A presidente eleita Dilma Rousseff tem uma excelente oportunidade de se livrar de um grande problema no nascedouro. Desconvidar, se é que o convite foi feito, o ministro da Defesa Nelson Jobim para continuar à frente da pasta em seu governo. O argumento seria de traição à pátria por passar informações privilegiadas aos Estados Unidos, como revelaram os documentos vazados pelo site Wikileaks.
A palavra traição pode soar forte, já que Jobim não entregou nenhum dado que ameaçasse a segurança do país, mas se valeu do cargo para transmitir ao embaixador do EUA no Brasil, Clifford Sobel, informações confidenciais, às quais só teve acesso pelo cargo que ocupa.
Jobim jamais poderia ter dito ao embaixador americano, dias depois de uma visita do presidente Lula a La Paz, da qual participou, que o presidente boliviano Evo Morales teria um diagnóstico de câncer e citado, inclusive, uma oferta brasileira de um tratamento em São Paulo. A doença de qualquer presidente é um assunto estratégico de cada país, e, no caso de Morales, tinha um caráter ainda mais relevante por se tratar de um desafeto do governo americano. O ministro brasileiro não é nenhum inocente para alegar que teria feito apenas um comentário. Ele sabia, se o fato for confirmado, que detinha uma informação importante e de grande interesse para os EUA. Se a passou foi com algum propósito cuja explicação deve à sociedade brasileira.
Se tal fato parece insuficiente, Jobim incorreu em falta ainda mais grave ao falar ao embaixador de inclinação antiamericana do Itamaraty e acusar um colega de governo, o então secretário- geral do Ministério das Relações Exteriores, Samuel Pinheiro Guimarães, de ter ódio aos EUA e trabalhar para criar problemas nas relações.
A política externa brasileira deu um salto de qualidade no governo Lula e ganhou respeitabilidade mundial para ser exposta, mesmo que sob a ótica individual e limitada, por um ministro de governo, que deveria ser investigado desde já com vistas a uma possível exoneração caso os fatos fossem comprovados. Os EUA não negaram a veracidade dos documentos de sua diplomacia, apresentados pelo Wikileaks, e os relatos das correspondências são detalhados o suficiente para incriminar os envolvidos.
A Jobim, como ministro do governo brasileiro, jamais competiria externar a um representante estrangeiro orientações da política externa do país. As revelações do Wikileaks expuseram também um brasileiro subalterno, que funcionou como fonte de informação do governo americano. O protagonismo do Brasil no cenário internacional foi conquistado arduamente para ser ridicularizado por um político que parece se orientar pela famosa frase de Juracy Magalhães de que o que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil.
O presidente Lula peca ao minimizar os documentos secretos da diplomacia americana e colocar a palavra de Jobim contra a de Sobel sem a menor investigação. Se pretende evitar problemas no último mês de seu governo, ao menos poderia impedir o prosseguimento dos mesmos no mandato de sua sucessora.
Jobim sempre foi um bufão, ávido de poder, que prestou péssimos serviços ao país, atuando contra o Plano Nacional de Direitos Humanos e contribuindo para prejudicar a Operação Satiagraha ao denunciar em reunião da coordenação do governo a compra pela Abin de equipamentos de escutas telefônicas que poderiam ter grampeado o então presidente do STF Gilmar Mendes. A suposta escuta, que jamais foi comprovada, custou o afastamento do diretor-geral da agência de inteligência, Paulo Lacerda
Já os serviços prestados aos EUA foram reconhecidos pelo embaixador Sobel, que classificou o ministro da Defesa como “um dos mais confiáveis líderes no Brasil”. Confiável certamente para os EUA, mas não para o Brasil.
Mair Pena Neto
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