Mente vazia, oficina do sistema da mídia golpista

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segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

A frigideira venezuelana

O que se pretende fritar na Venezuela é mais que o chavismo; a crise testa os novos apetrechos do extremismo conservador na região.

por: Saul Leblon 

Arquivo











A Venezuela é a frigideira geopolítica da América Latina nesse momento.

Inútil trata-la à distância, com pinças e luvas cirúrgicas.

O que se pretende fritar ali é mais que o chavismo.

Peixes graúdos que se cuidem: se a extrema-direita vencer, o óleo fervente vai se derramar abaixo do Equador.

O que está em jogo não é só o petróleo  –embora incomode que as maiores reservas de óleo pesado do planeta estejam sob a guarda de um socialismo difuso,  e não de carmonas, capriles e leopoldos  de fácil trato.

Incomoda, sobretudo, os limites ultrapassados.

Os interditos rompidos.

As grandes questões do poder de classe recolocadas na mesa da luta política.

Incomoda o chavismo ter ‘sujado’ de novo a agenda econômica regional ao escancarar a dimensão política da luta pelo comando do desenvolvimento. 

Chávez e o chavismo esticaram  a tal ponto as cordas da história que devolveram pertinência e atualidade a referências e bandeiras que se imaginava silenciadas e calcificadas para sempre.

As trancas rompidas incomodam  setores da própria esquerda moderada.

Súbito, ei-los convocados a amarrar essa nau à deriva em algum pontão do futuro que ninguém mais ousava dizer que ainda existia  –e que talvez precise de fato ser reinventado.

É por esse efeito contagioso que a aventura precisa ser exemplada como um desastre irremediável -- coisa da qual a mídia internacional se desincumbe diuturnamente,  há anos.

Agora com redobrado empenho.

Se alguém nutre dúvidas quanto a ferocidade desse cerco, acesse o site em português do jornal El País.

Um dos principais veículos do mundo, a página do diário espanhol, em versão local, traz cinco manchetes sobre a Venezuela.
O conjunto compõe uma narrativa que o líder da extrema direita, Leopoldo Lopez, distribuiria com naturalidade pelas ruas de Caracas.

Da mídia brasileira não é preciso dizer mais nada.

Seria preferível que a Venezuela fosse mais devagar?

Tanto quanto teria sido melhor que a primeira revolução socialista ocorresse na Alemanha, ou nos EUA. Não na Rússia czarista e feudal, não em Cuba desprovida de tudo e tão perto do inferno.

 Mas não é assim que a história caminha.

Tempos históricos embaralhados na confusa fronteira entre populismo, nacionalismo, socialismo, miséria extremada e opulência oligárquica, urgências, voluntarismo e desassombro se entrecruzaram na Venezuela nas últimas décadas  conduzindo as coisas até esse desemboque.

Muitos gostariam de circunscrever o coquetel agridoce dando-lhe o subtítulo  de um ponto fora da curva no cardápio da moderação regional.

Mas o  que  se vive em Caracas não configura uma experiência particular.

Rupturas de ciclo histórico frequentam os elos mais frágeis  e extremados da corrente.

O destino das experiências progressistas em todo o continente está entrelaçado ao enredo venezuelano e seria oportuno aprender com a travessia em curso.

A lição que avulta no primeiro plano sugere que um pedaço do conservadorismo  –personificado lá em Leopoldo López--  concluiu que a via eleitoral ficou estreita demais, depois de tantas  derrotas presidenciais.

Quem enxerga as interações em curso não titubeia na conclusão: as forças progressistas devem reforçar os alicerces do muro anti-golpista  em toda América Latina.

Outros Leopoldos López virão.

A integração latino-americana agiganta-se em importância como vigia e fiador da transição para uma democracia social efetiva.

A cabeça de ponte em gestação nas ruas de Caracas não pode ser subestimada: hesitar diante dela significa endossar uma interdição histórica.

Ela tornará ornamental a bandeira da construção de um Estado social na região.
  
Se a escolha não for pela resignação é preciso dar consequências a ela.

O cinturão de legalidade em torno de Maduro precisa ser fortalecido com gestos, recursos e a presença física de chefes de Estado da Unasul e Mercosul em Caracas.

É urgente materializar um contraponto claro às turbinas que impulsionam o golpismo.

Lula tem liderança e prestígio regional para liderar esse mutirão.

Há mais a fazer, porém.

