Confesso: ontem vibrei quando
ecoaram as vaias ao interino, durante os 10 segundos de sua aguardada
alocução na abertura das Olimpíadas.
É sempre prazeroso ouvir uma
retumbante desaprovação pública a um político que não tem nenhum apreço à
democracia, nem respeito ao eleitor e suas escolhas.
Mas, não nos enganemos. Ontem, no
Maracanã, o público que vaiou Temer é do mesmo perfil socioeconômico e
demográfico daquele que há algum tempo vaiou e vomitou impropérios
contra a presidenta legítima e constitucional, Dilma Rousseff. Naquela
ocasião, as vaias e os xingamentos de um banco de imbecis e covardes
escancaram para o mundo que os segmentos abastados e de classe média
conservadora no Brasil não respeitam a democracia, os representantes
legitimamente eleitos e, no caso, não escondiam o nível de misoginia,
preconceito, ódio e deseducação dessa parte de endinheirados e
escolarizados. Dilma comportou-se estoicamente. Temer, ontem, postou-se
como os machões da política nacional que, quando - muito raramente -
são pegos com as calças curtas, agem como ovelhinhas e pedem arrego no
colo da mamãe...
Portanto, as vaias de ontem não
expressam a desaprovação do público ao presidente golpista, suas
práticas, seu grupo, seu governo. Demonstram que segmentos majoritários
de nossas elites econômicas, sociais, políticas, religiosas, culturais
não têm nenhum apreço à democracia; criminalizam a política; não têm
pudor em afrontarem as autoridades constituídas, principalmente quando
seus interesses de classe são contrariados. Enfim, são segmentos
poderosos que não estão comprometidas com governos que atuem em
benefício público, social e coletivo.
Muito provavelmente, o que ocorreu ontem pode ser explicado a partir dos conceitos de comportamento coletivo, portanto espontâneos e pontuais, e/ou ações coletivas,
que congregam interesses comuns (no caso, o desdém à política e à
democracia), derivando na vaia apoteótica. Mas, certamente, não há
motivação política na base do protesto - que cumpriu papel importante ao
publicizar para o mundo o golpe em curso no país.
Não pensemos que será dos brancos,
endinheirados, da zona sul carioca e dos turistas visitantes que
superaremos o golpe e suas consequências à democracia brasileira.
Se a vaia a Temer aplacou um pouco
nossa ira coletiva em relação ao interino, e desopilou nosso fígado,
não nos deixemos iludir pela ocasião. A festa foi bonita; os brasileiros
não precisam ter complexo de vira-latas, mas o fato político mais
importante da abertura da Olimpíadas foi o descomunal desprezo da
comunidade internacional ao governante de plantão. As inúmeras cadeiras
reservadas às autoridades vazias; a pouca significância das autoridades
presentes no evento e o desdém generalizado ao interino amedrontado
mostraram que o mundo já rejeitou o golpe. Agora, só falta o Brasil...
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