Por Dennis de Oliveira, na revista Fórum:
Régis Debray escreveu tempos atrás que vivemos sob uma sociedade da imagem e cujo poder se legitima pela sedução. Em termos comparativos, ele afirma que o antecessor da sociedade da imagem era a da escrita com o poder sendo exercido pela autoridade do conhecimento e, antes disto ainda, a sociedade da oralidade e o poder da fala. Uma sociedade da sedução coloca para os indivíduos a valorização do exibicionismo – a sua validade é diretamente proporcional à imagem que constrói.
Acrescento ainda a isto o fato desta sociedade da imagem acontecer em um momento da “desregulamentação” e individualização extremada da sociedade, em que todas as responsabilidades de sucesso ou fracasso cabem ao indivíduo. Vencer a qualquer custo é o imperativo do momento que vivemos, e vencer significa ter capacidade de sedução nesta sociedade imagética. Por isto que a autoridade foi substituída pela celebridade midiática, célebre por tautologia – é famosa por ter espaço na mídia e ponto final.
Esta é a base destes programas de reality shows que povoam a programação da mídia. Temos aquela coisa horrorosa e mimética do mundo corporativo do “Aprendiz” em que jovens são submetidos ao tacão moralista e civilizatório de uma imagem caricata de empresário (feito antes por Justus e agora por Dória). E o mais famoso deles, o Big Brother Brasil, da empresa Endemol e transmitido por estas paragens pela Globo.
Reality show – tradução literal: mostrar a realidade! Mas que realidade? Aquela construída sob os parâmetros dos aparatos tecnológicos e estéticos da televisão. Motrar a realidade não seria tarefa do jornalismo? Mas a realidade que se quer mostrar é aquela enquadrada nos dispositivos ideológicos do momento de uma sociedade imagética, sedutora e que coloca aos indivíduos a busca do sucesso via a sua capacidade de sedução – isto é, o exibicionismo puro e simples.
Floresce, assim, uma das últimas fronteiras de expansão do capital, a indústria da imagem, esta mesma que sustenta toda a indústria do entretenimento (artes, esportes, lazer, eventos) e penetra em outros campos, como na política. Atletas, artistas, cidades, bairros (Cracolândia não, Nova Luz por favor!), produtos, candidatos a cargos públicos são avaliados com base nos seus potenciais imagéticos. Para tanto, contam com um aparato de “especialistas” (consultores, assessores, designers) para cuidar da construção destes simulacros.
E as pessoas comuns que não contam com isto? São jogadas em uma selva onde vale a lei de quem pode mais chora menos. Os seus fracassos são resultados da sua própria incompetência. O cartaz da imagem demonstra isto: “Não seja estuprada” ao invés de “Não estupre”. Aquela idéia de que é a mulher que deve “se preservar”, de “se respeitar”. A culpa é da vítima. Assim como os afrodescendentes – esforcem-se para poder entrar na universidade e não fiquem esperando “favores como as cotas”! De repente as hierarquias raciais e de gênero deixam de existir para entrarmos em um mundo de competências premiadas e incompetências punidas.
Os programas de reality shows consolidam isto – são “gincanas” públicas em que tais pessoas têm sua capacidade testada de sobreviver nestas regras. A polêmica do caso Daniel e Monique é a cereja do bolo desta lógica. Posso tudo, inclusive usar da força de macho para usufruir de uma mulher, deve ter pensado ele. Qualquer problema, o álcool é o álibi. E, de repente, isto pode alavancar uma audiência no programa.
O pay-per-view do BBB vende muito pois se baseia na lógica perversa presente no subconsciente de muitos de poder espiar alguma cena picante (que pode ser simplesmente alguém ficando nu). Qual é o prazer de ficar espiando um bando de pessoas dentro de uma casa? E ainda pagar (!!!) por isto?
“O amor é lindo” foi a primeira reação da emissora, achando que a repercussão do caso iria dar um “up” na audiência do programa que anda em baixa. Mas o feitiço virou contra o feiticeiro. Neste mundo imagético e de lei da selva há ainda os que se indignam. Aqueles que ainda dizem “assim não dá!”. Aqueles que acreditam que a sociedade deve se seguir não pela regra do “vença a qualquer custo”, mas sim de que “vamos construir juntos uma vida digna para todos”.
