e no valor em dólar das exportações (13,16%).

S&P diz que não contempla novo rebaixamento do Brasil

RIO DE JANEIRO, 25 Mar (Reuters) - A agência de classificação de risco Standard & Poor's indicou nesta terça-feira que não vê novo rebaixamento para o Brasil, destacando que isso só acontecerá se os indicadores externos tiverem forte deterioração e se o governo romper seu compromisso com políticas pragmáticas.
"Reduzir os ratings de novo é realmente um cenário que nós não estamos contemplando", disse a analista da agência Lisa Schineller em uma conferência telefônica com analistas e jornalistas.
A S&P disse que, apesar de ter identificado uma certa deterioração nas políticas fiscal e monetária brasileiras, o governo continua comprometido com o combate à inflação e com o cumprimento de metas de superávit primário.
Na segunda-feira, a S&P cortou o rating soberano do Brasil para "BBB-", a faixa mais baixa da categoria de grau de investimento, ante "BBB", com perspectiva estável.
Apesar disso, não havia grande impacto sobre os mercados brasileiros nesta terça-feira, uma vez que o movimento já era esperado pelos investidores e, por isso, já havia tinha precificado. Assim, o dólar tinha leve queda ante o real, assim como os juros futuros, enquanto a Bovespa subia.
(Reportagem de Walter Brandimarte)

sexta-feira, 21 de março de 2014

Dilma das pesquisas vence Dilma que mídia mostra

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Presidente segue soberana nas pesquisa de opinião, acima dos rumores sobre uma suposta perda de pontos; explicação para a manutenção da popularidade de Dilma, apesar de todas as apostas em contrário dos chamados formadores de opinão espalhados pela mídia familiar e tradicional, está nela mesma; o que soa como falta de habilidade política e administrativa nas notícias da imprensa está chegando ao público como sinceridade e objetivo; a cada levantamento publicado desde o início de seu governo a presidente Dilma Rousseff mostra que é bem mais difícil de derrotar do que sugerem tantos comentaristas

20 de Março de 2014 às 20:21
Marco Damiani _ 247 – Com 43% de intenções de votos, segundo pesquisa divulgada nesta quinta-feira 20 pelo instituto Ibope, e indicações de sobra para, além de ganhar em primeiro turno, bater qualquer outro adversário num forjado segundo turno, a presidente Dilma Rousseff parece ser duas.
Uma Dilma é, exatamente, a líder popular que jamais perdeu a liderança nas pesquisas desde que assumiu seu mandato, em janeiro de 2011. A figura que, mesmo após as manifestações de junho do ano passado, o máximo que permitiu de esperança aos adversários foi uma remota possibilidade de segundo turno. Nunca uma ultrapassagem. Aquela que o público identifica como patrocinadora de políticas sociais compensatórias e inclusivas, co-responsável pela retirada de 40 milhões de brasileiros da linha da pobreza.
A presidente Dilma Rousseff, enfim, que segue tranquila – de acordo com a ciência das pesquisas, frise-se – para a reeleição.
Outra Dilma é a que surge ao público, diariamente, pela ótica dos veículos da mídia familiar e tradicional. A presidente que não gosta ou não saber fazer política partidária (1); não se entende com o Congresso (2); perde aliados por tratá-los de maneira espartana (3); pilota uma política econômica que sobe juros e é leniente com a inflação (4); confunde e desanima empresários (5); não sabe o que fazer com a crise no setor elétrico (6); ignora assuntos internacionais polêmicos (7); etc etc.
Uma Dilma, portanto, que, de acordo com análises publicadas aos borbotões, estaria cada vez mais isolada no Palácio do Planalto.
Mas à hipotética pergunta 'qual Dilma você considera a verdadeira', a mais recente pesquisa Ibope indica que o público vê muito mais a presidente competente do que a executiva enrolada em dificuldades. A ponto de demonstrar, nas 43% de intenções de voto, que quer mantê-la já em primeiro turno no cargo.
Desta vez, a novidade da pesquisa foi exatamente a de não ter novidade. Nos boatos que cercaram a sua divulgação, capazes de mexer forte no desempenho das empresas estatais na bolsa de valores de São Paulo, a pesquisa Ibope iria mostrar uma queda nas intenções de voto da presidente. Não seria de estranhar. Afinal, o levantamento de campo se deu na semana passada, depois que os pré-candidatos da oposição puderam fazer todas as críticas que bem entenderam ao desempenho da economia no ano passado. E também ao comportamento político da própria presidente. Como se viu pelos 43% dados a Dilma na pesquisa Ibope, porém, nada dessa especulação foi verdade. 
Nem mesmo os reflexos do julgamento do chamado mensalão, o agravamento da violência urbana, a estiagem no Sudeste ou as enchentes no Sul foram capazes de abalar o desempenho de Dilma.  
MOSTRA A CARA - Uma das explicações para a manutenção na popularidade da presidente está em seu estilo. Dilma, como se diz popularmente, dá a cara para bater. Em discursos nos palanques de inaugurações, nas redes nacionais convocadas para pronunciamentos oficiais e na maneira de agir nos bastidores, a presidente vai-se notabilizando por enfrentar os problemas sem subterfúgios. Especialmente aqueles que, em tese, serviriam para proteger sua imagem.
Nesta semana, cujos fatos não influenciaram a pesquisa, fechada anteriormente, a presidente mostrou bem como gosta de agir. Ela respondeu pessoalmente a acusações em off – sem identificação da fonte de informação – publicadas nos jornais O Estado de S. Paulo e Folha de S. Paulo. Os jornais alegaram ter obtido de diretores da Petrobras informações segundo as quais Dilma teria tido todas as informações necessárias para, em 2006, barrar a compra, pela estatal, da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos.
Fiel ao seu estilo de não deixar para depois o que pode responder agora, Dilma divulgou uma nota garantindo que o parecer que orientou o conselho de administração da Petrobras foi "omisso" quanto a pontos do contrato, notadamente a cláusula de compra obrigatória em caso de litígio entre sócios, e "juridicamente falho".
Não é a primeira vez que Dilma encara de frente uma questão grave. No início de sua gestão, ela demitiu ministros por suspeitas de malfeitos. Por menos que isso, no oitavo mês de governo, mandou o então ministro da Defesa interromper viagem à Amazônia e voltar imediatamente para ser demitido do cargo. Motivo: em entrevista, ele haia criticado duas das mais próximas auxiliares da presidente, a atual ministra Ideli Salvatti e a ex Gleisi Hoffman.
Não é comum, no Brasil, que os políticos façam o que de melhor se espera deles. Explicações objetivas sobre situações de suspeita ou atitudes diretas para casos de disciplina quase sempre são trocados por pronunciamentos obtusos e posições dúbias. A conciliação é a regra acima do enfrentamento.
Residem no estilo tratoral que Dilma cultiva para si própria – e na suprema realização deu seu governo até aqui, a criação de 4,8 milhões de empregos desde janeiro de 2011 – as explicações para a perfomance superior da presidente sobre seus adversários. A presidente vem ocupando redes de rádio e televisão para falar até mesmo sobre o Dia da Mulher, como fez em 8 de março. Para a oposição, isso é uso do cargo para fins eleitorais. Mas além dos tribunais já terem recusado essa tese, não aceitando nem mesmo a imposição de pequenas multas à presidente, o que mais sobressai é que o povo não indica estar vendo nenhum problema nisso.
A julgar pelos números atuais, o povo gosta sim da Dilma que a mídia não costuma mostrar.

