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terça-feira, 25 de janeiro de 2011

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Fernando Henrique Cardoso não se enxerga?


A linguagem popular é rica de expressões que têm muitas vezes uma precisão cruel. Uma delas é “ele não se enxerga”, que se aplica como uma luva às declarações recentes – mas não novas – do ex-presidente neoliberal Fernando Henrique Cardoso sobre a política externa do governo Lula e do chanceler Celso Amorim, mantida pela presidente Dilma Rousseff e pelo chanceler Antônio Patriota.

Basta lembrar alguns episódios vexaminosos da diplomacia comandada por Fernando Henrique Cardoso para que se tenha a dimensão dos disparates que ele e seus partidários conservadores e pró-americanos repetem sobre a diplomacia brasileira autônoma e independente reinaugurada por Lula e Celso Amorim.

Um desses episódios foi a demissão do diplomata Samuel Pinheiro Guimarães da presidência do IPRI (Instituto de Pesquisas de Relações Internacionais do Itamaraty), em 2001. Outro, em 2002, foi a demissão do embaixador José Maurício Bustani da direção geral da Opaq (Organização da ONU para as Armas Químicas). Outro, ainda mais devastador para o orgulho nacional, ocorreu em 2002 sendo protagonista o próprio chanceler tucano Celso Lafer que, em visita oficial aos EUA para apoiar o governo local depois dos ataques terroristas de 11de setembro de 2001, aceitou submeter-se à rígida revista policial nos aeroportos de Nova York e de Washington, chegando inclusive a tirar os sapatos, como exigiam os agentes que faziam a revista.

Há uma coerência entre estes episódios vergonhosos. Enquanto o ministro constrangia o Brasil com sua atitude servil, os diplomatas punidos (Samuel Pinheiro Guimarães e José Maurício Bustani) pagaram por sua altivez e dignidade e por não aceitarem dobrar-se ante as imposições da diplomacia norte-americana. Guimarães sempre foi um crítico da ALCA; Bustani rejeitou as pressões do governo de Washington para usar seu cargo na ONU e “criminalizar” nações independentes acusadas mentirosamente por Bush e seus pupilos de detentoras de armas químicas, como ocorreu com o Iraque, contra quem aquelas alegações falsas serviram para legitimar a agressão que destruiu o país e infelicitou o povo.

Esta é a diplomacia que Fernando Henrique Cardoso quer de volta: a dos sem sapatos nem vergonha na cara, submissos passivamente às imposições norte-americanas. Um estudioso, o historiador Moniz Bandeira, chegou a escrever que a política externa de Fernando Henrique Cardoso foi um “simples acessório dos interesses hegemônicos dos Estados Unidos, no mundo e, em especial, na América Latina”. Ele tem razão.

Aquela foi uma política de cabeça baixa, pés descalços e “sim senhor”, que não volta mais. Outro dito popular muito valorizado nos arraiais tucanos diz que “manda quem pode, obedece quem tem juízo”. É o que eles fizeram no governo, rosnando para países pequenos e pobres (como a Bolívia, por exemplo), e curvando a espinha ante os poderosos do mundo, como os governantes de Washington.

O Brasil democrático nem manda nem obedece – trata todos os povos e nações como iguais, cujos interesses precisam ser articulados soberanamente em acordos que contemplem as necessidades e os limites de cada um. Esta é a melhor tradição diplomática brasileira, retomada por Lula e Celso Amorim e que projetou o Brasil no mundo como um parceiro da paz e da busca do desenvolvimento e do progresso para todos os povos. O resto é conversa fiada de gente saudosa do poder do qual foi escorraçada pelo voto popular e cujas chances de voltar são cada vez mais remotas.


Editorial do Vermelho

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