Praça Tahrir, Egito e a Primavera Árabe (11/2/2013) |
Quando ocorreram as
trágicas, (agora sabemos devido ao retrocesso e condenações à morte) jornadas
da primavera árabe, fui tomada por um senso de déjà vu, confesso.
Durante minha estada
na Europa, tive a oportunidade de conviver com vários ucranianos e outros
imigrantes, seja em instituições de ensino ou ajuda humanitária. Perguntados
sobre a vida em seu país, reportavam-me uma realidade dura e as novidades no
lado da União Europeia (UE) eram consideradas a certeza de uma vida
melhor.
Já em 2012, uma
pesquisa revelava que 80% dos imigrantes ucranianos eram mulheres
envolvidas em trabalho doméstico, um fenômeno recente se
comparado aos países da área.
As ucranianas que
conheci faziam tarefas como cidadãs de “segunda classe”, ilegais. Elas estavam
no centro da economia informal junto com polonesas e romenas, sejam como babás,
cuidadoras ou faxineiras e outros. Muitas delas possuíam curso superior e
estavam na maturidade dos seus 40 anos fazendo cursos extensivos e graduação.
Questionadas, os discursos eram sempre de mandar dinheiro para família ou
comprar um celular. Depois disso, voltar para o país de origem após algumas
temporadas de trabalho in nero
(ilegal).
Penso (conhecendo
bem) em como estas pessoas se decepcionaram com a não entrada da Ucrânia na União
Europeia (UE) quando esta acenou com “tamanha benevolência”. Ali, estava a
solução para anos de trabalho análogo a escravidão.
Dentro deste
contexto, fica claro parte dessas forças externas que atuaram na Ucrânia sem
uma visão mais amiúde de tudo que estaria em jogo.
Entretanto, devido
as circunstâncias atuais, parece que os cidadãos ucranianos estão descobrindo
que a União Europeia não é aquela que o marketing
e a idealização inicial “contou”. Dados recentes comprovam a mudança
inevitável:
TAXA DE DESEMPREGO
MENORES DE 25 ANOS
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Alemanha - 7,8%
|
Espanha - 54%
|
Eurozona - 23,3%
|
França - 22,5%
|
Grécia 57,7%
|
Itália - 43%
|
Portugal - 34,8%
|
Essa é a realidade
da UE de hoje.
Os dados acima,
tornam muito compreensível que o governo ucraniano, à época inicial dos eventos,
fizesse a escolha pela estabilidade russa descartando a entrada na União
Europeia.
Trata-se de
objetividade e realismo diante de um novo contexto. Se agrava também uma
espécie de conjunção profana no encontro da esquerda e direita radicais em
diversos eventos da atualidade, festejadas inclusive na arte geral. Obras
digitais, a exemplo de recente exposição em Viena, reunindo várias delas sob o
título de “EU
SOU UMA GOTA NO OCEANO” [I
Am a Drop in the Ocean - vídeo] e cinema, além de outras não
diretamente ligadas a Ucrânia.
"Eu sou uma Gota no Oceano" |
Esse fato tem,
enfim, despertado a atenção de muitos para a propagação de um determinado
conceito. Dito isso, volto a uma afirmação vista em alguns jornais: a parte
ocidental da Ucrânia é mais propensa a receber influências externas, além de
ter menor média etária.
Os jovens são mais
propensos a esse contato midiático. Talvez sejam, mas de um fascínio fugaz e
pouco analítico. Os jovens vivem um desejo por realizações pessoais e
embevecidos por fazer história. No entanto, o enredo se assemelha as
telenovelas na sua produção, visto que os atores muitas vezes não sabem o que o
autor lhes reserva, utilizando-os ao sabor da audiência e interesses
momentâneos dos anunciantes.
Tal fato pode ser
comparado à formação observada na Ucrânia, em um estado que se aproxima cada
vez mais de ser um grande conglomerado financeiro sem regras claras para a
população e instituições democráticas. Devido a isso, o país enfrenta uma longa
crise onde surge a necessidade, e pré-acordada na transição, de mais
empréstimos para pagar dívidas já “insolventes”, deixando de se investir no
país.
Dentro deste
contexto, agentes externos aliam-se com antigas e escabrosas forças políticas
ucranianas como os partidos fascistas (Svoboda e Setor Direita).
Os agentes externos
aliados e esses partidos “exigem” que Estado Russo pague a conta, passivamente,
dos acordos desfeitos. Mas isto não vai acontecer. Agora, não há mais espaço
para opiniões ou dissidências entre todos os desiguais envolvidos, imersos num
mesmo poço inesperado.
Karl Popper |
Mergulhados em uma
crise mortal e vida barbaresca, a Ucrânia sedimenta um modus operandi percebido já no Egito, na Líbia, etc. (salvo
particularidades culturais, óbvio). Aos poucos, vai tomando corpo a teoria que
muitos desconhecem e insistem em repetir mundo afora, sem perceber que sufocará
o direito a manifestação e escolha chamados por muitos de democracia.
Um fator importante
nos últimos acontecimentos dessa novela, que tem sido escrita em várias partes
do planeta, é um filosofo nascido em 1902 em meio a efervescência cientifica do
período, Karl Popper.
Para ele uma teoria
só é considerada cientifica se puder ser contestada. Popper talvez não seja tão
conhecido nestas sociedades, mas teve como seu discípulo o magnata George Soros. Este,
junto a outros agentes mais ou menos conhecidos, leva às últimas consequências
(como sociopatas, digamos) os conceitos de Popper na vida das massas.