quinta-feira, 13 de março de 2014

Conheça os 40 mandamentos do reacionário perfeito

"Cada um dos tópicos abaixo foi diretamente inspirado nas falas ou nas atitudes de pessoas de carne e osso

Por Gustavo Moreira, em seu Blog / Pragmatismo Político  

1-Negue sistematicamente a existência de qualquer conflito de classe, gênero, etnia ou origem regional ao seu redor, mesmo que o problema seja evidente até aos olhos do turista mais desatento. Afinal, sempre nos foi ensinado que a sociedade é um todo harmônico.

2-Não sendo possível negar o conflito, pela sua extensão, tente convencer seu interlocutor de que ele é limitado, reduzido a alguns focos ou induzido por estrangeiros perversos, mas que logo tudo voltará à tranquilidade costumeira.

3-Sendo impossível negar que o conflito é vasto e presente em quase toda parte, tome o partido dos mais poderosos. Afinal, eles representam a ordem, que deve ser mantida a qualquer custo.

4- Manifeste sua contrariedade diante de qualquer estatística que aponte para uma tendência de aumento da massa salarial. É inadmissível que os abnegados empreendedores sejam constrangidos a margens de lucro menores.

5-Demonstre contrariedade ainda maior quando notar que filhos de operários, camelôs e empregadas domésticas estão frequentando universidades.
Prevalecendo esta aberração, que vai limpar o vaso sanitário para seu filho daqui a vinte anos?

6-Repita mil vezes por dia, para si mesmo e para os outros, que esquerdismo é doença, ainda que faça parte de uma classe média de orçamento curto, mas que, em estranho fenômeno psicológico, se enxerga como parte da melhor aristocracia do planeta.

7-Atribua a culpa pelos altos índices de criminalidade aos migrantes vindos de regiões pobres e imigrantes de países miseráveis. Estas criaturas não conseguem nem reconhecer a generosidade da sociedade que os acolhe.

8-Associe, sempre que possível, o uso de drogas a universitários transgressores e militantes de esquerda, mesmo sabendo que o pó mais puro costuma ser encontrado nas festas da “boa sociedade”. É necessário ampliar ou pelo menos sustentar o nível de reacionarismo da população em geral.

9- Tente revestir seu conservadorismo com uma face humanitária, reivindicando o direito à vida de todos os fetos, ainda que, na prática, vá pagar um aborto caso sua filha fique grávida de um indesejável, e seja favorável ao uso indiscriminado de cassetete e spray de pimenta contra os filhos de indesejáveis já crescidos.

10- Assuma o partido, em qualquer querela, daquele que for mais valorizado socialmente. Não é prudente que os “de baixo” testemunhem quebras de hierarquia, nem nos casos de flagrante injustiça.

11- Tente justificar, em qualquer ocasião, os ataques militares da OTAN contra países da Ásia, África ou da América Latina, mesmo que estes não representem a menor ameaça concreta para os agressores. Pondere que não é fácil carregar o fardo da civilização.

12- Mantenha assinaturas de pelo menos um jornal e uma revista de linha editorial bem reacionária, para usá-las como argumento de autoridade. Quando suas afirmativas forem refutadas, retruque de imediato com a fórmula “eu sei de tudo porque li o …”.

13-Nunca se esqueça: se um político socialista ou comunista cometer crimes comuns, isto é da essência do esquerdismo; se os crimes forem cometidos por um político de direita, ele é apenas um indivíduo safado que não merece mais o seu voto.

