18/08/2010 - 23:16 | Enviado por: Mauro Santayana
Por Mauro Santayana
O que fascina os historiadores, no exame do breve relâmpago que foi o sistema ateniense, é a descoberta, simultânea, e ali, das ideias da liberdade, da lógica, das artes e da justiça. A ação política, vista como exercício da ética, tinha como objetivo manter o Estado a serviço da sociedade, na construção do que se considerava ser o bem comum. As vicissitudes históricas destruíram a polis, a partir das derrotas militares, mas o fulgor do projeto permaneceu como inspiração recorrente da civilização ocidental. Os romanos foram os primeiros a assimilar alguns dos princípios estatais gregos (a legislação de Sólon). A elaboração do Direito Romano, ao longo dos séculos, e sua magnífica codificação no Digesto de Justiniano constituem o núcleo das ideias jurídicas modernas. Essas ideias tiveram que adaptar-se – sem prejuízo de seu sêmen ético – aos novos regimes de poder, a partir da razão elementar de que as sociedades fazem as leis.
Os políticos gregos e romanos eram, em sua maioria, homens de ideias e de ação. Em carta notável, dirigida a Einstein, Benedetto Croce lembra que a filosofia não basta para fazer estadistas, e dá o exemplo de Sócrates: antes de discutir os problemas do Estado e da política, o filósofo combateu em Potideia. Mas, se a política é ação, ou práxis, ela se desenvolve melhor quando está fundada nas ideias.
Em nossos dias contamos com Estados poderosos. Eles, ao contrário do que pregam os neoliberais, não minguaram nos últimos anos. A diferença é que o seu poder é exercido preferencialmente em favor do sistema capitalista de produção. Na ponta desse sistema sempre se encontram as empresas de produção bélica.
Para que essa indústria, tida como indutora tecnológica de todas as outras, continue a crescer – valha o óbvio – é preciso que haja guerras. Foram Krupp e outros produtores de armas que instigaram o Kaiser em 1914, antes de açularem Hitler, logo depois. A tecnologia moderna, argumentam alguns, possibilitou, entre outros avanços, o da medicina, que dobrou a expectativa de vida nas últimas gerações. Esquecem outros números que fizeram do século 20 o mais sangrento de toda a História. A ciência, com Fleming, criou a penicilina, que a guerra industrializou. A ciência, com Fermi e Einstein, entre outros, construiu a bomba atômica que assassinou centenas de milhares de civis em Nagasáki e Hiroshima, há 65 anos.
O Estado moderno tem sido eficaz, na construção de grandes obras de infraestrutura, na criação de universidades, no adestramento e manutenção de exércitos, no incentivo às pesquisas científicas. Mas, com todo o seu poder, não consegue salvar as crianças e adolescentes das drogas, nem criar condições para evitar que se transformem em vulgares agressores de seus próprios colegas, em espancadores (e assassinos) de seus pais e, ainda pior, quando se tornam pais, em matadores de seus filhos.
Os ecologistas falam em salvar o meio ambiente. Os desenvolvimentistas prometem acelerar a produção e a exportação de bens e serviços. Promete-se, da mesma forma, a segurança nas ruas e bons hospitais. Mas nada disso responde à angústia fundamental de nossa época. Mais do que salvar os animais silvestres, mais do que encontrar energia limpa e construir trens-balas, mais do que reformar estádios para a Copa, temos que salvar o homem, retornar à ética e à justiça, refundar as escolas, recuperar a ideia de pátria como ato solidário.
É esse o compromisso que está faltando aos candidatos nesta campanha eleitoral, tão pejada de números, tão escassa de ideias e sentimentos reais.
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