Régis Debray escreveu tempos atrás que vivemos sob uma sociedade da imagem e cujo poder se legitima pela sedução. Em termos comparativos, ele afirma que o antecessor da sociedade da imagem era a da escrita com o poder sendo exercido pela autoridade do conhecimento e, antes disto ainda, a sociedade da oralidade e o poder da fala. Uma sociedade da sedução coloca para os indivíduos a valorização do exibicionismo – a sua validade é diretamente proporcional à imagem que constrói.
Acrescento ainda a isto o fato desta sociedade da imagem acontecer em um momento da “desregulamentação” e individualização extremada da sociedade, em que todas as responsabilidades de sucesso ou fracasso cabem ao indivíduo. Vencer a qualquer custo é o imperativo do momento que vivemos, e vencer significa ter capacidade de sedução nesta sociedade imagética. Por isto que a autoridade foi substituída pela celebridade midiática, célebre por tautologia – é famosa por ter espaço na mídia e ponto final.
Esta é a base destes programas de reality shows que povoam a programação da mídia. Temos aquela coisa horrorosa e mimética do mundo corporativo do “Aprendiz” em que jovens são submetidos ao tacão moralista e civilizatório de uma imagem caricata de empresário (feito antes por Justus e agora por Dória). E o mais famoso deles, o Big Brother Brasil, da empresa Endemol e transmitido por estas paragens pela Globo.
Reality show – tradução literal: mostrar a realidade! Mas que realidade? Aquela construída sob os parâmetros dos aparatos tecnológicos e estéticos da televisão. Motrar a realidade não seria tarefa do jornalismo? Mas a realidade que se quer mostrar é aquela enquadrada nos dispositivos ideológicos do momento de uma sociedade imagética, sedutora e que coloca aos indivíduos a busca do sucesso via a sua capacidade de sedução – isto é, o exibicionismo puro e simples.
Floresce, assim, uma das últimas fronteiras de expansão do capital, a indústria da imagem, esta mesma que sustenta toda a indústria do entretenimento (artes, esportes, lazer, eventos) e penetra em outros campos, como na política. Atletas, artistas, cidades, bairros (Cracolândia não, Nova Luz por favor!), produtos, candidatos a cargos públicos são avaliados com base nos seus potenciais imagéticos. Para tanto, contam com um aparato de “especialistas” (consultores, assessores, designers) para cuidar da construção destes simulacros.
E as pessoas comuns que não contam com isto? São jogadas em uma selva onde vale a lei de quem pode mais chora menos. Os seus fracassos são resultados da sua própria incompetência. O cartaz da imagem demonstra isto: “Não seja estuprada” ao invés de “Não estupre”. Aquela idéia de que é a mulher que deve “se preservar”, de “se respeitar”. A culpa é da vítima. Assim como os afrodescendentes – esforcem-se para poder entrar na universidade e não fiquem esperando “favores como as cotas”! De repente as hierarquias raciais e de gênero deixam de existir para entrarmos em um mundo de competências premiadas e incompetências punidas.
Os programas de reality shows consolidam isto – são “gincanas” públicas em que tais pessoas têm sua capacidade testada de sobreviver nestas regras. A polêmica do caso Daniel e Monique é a cereja do bolo desta lógica. Posso tudo, inclusive usar da força de macho para usufruir de uma mulher, deve ter pensado ele. Qualquer problema, o álcool é o álibi. E, de repente, isto pode alavancar uma audiência no programa.
O pay-per-view do BBB vende muito pois se baseia na lógica perversa presente no subconsciente de muitos de poder espiar alguma cena picante (que pode ser simplesmente alguém ficando nu). Qual é o prazer de ficar espiando um bando de pessoas dentro de uma casa? E ainda pagar (!!!) por isto?
“O amor é lindo” foi a primeira reação da emissora, achando que a repercussão do caso iria dar um “up” na audiência do programa que anda em baixa. Mas o feitiço virou contra o feiticeiro. Neste mundo imagético e de lei da selva há ainda os que se indignam. Aqueles que ainda dizem “assim não dá!”. Aqueles que acreditam que a sociedade deve se seguir não pela regra do “vença a qualquer custo”, mas sim de que “vamos construir juntos uma vida digna para todos”.
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