Ao transbordar de forma beligerante para as ruas,  a disputa pelo poder na Venezuela iluminou a necessidade de um aparato popular  –inexistente na maioria dos países-- para defender os avanços e conquistas acossados pela radicalização conservadora.

Insista-se, não se trata de um problema apenas do chavismo.

Mas de uma região inteira traumatizada pelas refregas colhidas ao longo de diferentes tentativas de transitar para uma sociedade mais justa.

Inclua-se nessa lista o fracasso emblemático da  guerrilha de Che Guevara, morto em outubro de 1967, na Bolívia.

Mas, sobretudo, o massacre da via democrática para o socialismo de Salvador Allende , no Chile de 1973.

Em 11 de setembro, o então chefe das Forças Armadas, general Augusto Pinochet, eviscerou a esperança em uma transição socialista, cuja principal âncora era a ilusão no profissionalismo de um aparato militar  obedientes às urnas.

Desde então o socialismo passou a figurar no discurso progressista  como a margem de um rio desprovida de pontes e embarcações de acesso.

Aos sangrentos reveses dos anos 60/70, seguiu-se um ciclo de regressividade neoliberal.

A tensão venezuelana  veio sacodir essa prostração histórica, prestes a completar 40 anos.

Depois de Allende, nenhuma outra experiência de governo popular levou tão a sério o desafio de dilatar as fronteiras da democracia social quando a revolução bolivariana.

Não que o tenha concluído.

 Longe disso.

Há lacunas imensas no chavismo; algumas que assustam.

A fragilidade de sua pata econômica, incapaz de internalizar a receita petroleira em dinâmicas endógenas de crescimento, emprego e renda, é uma delas.

Outra:  a inexistência de um partido enraizado, capaz de comandar a revolução na ausência de Chávez,  morto em março de 2013.

O cerco asfixiante da  mídia, porém,  também oculta  avanços  notáveis, que ajudam a entender como esse besouro político ainda voa, 15 anos depois das duras provas do poder.

 Ignacio Ramonet mediu as asas do versátil coleóptero chavista:  42% do Orçamento do Estado vão para investimentos sociais;  5 milhões de pessoas foram retiradas da pobreza, a mortalidade infantil caiu drasticamente; o analfabetismo foi erradicado; quintuplicou o número de professores nas escolas públicas (de 65 mil a 350 mil); Chávez criou 11 novas universidades; concedeu aposentadorias a todos os trabalhadores, etc.

Que um movimento de extrema direita  tenha empalmado a classe média e conseguido traze-la  às ruas contra isso diz o bastante  da concepção de sociedade que  hoje se reclama como ‘democrática’ nas ruas de Caracas.

O que está em curso na Venezuela alerta os governos progressistas para os estreitos  limites da tolerância conservadora na região.

Para afrontá-los  é crucial saber onde se pretende chegar e como providenciar as condições para isso.

Muitos acham que essa é uma ‘não-questão’; que tudo se resolve no piloto automático do economicismo, com avanços incrementais que se propagam mecanicamente na correlação de forças na sociedade.

A esses, o economista Márcio Pochaman, em recente entrevista à CUT, endereçou uma pergunta essencial nesses dias em que as barricadas abrigam seguidores de Yulia Timoshenko, em Kiev, e as de Caracas são ocupadas  pelos mascarados de Leopoldo Lopez:

“Criamos 17 milhões de empregos desde 2003; um milhão de jovens ingressaram na universidade graças ao Prouni e 1,5 milhão de famílias ascenderam ao Minha Casa, Minha Vida Qual foi o saldo organizativo de  tudo isso?”, indaga  Pochman.

É como se dissesse: a frigideira está fervendo na Venezuela; qual a nossa capacidade de resistir à fritura e avançar de agora em diante? 

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Onde mora o Leopoldo López nativo

Para escapar das agências de risco, governo corta crescimento e aumenta economia para pagar juros: menos R$ 44 bilhões em investimentos

Maduro faz gesto de conciliação: convida oposição a um diálogo nacional; liberta 90% dos estudantes presos e demite chefe do serviço de espionagem por descumprir ordens de moderação diante dos protestos

Doações ultrapassam 80% da multa aplicada a Dirceu

PSDB faz gato e sapato da justiça: partido tira Azeredo da cena para abafar o mensalão tucano e blindar Aécio em ano eleitoral; Gilmar e Barbosa vão se manifestar?