14- Vista-se somente com roupas de grifes caríssimas, não importando o quanto vá se endividar. Sobretudo jamais seja visto sem gravata por pessoas das classes C, D e E.

15- Nunca perca a oportunidade de discursar a favor da pena de morte quando o jornal televisivo noticiar o assassinato de um pequeno burguês por assaltante ou traficante de favela; se, ao contrário, surgir a imagem de algum rico que passou de carro a 200 km/h por cima de pobres, mude de canal, procurando um filme de entretenimento.

16- Quando ouvir narrativas sobre ações violentas de neonazistas e outros militantes de extrema-direita, minimize a questão. Afinal, eles podem ser malucos, mas contrabalançam a ação da esquerda.

17- Reserve pelo menos uma hora, durante as festas de aniversário de seus filhos, para aquela roda em que alguns contam piadas sobre padeiros portugueses burros, negros primitivos, judeus e árabes sovinas, gays escrachados e índios canibais. É necessário, para reforçar a coesão da comunidade burguesa “cristã-velha”!

18- Quando forçado a conversar com pobres, tente parecer um grande doutor, empregando seguidamente expressões estrangeiras; se um subalterno for inconveniente ou falar demais, dispare sem hesitar: “Fermez la bouche!” .

19- Seja sócio de um clube tradicional, ainda que falido, e se possível ocupe uma de suas diretorias, mesmo que totalmente irrelevante. Manifeste-se sempre contra a entrada no quadro social de emergentes sem diploma e outros tipos sem classe.

20- Jamais ande de trem ou de ônibus. É a suprema degradação, comparável somente a ser açougueiro na sociedade absolutista.

21- Obrigue todo empregado doméstico que venha a cair sob suas ordens a comprar uniforme e usá-lo diariamente, impecavelmente lavado e passado. Afinal, para que serve o salário mínimo?

22-Jamais escute música baiana de qualquer vertente, samba, forró ou cantores sertanejos. Uma vez flagrado, sua reputação de homem civilizado estaria arruinada.

23-Pareça o mais alinhado possível com o liberalismo do século XXI. Tendo preguiça de se dedicar a textos complexos, leia pelo menos “Não somos racistas”, de Ali Kamel, e o “Manual do perfeito idiota latino-americano”. 
Passará como intelectual para pelo menos 90% da juventude de direita.

24- Morra virgem, mas nunca apresente como esposa, noiva ou namorada uma mulher que não caiba no estereótipo da burguesa cosmopolita, porém comportada.

25- Faça eco aos discursos dos octogenários conservadores que constantemente repetem a fórmula “no meu tempo não era assim”, mesmo que saiba sobre inúmeras falcatruas e atrocidades “do tempo deles”. Quanto mais perto do Império e da República Velha, mais longe da contaminação esquerdista!

26- Passe sempre adiante, para parentes, amigos e conhecidos, notícias forjadas na Internet, no estilo “Todas as mulheres de uma cidade do Ceará se recusaram a trabalhar numa fábrica de sapatos, porque já recebiam o bolsa-família”. Não importa se é impossível que qualquer pessoa com mais de quatro neurônios ativos acredite que uma cidade inteira tenha recusado um salário de pelo menos seiscentos reais por achar que vive bem com um auxílio de cento e cinquenta.

27- Repasse, igualmente, juízos de valor negativos sobre personalidades de esquerda, na linha “Michael Moore é mentiroso”, “Chico Buarque é um comunista hipócrita que vive no luxo”, “Dilma foi terrorista”, etc. É preciso dar continuidade à teatral associação entre reacionarismo e moralidade.

28-Diante de qualquer texto ou discurso de esquerda, classifique-o imediatamente como doutrinação barata ou lavagem cerebral. Não importando sua eventual ignorância sobre o tema, é preciso fechar todos os espaços à conspiração gramsciana mundial.

29- Sustente a surrada versão de que “apesar dos erros, os milicos salvaram o Brasil do comunismo em 1964”. Desconverse mais uma vez se alguém perguntar como se chegaria ao comunismo através da provável eleição de Juscelino Kubitschek em 1965.

30- Deprecie ao máximo mexicanos, chilenos, peruanos, paraguaios, bolivianos, colombianos e demais hispânicos como caboclos de cultura atrasada. Abra exceção para argentinos ricos filhos de pais europeus, desde que estes se abstenham de chamá-lo de macaquito.

31- Defenda o caráter sagrado da propriedade rural. Quando alguém recordar que as terras registradas nos cartórios do estado do Pará equivalem a quatro Parás, procure ao menos convencê-lo de que é uma situação atípica.

32- Afirme com veemência que todo posseiro, índio ou quilombola em busca de regularização de terras é vagabundo, mesmo que seus antepassados estejam documentados no local há duzentos anos. Por outro lado, todo latifundiário rico sempre será um proprietário respeitável, ainda que tenha cercado sua fazenda à bala há menos de vinte.

33- Denuncie nas redes sociais os ambientalistas que tentam embargar a construção de fábricas de artefatos de cimento em bairros superpopulosos e de depósitos de gás ao lado de estádios de futebol. Esses idiotas não sabem que nada é mais importante do que o crescimento do PIB?

34- Rejeite toda queixa que ouvir sobre trabalho escravo. É tirania impedir que alguém trabalhe em troca de água, caldo de feijão, laranja mofada e colchão de jornal, se estiver disposto a isto. Deixem a vida social seguir seu curso espontâneo!

