A democracia que só fala com os amigos
Foi com espanto e tristeza que ouvi os xingamentos a mim dirigidos pelo senador eleito Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP). Na noite de segunda-feira (25), o ex-chefe da Casa Civil do governo paulista classificou-me como “pelego e filho da puta.” A agressão verbal ocorreu antes do debate realizado pela Rede Record entre os candidatos à Presidência da República.
Ao senador, não havia, até aquele momento, dirigido nenhuma palavra. Tudo o que ele sabe de mim, naquele instante e agora, é que trabalho para a Rede Brasil Atual e para a Revista do Brasil. Parece ser suficiente para que se sinta no direito de proferir insultos: são veículos produzidos por uma empresa privada cuja receita vem da prestação de serviço (venda de anúncios e assinaturas) a pessoas físicas e jurídicas – incluindo sindicatos de trabalhadores.
Foi por conta desse aspecto que o PSDB obteve liminar, via Tribunal Superior Eleitoral (TSE), vetando a continuidade da distribuição e a divulgação da edição 52 da revista na internet sob a argumentação de que dinheiro do trabalhador não pode financiar material eleitoral - este assunto já foi discutido aqui e a editora apresentou recurso ao TSE, não cabendo de minha parte qualquer argumentação.
O que a mim, como jornalista, é importante debater é a maneira como o senador se sente no direito de tratar a imprensa. É deplorável que, como repórter, tenha de me posicionar contra a agressão que sofri, deixando de exercer o fundamento básico da minha profissão, que é escrever sobre os outros, e não sobre minha vida. O único bem de um jornalista, ao menos daquele que não se presta a coleguismos com o poder, é a palavra: é ela que ouço, é com ela que conto histórias.
Quando o senador classifica a mim como “pelego filho da puta” porque trabalho em um veículo que jamais escondeu sua posição favorável à continuidade do atual projeto de governo, recorre a uma simplificação lamentável. Seguida a linha de pensamento do futuro parlamentar, todos os que trabalham em Veja, Folha, Estado e O Globo são, necessariamente, tucanos – e aí o leitor escolha o adjetivo que deve acompanhar a classificação.
A fala do senador é reveladora da propensão a não lidar com o contraditório. Talvez por maus costumes: quem circula pelos eventos políticos brasileiros sabe a cordialidade com que são tratados alguns líderes políticos, plenamente oposta à ferocidade dispensada a outros. Ao recorrer a esta simplificação, realiza-se um desmerecimento prévio de meu trabalho, numa triste tentativa de intimidação de minha atuação. Simplificação que teve continuidade no Twitter, em que o senador utilizou aspas para dizer que sou jornalista: "O 'jornalista' faz o que eu esperava dele: mente quando afirma que o xinguei de fdp. Chamei de pelego, o que é verdade e, a mim, muito pior."
O senador sabe as palavras que proferiu. Se quer admitir em público ou não, para mim é indiferente. O que não se pode colocar em dúvida é minha formação e minha integridade profissional. Sou jornalista – sem aspas – formado pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP). Minha passagem pelo Departamento de Jornalismo e Editoração, portanto, está lá registrada, caso alguém se interesse em averiguar.
Daqui por diante, como o senador espera que se proceda para entrevistar algum integrante do PSDB? Será que a democracia ideal contempla apenas a manifestação das vozes amigas (e queridas), sem espaço ao debate necessário para o amadurecimento da sociedade e, por consequência, da realização do bom jornalismo? O PSDB, que tem recorrido a simplificações para acusar adversários de quererem cercear a liberdade de pensamento, é quem mais nos fornece exemplos deste suposto cerceamento. Já não cabem nos dedos de uma mão: a restrição da circulação da Revista do Brasil, a censura ao jornal ABCD Maior, a tentativa de agressão do padre que se manifestou contra boatos, a ação no Paraná para impedir a publicação de pesquisas eleitorais, a "criminalização" de jornalistas que fazem perguntas efetivas a Serra e, agora, este xingamento.
Uma coisa é a opinião de um veículo. Outra, que não se confunde, é a opinião do jornalista. Esta, manifesto em blogues e nas redes sociais da internet, bem como outras centenas de profissionais da área, e deixo para trás quando estou na condição de repórter. Nas redações nas quais trabalhei, e há nesta lista algumas que o senador seguramente vê com bons olhos, sempre mantive minha posição de não deixar que interesses se misturem. Cumpro o compromisso de ouvir todos os lados. Como teria feito na última segunda-feira, se me tivesse sido conferida, pelo senador, tal oportunidade. Espero que, na próxima ocasião, Aloysio Nunes se mostre aberto ao diálogo. Sem ofensas, sem simplificações.
