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terça-feira, 17 de agosto de 2010

Na TV, campanha aplica "vacinas" contra discurso anti-Dilma


Se houvesse carteirinha de vacinação para campanhas eleitorais e as vacinas fossem os programas na TV, a primeira peça de campanha da presidenciável Dilma Rousseff (PT) no horário eleitoral gratuito poderia ser considerada uma "tríplice viral". O jornalista João Santana, responsável pela campanha da candidata, conseguiu colocar no mesmo programa de 10 minutos três doses de vacina para neutralizar argumentos que a oposição costuma esgrimir contra Dilma.



Um deles é o de que a candidata não tem experiência e não está preparada para governar o país. Outra tese da oposição é que a luta de Dilma contra a ditadura é uma mancha na sua biografia. E, por fim, espalham que a ex-ministra é uma pessoa rude e antipática. Todas estas questões foram sutilmente abordadas e "neutralizadas" no programa de TV de Dilma, exibido nesta terça-feira, na estréia dos candidatos presidenciais na propaganda eleitoral gratuita.

Apelando para o tom emocional ---estratégia preferida por dez entre dez marqueteiros--, Santana conseguiu passar a mensagem de que Dilma está preparada sim para governar, de que se orgulha do seu passado de lutas e que por trás de sua "fama de má" há uma mulher doce, conciliadora, uma "mãezona" que vai cuidar do povo brasileiro. Foram estes os eixos do primeiro programa de Dilma na TV. A presença de Lula, já esperada, acabou nem sendo o apelo mais importante do programa, que focou na biografia e no perfil de Dilma.


Receita tradicional: emoção


Os primeiros programas do horário eleitoral são tradicionalmente usados para apresentar os candidatos e destacar suas biografias. Foi isso que o programa de Dilma e de seu adversário do PSDB, José Serra, fizeram no primeiro. Quem destoou foi a candidata do PV, Marina Silva, que optou por um vídeo-mensagem-alerta sobre os perigos ao meio ambiente.

Tanto o programa de Dilma quanto o de Serra elegeram a emoção como mote de estreia no horário eleitoral na televisão. Enquanto uma das primeiras falas de Dilma menciona a "paixão pra fazer" o que a mobiliza, Serra fala em governar com o coração. As propostas de governo ficaram para os programas seguintes.

Dilma demonstrou sua "afetividade" com o povo brasileiro e exalta sua "relação afetiva com o povo". Para ela, o governante não pode se guiar apenas racionalmente, tem que se "incomodar afetivamente com a pobreza". E conclui: "a mim sempre me tocou muito afetivamente a humildade do povo".

A equipe de Serra transformou em jingle a música "Bate coração", interpretada por Elba Ramalho, que também canta o jingle, numa alusão à tentativa do candidato e ex-governador de São Paulo se aproximar do eleitorado da região nordeste. Logo na abertura do programa, ouve-se na voz de Elba: "Tum, tum, eu vou de coração". Na sequência, Serra declara: "quero governar o País com os brasileiros no coração".

Essa também foi a opção do comando da equipe de Dilma, que, no programa de rádio de hoje, trouxe uma balada, com toques de viola, que transborda melancolia. O tema não entrou no programa de tevê, mas será explorado adiante, com um videoclipe sentimental, protagonizado por Lula e Dilma.

A canção remete a uma conversa em que Lula pede a Dilma que cuide dos brasileiros e introduz a sua despedida: "deixo em tuas mãos o meu povo e tudo o que mais amei (...) agora as mãos de uma mulher vão nos conduzir, eu sigo com saudade; meu povo ganhou uma mãe que tem um coração que vai do Oiapoque ao Chuí".

O discurso da emoção ajudou o "Lulinha paz e amor", moldado pelo publicitário Duda Mendonça, a vencer a eleição presidencial em 2002.

Menos Lula, mais Dilma


Ao contrário do que chegou a ser divulgado, Lula não foi o âncora do primeiro programa de Dilma. Ele aparece em várias imagens ao lado dela, mas só fala uma vez, no depoimento em que relata como, após um único encontro, impressionou-se com ela e decidiu que ela seria sua ministra de Minas e Energia.

Foi uma estratégia para não deixar que o presidente com 78% de aprovação popular ofusque a candidata. "A estrela do programa tem que ser a Dilma", frisou o presidente do PT e um dos coordenadores da campanha, José Eduardo Dutra.