A mudança de ciclo na economia mundial enseja o aparecimento desses %u218heróis do ultimato%u219 ao estreitar o espaço de manobra progressista da América Latina.

por: Saul Leblon 



A oito meses da eleição de outubro, a  Presidenta Dilma tem a aprovação de 55% dos brasileiros, diz a pesquisa da CNT divulgada nesta 3ª feira.

O dado ficou três pontos abaixo dos 58% registrados na enquete anterior  - festeja a emissão conservadora.

É fato. Mas em 2006, com a mesma contagem regressiva no calendário, o então Presidente Lula tinha uma taxa de aprovação menor: 53% de aprovação. A de Fernando Henrique Cardoso, em fevereiro de 2002,  patinava em 40,5% .

O endosso ao desempenho da Presidenta, portanto,  sugere que a população sabe diferenciar a diretriz mais geral, das oscilações conjunturais e setoriais que fizeram com que o índice de ótimo e bom do seu governo ficasse em 36,4% (39% na última avaliação), saltando para mais de 74% quando à percepção positiva se agrega o sentimento dos que percebem a gestão como ‘regular’.

O diagnóstico favorável encontra lastro na pesquisa de intenção de votos da CNT: com 43,7% , Dilma teria sua eleição garantida no 1º turno, contra qualquer adversário, caso o pleito fosse hoje.

O pleito é em outubro e os 43,7% ficam sugestivamente numa faixa intermediária entre o seu potencial de crescimento (até os 55% da avaliação pessoal) e os 36,4% do endosso mais assertivo ao conjunto do governo.

Ademais  do intervalo de oito meses há uma Copa do mundo no meio do caminho.

Oitenta e cinco por centro dos brasileiros acreditam que ocorrerão manifestações durante o evento --cujos gastos, pouco explicados pela comunicação institucional,  tem a reprovação da maioria.

A unanimidade negativa nesse aspecto é  pontual, insuficiente para criar uma sentimento de oposição ao governo, o que é corroborado por outra sugestiva maioria: 82% dos brasileiros não pretendem participar das eventuais mobilizações de protesto.

O que aparenta um paradoxo insere-se numa expectativa de continuidade com avanços.

A vasta maioria dos eleitores espera, como é natural, que um próximo governo incorpore mudanças no comando do país. Mas apenas 37% desejam uma guinada radical, o que supostamente validaria um outro projeto sob um novo comando político.

Em resumo, o conservadorismo, qualquer que seja a sua tonalidade, necessita de algo mais para produzir aquilo que seus partidos, togas, o dispositivo midiático, o rentismo e a energia auxiliar de mascarados --que a exemplo do general da ditadura querem que o país exploda--  não foram capazes de providenciar até agora: o descrédito em um projeto negociado de construção da democracia social no Brasil.

Erra, no entanto, quem atribuir a tarefa da reeleição ao piloto automático da inércia publicitária.

Quando a democracia desautoriza suas demandas, o conservadorismo não desiste.

As distâncias e contextos são apreciáveis, mas o que se assiste na Venezuela nesse momento é pedagógico do quão elástico é  o apego liberal à democracia quando ela o desfavorece.

O bolivarianismo por certo acumula erros e limitações sabidos.

Sem a liderança carismática de Chávez as inconsistências encontraram um catalizador na inexperiência de um Maduro desprovido de tempo, recursos e tolerância para empreender retificações inadiáveis.

Entre elas, um ajuste cambial em processo (lá como cá, na Argentina e no resto da AL).

Ele adiciona nitroglicerina inflacionária a uma inquietação social extremada pelo golpismo, que tem em Leopoldo López sua expressão caricatural: o ex-prefeito de Chacao,  foi um dos operadores de rua do fracassado golpe contra Chávez, em 2002.

Um democrata.

O fato é que a mudança de ciclo na economia mundial enseja o aparecimento desses ‘heróis das ruas’, na medida em que estreitou o espaço de manobra dos governos progressistas da América Latina.

Seja na Venezuela, na Argentina e mesmo no Brasil esse é o elemento novo com que contam as oposições para pavimentar uma volta ao poder até agora desprovida de chão firme no embate com os projetos e resultados em andamento.

