Uma crise profunda e uma guerra quase aberta entre mastodontes do liberalismo planetário como são Estados Unidos e União Europeia combinam-se em momentos nos quais os dirigentes da União Europeia analisam o projeto de reforma promovido por França e Alemanha com o objetivo de superar a crise. Nicolas Sarkozy e Angela Merkel tomaram o timão de um barco em plena tormenta. Isso lhes valeu o apelido de « Merkozy ». Ambos preconizam uma « nova união para a estabilidade e o crescimento para os 17 países do euro ». O artigo é de Eduardo Febbro.
Eduardo Febbro - Correspondente da Carta Maior em Paris
Uma crise profunda e uma guerra quase aberta entre mastodontes do liberalismo planetário como são Estados Unidos e União Europeia combinam-se em momentos nos quais os dirigentes da União Europeia analisam o projeto de reforma promovido por França e Alemanha com o objetivo de superar a crise.
Justamente quando vai começar uma cúpula em Bruxelas destinada a salvar a eurozona, a agência de classificação de risco norteamericana Standard and Poor’s coloca diretamente sob vigilância a União Europeia, um fato sem precedentes até hoje, sobretudo entre jogadores do ultra-neoliberalismo. Especialistas, banqueiros, analistas e dirigentes do Velho Continente olham a década através de um prisma de caos, ajustes e recessão onde todas as alternativas são tangíveis, sobretudo as piores : o fim do euro deixou de ser uma coisa impossível, assim como o surgimento de uma Europa a duas velocidades, composta, por um lado, pelos países rigorosos e competitivos do Norte e, por outro, pelos do sul.
Citado pelo jornal Le Monde, Jean Pisani-Ferry, uma analista belga do grupo de reflexão Bureguel, reconhecia que as projeções catastróificas semalhantes à crise norteamericana de 1929 « não podem ser afastadas com um tapa ». Desde que o presidente francês, Nicolas Sarkozy, e a chanceler alemã, Angela Merkel, se reuniram segunda-feira em Paris para defender um rigoroso plano de controle dos déficits, as más notícias despencaram como uma tempestade sobre o Velho Continente.
Os principais golpes não vêm de dentro, mas sim dos Estados Unidos, o outro grande eixo liberal. Em três movimentos, a agência de classificação de riscos norteamericana Standard and Poor’s sentenciou antecipadamente a eficácia das medidas que poderão ser adotadas na cúpula de Bruxelas.
No início da semana, a Standard and Poor’s colocou sob uma perspectiva negatuva as notas dos países da zona Euro e pôs sob vigilância 15 dos 17 países da dita zona, incluindo Alemanha, Franca, Áustria, Luxemburgo, Finlândia e Holanda.
No médio prazo, isso poderia se traduzir nos próximos meses por uma das sanções mais agudas : a perda da prestigiada nota AAA. Dois dias depois, a mesma agência sepultou o famoso fundo de resgate europeu criado especialmente para salvar da bancarrota os países da UE. A S&P anunciou que o fundo estava sob « supervisão negativa ».
O último ato aconteceu um dia antes da cúpula de Bruxelas : a agência estadunidense colocou sob vigilância a dívida da União Europeia (que desde 1976 tem a nota AAA) e extendeu sua sanção ao sistema banário.
A S&P adiantou ainda que previa baixar a nota de vários bancos importantes da zona euro, entre os quais os franceses BNP Paribas, BPCE, Société Générale, BRED-Banque Populaire, Crédit foncier de France, Crédit Lyonnais, Crédit Agricole, os alemães Deutsche Bank e Commerzbank e o italiano UniCredito. Durante um encontro realizado com deputados de sua base de apoio, Nicolas Sarkozy ofereceu uma síntese realista da situação.
O chefe do Estado francês não só disse que o « risco de uma explosão » é tangível, mas que, além disso, um dos maiores limites com os quais se choca a União Euopeia reside em que « a Europa precisa financiar sua dívida, mas os detentores dos empréstimos não tem confiança ». A eurozona é uma dama que perde seus encantos e está em pleno colapso.