Além de enfocar o lado humano de Dilma, a equipe de João Santana procurou explorar a linguagem feminina. Afinal, sua principal bandeira é a de representar as mulheres no poder. Por isso, o programa trouxe uma versão delicada e feminina de Dilma. Ela aparece com uma camisa branca e colar de pérolas, e em imagens suaves, ora admirando uma paisagem, ora brincando com o cachorro. Ela também aparece como filha, esposa e mãe. O eleitor é apresentado à sua filha única, Paula, e ouve um depoimento de seu ex-marido Carlos Araújo, uma novidade que responde ao questionamento de muita gente que se perguntava quem era, afinal, o ex-marido de Dilma e se ele seria um problema ou não para a campanha da candidata.

Santana destacou ainda a ligação de Dilma com Minas Gerais e o Rio Grande do Sul. "Olho o Brasil com um olhar mineiro, e penso o país com um pensamento gaúcho", diz Dilma no vídeo.

Interessante notar que as falas de Dilma, com seus vícios de linguagem, o excesso de "acho" e alguma gagueira, poderiam ter sido editadas, mas foram preservadas, talvez para não artificializar a candidata e mostrá-la mais próxima do povo.

Serra: mais do mesmo

Serra com crianças em favela cenográfica: artificialidade para vincular o candidato aos pobres
Neste sentido, os programas evidenciaram a preocupação tanto de Dilma quando de Serra, que se mostraram como pessoas próximas ao eleitorado de baixa renda. Conhecido no meio político como exigente e centralizador, e preocupado em se dissociar da imagem de "partido de elite", que marca o PSDB, Serra é apresentado ao eleitor como um "homem simples, de bem com a vida", que nasceu em família humilde e estudou em escola pública. É o "Zé que batalhou, estudou, foi à luta", diz o narrador.

Mas o exagero nesta ênfase pode soar artificial. A imagem final do programa de Serra, com o candidato numa favela cenográfica é um indício desta artificialidade, que pode acabar tendo efeito contrário na campanha do candidato. Ao invés de conquistar o voto dos mais pobres, pode provocar um afastamento deste eleitorado.

Coordenado pelo marqueteiro Luiz Gonzalez, o mesmo que vem trabalhando para o PSDB há quase duas décadas, o programa de Serra foi praticamente um repeteco dos programas que inauguraram o horário eleitoral gratuito de Serra nas campanhas dele para presidente em 2002, para prefeito em 2004 e para governador em 2006. Até o locutor é o mesmo. Fórmula e discurso que, para os mais atentos, começam a ficar cansativos.

O programa de Serra expõe as realizações dele na área de saúde e convida o eleitor a responder "quem foi o melhor ministro da Saúde do Brasil". Fala dos genéricos, do programa de combate à Aids, do FAT. E mostra Serra conversando com suspostos eleitores beneficiados por programas como os mutirões e saúde.

Marina: surpresa adiada?

Com pouco mais de um minuto de tempo de TV, o programa da candidata do PV, Marina Silva, explorou sua principal bandeira: a defesa do meio ambiente e do desenvolvimento sustentável. Marina chegou a dizer que o programa surpreenderia pela forma criativa de usar o pouco tempo disponível, mas isso não aconteceu.

No programa de Marina foi exibida uma sequência de imagens com alertas para o aquecimento do planeta Terra, a falta de água que vai afetar dois bilhões de pessoas, as ondas que podem crescer até sete metros e inundar cidades como Rio de Janeiro, Recife e Florianópolis. Ficou parecendo uma propaganda de um dos programas da National Geographic e com um texto excessivamente rebuscado e técnico, ininteligível para a maioria do eleitorado.

A candidata só aparece nos segundos finais, em que se apresenta de forma objetiva: "sou Marina Silva, candidata a presidente do Brasil".

Os outros


Os demais candidatos, dos pequenos partidos, fizeram o de sempre: programas toscos, mal elaborados tecnicamente, com velhos bordões. Surpreendeu Rui Pimenta, do PCO, usando terno num cenário sofisticado, tipicamente burguês. E o candidato do PCB, Ivan Pinheiro, com um discurso abertamente anti-capitalista, mais duro que o do PCO e o do PSTU.

Mas o pior mesmo veio no espaço reservado aos candidatos a deputado federal. O excesso de "zé manés" e celebridades sem compromisso político, como Tiririca --que já ocupa o Top Trending do Twitter-- acabam nivelando por baixo as campanhas proporcionais. E contribuindo para aumentar o preconceito da sociedade em relação aos políticos.


Da redação,
Cláudio Gonzalez, com agências

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