O ajuste internacional  embalado pela cambaleante recuperação econômica nos países ricos sacode esse equilíbrio em três frentes simultaneamente: o custo de financiamento externo dos países em desenvolvimento tende a crescer com o ensaio de retorno dos capitais aos EUA e Europa; a confortável valorização das moedas locais --mantida assim como recurso de acomodação dos conflitos sociais via importações baratas—tornou-se inviável sob risco de colapsar exportações e esfarelar contas externas já pressionadas pelo menor ingresso de capitais; os preços das commodities cujo fastígio contribuiu para lubrificar a expansão do emprego, projetos sociais, crédito e consumo, refluem sob o duplo torniquete da alta dos juros e da menor demanda chinesa.

Ademais de frear a mobilidade social , as medidas de reacomodação requeridas pressionam a inflação e desafiam a capacidade do setor público de realizar  os investimentos cobrados pela expansão da demanda popular.

Não é um processo linear, nem atinge todos os países em desenvolvimento de maneira uniforme.

‘Os vulneráveis’, como gosta de proclamar o ressentimento conservador ao nivelar Brasil e Turquia, por exemplo, são tão idênticos quanto um tuiuiú e um tico-tico.

Mas as transições de ciclo de desenvolvimento nunca foram  feitas à frio, nem a salvo de um acirramento político dos conflitos de interesse.

O que o conservadorismo busca no Brasil é antecipar os sacolejos desse processo para com ele animar uma aspiração eleitoral até agora desautorizada, como mostram os números da CNT.

Longe de dispor do combustível à mão disponível na Venezuela ou mesmo na Argentina  –juntos os dois países tem reservas cambiais pouco superiores a 15% dos quase US$ 400 bi do Brasil--  o tudo ou nada local  aposta no poder ‘premonitório’ dos mercados para se viabilizar.

Os mercados dispõem de distintos mecanismos para precificar imediatamente, no presente, as especulações de dificuldades futuras que eles próprios cogitam, ou são por eles magnificadas.
O martelete incansável do dispositivo midiático é um deles e a guerra de expectativas está nas manchetes: elas gritam onde eles querem chegar e para onde pretendem arrastar o país

Agências de risco são outra coleira poderosa dessa engrenagem destinada a adestrar governos e submeter as nações à supremacia de uma lógica que une interesses  do rentismo local e internacional.

Uma espécie de cães farejadores dessas massas de capital fictício, elas latem alertando para eventuais perigos mais adiante e com isso promovem as fugas em massa de fundos investidores.

Mesmo erradas no diagnóstico, como agora ao nivelarem o Brasil aos ‘vulneráveis’,  acabam produzindo os desdobramentos de seu vaticínio equivocado.
São quase autossuficientes na sua dupla ação.

Não se trata, ademais, de um poder equacionável exclusivamente na esfera econômica e financeira, exceto se atendido integralmente em seus desígnios, em colisão frontal com as urgências nacionais.

Alguns números liberados pela Associação Internacional de Fundos de Investimento (citados entre outros pelo jornal El País) resumem o poder de coação subjacente a essa engrenagem.

No final de 2013, o patrimônio administrado pelos fundos de investimento e os fundos de pensões equivalia a 75,5% do PIB mundial; hoje, essas trincheiras da lógica especulativa detém 31% mais dinheiro do que antes da crise de 2007; tem bala  suficiente para comprar todas as empresas do planeta cotadas em bolsa –ou para destruí-las com ordens de vendas maciças.

O mesmo duplo efeito se aplica aos títulos públicos detidos por essas máquinas de reproduzir o capital fictício.

As agências de risco são os cães de guarda dessa usinagem financeira.

Seria um suicídio anunciado desafiar o conjunto sem dispor de um contraponto  à  previsível fuga de capitais  –um fundo emergencial  compatível só teria viabilidade no âmbito dos BRICs, com participação ativa das reserva chineses; o que existe hoje é um ensaio disso e reúne apenas US$ 100 bi.

O caminho que resta entre a rendição incondicional cobrada pelo conservadorismo e o voluntarismo  irresponsável é a construção de um poder político dotado de força e consentimento social para resistir , ganhar tempo e promover uma transição negociada em direção a um novo ciclo de desenvolvimento.

Trata-se de estender urgências e ajustes no tempo; suavizar os custos da transição e não  abdicar dos objetivos maiores em jogo: a construção da democracia social no país.

Enfim, tudo o que não cabe no ultimatismo inflamável dos black blocs de máscara ou de gravata de seda.

Não há no horizonte brasileiro um Leopoldo López pronto. Mas conservadorismo tenta substituí-lo pelo ultimato das agencias de risco. E as divisões autodestrutivas da esquerda podem lubrificar a montagem de um similar nacional.