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sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Dona Zelite reclama: meteram a mão no meu IOF

Maringoni















A Zelite está inconformada. Agora, seu rolezinho no exterior ficou mais caro. Fui vítima de um atentado violento ao meu direito de livre compra, diz ela.

Paris -  Tendo chegado à capital francesa na semana passada, Dona Zelite cumpriu uma estafante agenda de entretenimento que incluiu um rolezinho básico pela célebre avenida dos Champs-Elysées, de manhã, uma tarde na Eurodisney e um colóquio com Joaquim Barbosa, à noite.

Mas nada disso foi suficiente para acalmá-la. Dona Zelite está possessa.

"Fui vítima de um atentado violento ao meu direito de livre compra" - disse a cidadã do mundo que tem sua residência oficial em Higienópolis, o bairro chiquérrimo de São Paulo.

“Ofende a Declaração Universal dos Direitos Humanos”!”.

“A da ONU”? perguntei.

“Não”, ela respondeu. “Esta é coisa de comunista. É a do FMI”.

O suposto atentado teria sido cometido pelo governo brasileiro, que elevou o Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguros (IOF) de 0,38% para 6,38% para as transações de débito em cartão no exterior.

As transações na opção crédito já eram debitadas nesse valor. A medida igualou o imposto do cartão pelo patamar mais alto.

Perguntei à Zelite quando ela percebeu que haviam passado a mão em seu IOF.

"Senti algo estranho assim que desci da primeira classe da aeronave. De repente, percebi que estava sendo bolinada em meus valores mais profundos. Quando olhei para trás, vi o ministro Guido Mantega passando a mão no meu IOF".

Segundo a Zelite, o aumento do IOF é quase um confisco  da propriedade privada, uma reforma agrária no mundo das finanças, além de ser uma quebra de contrato gravíssima e um pecado capital, na verdade, um pecado contra o capital.

Em sua opinião, é pior que o confisco da poupança perpetrado pelo governo Collor. 
Como bem conheço a Zelite de outros carnavais, retruquei imediatamente que, se bem me lembro, à época do confisco, a Zelite não reclamou de nada. Muito pelo contrário. Apoiou entusiasticamente.

"Muito fácil de explicar. Rico não tem dinheiro em poupança. A gente se garante pondo nosso dinheirinho nas Ilhas Virgens".

Lembrei à socialaite que as tarifas bancárias abocanham muito mais que o IOF.
Dona Zelite empinou o nariz, deu com os ombros e, simulando um sorriso irônico, explicou como se fosse a coisa mais natural do mundo: "mas banco é privado, meu querido. Privado pode. Governo é que não pode. Banco pode fazer o que bem entender. Quem quiser que troque de banco. Agora, neste nosso país difícil é trocar de governo, com esse povinho votando sempre no mesmo".

Minha tentativa de vencê-la pelo cansaço prosseguiu para mais um round. Lembrei à Zelite que ela gasta mais com o garçom e com o couvert do restaurante do que com IOF. "Exatamente. Eu agora não sei como cobrir essas despesas, vai fazer falta. O aumento do IOF prejudica o garçom, vai ter gorjeta de menos. Agora, no meu couvert ninguém mexe.".

Cá entre nós, foi algo realmente desolador. A Zelite quase me convenceu.
Apontando para o Museu do Louvre, como se tivesse da Vinci, Rodin e Rembrandt por testemunhas, mostrou-me o quanto o aumento do IOF na opção débito do cartão foi um duro golpe para a humanidade.

Seu argumento mais forte ainda estava por vir: "eu já saquei qual é a desse governo. Ele quer que eu troque Paris, Miami e Nova York pela 25 de março ou pela Feira de São Cristóvão. Jamé!".

Se não me engano, "jamé" quer dizer "jamais". Acho até que se escreve do mesmo jeito em Português, só que com um toque de classe.

Então, a quem interessar possa: de agora em diante, para dizer "jamé" na opção débito tem que pagar 6,38% de IOF. Ser chique anda cada dia mais caro. Assim não dá.

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