35- Quando alguém protestar contra o assassinato de duzentos gays no ano Y, responda que outras quarenta mil pessoas morreram violentamente naquela temporada. Finja que é limítrofe e não entendeu que a cifra se limita aos gays mortos em decorrência desta condição e não aos que tombaram em latrocínios, brigas entre torcidas e disputas armadas por vagas de garagem.

36- Acuse todo movimento constituído contra determinado tipo de opressão de querer promover a opressão com sinal contrário. As feministas, por exemplo, pretendem castrar os machos e colocar-lhes avental para lavar a louça e cuidar de poodles.

37- Enalteça “esportes e diversões” que favorecem o gosto pelo sangue, como arremesso de anões, rinhas de galo, pegas, caçadas em áreas de preservação ambiental, touradas, farras do boi e congêneres. Como já dizia seu patrono oculto Benito Mussolini, “o espírito fascista é emoção, não intelecto”.

38-Procure enxertar referências bíblicas nas suas falas sobre política. Ao defender um oligarca truculento, arremate a obra dizendo algo como “Cristo também jantou na casa do rico Zaqueu”. Tente dar a impressão de que qualquer um que venha a contestá-lo despreza pessoas religiosas.

39-Apresente a todas as crianças que tiver ao seu alcance, antes dos dez anos, o repertório integral de Sylvester Stallone e similares, nos quais o árabe é sempre terrorista, o vietnamita um comunista fanático que jamais tira a farda e o hispano-americano batedor de carteira ou traficante. Tendo a chance, compre também Zulu, para a garotada aprender desde cedo que africanos são selvagens que correm em torno da fogueira sacudindo lanças de madeira.

40- Não permita que a política externa dos Estados Unidos seja criticada impunemente. Nunca se sabe quando o homem de bem precisará de um poder maior e talvez irresistível para defendê-lo do zé povão."

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Um cheiro de cinzas no ar

Cai a acusação de quadrilha no STF; fica desmoralizada a tese do domínio do fato; sobra a Barbosa adornar o palanque conservador

Jogral do Brasil aos cacos erra feio: PIB do 4ª trimestre tem o terceiro maior crescimento do mundo, só atrás da Coreia do Sul e EUA.

Investimento em alta cresce 3,6% em 2013; consumo das famílias avança há 10 anos

PIB de 2013 vai a 2,3%; o do México cresceu 1%: mas o isento Financial Times louva o México pró-mercados; e ataca Guido

Investimento federal em janeiro foi de R$ 11 bi; economia para pagar juros chegou a quase R$ 13 bi, mas os mercados acham pouco

Fica difícil afastar a percepção de que o carnaval conservador saltou para a dispersão sem passar pela apoteose. O cheiro de cinzas no ar é inconfundível.

por: Saul Leblon 

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Como parte interessada, a mídia jamais reconhecerá no fato o seu alcance: mas talvez o Brasil tenha assistido nesta 5ª feira a uma das mais duras derrotas já sofridas pelo conservadorismo desde a redemocratização.

Quem perdeu não foi a ética, a lisura na coisa pública ou a justiça, como querem os derrotados.

A resistência conservadora a uma reforma política, que ao menos dificultasse o financiamento privado das campanhas eleitorais, evidencia que a pauta subjacente ao julgamento da AP 470 tem pouco a ver com o manual das virtudes alardeadas.

O que estava em jogo era ferir de morte o campo progressista

Não apenas os seus protagonistas e lideranças.

Mas sobretudo, uma agenda de resiliência  histórica infatigável, com a qual eles seriam identificados.

Ela foi golpeada impiedosamente em 54 e renasceu com um único tiro; foi golpeada em 1960 e renasceu em 1962; foi golpeada em 1964, renasceu em 1988; foi golpeada em 1989, renasceu em 2003; foi golpeada em 2005 e renasceu em 2006, em 2010...

O  que se pretendia desta vez, repita-se, não era exemplar cabeças coroadas do petismo, mas um propósito algo difuso, e todavia persistente, de colocar a luta pelo desenvolvimento como uma responsabilidade intransferível da democracia e do Estado brasileiro.

A derrota conservadora é  superlativa nesse sentido, a exemplo dos recursos por ela mobilizados --sabidamente nada  modestos.

Seu dispositivo midiático lidera a lista dos mais esfarrapados egressos da refrega histórica.

Se os bonitos manuais de redação valessem, o  desfecho da AP 470  obrigaria a mídia ‘isenta’ a regurgitar as florestas inteiras de celulose que consumiu com o objetivo de espetar no PT o epíteto eleitoral de ‘quadrilha’.

Demandaria uma lavagem de autocrítica.

Que ela não fará.

Tampouco reconhecerá que ao derrubar a acusação de quadrilha, os juízes que julgam com base nos autos desautorizariam implicitamente o uso indevido da teoria  do  domínio do fato, que amarrou toda uma narrativa largamente desprovida de provas.

Se não houve quadrilha, fica claro o propósito político prévio  de emoldurar a  cabeça  do ex-ministro José Dirceu no centro de uma bandeja eleitoral, cuja guarnição incluiria nomes ilustres do PT, arrolados ou não  na AP 470.

O banquete longamente preparado  será degustado de qualquer forma agora.
Mas fica difícil  afastar  a percepção de que o carnaval conservador saltou  direto da concentração para  a dispersão sem passar pela apoteose.