Poucos episódios refletem melhor esse nervosismo como as reações provocadas pela visita do Secrtetário do Tesouro norte-americano, |Timothy Geithner. O ex-presidente francês Valery Giscard d’Estaing (1974 e 1981) qualificou-a de « inoportuna » e « insuportável ». O ex-presidente julgou inclusive que essa visita só contribuirá para que a Europa seja uma vítima entregue a todos os sacerdores mundiais ». Giscard também impugnou o papel desempenhado por agências de classificação de risco como a S&P. Em outros tempos essas agências eram aliadas do liberalismo europeu, mas agora não é o caso.
Os analistas se perguntam como se chegou a um desastre tão profundo. As respostas não são tão convergentes como o quadro que se pinta no caso de o euro desaparecer do mapa. Os especialistas já se adiantaram nos cálculos : inflação, fuga de capitais, deavalorização, instabilidade, etc., etc. Se as moedas nacionais voltassem a circular, os países do Sul teriam que desvalorizar suas moedas entre 30 e 40%, ao mesmo tempo que os cidadãos perderiam cerca de 40% de seu poder aquisitivo, sem que isso fosse uma garantia de estabilidade.
Jean Pisani-Ferry, autor do livro « O despertar dos demônios », lembra nas páginas do Le Monde o território de areias movediças que ameaça os países da Europa em caso de desaparição do euro e destaca o que acontecer na Argentina com a crise de 2001.O ensaista assinala que em janeiro de 2002 o dólar custava 1,4 pesos e que, seis meses mais tarde, a moeda perdeu três quartas partes de seu valor. Na Grã-Bretanha, onde o euro não circula, o portal de apostas online William Hill revelou que as apostas (três contra um) em torno do euro vão em uma única direção : sua desaparição.
Nicolas Sarkozy e Angela Merkel tomaram o timão de um barco em plena tormenta. Isso lhes valeu o apelido de « Merkozy ». Ambos preconizam uma « nova união para a estabilidade e o crescimento para os 17 países do euro ». Esse plano preconiza uma férrea austeridade orçamentária para absorver os déficits e castigo para quem não cumprir com ela. O voluntarismo oportunista do eixo franco-alemão não é analisado como uma salvação, mas sim como um tardio movimento dos setores políticos para ter influência na enlouquecida corrida de um sistema que se mutilou a si mesmo a força de excessos e impunidade.
Tradução: Katarina Peixoto
Justamente quando vai começar uma cúpula em Bruxelas destinada a salvar a eurozona, a agência de classificação de risco norteamericana Standard and Poor’s coloca diretamente sob vigilância a União Europeia, um fato sem precedentes até hoje, sobretudo entre jogadores do ultra-neoliberalismo. Especialistas, banqueiros, analistas e dirigentes do Velho Continente olham a década através de um prisma de caos, ajustes e recessão onde todas as alternativas são tangíveis, sobretudo as piores : o fim do euro deixou de ser uma coisa impossível, assim como o surgimento de uma Europa a duas velocidades, composta, por um lado, pelos países rigorosos e competitivos do Norte e, por outro, pelos do sul.
Citado pelo jornal Le Monde, Jean Pisani-Ferry, uma analista belga do grupo de reflexão Bureguel, reconhecia que as projeções catastróificas semalhantes à crise norteamericana de 1929 « não podem ser afastadas com um tapa ». Desde que o presidente francês, Nicolas Sarkozy, e a chanceler alemã, Angela Merkel, se reuniram segunda-feira em Paris para defender um rigoroso plano de controle dos déficits, as más notícias despencaram como uma tempestade sobre o Velho Continente.
Os principais golpes não vêm de dentro, mas sim dos Estados Unidos, o outro grande eixo liberal. Em três movimentos, a agência de classificação de riscos norteamericana Standard and Poor’s sentenciou antecipadamente a eficácia das medidas que poderão ser adotadas na cúpula de Bruxelas.
