Gilmar Mendes, Élio Gáspari ('Éeeeliooo, o Heitor!') e assemelhados criticam consulta popular --'bolivarianismo' , diz a direita togada.
*Maria Inês Nassif entrevista o jurista Pedro Serrano : o decisivo é que a reforma política ocorra protegida do atual sistema de poder (leia nesta pág)
Constituinte exclusiva ou Plebiscito para realizar a 'ampla e profunda' reforma política, anunciada pela Presidenta Dilma, em seu discurso na 2ª feira? Não importa a forma, desde que se promova um efetivo aggiornamento da democracia brasileira, em sintonia com os anseios sinceros da rua por mais participação e menor influencia do dinheiro grosso no sistema político nacional. O mais importante é que o governo saiu da defensiva e desenhou o escopo de um grande debate nacional, capaz de incorporar as vozes e inquietações das ruas. E, sobretudo, decidiu dar à soberania popular o comanda das mudanças do ciclo que se inicia. Cumpre às administrações locais avançarem nessa direção criando contrapartidas de ampliação da democracia ali onde a vida acontece, na gestão das cidades. A sorte de prefeitos e gestões progressistas, como a de Fernando Haddad, em São Paulo, depende desse desassombro. Trata-se de abrir canais de escuta forte da cidadania. Não canais ornamentais, mas instrumentos relevantes e críveis de poder sobre o orçamento. O PT tem experiências a resgatar; a disseminação da tecnologia permite, hoje, mais que ontem, submeter a gestão da cidade à soberania dos cidadãos. A Presidenta Dilma respondeu com perspicácia histórica ao clamor das ruas. Disparou na direção certa. A questão que aglutina a fragmentação das bandeiras desordenadas do nosso tempo é o poder. Todo o processo de globalização e financeirização apoia-se na captura da soberania popular pelo dinheiro grosso. Governos se emasculam. O voto se desmoraliza. Os partidos se descarnam. A existência se acinzenta. A lógica do negócio imobiliário se apodera das cidades. A mídia conservadora é a torre de vigia desse sequestro, que esfarela o poder da sociedade sobre ela mesma (leia a coluna de Venício Lima; nesta pág). Ou as lideranças e partidos revertem essa espiral, ou vence a exaustão caótica. E com ela a bandeira já sussurrada pela direita e seus ventríloquos obsequiosos: 'ordem e um Napoleão de toga'. (Leia mais:blog do Emir; Boaventura Santos e 'A tarefa mais urgente' e 'A resposta é mais democracia')
Para Pedro Serrano, Constituinte é decisão política, não questão jurídica
Jurista afirma que uma Constituinte originária pode tudo, inclusive se autolimitar, e que numa situação de tensão entre o Estado de direito constitucional e a soberania popular, a sociedade deve assumir o seu destino. Por Maria Inês Nassif.
Maria Inês Nassif
No debate sobre a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte com poderes limitados à mudança do sistema político, o que menos conta é a avaliação jurídica da proposta feita pela presidente Dilma Rousseff como base para um acordo nacional, porque a discussão é essencialmente política. É a conveniência política que deve pautar essas discussões, segundo o constitucionalistas Pedro Serrano, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. O Brasil vive uma situação em que o Estado de direito constitucional está tensionado pela questão da soberania popular. E, nesse caso, “a sociedade deve ser dona de seu destino.”
Do ponto de vista jurídico, existem apenas dois poderes constituintes: um é originário, destinado a mudar o sistema jurídico, e nesse caso ele tem que ter poderes ilimitados; e outro derivado, com o poder de reformar a Constituição atribuído ao parlamento. Uma Constituinte limitada à reforma política incorreria, teoricamente, no vício jurídico de sofrer restrições (o que tiraria sua característica de originária), ou de concorrer com quórum menor ao poder de reforma do Congresso (que obriga quórum qualificado, enquanto a Constituinte pode decidir por maioria simples).
Para Serrano, contudo, esses são apenas modelos. “Se houver conveniência política de realização da Constituinte com poderes limitados, nosso papel é descrever essa nova categoria, que será um fato novo e decorrerá da politica, não do direito. Não é tudo preto ou branco. Existem muitos tons de cinza pelo caminho.”