A teoria só é
cientifica se possibilita a contestação exitosa ou não. Mas como isso se aplica
na Ucrânia? A resposta é Open Society Fondations
(OSF).
Henri Bergson |
Nome originário de
um conceito do filósofo francês, estudioso da memória, o que é imensamente
relevante para nosso argumento já que a memória é uma construção mental e sofre
diversas influências nessa construção, entre outras, de Henri Bergson.
A primeira fase da
OSF foi como organização criada para fazer a transição comunista para um
sistema de capital. A Open Society
tem muitos serviços prestados com esse fim, ela pertence a Soros, “muito
entusiasta dos movimentos sociais” e com muitos tentáculos em países no Oriente
Médio, África e emergentes. Ao todo 60 países no mundo. Soros é também um hábil
homem de negócios. Soros, tem textos onde exorta jovens ucranianos. Por volta
de 07 abril de 1914 George Soros escreveu: Mantenha
o Espírito do Maidan Vivo (em inglês) direcionado aos jovens da Ucrânia
conclamando pessoalmente os ucranianos a contestar.
George Soros, aproveita
essa sede de contestação natural que é parte da busca da identidade, inerente
ao jovem e na ideia dessa “Sociedade Aberta” (Open Society) um conceito social
de Karl Popper, seu mentor, onde a “resistência” é o contraditório de sua vida
e ações ao discurso que faz; é maleável em diversos momentos.
Investe em várias
ações para alcançar seus objetivos. Se vale de diferentes abordagens, métodos,
paradigmas e muitos formadores de opinião sempre “uns jovens contestadores”,
“repetidores independentes”, ligados a sua obra.
Não à toa o nome
dado a esse organismo criado por Soros teve em suas duas edições, mudando o
nome, mas mantendo sempre a “Open Society”:
é o conceito do mestre Popper, que definiu assim a sociedade aberta:
Um lugar em que os indivíduos são confrontados com decisões pessoais.
Distanciando por
fim das escolhas tradicionais e coletivas do tribal, o que seria uma evolução
natural, segundo ele.
Voltando a Bergson,
o estudioso da memória, podemos encontrar a conclusão que definem as ações de
cidadãos ucranianos (ou não pelo mundo das manifestações) simples, jovens e
criando sociedades convulsionadas pelos agentes da tese de Popper que se
regozija no túmulo.
O capitalismo
sempre se utilizou dessas maquinações e do desconhecimento de propagação de
conceitos. Soros parece negar Popper para um leitor menos atento, mas muito
pelo contrário, o utiliza para um mais perspicaz observador de forma sistemática
e coerente.
Quando se vir o
filósofo, porém, não o identificará com sociedade aberta democrática ou
capitalismo laissez-faire, mas sim
com um “quadro crítico de espírito por parte do indivíduo” (nem esquerda, nem
direita o que eu quero é “liberdade”?).
Ucrânia e a Praça Maidan em Kiev |
Os manifestantes
agem de acordo a interesses comuns, em um grupo de qualquer
espécie ao utilizar um discurso de sociedade que se rebela, de forma criticar,
e despreza o conceito de esquerda ou direita para aderir a só sua
individualidade, e mistura diferentes ideologias. Cria-se então, uma pasta
humana que serve aos aliciadores e multiplicadores de organizações como a OSF,
mas não ao público.
George Soros |
É uma mudança rumo
ao desconhecido. Aplicado tão bem por Soros quando “reconhece a força emocional
de continuar”, do que o filósofo chamou de “espírito de grupo perdido do
tribalismo”, tal como se manifesta por fim, por exemplo, nos totalitarismos do
século passado.
Isso que, na
prática, foi a aposta no Egito e está se dando na Ucrânia, por exemplo.
Para aqueles sem
nenhuma consciência de como seus anseios pessoais são usados em benefício de
algumas experiências de negócios lucrativas, e de sobrevida do sistema, abrindo
novos parceiros em nações que serão mais dependentes, gerar mais empréstimos e
menos cooperação com parceiros próximos geográfica e culturalmente.
O sucateamento da
memória de um povo é condição sem a qual, ao se crer independente e em novos
movimentos “supostamente” sem lideres, sem partidos e sem fins objetivos, se repetem
em alguns eventos.
Para articuladores
financistas ainda é prazeroso poder olhar as teorias apreendidas na juventude
sendo provadas (implementadas) arriscar em meio aos momentos de lazer com as
massas, entre os negócios, a Sociedade Aberta e o seu teste sendo aplicado como
teoria social em constante aperfeiçoamento ao sabor do contexto em que se
aplica.
O discípulo nega e
se mostra critico, mas está aplicando perfeitamente seu mestre que se sentiria
homenageado.
PS: Quando criança
pensava e dizia à minha mãe que tudo que repetimos massivamente já foi pensado
e disposto por algum professor em uma universidade pelo mundo.
Camille Helena Claudel
[*] Camille
Helena Claudel
é uma pesquisadora, historiadora e licenciada. Nascida no Brasil, estudou na
Itália, Espanha e Alemanha onde trabalhou com projetos sociais e culturais. Tem
diversos cursos na Itália e Brasil, além de artigos publicados em revistas
voltadas a história e também de cultura italiana e brasileira. Colabora
atualmente com o Jornal Rebate, redecastorphoto e sites no exterior como o
Jornalistas Sem Fronteiras e Informare
per Resistere. Foi militante contra a ditadura pelas diretas e movimentos
dos estudantes secundaristas. Atuou nos movimentos sociais de ajuda e
reabilitação de crianças de rua, imigrantes e também a pastoral carcerária, na
Alemanha.
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