Jornalista afirma que "o país reelegeu a
presidente Dilma Rousseff e o programa petista, mas as forças derrotadas
buscam impor sua agenda"; em um movimento sutil, diz Breno Altman, a
oposição tenta emparedar o governo e obrigá-lo a acatar medidas e
nomeações ao gosto do bloco político-social batido nas urnas, ou seja, o
PSDB; "A chave conceitual destas operações está na afirmação de que a
nação teria saído dividida do processo eleitoral. Fora desse diapasão,
não teria condições e legitimidade para governar", explica; "A direita
ensaia, com a tese da divisão, um discurso para dobrar e desidratar o
governo, antes de esquartejá-lo"
247 – "O terceiro turno já começou". A afirmação é do jornalista Breno Altman, que em
nova coluna no 247,
não vê, no momento, "tentativas abertas de desestabilização e
sabotagem" do governo eleito pelo povo, e sim uma forma "mais sutil,
mesmo que possa ser preparatório de manobras mais agressivas", de a
oposição "impor sua agenda".
"Trata-se de emparedar o governo e obrigá-lo a acatar medidas e
nomeações ao gosto do bloco político-social batido nas urnas", diz ele,
em referência ao PSDB do candidato derrotado Aécio Neves. "A chave
conceitual destas operações está na afirmação de que a nação teria saído
dividida do processo eleitoral. Fora desse diapasão, não teria
condições e legitimidade para governar", explica.
Segundo Altman, "a tese da divisão serve, neste momento, à intenção
de encurralar o governo e forçá-lo a adotar caminho que, atendendo as
reivindicações do mercado, provoque o máximo desgaste junto aos
eleitores e militantes de esquerda".
"A direita ensaia, com a tese da divisão, um discurso para dobrar e
desidratar o governo, antes de esquartejá-lo", diz ainda. "A esquerda,
talvez com alguma timidez, acumula forças para enfrentar os entulhos
autoritários, encravados no sistema político e no monopólio da mídia,
sobre os quais se mantém a dualidade de poderes que freia a aceleração e
o aprofundamento das reformas", completa.
TESE DA DIVISÃO É CHANTAGEM CONTRA GOVERNO
Breno Altman
O terceiro turno já começou. O país reelegeu a
presidente Dilma Rousseff e o programa petista, mas as forças derrotadas
buscam impor sua agenda.
O instrumento principal, por ora, não são tentativas abertas de
desestabilização e sabotagem. O movimento é mais sutil, ainda que possa
ser preparatório de manobras mais agressivas. Trata-se de emparedar o
governo e obriga-lo a acatar medidas e nomeações ao gosto do bloco
político-social batido nas urnas.
A chave conceitual destas operações está na afirmação de que a nação
teria saído dividida do processo eleitoral. Vencedora por margem
estreita, só restaria à presidente abraçar teses que atendessem os
interesses e as posições de seus adversários. Fora desse diapasão, não
teria condições e legitimidade para governar.
A chefe de Estado, nesta lógica, teria que aceitar ser refém dos
grupos políticos e corporativos que, sem maioria popular, controlam o
poder econômico e de informação, além de reter forte influência sobre o
Parlamento, a Justiça e outras instituições do Estado.
O preço para a paz seria o predomínio, mesmo que parcial, da
plataforma neoconservadora rejeitada pelo voto. Ainda assim, sem
quaisquer garantias de que, feitas as concessões, seriam respeitados
eventuais acordos.
Vale lembrar que não há uma só linha na norma constitucional que
subtraia prerrogativas de um governante que tenha sido eleito por
diferença pouco confortável.
Ou alguém acha que, vitorioso Aécio Neves, estaríamos assistindo
pressão equivalente, dos mesmos atores antidivisionistas, para nomear um
sindicalista para o Ministério da Fazenda ou cortar juros como
principal providência de ajuste fiscal?
A questão é puramente funcional. A tese da divisão serve, neste
momento, à intenção de encurralar o governo e força-lo a adotar caminho
que, atendendo as reivindicações do mercado, provoque o máximo desgaste
junto aos eleitores e militantes de esquerda.
A divisão real do país é de outra natureza, que não pode ser
confundida com a decisão democrática e soberana que reconduziu Dilma ao
comando da República, dando-lhe mandato uno e legítimo.
Mas é fato que o Brasil vive em dualidade de poderes desde a primeira
posse de Lula, em 2003. As forças progressistas detêm o governo
nacional, mas sem maioria parlamentar, sob fogo cerrado dos monopólios
da comunicação e com instituições judiciais usualmente cúmplices de
manobras oposicionistas.
Como tal impasse pode ser rompido? Essa talvez seja a principal dúvida de todos os protagonistas.
O campo conservador aparentemente escolheu sua estratégia, com duas variantes.
A primeira está em curso: chantagear a presidente e obriga-la a recuos de peso, desidratando sua liderança política.
A segunda permanece embutida: deflagrar processo de sabotagem e
impedimento, a partir de eventuais denúncias de corrupção no caso
Petrobrás, com a meta de fazer o governo, o PT e Lula chegarem
estropiados a 2018.
A presidente e o petismo, porém, vivem uma encruzilhada.
Durante doze anos, a busca de governabilidade foi encarada quase
exclusivamente como uma tarefa institucional, constituindo alianças
parlamentares que pudessem aprovar os projetos do Planalto e proteger o
governo da desestabilização.
O arrefecimento da disputa política-ideológica era visto como
necessário para facilitar estes acordos, reduzindo conflitos e danos. A
militância e os movimentos sociais, sempre fundamentais para as batalhas
eleitorais, eram recolhidos à posição de reserva estratégica na hora de
governar.
O cenário, no entanto, parece ter mudado sensivelmente. O avanço nas
reformas encontra resistência conservadora cada vez mais dura e frontal,
contaminando amplos setores centristas da base parlamentar.
Vão se
fechando os espaços para trafegar entre as velhas instituições.
O discurso da vitória de Dilma reflete, de algum modo, a presente situação.
A presidente reeleita falou em diálogo e união, buscando isolar as
frações mais radicalizadas da direita e ganhar tempo na reconfiguração
de seu governo.
Mas também deu centralidade à proposta de reforma política através de
plebiscito popular, sinalizando que é chegado o momento de enfrentar os
problemas estruturais.
O presidente do PT, Rui Falcão, foi enfático ao dizer que, sem
mobilização popular, não haverá reforma alguma. Não é pouca coisa.
Claramente introduz as ruas como elemento imprescindível da
governabilidade, o que constitui forte novidade na estratégia petista.
Estamos assistindo, de toda forma, aos primeiros passos de um embate decisivo.
A direita ensaia, com a tese da divisão, um discurso para dobrar e desidratar o governo, antes de esquarteja-lo.
A esquerda, talvez com alguma timidez, acumula forças para enfrentar
os entulhos autoritários, encravados no sistema político e no monopólio
da mídia, sobre os quais se mantém a dualidade de poderes que freia a
aceleração e o aprofundamento das reformas.