“A Assembleia originária é um fenômeno politico e pode tudo,inclusive abrir mão de ser absolutamente ilimitada. Se isso acontecer, poderá alterar na Constituição de 1988 todas as normas políticas e vinculadas, mas não poderá alterar as cláusulas pétreas”, disse.
Embora pessoalmente não tenha posição política, contra ou a favor, da proposta da presidente, Serrano diagnostica uma situação política de tensão que justificaria, do ponto de vista doutrinário, uma solução que não está nos manuais jurídicos. Ele constata que existe hoje, no Brasil, “um Estado de direito constitucional tensionado pela questão da soberania popular”.
Há uma multidão nas ruas exigindo uma reforma política, “independente, autônoma“ e que ocorra protegida dos interesses imediatos dos participantes do atual sistema político. E, de outro lado, uma impossibilidade do sistema político de gerar respostas dentro do atual sistema jurídico, já que os reformadores da Constituição são os que têm interesse direto nessa questão.xUma Assembleia exclusiva para fazer a reforma política, nesse caso, seria uma exceção à ordem jurídica, mas não no sentido de desconstituir direitos, mas de constituir novos direitos.
Serrano cita o jurista argentino Genaro Carrió, para quem o direito apenas consegue debater na esfera das linguagens de competência e situações reguladas. “Quando as situação foge à norma, o direito não consegue mais debater”, afirma. No caso de uma constituinte originária, ela remete a uma primeira causa, algo que não está na órbita do limite semântico do direito. Por isso, a Constituinte é uma questão política, e não jurídica.
Se essa fórmula política for adotada, Serrano considera que o Supremo Tribunal Federal (STF) terá um papel fundamental no controle das atribuições da Constituinte Exclusiva e na defesa das cláusulas pétreas da Constituição de 1988.
Do ponto de vista jurídico, existem apenas dois poderes constituintes: um é originário, destinado a mudar o sistema jurídico, e nesse caso ele tem que ter poderes ilimitados; e outro derivado, com o poder de reformar a Constituição atribuído ao parlamento. Uma Constituinte limitada à reforma política incorreria, teoricamente, no vício jurídico de sofrer restrições (o que tiraria sua característica de originária), ou de concorrer com quórum menor ao poder de reforma do Congresso (que obriga quórum qualificado, enquanto a Constituinte pode decidir por maioria simples).
Para Serrano, contudo, esses são apenas modelos. “Se houver conveniência política de realização da Constituinte com poderes limitados, nosso papel é descrever essa nova categoria, que será um fato novo e decorrerá da politica, não do direito. Não é tudo preto ou branco. Existem muitos tons de cinza pelo caminho.”
“A Assembleia originária é um fenômeno politico e pode tudo,inclusive abrir mão de ser absolutamente ilimitada. Se isso acontecer, poderá alterar na Constituição de 1988 todas as normas políticas e vinculadas, mas não poderá alterar as cláusulas pétreas”, disse.
Embora pessoalmente não tenha posição política, contra ou a favor, da proposta da presidente, Serrano diagnostica uma situação política de tensão que justificaria, do ponto de vista doutrinário, uma solução que não está nos manuais jurídicos. Ele constata que existe hoje, no Brasil, “um Estado de direito constitucional tensionado pela questão da soberania popular”.
Há uma multidão nas ruas exigindo uma reforma política, “independente, autônoma“ e que ocorra protegida dos interesses imediatos dos participantes do atual sistema político. E, de outro lado, uma impossibilidade do sistema político de gerar respostas dentro do atual sistema jurídico, já que os reformadores da Constituição são os que têm interesse direto nessa questão.xUma Assembleia exclusiva para fazer a reforma política, nesse caso, seria uma exceção à ordem jurídica, mas não no sentido de desconstituir direitos, mas de constituir novos direitos.
Serrano cita o jurista argentino Genaro Carrió, para quem o direito apenas consegue debater na esfera das linguagens de competência e situações reguladas. “Quando as situação foge à norma, o direito não consegue mais debater”, afirma. No caso de uma constituinte originária, ela remete a uma primeira causa, algo que não está na órbita do limite semântico do direito. Por isso, a Constituinte é uma questão política, e não jurídica.
Se essa fórmula política for adotada, Serrano considera que o Supremo Tribunal Federal (STF) terá um papel fundamental no controle das atribuições da Constituinte Exclusiva e na defesa das cláusulas pétreas da Constituição de 1988.
Fotos: EBC
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