Aqui e ali, haverá quem arrote  peru nos camarotes e colunas da indignação seletiva.

O cheiro de cinzas, porém, é inconfundível e contaminará por muito tempo o ambiente político e econômico do conservadorismo.

O  que se pretendia, repita-se, não era apenas criminalizar fulano ou sicrano, mas a tentativa em curso de enfraquecer o enredo que os mercados impuseram ao país de forma estrita e abrangente no ciclo tucano dos anos 90.

Inclua-se aí a captura do Estado para sintonizar o país à modernidade de um capitalismo ancorado na subordinação irrestrita da economia, e na rendição incondicional da sociedade, à supremacia das finanças desreguladas.

O Brasil está longe de ter subvertido essa lógica.

Mas não por acaso, a cada três palavras que a ortodoxia pronuncia hoje, uma é para condenar as ameaças e tentativas de avanços nessa direção.

O jogral é conhecido: “tudo o que não é mercado é populismo; tudo o que não é mercado é corrupção; tudo o que não é mercado é inflacionário, é ineficiência, atraso e gastança”.

O eco desse martelete percorreu cada sessão do mais longo julgamento da história brasileira.

Assim como ele, a condenação da política pelas togas coléricas reverberava a contrapartida de um anátema econômico de igual veemência,  insistentemente  lembrado pelos analistas e consultores: “o Brasil não sabe crescer, o Brasil não vai crescer, o Brasil não pode crescer --a menos que retome  e conclua  as ‘reformas’”.

O eufemismo cifrado designa o assalto aos direitos trabalhistas; o desmonte das políticas sociais;  a deflagração de um novo ciclo de   privatizações e a renúncia irrestrita a políticas e tarifas de indução ao crescimento.

Não é possível equilibrar-se na posição vertical em cima de um palanque abraçado a essa agenda, que a operosa Casa das Garças turbina para Aécio --ou Campos, tanto faz.

Daí o empenho meticuloso dos punhais midiáticos em escalpelar os réus da AP 470.

Que legitimidade poderia ter um projeto alternativo de desenvolvimento identificado com uma  ‘quadrilha’ infiltrada no Estado brasileiro?

Foi essa indução que saiu  seriamente chamuscada da sessão do STF na tarde desta 5ª feira.

Os interesses econômicos e financeiros que a desfrutariam continuam vivos.

Que o diga a taxa de juro devolvida esta semana ao degrau de 10,75% , de onde a Presidenta Dilma a recebeu e do qual tentou rebaixá-la, sob  fogo cerrado da república rentista e do seu jornalismo especializado.

Sem desarmar a bomba de sucção financeira essas tentativas  tropeçarão ciclicamente  em si mesmas.

Os quase 6% que o  Estado brasileiro destina ao rentismo anualmente, na forma de juros da dívida pública, dificultam sobremaneira desarmar o círculo vicioso do endividamento, do qual eles são causa e decorrência.

É o labirinto do agiota: juro sobre juro leva a mais juro. E mais alto.

Dessa encruzilhada se esboça a disputa entre  dois projetos distintos de desenvolvimento.

A colisão entre as duas dinâmicas fica mais evidente quando a taxa de crescimento declina ou ocorrem mudanças de ciclo na economia mundial, estreitando adicionalmente a margem de manobra do Estado e das contas externas.

É o que a América Latina, ou quase toda ela, experimenta  nesse momento.

A campanha eleitoral deste ano prestaria inestimável serviço ao discernimento da sociedade se desnudasse esse conflito objetivo, subjacente à  guerra travada diante dos holofotes no julgamento da AP 470.

O conservadorismo foi derrotado. Mas não perdeu seus arsenais.

Eles só serão desarmados pela força e o consentimento  reunidos das grandes mobilizações democráticas.

As eleições de outubro poderiam funcionar como essa grande praça da apoteose.

A ver.

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

A única força capaz de resistir aos mercados.

Isenção: primeira página da Folha de hoje tem 11 chamadas: 8 contra o governo e o PT; uma contra os impacientes usuários do metrô de SP que já não toleram as falhas seguidas no serviço tucano.

Inconformado, Gilmar Mendes puxa a coleira e o jogral conservador late imediatamente: doações solidárias aos petistas são suspeitas; cabe perguntar: inclusive os R$ 10 mil do ex-ministro Jobim?

Defeito em linha de transmissão causou apagão; manchete garrafal no site do Valor Econômico: 'Dilma comanda abafa sobre risco energético'.

A desordem financeira global não cederá tão cedo, nem tão facilmente; o cerco pela adoção da vacina ortodoxa é cada vez mais asfixiante.

por: Saul Leblon 

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A desordem financeira global não cederá tão cedo, nem tão facilmente, avisam os solavancos recorrentes das bolsas mundiais e a volatilidade dos mercados de câmbio.

Dia sim, dia não, sirenes alertam para as intempéries de uma transição em curso: é só o começo.

Quando os EUA elevarem a taxa de juro (hoje negativa) o sacolejo pode piorar com congestionada migração de capitais ao bunker de origem. É o vaticínio do jogral que nunca desafina.

A precificação desse futuro  inspira cautela mas não pode significar imobilismo.

O cerco pela adoção da vacina ortodoxa é cada vez mais asfixiante.

Entende-se por isso prevenir a fuga de capitais, e a retração dos investidores, entregando por antecipação o que eles cobram: novas altas nos juros e cortes robustos no gasto fiscal.

