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Conversa Afiada tem o prazer de publicar artigo de Mauro Santayana:
O pré-sal em um mundo sem petróleo e as Forças Armadas
por Mauro Santayana
Há décadas que a exaustão dos mananciais de petróleo vem sendo anunciada. O assunto foi dos mais discutidos pelo Clube de Roma, que pretendia deter o desenvolvimento econômico do mundo, com o congelamento do progresso e o crescimento zero. Os argumentos eram poderosos: como os recursos do planeta são finitos, infinito não pode ser o seu consumo, e o modelo de vida deve ser mudado. Ocorre que os países ricos – que promoveram o encontro e soaram o alarme – pretendiam congelar o tempo: os que se encontravam à frente, à frente continuariam, enquanto os outros, não podendo desenvolver-se, pelo acordo pretendido, regrediriam. A reação dos países em desenvolvimento, com o apoio então da URSS, tornou o projeto inviável.
A partir da Conferência de Estocolmo, em 1972, a preocupação com o meio ambiente passou a ser, sobretudo, dos países em desenvolvimento, que apontaram as razões reais da crise: a civilização do desperdício imposta ao mundo pelos países ricos. A partir de então, os países centrais aceleraram o seu esforço a fim de controlar as fontes de matéria prima, sobretudo do petróleo, no mundo inteiro, com o emprego da diplomacia e da guerra. Essa ofensiva foi possível mediante a aliança entre Reagan, Thatcher e o Vaticano, com a cumplicidade de Gobartchev, contra o sistema socialista – que apoiava os esforços do Terceiro Mundo.
Uma das artimanhas do poder imperial é a desinformação. Com relação à energia – além do petróleo, o urânio e terras raras – essa desinformação é patente: tenta esconder o entendimento entre os países ricos para o controle direto das atuais jazidas, que se exaurem rapidamente. Não se preocupam com a poluição do mundo, nem com o chamado efeito estufa: seu cuidado é o de manter a posição hegemônica. Nessa atitude, os Estados Unidos, os países europeus e os chineses continuam a proclamar a intenção de encontrar saídas para proteger o ambiente da vida, enquanto continuam em seu processo poluidor, não só em seus territórios nacionais, mas no mundo inteiro – conforme a atuação de suas empresas na África, na Ásia e na América Latina.
As grandes empresas petrolíferas – que mantêm influência poderosa nos governos dos países centrais, de forma direta, ou mediante o Clube de Bilderberg – escondem as previsões assustadoras de que as reservas petrolíferas do mundo chegarão ao seu pico nos próximos três anos, e se iniciará o processo de exaustão, calculado em 5% ao ano – nos termos atuais de consumo. Se essa previsão se confirmar, em 20 anos as atuais reservas estarão esgotadas, se o consumo não aumentar, o que reduziria o prazo previsto.
Um dos sinais das dificuldades a vir é o malogro do grande campo de Kachagan, nas águas sob a jurisdição do Casaquistão, no Mar Cáspio. A província petrolífera de Kachagan era uma das maiores promessas de grande produção. As reservas são calculadas entre 9 e 16 bilhões de barris. O início da produção estava previsto para daqui a dois anos – em 2014. Dificuldades técnicas e dificuldades econômicas se alternam. É preciso trabalhar em condições extremas, com a temperatura variando de 35 graus abaixo de zero, no inverno, a 40 graus acima de zero, no verão. As condições são de tal maneira duras que os trabalhadores da região protestaram, em dezembro, de forma vigorosa contra as condições de trabalho impostas pelas empresas Total, da França; Shell, da Holanda e do Reino Unido; Exxon, dos Estados Unidos, e Eni, da Itália. Foram reprimidos à bala pelo governo do Casaquistão, com pelo menos dez mortos. Houve deliberado silêncio sobre o incidente.
Com toda a pujança do campo de Kachagan, suas reservas totais dariam apenas para o consumo mundial, nos níveis atuais, de três meses (na previsão mais baixa, de 9 bilhões de barris) a menos de seis meses (na hipótese de 16 bilhões). O Cáspio era a grande miragem dos Estados Unidos e seus aliados europeus, e a verdadeira razão da guerra movida contra o Afeganistão, assim como a verdadeira razão da guerra contra o Iraque sempre foi o petróleo. Embora haja ainda a possibilidade de outras jazidas, de menor expressão, de petróleo e gás na região, a grande expectativa, a de Kachagan se frustra. Diante dos obstáculos, os investidores se afastam do projeto, e as empresas envolvidas começam a planejar a retirada, mas se encontram presas ao contrato com o governo do Casaquistão, e esse contrato termina em 2041 – com a transferência para o país das instalações da grande ilha artificial montada pelas contratantes.
O petróleo continua sendo a mais importante das matérias primas, enquanto a ciência não lhe encontrar sucedâneos. A advertência de que a contagem para a sua exaustão já se inicia deve ser meditada em nosso país. Estamos eufóricos com as perspectivas das jazidas encontradas sob a camada de sal no litoral atlântico. Há hoje uma disputa entre estados e municípios para o dispêndio de parcela dos resultados dessa exploração, por via dos royalties. Isso se houver realmente royalties, uma vez que, se não prevalecer a emenda Pedro Simon, os royalties a serem pagos pelas empresas exploradoras serão a elas devolvidos em óleo.
Temos também que usar desses recursos, se eles corresponderem ao que esperamos, para financiar pesquisas nacionais em busca de fontes alternativas de energia e, com a mesma preocupação, do fortalecimento de nossos exércitos. No que se refere às Forças Armadas, é urgente restabelecer a indústria nacional de armamentos, abandonada pelo derrotismo interessado dos neoliberais brasileiros. Essa atitude capitulacionista quase nos custou a entrega total da Petrobrás às sete irmãs bastardas, que são as principais petroleiras do mundo. O balanço objetivo do que foi o governo Fernando Henrique poderá ser realizado com a CPI das Privatizações, a ser constituída em breve.
O mundo que temos à frente não nos promete a paz – a menos que sejamos capazes de agir decisivamente contra o sistema atual, dominado por meia dúzia de meliantes, que controlam os governantes, a maioria deles pessoas medíocres e subornadas pelos grandes bancos, que também controlam as grandes corporações multinacionais. As manifestações de massa do ano que passou podem ter sido apenas fogo de palha. Falta organizar politicamente o inconformismo, em cada um dos países do mundo, a fim de assegurar aos seres humanos os direitos que lhes são naturais, e que se resumem em viver, enquanto vida houver, sem medo e sem ódio.
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