Ao senador, não havia, até aquele momento, dirigido nenhuma palavra. Tudo o que ele sabe de mim, naquele instante e agora, é que trabalho para a Rede Brasil Atual e para a Revista do Brasil. Parece ser suficiente para que se sinta no direito de proferir insultos: são veículos produzidos por uma empresa privada cuja receita vem da prestação de serviço (venda de anúncios e assinaturas) a pessoas físicas e jurídicas – incluindo sindicatos de trabalhadores.
Foi por conta desse aspecto que o PSDB obteve liminar, via Tribunal Superior Eleitoral (TSE), vetando a continuidade da distribuição e a divulgação da edição 52 da revista na internet sob a argumentação de que dinheiro do trabalhador não pode financiar material eleitoral - este assunto já foi discutido aqui e a editora apresentou recurso ao TSE, não cabendo de minha parte qualquer argumentação.
O que a mim, como jornalista, é importante debater é a maneira como o senador se sente no direito de tratar a imprensa. É deplorável que, como repórter, tenha de me posicionar contra a agressão que sofri, deixando de exercer o fundamento básico da minha profissão, que é escrever sobre os outros, e não sobre minha vida. O único bem de um jornalista, ao menos daquele que não se presta a coleguismos com o poder, é a palavra: é ela que ouço, é com ela que conto histórias.
Quando o senador classifica a mim como “pelego filho da puta” porque trabalho em um veículo que jamais escondeu sua posição favorável à continuidade do atual projeto de governo, recorre a uma simplificação lamentável. Seguida a linha de pensamento do futuro parlamentar, todos os que trabalham em Veja, Folha, Estado e O Globo são, necessariamente, tucanos – e aí o leitor escolha o adjetivo que deve acompanhar a classificação.
A fala do senador é reveladora da propensão a não lidar com o contraditório. Talvez por maus costumes: quem circula pelos eventos políticos brasileiros sabe a cordialidade com que são tratados alguns líderes políticos, plenamente oposta à ferocidade dispensada a outros. Ao recorrer a esta simplificação, realiza-se um desmerecimento prévio de meu trabalho, numa triste tentativa de intimidação de minha atuação. Simplificação que teve continuidade no Twitter, em que o senador utilizou aspas para dizer que sou jornalista: "O 'jornalista' faz o que eu esperava dele: mente quando afirma que o xinguei de fdp. Chamei de pelego, o que é verdade e, a mim, muito pior."
O senador sabe as palavras que proferiu. Se quer admitir em público ou não, para mim é indiferente. O que não se pode colocar em dúvida é minha formação e minha integridade profissional. Sou jornalista – sem aspas – formado pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP). Minha passagem pelo Departamento de Jornalismo e Editoração, portanto, está lá registrada, caso alguém se interesse em averiguar.
Daqui por diante, como o senador espera que se proceda para entrevistar algum integrante do PSDB? Será que a democracia ideal contempla apenas a manifestação das vozes amigas (e queridas), sem espaço ao debate necessário para o amadurecimento da sociedade e, por consequência, da realização do bom jornalismo? O PSDB, que tem recorrido a simplificações para acusar adversários de quererem cercear a liberdade de pensamento, é quem mais nos fornece exemplos deste suposto cerceamento. Já não cabem nos dedos de uma mão: a restrição da circulação da Revista do Brasil, a censura ao jornal ABCD Maior, a tentativa de agressão do padre que se manifestou contra boatos, a ação no Paraná para impedir a publicação de pesquisas eleitorais, a "criminalização" de jornalistas que fazem perguntas efetivas a Serra e, agora, este xingamento.
Uma coisa é a opinião de um veículo. Outra, que não se confunde, é a opinião do jornalista. Esta, manifesto em blogues e nas redes sociais da internet, bem como outras centenas de profissionais da área, e deixo para trás quando estou na condição de repórter. Nas redações nas quais trabalhei, e há nesta lista algumas que o senador seguramente vê com bons olhos, sempre mantive minha posição de não deixar que interesses se misturem. Cumpro o compromisso de ouvir todos os lados. Como teria feito na última segunda-feira, se me tivesse sido conferida, pelo senador, tal oportunidade. Espero que, na próxima ocasião, Aloysio Nunes se mostre aberto ao diálogo. Sem ofensas, sem simplificações.
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