O conjunto  precipitaria a emergência de uma economia entrevada em desemprego e recessão que se pretende evitar.

Capitais viciados na alfafa suculenta da arbitragem de juros, e na aveia fina da volatilidade das moedas, cobram rapidez na liberação de novos piquetes.

Nações estremecem; o bucho protuberante do rentismo estica e brilha: grandes bancos quadruplicaram seu lucro na Espanha no ano passado; os suicídios bateram recorde no país, com alta de 11%.

O Brasil iniciou uma ziguezagueante correção da taxa de câmbio em 2012.

A desvalorização acumulada  do Real é superior a 17%.

A meta do governo é equilibrar a paridade em R$ 2,45 (bateu em R$ 2,43 nesta 3ª feira).

Busca-se superar uma valorização que esfolava a indústria e golpeava o comércio exterior do país.

 O déficit de US$ 4 bi em janeiro  foi fortemente pressionado pela importação de bens de consumo, cujo similar nacional  foi preterido pelo diferencial do preço.

A taxa de juro brasileira já é a 3ª mais alta do mundo (superior a 4% em termos reais)

Nada disso adianta e não adiantará, assegura a emissão conservadora.

Mesmo abrigado em um lacre de reservas equivalente a 13 meses de importações, a julgar pela vontade do mercadismo,  o país  deveria  cumprir a penitência prescrita a outras praças infinitamente mais fragilizadas.

Os paladinos do capitalismo pró-cíclico, a exemplo de Edmar Bacha, formulador tucano e assessor especial de Aécio Neves, tem a receita na ponta da língua.

A depender deles, o Brasil  iniciaria desde já um tratamento  feito de intermináveis doses de ajustes e arrochos recessivos, com a revogação maciça de tarifas protecionistas e alta sideral dos juros.

 O país que sobrar disso poderá estacionar a carcaça no cemitério da paz salazarista que hoje abriga  os metabolismos exauridos de Portugal, Espanha e assemelhados.

É o que os mercados podem fazer pelo Brasil.

E o farão, se não forem contidos.

O fatalismo do receituário conservador exprime uma tendência mais geral de um capitalismo que, deixado à própria sorte, mais que nunca vai operar em condições de baixa demanda efetiva, elevado desemprego e especulação solta na esfera financeira (leia a análise de Michael Roberts; nesta pág; bem como a entrevista de Marcelo Justo com chefe de investigação do Conselho Europeu de Relações Exteriores, Hans Kundnani, e a nota neste blog ‘Obama: o mercado vai bem, o povo vai mal’).

Se quiser resistir ao rodo nivelador, o Brasil terá que  calibrar os ajustes que precisam ser feitos –como o do câmbio e a maior ênfase no investimento--   a contrapelo dos  automatismos de mercado.

Só existe uma força capaz de fazer frente a eles: a política.

A política contribuiu de maneira inestimável para o modo como essa lógica se impôs.

Só ela poderá reverter a brutal agonia da decadência atual.

A espoleta da maior crise do capitalismo desde 1929 foi o recuo desastroso do controle da Democracia sobre o poder do Dinheiro. Seu vetor, o desmonte das travas regulatórias do sistema bancário consolidado no pós-guerra.

Recuos e derrotas acumulados pela esquerda mundial desde os anos 70, sobretudo a colonização de suas referências pelos valores neoliberais, alargaram os vertedouros para o espraiamento da dominância financeira atual.

A queda do Muro de Berlim em novembro de 1989 simbolizou a supremacia de uma ordem regressiva que agora vive a sua fase crepuscular.

A sociedade que cedeu a soberania ao suposto poder autorregulador dos mercados perdeu a capacidade institucional de gerar antídotos às degenerações intrínsecas a essa renúncia.

A democracia terá que se reinventar para que tal possibilidade se recoloque no horizonte da ação política.

Não é uma agenda protelatória à espera de um alvorecer redentor.

É um imperativo à negociação política do passo seguinte do desenvolvimento brasileiro.

 Caminhar  em busca desse ponto de mutação requer, ademais do discernimento do governo, a prontidão das forças sociais para trilhar o caminho.

Faz parte do trajeto  um salto na compreensão das interações perversas que subordinam o emprego, o salário e a própria sobrevivência operária à corrosão industrial em marcha batida na economia.

Juros altos e cambio flutuante  transformaram-se em armadilha contra a produção e o emprego.

A valorização cambial nos últimos anos  beneficiou o poder de compra dos salários.
 
Mas o crescimento desbragado das importações vazou a demanda para a China e transferiu vagas para a Ásia.

Retificar o curso dessa sangria tem um preço.

Se o ajuste for feito via mercado, será descarregado integralmente no bolso do assalariado.

Num processo de repactuação política , ônus, bônus e prazos serão ordenados pela correlação de forças em movimento –que terão nas eleições de outubro um de seus moduladores.

Uma certeza emerge das tensões e impasses refletidos nos indicadores econômicos: o capitalismo aceita tudo.

Menos a violação do seu impulso vital imiscível, como água e óleo, com ideais de harmonia e estabilidade.

Não é a necessidade que comanda a produção. É o oposto.

É nesse percurso avesso a convergências sociais que regurgitam as bolhas constitutivas de uma crise permanente de  superprodução --de capitais fictícios e não de mercadorias.

Desmontar essa usina efervescente, repita-se,  não é obra técnica para os mercados.

Ela tampouco será revertida em um só país e delimita a correlação de forças em cada um deles.

