
A candidata do PSB, Marina Silva, se apresenta como a representante da “nova política”.
A
política não seria feita de acordos e disputas entre partidos políticos
e grupos na sociedade, mas de uma reunião das pessoas “de bem”. Quem
define quem faz parte da “nova política” é a própria candidata, com uma
sabedoria que, ao que parece, viria da pureza de quem está fora da
política e imbuída de uma missão.
Acreditava que no Brasil de
hoje não havia o risco de um novo salvador. Afinal, o momento em que
Collor apareceu como candidato da “nova política”, contra a política dos
marajás, parece não apenas distante, mas de algum modo aquém do patamar
em que as disputas se colocaram desde então.
Estava enganada.
Temos hoje novamente uma candidata que se apresenta como a representante
da “nova política”. A recusa da dinâmica política aparece como a
solução, os partidos e as instituições são vistos como entraves, mas sua
candidatura só foi possível porque seguiu a rota mais convencional do
casuísmo, tomando carona em um partido que nada tem a ver com a agenda
que parecia ser a sua. E tudo para garantir que não ficaria de fora da
disputa eleitoral, mesmo não acreditando nos caminhos desta política.
Marina
Silva também se apóia em concepções da economia que nada têm de novas,
que são defendidas há décadas pelos banqueiros e pelos economistas que
estão com ela – eles tiveram, aliás, lugares bem pagos e de prestígio em
consultorias, bancos e em governos anteriores.
Maior controle do
mercado sobre o Banco Central (a independência do BC), ajustes na
economia para restabelecer a “confiança” dos investidores, é assim o
“novo” de Marina Silva. Ela é “nova” financiada pelo Itaú, fazendo
acordos com o agronegócio e com uma agenda econômica produzida por André
Lara Resende (quem não se lembra dele, pode lançar no google confisco
da poupança no governo Collor, grampo do BNDES, banco Matrix,
privatização da Telebrás etc.) e Eduardo Gianetti (que repete a fórmula
dos “ajustes duros” e da autonomia do Banco Central, além de elogios à
política econômica de Fernando Henrique Cardoso).
O
fundamentalismo religioso a coloca numa posição em que a crença supera
os direitos individuais. Já falou a favor do criacionismo, recusando o
conhecimento científico. É contrária aos direitos dos homossexuais e
prefere diluir os problemas em noções vagas de diferença a enfrentar o
fato de que sua posição colabora para a recusa da cidadania e para a
violência contra tantas pessoas. É mulher na política, mas retirou a
palavra “sexismo” do seu programa de governo. Afinal, conflitos são
coisa do passado.
O que ela teria de distinto, sua identidade de
ambientalista, vai rapidamente pelo ralo. Afinal, é preciso garantir a
“confiança”. E como não há conflitos na sociedade dos discursos de
Marina Silva, as dúvidas sobre os transgênicos se resolvem definindo
áreas de plantio para transgênicos e não-transgênicos: um caminho para a
paz entre o agronegócio e os ambientalistas, afinal! E o etanol se
transforma em aliado do ambientalismo, garantindo um lugar para os
usineiros no pacote da “nova política”.
O messianismo garante que
Marina Silva seja “líder nata” sem propostas e com a entrada mais
tradicional no jogo político. Ela está acima das disputas e dos
conflitos. E os acordos… bem, os acordos são feitos à velha moda, nos
bastidores, enquanto ela repete “nova política”, “nova política”, “nova
política”.
Sabemos, no entanto, que os conflitos sociais não
desaparecem e os apoios de banqueiros, investidores e empresários são
cobrados depois. Sabemos também que por mais complicado que seja
governar com instituições democráticas, sem elas nós todos nos tornamos
reféns do que nos reservam as boas intenções ou a vontade de uma
“iluminada”.
(*) Professora do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília