Mente vazia, oficina do sistema da mídia golpista

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sexta-feira, 4 de julho de 2014

Mídia usa tragédia em BH para sua revanche na Copa

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Constrangida pelo sucesso do Mundial, reconhecido dentro e fora do Pais, oligopólio da mídia familiar no Brasil se escora no acidente de engenharia ocorrido ontem em Belo Horizonte para uma pequena vingança; na Folha, a queda de um viaduto se transformou em "Obra inacabada da Copa desaba e mata 1 em BH"; no Globo, "Viaduto de obra da Copa desaba e mata 2 em BH"; no Estado, "Viaduto planejado para Copa cai e mata 2"; nos três jornais, ênfase no fato de se tratar de uma obra do PAC, o Plano de Aceleração do Crescimento, que, embora federal, depende da execução de estados e municípios; no caso concreto, a responsabilidade pela execução da obra era da prefeitura de Belo Horizonte, governada por Marcio Lacerda, do PSB, que viu "falha de engenharia"

247 - Até aqui, a imprensa familiar brasileira vinha sofrendo a maior goleada da história das Copas. Depois de apostar no fiasco da Copa do Mundo de 2014 e usar seus colunistas para disseminar o pânico de um vexame internacional, o pequeno oligopólio da mídia no Brasil tentou marcar nesta sexta-feira, dia em que o Brasil decide contra a Colômbia uma vaga nas semifinais, um golzinho de honra. Nem que para isso tenha sido necessário explorar uma tragédia, ocorrida ontem em Belo Horizonte, onde um viaduto desabou e matou duas pessoas.

O lamentável acidente, decorrente de uma provável falha de engenharia da empreiteira Cowan, ganhou uma embalagem peculiar nos jornais brasileiros, com sabor de vingança. Na Folha, o fato se transformou na manchete "Obra inacabada da Copa desaba e mata 1 em BH". No Globo, "Viaduto de obra da Copa desaba e mata 2 em BH". No Estado, "Viaduto planejado para Copa cai e mata 2". Ou seja: depois da constatação de que os aeroportos funcionaram a contento e de que os estádios (que para determinado grupo de mídia ficariam prontos apenas em 2038) encantaram o mundo, caiu um viaduto. Era o que bastava para a execução da revanche.

Nos três três jornais, a ênfase foi dada ao fato de se tratar de uma obra do PAC, o Plano de Aceleração do Crescimento, que, embora federal, depende da execução de estados e municípios. No caso concreto, embora a obra tenha recebido financiamento de R$ 171,7 milhões do governo federal, a responsabilidade pela execução era da prefeitura de Belo Horizonte, governada por Marcio Lacerda, do PSB e aliado do PSDB na política mineira.

Na Folha, que foi o jornal que produziu a manchete mais milimétrica contra a Copa após o incidente, houve ainda espaço para um editorial, chamado "Humor de Copa", sobre o impacto do sucesso do Mundial na mais recente pesquisa Datafolha, onde a presidente Dilma foi de 34% a 38% das intenções de voto. Num dos trechos, comentou-se o incidente de ontem em Belo Horizonte.  "Verdade que, até quarta-feira, registravam-se somente incidentes operacionais de menor impacto; o mais grave deles havia sido a invasão de chilenos no Maracanã, fruto de uma falha de segurança. Nada comparável à queda de um viaduto em Belo Horizonte. O acidente, ocorrido ontem, resultou na morte de ao menos uma pessoa e deixou 22 feridos. A obra faz parte do pacote de melhorias de mobilidade urbana e não ficou pronta no prazo prometido. Não foi, felizmente, tragédia de maiores proporções. Serve para lembrar, ainda assim, o quanto houve de irresponsabilidade e improviso, para nada dizer de corrupção, na organização do Mundial. O primeiro jogo da Arena das Dunas, em Natal, deu-se sem a liberação dos bombeiros, por exemplo."
Com a queda do viaduto, a mídia familiar fez um golzinho e diminuiu a goleada que vem sofrendo. Há tempo para a virada?

Politicagem mórbida: viaduto de BH era da ‘obra da Copa’. E a viga do monotrilho que matou 1 em SP, não?

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Jornalismo não briga com fatos.

Mas também não noticia seletivamente fatos.
Há menos de um mês, caiu uma viga da obra do monotrilho da Linha 17 – Ouro do Metrô paulista, próxima ao Aeroporto de Congonhas, e matou uma pessoa.

O monotrilho, que fará a ligação entre o aeroporto de Congonhas e a rede de trens metropolitanos da capital paulista, era, como está noticiado em uma velha matéria do UOL, ” a única obra de responsabilidade do governo do Estado de São Paulo que consta na Matriz de Responsabilidades da Copa do Mundo”.
É preciso ver em textos antigos, porque, quando do acidente, isso não foi dito ou escrito pela mídia.

Ontem caiu o viaduto Guararapes, obra da prefeitura de Belo Horizonte igualmente parte da Matriz de responsabilidade, matando duas pessoas.

Duas tragédias dolorosas, que mataram seres humanos como eu ou você e que resultaram de erros técnicos incompatíveis com as boas práticas da engenharia, pois ambas estavam em construção, sem desgastes ou acidentes de origem externa.

Pelo que, é claro, ambas são notícia, e notícia importante.

A questão jornalística é: porque o viaduto era da Copa e isso é agitado nas manchetes e o monotrilho “não era da Copa” – uma vez que é igualmente parte das obras para as quais o Governo Federal deu recursos aos governos locais?

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Se a queda do viaduto mineiro é manchete, porque a viga paulista foi apenas um tímido registro nos jornais de São Paulo?

Nem no Estadão, que você vê lá em cima, nem na Folha, que reproduzo ao lado. A Folha, aliás, publica a reportagem do desastre no caderno de política.

Ambas mataram pessoas. E em número bem parecido: duas ontem, uma há um mês.

Mas uma é associada a Geraldo Alckmin, estrela do tucanato e peça-chave da eleição e a outra nem vai ser tanto a Márcio Lacerda, um burocrata insípido que – embora filiado ao PSB  de Eduardo Campos e cabo eleitoral declarado de Aécio Neves – é nacionalmente desconhecido.

Assim, o monotrilho é obra de Alckmin e o viaduto é “obra da Copa” e, claro, daquela senhora que é responsável por tudo o que acontece na Copa ou em suas obras.

Embora, em nenhum dos dois casos, nem mesmo se possa suspeitar de pressões indevidas para que as obras fossem feitas de forma acelerada e imprudente, porque não seriam mesmo utilizadas na Copa, como é óbvio.

Por isso, a politicagem dos jornais brasileiros, sempre asquerosa, adquire aqui tons de morbidez.
A responsabilidade pelos dois eventos é dos responsáveis pelo projeto e execução, das empresas construtoras e dos contratantes das obras, o Governo de São Paulo e a Prefeitura de Belo Horizonte, simples assim. Nas placas das obras, aliás, há os nomes dos responsáveis técnicos, que num caso ou em outro não foram sequer procurados.

E o pior, para a minha profissão, é que a imensa maioria dos jovens profissionais de imprensa, que “se acham”, nem sequer percebem o óbvio.

Obra de engenharia cai porque é mal projetada ou mal-feita. Ou mal fiscalizada.

Não porque é “da Copa”.

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