Mas há mais a ser feito do que simplesmente sancionar a fatalidade ortodoxa.

O que há para ser feito é romper a caixa preta do economicismo  com uma repactuação progressista do desenvolvimento brasileiro.

A premência desse mutirão político soou a sua hora e a eleição de outubro se oferece como seu catalisador  no país.

A ver
.

sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Obama: o mercado vai bem, o povo vai mal

Solidariedade a Genoino e Delúbio se traduz em mais de R$ 1,6 milhão.

Um Brasil aos cacos? ciclo de governos do PT reduziu em 50% o desemprego no país

11,6 milhões de brasileiros tem carteira assinada: um Portugal inteiro com trabalho formal

Brasil vive o menor desemprego de sua história: 5,4% nas seis regiões metropolitanas

Lula e a questão fundamental: como fazer política hoje? (assista: https://www.youtube.com/watch?v=csK6SAqw-Jg#t=21)


Adultos em idade produtiva compõem a maioria dos lares nos EUA que depende de ajuda estatal para alimentação: de cada 7 pessoas, uma recebe vale refeição.

por: Saul Leblon 

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A economia dos EUA caminha a duas velocidades. A expansão em 2013 foi tímida: 1,9% de crescimento. No último trimestre avançava a bordo de uma taxa anualizada de 3%, mas ainda abaixo dos 4% preconizados pelos otimistas.

O consumo cresce, mas os pedidos de seguro desemprego também. Um dos principais patrimônios dos EUA, a classe média afluente, derrete.

Os empregos são de baixa qualidade, a precariedade impera: a curva de crescimento dos salários, comparativamente a dos lucros, mostra a relação mais baixa da história dos EUA. 

Pessoas em idade de trabalhar agora compõem a maioria dos norte-americanos que dependem do vale-refeição do governo para comer.

Trata-se de uma ruptura de padrão: a norma, depois da depressão dos anos 30, era uma clientela feita de crianças e idosos.

Um em cada sete norte-americanos recebe ajuda alimentar.

O conservadorismo no Congresso quer cortar  US$ 4 bi/ano do programa –que hoje soma US$ 80 bi/ano, o dobro do valor de cinco anos atrás. Lá como cá, o mercadismo entende que isso  gera  ‘dependência e abuso’.

Esse o mundo real.

Na  atividade papeleira a história é outra: a banca colhe bons lucros, as bolsas decolam. Bônus milionários  voltaram a tonificar os pelos dos lobos de Wall Street.

Lembremos: são quase cinco anos de injeção mensal de US$ 85 bilhões nas mãos da matilha financeira.

Nesta semana, a ração foi mitigada com um segundo corte: o Fed depositará US$ 65 bi mensais na cuia dos lobos.

Do acúmulo efervescente parte o frisson responsável, em boa medida, por acionar a viagem de volta dos capitais estacionados em vários pontos do planeta.

A matilha fareja carne fresca no habitat original;  prepara-se para ocupar posições.

O ensaio de êxodo explica a  instabilidade cambial nas economias em desenvolvimento. Atinge, sobretudo,  dependentes de fluxos especulativos, que não conseguem segurar a fuga de capitais.

Céticos dizem que  há uma, várias,  para dizer a verdade, bolhas embutidas em uma recuperação  inflada na circularidade do dinheiro descolado do sistema produtivo.

A julgar pelo que disse Obama 3ª feira, no tradicional discurso sobre o estado da arte do país, a suspeita guarda pertinência.

Após saudar a retomada nos indicadores, o democrata emendou um desabafo sobre o panorama debaixo da ponte:

"A desigualdade se aprofundou. A mobilidade ascendente se estancou, e há pessoas demais que não estão trabalhando", lamentou.

O paradoxo do renascimento sem vida foi desdenhado na abordagem  midiática.

Preferiu-se focar  o esforço de Obama para recuperar o tônus eleitoral de um prestígio esfarelado por cinco anos de hesitações sob o garrote implacável do conservadorismo.

A contabilidade política do democrata equipara-se atualmente a de Bush  em final do mandato : apenas 40% dos americanos o apoiam; somente 30% enxergam motivos para otimismo com o país

O fato de Obama não ter conseguido até hoje reajustar o salário mínimo norte-americano, congelado há 15 anos, diz muito sobre a natureza de uma recuperação sem povo a bordo. Ou pelo menos mantido longe da primeira classe.

Parodiando um general da ditadura sobre o  ‘milagre brasileiro’:  nos EUA  os mercados vão bem, o povo vai mal.

‘Deem  um aumento à América", exortou  Obama, em busca da anuência do Congresso para seu projeto de lei que eleva em 40%  o salário mínimo  -- hoje  20% menor do que o vigente no governo Reagan, lamentou.

A título de comparação: nos últimos 12 anos, o salário mínimo brasileiro teve um aumento de 70% acima da inflação.

O desemprego nos EUA –oficial— é de 6,5%. Lambe os dois dígitos entre os negros e hispânicos.

A título de comparação número dois: nos últimos 10 anos, caiu à metade o número de  desempregados no Brasil; foi  criado um Portugal  inteiro de vagas (11,6 milhões) com carteira assinada; ao final de 2013, nas seis principais regiões metropolitanas, a taxa de desemprego atingiria a sua mínima histórica: 5,4%. Não por acaso, a inadimplência recuou ao menor nível desde 2011, mesmo com o  estoque de crédito na economia tendo crescido 14,5%  no ano passado, para somar um volume equivalente a 56,5% do PIB  (girava em torno de 25% no ciclo tucano)

As chances de Obama sensibilizar uma Câmara dominada pelos republicanos desde 2010 são equivalem às de Dilma em convencer o Tea Party tupiniquim de que não se deve jogar fora a maior defesa do país nessa transição de ciclo mundial: seu imenso mercado interno.

