As bombas de efeito-retardado que Sérgio Machado deixou para a coalizão Temer-PSDB: Furnas, Castelo de Areia e dois entregadores de propina
Da Redação
José Sérgio de Oliveira Machado, ao se aproximar dos 70 anos de idade, deve ter imaginado que não valia a pena terminar a vida na cadeia.
Juntou-se aos três filhos que participaram direta ou indiretamente de seus negócios e produziu 246 páginas de denúncias sobre o submundo da política brasileira.
Ele tem história. Serviu como coordenador de campanha de Tasso Jereissati no Ceará, estado pelo qual foi eleito deputado federal (1991-94) e senador (1995-2003).
Foi líder do PSDB no Senado, mas não se reelegeu em 2002.
Indicado pelo PMDB, assumiu a direção da Transpetro no governo Lula e passou a “pagar” a conta aos que o sustentavam no cargo: Renan Calheiros, Romero Jucá, Édison Lobão e José Sarney.
Machado calcula que distribuiu a políticos mais de R$ 100 milhões. Renan teria levado R$ 32 milhões, Lobão R$ 24 mi, Jucá R$ 21 mi, Sarney R$ 18,5 mi, Jader Barbalho R$ 3 mi e Henrique Eduardo Alves R$ 1,5 mi.
Trata-se da base de sustentação do governo interino de Michel Temer.
O próprio Sérgio Machado chegou a acumular no Exterior uma fortuna estimada em R$ 74 milhões — ele alega que juntou dinheiro dentre outros motivos para disputar o governo do Ceará em 2010.
Transitando na confluência dos negócios com a política, Machado aparece no documento da Procuradoria Geral da República como uma espécie de historiador do propinoduto brasileiro, que ele alega ter surgido em 1946 com taxas fixas: 3% em contratos nacionais, 5 a 10% em estaduais, 10 a 30% em negócios municipais.
Ele relata curiosas manobras políticas de bastidores: o ex-presidente do PSDB, Sergio Guerra, e o demo Heráclito Fortes teriam cobrado propina para deixar andar numa comissão do Senado um projeto que interessava à construção naval no Brasil.
Trata também do esforço que levou Aécio Neves à presidência da Câmara no segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso. Para montar a bancada de 99 deputados, foram feitas contribuições de campanha de 100 a 300 mil com dinheiro do empresariado, inclusive trazido de fora. Das sobras da campanha de FHC teriam vindo R$ 4 milhões. Aécio teria embolsado R$ 1 mi em dinheiro.
Diz a delação que “com frequência, Aécio recebia esses valores através de um amigo de Brasília, que o ajudava nessa logística; que esse amigo era jovem, moreno e andava sempre com roupas casuais e uma mochila”.
FHC temia contrariar Antonio Carlos Magalhães, já que o PFL tinha a maior bancada na Câmara (105 deputados). Mas Aécio, bombado com dinheiro do propinoduto, deu o golpe fechando acordo com o PMDB, que elegeu Jáder Barbalho presidente do Senado.
Sobre questões mais atuais, como a tentativa da coalizão PMDB-PSDB de acabar com a Lava Jato, Machado esclareceu que Renan Calheiros tratou do assunto com os tucanos José Serra e Aécio Neves e pretendia em breve incluir nas conversas José Agripino e Fernando Bezerra.
Mas há outros danos, de efeito-retardado, que a delação da família Machado pode inflingir ao governo Temer.
Sérgio Machado, falando como íntimo do tucanato, reforça enormemente denúncias que o PSDB tanto fez para desacreditar, sobre o esquema de Furnas.
A certa altura, ele diz que num contrato de janeiro de 2008 entre a Transpetro e a Bauruense, o dono desta, Airton Daré, pagou 300 mil reais em propina e que o empresário revelou que agia da mesma forma com a Eletrobras.
Daré, como se sabe, foi recordista em contratos com Furnas, que tinha um aliado de Aécio Neves, Dimas Toledo, como diretor de Engenharia. Numa ação de busca e apreensão na casa do empresário, em Bauru, a Polícia Federal apreendeu R$ 1.027.850,00 e U$ 356.050,00 em dinheiro vivo.
O doleiro Alberto Yousseff e o ex-presidente do PP, Pedro Corrêa, já haviam mencionado Aécio. Segundo eles, Daré pagava propina ao hoje senador tucano pelos contratos obtidos em Furnas. Corrêa mencionou a irmã do tucano, Andrea Neves, como intermediária.
Na famosíssima Lista de Furnas, que teria bancado a campanha dos tucanos em 2002, o nome de Andrea aparece ao lado de R$ 650 mil: “Valor avulso repassado para Andréa Neves, irmã de Aécio Neves, para os comitês e prefeitos do interior do Estado – MG”.
Já aparece no horizonte a possibilidade de que outro delator, Nilton Monteiro, venha a ser ouvido em futuras investigações. Ele foi íntimo das campanhas tucanas em Minas Gerais. Já afirmou que aceitaria contar tudo a autoridades federais desde que os processos a que responde na justiça estadual sejam federalizados.
Outro ponto importantíssimo da delação de Sérgio Machado é a descrição que ele faz de um esquema envolvendo a empreiteira Camargo Corrêa. O executivo Pietro Bianchi teria repassado R$ 9 milhões vindos de contas no paraíso fiscal de Andorra ao esquema comandado por Sérgio Machado.
Como se sabe, muito antes da Operação Lava Jato a Camargo Corrêa foi o foco da Operação Castelo de Areia, anulada pelo STJ. A Polícia Federal, ao fazer busca e apreensão na empresa, conseguiu acesso à contabilidade paralela da empreiteira. Bianchi foi um dos principais alvos da Castelo de Areia. O nome do hoje presidente interino Michel Temer aparece várias vezes nos relatórios da operação da PF (reproduzidos abaixo).
Como se tudo isso não bastasse, a família Machado ainda entregou à PGR dois “homens da mala”, intermediários que faziam o trânsito de dinheiro vivo para o pagamento de propina a políticos: um se chama Felipe Parente e o outro, Alexandre Lui.
Certamente ambos serão chamados a depor, o que acrescenta a possibilidade de que, em breve, saberemos detalhes pitorescos sobre a circulação do cash no propinoduto de Sérgio Machado.
Destinatários? Todos os “homens fortes” do governo Temer.
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