Sem citar nomes, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse ontem que “o governo anterior” é culpado pela “consolidação” da “corrupção sistêmica” que toma conta do estado. Alguns meios de comunicação entenderam que FHC referiu-se a Lula, mas suas palavras permitem várias interpretações, inclusive a de que ele não acusou só Lula, mas Dilma também.
A presidente teve postos de destaque no governo anterior durante seus oito anos. E, nos últimos seis, ocupou o segundo cargo mais importante. Se houve “consolidação da corrupção” naquele período, portanto, teria até mais responsabilidade do que o ex-presidente Lula, pois coordenava os outros ministérios e, assim, teria mais condições de saber o que neles se passava.
Se houve processo tão escandaloso de “consolidação” da corrupção no governo anterior ao ponto de até um político da oposição saber disso, é óbvio que a Dilma sabia. Essa é uma interpretação perfeitamente cabível. E se sabia e não disse nada, permanecendo gostosamente em um governo corrupto, a corrupção a atinge, de acordo com a tese fernandina.
Além da falta de modos e de caráter de FHC, sua fala revela seu cinismo insuperável. Afinal, o governo anterior aprimorou e investiu em todos os mecanismos de combate à corrupção que o governo tucano desarticulou com o beneplácito da Globo, da Folha de São Paulo, do Estadão e da Veja, mais do que outros bajuladores midiáticos menores do mesmo FHC e de seu partido.
A Polícia Federal desmotivada, mal-paga e sem quadros que durante o governo FHC não fez nem cem operações de combate à corrupção, no governo Lula promoveu cerca de mil operações, produzindo centenas e centenas de prisões e processos na Justiça. Na era Lula, aliás, até banqueiros foram presos – Edmar Cid Ferreira e Daniel Dantas –, o que seria impensável na era FHC.
Mas talvez a maior ação em prol do combate à corrupção empreendida pelo governo Lula tenha sido a de indicar três procuradores-gerais da República diferentes em oito anos, sempre anuindo ao primeiro indicado da lista tríplice que o Ministério Público Federal sempre enviou ao presidente da República para que escolhesse o novo chefe da instituição e que, na era FHC, era solenemente ignorada em prol de um “engavetador-geral da República”, que atendia pelo nome de Geral Brindeiro e permaneceu à frente da instituição por oito anos.
O procurador-geral da República, como se sabe, é o único que tem a prerrogativa de processar o presidente. Enquanto que o escolhido por FHC para chefiar o MPF durante seus oito anos engavetou todas as representações e denúncias apresentadas e jamais tomou a iniciativa de denunciar qualquer coisa, os procuradores-gerais de Lula puderam até ser usados pela oposição como argumento contra ele e seu governo, pois os fustigaram impiedosamente.
Corrupção foi a venda subfaturada do patrimônio público por FHC, fazendo a fortuna dos amigos e tendo melhorado de vida a olhos vistos após sua passagem pela Presidência da República. FHC deveria ter vergonha de dizer o que disse. Ou cuidado, porque alguém poderia resolver investigar seu governo sujo.
Mas o mais revoltante nessa declaração de FHC é que mostra que, além de promotor da corrupção, ele também é desleal, mal-agradecido e traiçoeiro, pois aquela que teve a generosidade de fazer um reconhecimento de seu papel para quebrar a inércia inflacionária nos anos 1990, e que lhe tem dispensado tantas deferências, agora é tratada como, no mínimo, conivente com a corrupção.
Eis o que Dilma ganha por tentar contemporizar com esses gangsters da imprensa golpista e da direita partidária. É apunhalada pelas costas na primeira oportunidade, por mais que os bajule. E já que não adianta tentar manter uma relação civilizada com eles, portanto, então que tal ela começar a se dar ao respeito e ao menos parar com essa bajulação?
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