No desencontro entre essas duas trajetórias  desenha-se a encruzilhada que divide as avaliações sobre a pretensão brasileira de se construir enquanto nação justa e  soberana , em plena era dos capitais globalizados.

O consenso que esbraveja contra a gastança aqui e contra o vale-refeição lá tem uma receita um pouco diferente de futuro: cabe  aos  ‘livres mercados’  a tarefa de aplainar o terreno,  ordenar os alicerces e modelar a distribuição da renda e da riqueza na sociedade.

‘Tirar o governo do caminho’, como  gosta de dizer o Tea Party, seita norte-americana que se avoca intimidades mediúnicas com a mão invisível do mercado.

‘Um governo mais leve’,  evoca a linguagem atucanada por aqui, quase um esperanto do jornalismo isento, abraçado agora  também pelo neto que constrangeria  o avô  se vivo fosse.

A decepção de Obama ao constatar que a tão aguardada recuperação não revitalizou a sociedade na mesma proporção que agitou os índices Down Jones,  ilustra a dificuldade de se atribuir ao mercado aquilo que ele não sabe fazer.

O conjunto sugere que a Presidenta Dilma deveria analisar detidamente as características da convalescença em curso da maior crise do capitalismo desde 1929.

Convém atentar para as armadilhas do caminho, antes de endossar aquele pedaço do seu entorno que  mal consegue disfarçar  o entusiasmo com a janela de oportunidade para ressuscitar a dobradinha feita de  ‘arrocho monetário e fiscal’.

O discurso do Obama de 3ª feira  é o reconhecimento de uma emergência social.

Algumas informações colhidas de reportagens da Associated Press e do jornal El Pais:

- o governo dos EUA gasta atualmente US$ 80 bi  por ano com ajuda alimentar - o dobro do valor registrado há cinco anos;

- desde os anos 80, a dependência de ajuda para alimentação cresce mais entre os trabalhadores com alguma formação universitária --  sinal de que sob a égide  dos mercados desregulados, a  ex- classe média afluente não consegue sobreviver sem ajuda estatal;

- cerca  de 28% por cento das famílias que recebem vale-refeição são chefiadas por uma pessoa com alguma formação universitária;

- hoje o food stamps atende  1 de cada sete norte- americanos;

- de  2000 a 2011 , salários baixos e desigualdade  foram responsáveis por 13% da expansão do programa – contra  3,5%  entre 1980 e 2000

- pesquisas relativas ao período de 1979 e 2005 (ciclo neoliberal anterior à crise) revelam que 90% dos lares norte-americanos viram sua renda cair nesse período; apenas 1% das famílias ascendeu à faixa superior a meio milhão de dólares.

- 21% dos menores norte-americanos vivem em condições de pobreza atualmente.

O alarme anti-arrocho  emitido por essas estatísticas não  invalida o fato de que o Brasil precisa construir uma nova máquina de crescer.

Mais que nunca, porém, deixa claro que essa não é uma obra a se terceirizar aos livres mercados, como percebeu um Obama engessado em tibieza pessoal, mas não só nela.

Numa economia longamente descarnada de sua base industrial,  e desfibrada por taxas de sindicalização operária as mais baixas da história, a correlação de forças reservou-lhe pouca margem de manobra.

Exceto apelar algo pateticamente à boa vontade... dos mercados.

O Brasil vive um momento histórico distinto.

Se a trepidação global ajustar a paridade do Real na faixa dos R$ 2,45 por dólar, como quer o governo,  na verdade será  bom para regenerar seu tecido industrial e vitaminar o saldo comercial.

Pressões inflacionárias que assaltem a economia pelo canal dos bens importados, porém, não podem ser descarregadas exclusivamente no ombro dos assalariados.

Ganho de produtividade extraído da prensa dos holerites  tem sido  a norma em uma receita de capitalismo indiferente ao trunfo de seu mercado de massa.

Não é mais assim.

E os dados de 2013 sobre  consumo, emprego e renda  evidenciam o ganho da mudança processada desde 2003.

A produtividade imprescindível à renovação dessa engrenagem requer a  construção de um outro percurso.

Certamente ele será mais longo que o ajuste instantâneo oferecido pelo ferramental ortodoxo.

Mas se afigura também mais consistente do ponto de vista político  --e mais sólido se bem sucedido na inserção do país em cadeias tecnológicas de abrangência global, associada à expansão da infraestrutura local.

A única forma de modular uma travessia desse tipo, sob comando democrático da sociedade e do Estado, é pela negociação política.

O engessamento de Obama  demonstra que apostar na indulgência do conservadorismo parlamentar para pavimentar esse  caminho leva ao desmanche político.

Dilma tem os instrumentos dos quais  Obama se ressente e Roosevelt dispunha nos anos 30/40.

O Brasil preserva em seu metabolismo uma estrutura de organização social e sindical que precisa e poder ser rejuvenescida.

Dispõe de um governo progressista que mudou, para melhor, a face da sociedade em uma década e pouco à frente do Estado.

As eleições de 2014 configuram excelente oportunidade para as duas pontas renovarem o seu estoque de força e consentimento na repactuação da democracia social brasileira.