Mente vazia, oficina do sistema da mídia golpista

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segunda-feira, 21 de novembro de 2011

ALVOS DE PRECISÃO EGÍPCIA



A praça Tahrir, no centro do Cairo, sugere uma dessas rotatórias inóspitas,como tantas outras, destinadas a ordenar o fluxo do trânsito nas grandes metrópoles  subdesenvolvidas,  pouco ou nada pensadas para o convívio humano. Mas desde fevereiro deste ano, quando foi palco  de 18 dias consecutivos  de protestos  gigantescos que derrubaram o ditador  amigo das potências,  Hosni  Mubarak,  a praça Tahrir  ingressou definitivamente no panteão dos símbolos libertários do nosso tempo. Na sua textura inóspita o povo egípcio plantou uma das mais vigorosas sementes da primavera política que sacode o norte africano e todo o Oriente Médio. Desde a última 6ª feira, a semeadura tem sido regada pelo sangue derramado em novos confrontos que, a partir de Tahrir, espalham-se por  todo o país com um saldo devastador nas últimas 72 horas: 33 mortos pela repressão do Exército; 1.500 feridos e a renúncia  do gabinete civil que desde a queda de Mubarak  ordena a transição democrática, subordinado à mão dura militar. A uma semana das eleições parlamentares, a sociedade egípcia está farta dessa tutela que pretende se sobrepor  à nova institucionalidade, esvaziando-a na prática, a exemplo do que os mercados financeiros fazem  com as democracias maduras de uma Europa em transe.  No Egito, o definhamento opera pelo canal do  adiamento das eleições presidenciais; na zona do euro, com a captura do Estado pela lógica financeiro, tornando ornamental a rotatividade do poder. A principal  singularidade egípcia  está na eficácia das grandes mobilizações de massa. Armadas de alvos claros,  cirúrgicos e avessos às tergiversações  conservadoras  --mas permeados de intensa capilaridade junto a organizações civis e partidos políticos, ao contrário do mito da 'revolução digital'-- ,  elas arremetem contra o despotismo de plantão com uma contundência pavorosa para os seus ocupantes. Foi  assim que Tahrir derrubou Mubarak em 11 de fevereiro, após 18 dias de protestos que custaram 300 mortos e cinco mil feridos. É assim que ela se volta agora contra o cabresto militar, unificando partidos e vozes em uma exigência clara, incontornável, de rápida aderência popular: fim da tutela --ou como se ouve em Tahrir, 'deixem-nos respirar; deixem-nos viver'. A  articulação e a objetividade das jornadas  nascidas na praça política mais eficaz do mundo  talvez tenham algo a ensinar aos indignados do resto do planeta, ainda carentes da mesma habilidade para traduzir  o descontentamento social em alvos progressivos, práticos, de precisão egípcia.   
(Carta Maior; 2ª feira; 21/11/ 2011)

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