Volumes tsunâmicos de capitais continuam a ingressar na economia brasilera por todos os poros. O governo dificultou alguns, outros se abriram. Nesta 5º feira, o governo anunciou um IOF de 25% --antes era de 6%-- sobre operações com derivativos que reúnem apostas especulativas sobre a cotação futura do dólar. É uma tentativa indireta de conter um atalho encontrado pelo mercado para contornar as medidas disciplinadoras tomadas anteriormente nessa área. Um desses atalhos é o crédito intercompanhias. Fluxos enviados das matrizes para filiais brasileiras --mas também de filiais brasileiras para o departamento financeiro da sede -- inundam o mercado e derretem a cotação do dólar, que recuiu ao nível mais baixo em 12 anos na terça-feira. A operação intercompanhias ajuda a maquiar em investimento as operações de carry trade. Ou seja, o ingresso de recurso tomado lá fora a juro zero para engorda rápida no pasto rentista mais nutritivo do mundo, a juro de 6,8% reais ao ano. A avalanche impulsiona as importações com dois efeitos contraditórios: arrefece a inflação com o ingresso de mercadoria barata na economia, mas transfere emprego e produção para o exterior. É um corner estratégico para o qual não existe resposta estritamente econômica. No fundo trata-se de uma escolha sobre a sociedade que se quer construir no Brasil. Esta semana, o empresário Jorge Gerdau, de cujas convicções conservadoras não se deve duvidar, defendeu abertamente a adoção de limites de ingresso ao capital externo. Há 15 dias, metalúrgicos do ABC fizeram uma greve inédita cuja palavra de ordem era: contra a desindustrialização. Leia-se, contra o desemprego. Alguns economistas de esquerda mostram-se céticos. Acham que o país perdeu o timming para agir na medida em que permitiu uma valorização cambial tão grande. Reverter a roda agora trará custos e riscos -- inflacionários, por exemplo-- proporcionais ao exagero registrado em sentido contrário. Cabe à política, portanto, encontrar os contrapesos de que se ressente a lógica econômica estrita.No vácuo, o rentismo dará as cartas. Uma opção seria uma ofensiva propositiva de sindicatos e empresários sobre o passo seguinte do desenvolvimento brasileiro. O desequilíbrio cambial reflete um desarranjo mais amplo dos preços básicos da economia --entre os quais a taxa de juros se sobressai como um aspirador que suga recursos ao rentismo, em detrimento de outras prioridades. Reordenar essa equação requer uma negociação política mais ampla. O antídoto ao rebote da inflação, por exemplo --ameaça embutida no caso de um controle cambial que encareça subitamente as importações-- está na repactuação das bases do crescimento. Na equação ortodoxa não tem saída: é desindustrialização ou inflação.
(Carta Maior; 3º feira, 26/07/ 2011)
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