No início da semana, a Standard and Poor’s colocou sob uma perspectiva negatuva as notas dos países da zona Euro e pôs sob vigilância 15 dos 17 países da dita zona, incluindo Alemanha, Franca, Áustria, Luxemburgo, Finlândia e Holanda.
No médio prazo, isso poderia se traduzir nos próximos meses por uma das sanções mais agudas : a perda da prestigiada nota AAA. Dois dias depois, a mesma agência sepultou o famoso fundo de resgate europeu criado especialmente para salvar da bancarrota os países da UE. A S&P anunciou que o fundo estava sob « supervisão negativa ».
O último ato aconteceu um dia antes da cúpula de Bruxelas : a agência estadunidense colocou sob vigilância a dívida da União Europeia (que desde 1976 tem a nota AAA) e extendeu sua sanção ao sistema banário.
A S&P adiantou ainda que previa baixar a nota de vários bancos importantes da zona euro, entre os quais os franceses BNP Paribas, BPCE, Société Générale, BRED-Banque Populaire, Crédit foncier de France, Crédit Lyonnais, Crédit Agricole, os alemães Deutsche Bank e Commerzbank e o italiano UniCredito. Durante um encontro realizado com deputados de sua base de apoio, Nicolas Sarkozy ofereceu uma síntese realista da situação.
O chefe do Estado francês não só disse que o « risco de uma explosão » é tangível, mas que, além disso, um dos maiores limites com os quais se choca a União Euopeia reside em que « a Europa precisa financiar sua dívida, mas os detentores dos empréstimos não tem confiança ». A eurozona é uma dama que perde seus encantos e está em pleno colapso.
Poucos episódios refletem melhor esse nervosismo como as reações provocadas pela visita do Secrtetário do Tesouro norte-americano, |Timothy Geithner. O ex-presidente francês Valery Giscard d’Estaing (1974 e 1981) qualificou-a de « inoportuna » e « insuportável ». O ex-presidente julgou inclusive que essa visita só contribuirá para que a Europa seja uma vítima entregue a todos os sacerdores mundiais ». Giscard também impugnou o papel desempenhado por agências de classificação de risco como a S&P. Em outros tempos essas agências eram aliadas do liberalismo europeu, mas agora não é o caso.
Os analistas se perguntam como se chegou a um desastre tão profundo. As respostas não são tão convergentes como o quadro que se pinta no caso de o euro desaparecer do mapa. Os especialistas já se adiantaram nos cálculos : inflação, fuga de capitais, deavalorização, instabilidade, etc., etc. Se as moedas nacionais voltassem a circular, os países do Sul teriam que desvalorizar suas moedas entre 30 e 40%, ao mesmo tempo que os cidadãos perderiam cerca de 40% de seu poder aquisitivo, sem que isso fosse uma garantia de estabilidade.
Jean Pisani-Ferry, autor do livro « O despertar dos demônios », lembra nas páginas do Le Monde o território de areias movediças que ameaça os países da Europa em caso de desaparição do euro e destaca o que acontecer na Argentina com a crise de 2001.O ensaista assinala que em janeiro de 2002 o dólar custava 1,4 pesos e que, seis meses mais tarde, a moeda perdeu três quartas partes de seu valor. Na Grã-Bretanha, onde o euro não circula, o portal de apostas online William Hill revelou que as apostas (três contra um) em torno do euro vão em uma única direção : sua desaparição.
Nicolas Sarkozy e Angela Merkel tomaram o timão de um barco em plena tormenta. Isso lhes valeu o apelido de « Merkozy ». Ambos preconizam uma « nova união para a estabilidade e o crescimento para os 17 países do euro ». Esse plano preconiza uma férrea austeridade orçamentária para absorver os déficits e castigo para quem não cumprir com ela. O voluntarismo oportunista do eixo franco-alemão não é analisado como uma salvação, mas sim como um tardio movimento dos setores políticos para ter influência na enlouquecida corrida de um sistema que se mutilou a si mesmo a força de excessos e impunidade.
Tradução: Katarina Peixoto
Nenhum comentário:
Postar um comentário
comentários sujeitos a moderação.