O fato político mais relevante desses últimos dias não foi a
revelação das propinas recebidas pelo interino e seu ministro das
relações exteriores. Apesar do desdém da mídia nativa - manipuladora e
venal -, o acontecimento mais importante, repleto de sentidos e
significados, ocorreu na abertura dos jogos olímpicos, na última
sexta-feira (05/08). Aos olhos do mundo, o golpe apareceu retumbante não
nas vaias ao interino, mas na absoluta ausência de chefes de estado e
de governo na cerimônia, no Maracanã (veja também aqui).
A disputa pela narrativa do golpe foi abafada violentamente no
país. A coalização golpista - envolvendo líderes políticos, o
Parlamento, a mídia, parte do empresariado, do judiciário e dos setores
retrógrados da classe média - tentou a todo o custo impedir que os
brasileiros percebessem o golpe à democracia, travestido no processo de
impedimento de Dilma Rousseff. Pesquisas de opinião já comprovavam, na
semana anterior, que o povo não engoliu o engodo. A rejeição ao governo
de plantão é colossal.
Mas a prova dos nove seria a recepção da comunidade internacional
ao governo interino. Apesar dos esforços do Itamaraty em relativizar a
possível ausência de líderes, muitos sinais externos já evidenciavam a
rejeição dos democratas de todos os países a Temer e seu gabinete.
Mas a reportagem do jornalista Jamil Chade do Estadão (aqui)
caiu como um torpedo na cabeça dos golpistas. O repórter, único a
adentrar na área reservada às autoridades internacionais, constatou a
derrota colossal, vergonhosa, estupenda do interino, seu chanceler e seu
governo. Somente 18 chefes de estado presentes. Alguns, como Hollande,
vieram para cumprir protocolo, porque a França tem interesse em sediar
os jogos olímpicos no futuro. Outros, porque são membros do Comitê
Olímpico Internacional. Os poucos presentes eram de países sem
relevância no concerto das Nações. A ausência dos líderes dos BRICS, por
exemplo, deixa claro o estrago que um golpe provoca nas relações
internacionais. Da América Latina, nossos vizinhos, somente o argentino
Macri, cujo governo retrógrado, conservador, autoritário e entreguista
comunga com a turma do governo de plantão no país.
E como se não bastasse tamanho desdém da comunidade internacional,
os poucos líderes presentes evitaram se encontrar com Temer. E mais:
para a humilhação final e apoteótica, como um tiro de misericórdia,
autoridades convidadas a ocuparem a área reservada ao presidente
interino recusaram a “honraria”. Segundo o jornalista que descreveu a
constrangedora cena, “o governo brasileiro tentou convidar os poucos
líderes a ficar no principal camarote, ao lado de Michel Temer,
presidente interino. Sem sucesso, o local foi preenchido por diversos
ministros do governo e autoridades municipais e do governo do
estado. Antes mesmo de terminar o evento e logo depois do desfile da
delegação da França, o presidente François Hollande deixou o Maracanã, à
francesa”.
Hollande saindo à francesa. Um tapa na cara seria menos dolorido...
A foto do interino na abertura, solitário e desconcertado, sendo
ladeado pelos amigos da empreitada golpista, mostrava o isolamento do
governante de plantão...
Esse acontecimento, ignorado pela emissora oficial do golpe e pela
mídia nativa e que só foi revelado pela reportagem do Estadão, por
incrível que pareça, não deixa nenhuma dúvida. Os democratas que estão
lutando em prol da democracia no país ganharam a narrativa acerca do
golpe. Independentemente do resultado da votação do impeachment pelo
Senado - o jogo jogado de políticos interesseiros que envergonham
qualquer Nação -, a posteridade saberá o que ocorreu neste país quando
uma turba tomou de assalto o poder, à revelia da deliberação popular.
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