Mente vazia, oficina do sistema da mídia golpista

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sexta-feira, 24 de junho de 2016

Governo Temer se entrega aos planos privados de saúde; ANS e Ministério agem como se operadoras fossem vítimas de abusos, não os pacientes

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por Conceição Lemes

Há duas semanas, a Agência Nacional de Saúde Suplementar publicou em seu portal: ANS participa de reunião para reduzir judicialização da saúde.

Foi no gabinete do ministro interino da Saúde, o engenheiro e deputado federal licenciado Ricardo Barros (PP-PR), e o secretário-geral Suriêtte Santos representou a ANS.
A agência tem como missão a defesa dos interesses dos usuários e a regulação das relações entre operadoras e consumidores.
Por isso, além do título, alguns pontos (grifados em amarelo, na íntegra aqui) nos chamam a atenção:
ans 4
“Tudo indica que a ANS e o Ministério da Saúde pretendem intervir preventivamente no Judiciário para impedir ações judiciais contra planos de saúde”, alerta Mário Scheffer. “É preciso acompanhar com muita atenção essa movimentação. Espero que o Ministério Público e as entidades de defesa do consumidor cobrem explicações.”

Scheffer é professor do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), vice-presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e membro do Conselho Diretor do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec).

“O governo Temer se entrega aos planos privados de saúde”, vai mais fundo Scheffer. “Ao apoiar os Núcleos para tentar interferir nas decisões de juízes relacionadas a planos de saúde, a ANS e o Ministério da Saúde agem como se as empresas fossem as vítimas da judicialização, e não os usuários e pacientes.”
TRATAMENTOS NEGADOS PARA CÂNCER, CORAÇÃO, AVC, AUMENTOS ABUSIVOS PARA IDOSOS E “FALSOS COLETIVOS”

O movimento de duas semanas atrás é preocupante pelo histórico dos atores envolvidos. Afinal, o que está em jogo é o poder de um mercado bilionário.
Em 2015, o setor movimentou R$ 140 bilhões. São 48,8 milhões de brasileiros vinculados a algum plano de saúde.

Metade está nas mãos de 26 empresas, embora existam 806 operadoras de planos médico-hospitalares em atividade no País.

Em 2015, pelo quarto ano consecutivo, os planos de saúde lideraram o ranking de reclamações dos associados do Idec.

Foram responsáveis por 32,68% das 8.163 demandas registradas pela entidade.
Em comparação a 2014, as queixas sobre os planos cresceram 64,8%.
O segmento representa praticamente um terço de todas as demandas recebidas pelo instituto.
Reajustes abusivos das mensalidades e a quebra da Unimed Paulistana estão entre os temas que mais elevaram o número de atendimentos.

As ações na Justiça contra as operadoras também estão aumentando bastante.
Nos últimos seis anos, elas cresceram cinco vezes no Estado de São Paulo, revelam pesquisas feitas por Scheffer, que há mais de 20 anos estuda os planos de saúde.
Em 2010, foram julgadas 2.300 ações pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP); em 2015, 11.480.
No mesmo período, os clientes de planos de saúde passaram de 17,3 para 18,3 milhões. Portanto, as ações judiciais aumentaram em velocidade muito maior.

De janeiro a maio de 2016, já somam mais de 4 mil.

“Esses números referem-se apenas a decisões definitivas, de segunda instância”, atenta Scheffer. “Se consideramos as liminares e juizados especiais cíveis, esse número explode.”
   Ações contra planos de saúde julgadas 2ª instância pelo TJ-SP

ANS tabela 1








Em outra pesquisa, a equipe de Scheffer analisou a fundo uma amostra de 4.059 decisões, da comarca da cidade de São Paulo, proferidas pelo TJ-SP em 2013 e 2014.
Mais de 90% foram favoráveis aos pacientes e quase metade das ações envolve exclusão de coberturas.
tratamentos negados
São tratamentos negados para vários tipos de câncer (mama, próstata, colo de útero, leucemia), doenças do coração, incluindo infarto e acidente vascular cerebral (AVC).
Por exemplo, quimioterapia, radioterapia, stent (tubo minúsculo, em forma de malha, colocado no interior de uma artéria para evitar uma possível obstrução total dos vasos), mastectomia, hemodiálise, transplantes. Mas recusam também reabilitações, fisioterapia, fonoaudiologia, saúde mental e por aí vai.
“Na maioria das vezes não são tratamentos experimentais, fora de protocolos, mas muitos são caros, por isso os planos negam”, atenta o professor. “Outros 30% das ações são idosos reclamando de reajustes impraticáveis, uma verdadeira exclusão pecuniária.”
“Mas o que mais cresceu na Justiça foram os conflitos envolvendo o que chamamos de ‘falsos coletivos’, que são os ‘pejotinhas’ ou planos de adesão ‘dissimulada'”, observa.
São os planos contratados por pequenos grupos – a partir de duas pessoas, mediante um CNPJ – e os planos de adesão em que o próprio corretor indica a filiação a algum sindicato ou associação, muitas vezes sem nenhuma relação com a profissão ou ocupação do interessado.
Diferente dos contratos individuais, os coletivos em geral não são alcançados pela regulação quanto a limite de reajuste anual e rescisão de contrato. Nos pequenos ou “falsos” coletivos isso vira um grande problema.
“O cidadão cai numa arapuca”, afirma Scheffer.
O valor inicial dos “falsos coletivos” é bem menor do que um plano individual, mas depois o usuário é surpreendido com reajustes absurdos.
Ou a operadora dá um basta quando o contrato não lhe é mais conveniente. Por exemplo, quando uma ou mais pessoas daquele grupo ficam doentes e começam a demandar serviços mais custosos.
FINANCIADO POR DONO DE PLANO, MINISTRO DIZ QUE NÃO VAI CONTROLAR QUALIDADE
Não é toa que há tempos as operadoras pressionam o governo federal para diminuir as exigências e o controle dos planos de saúde.
O sonho do “mercado” é o liberou geral, terra sem lei. As empresas com a faca e o queijo na mão.
O ministro interino Ricardo Barros caiu-lhes do céu.
Em 2014, ele teve parte de sua campanha eleitoral financiada pelo empresário Elon Gomes de Almeida, presidente de uma das maiores administradoras de planos de saúde do País, a Aliança, registrada na ANS. Almeida fez uma doação pessoal de R$ 100 mil.
Parêntese. A relação dos planos de saúde com financiamento de campanhas eleitorais é antiga, com crescimento impressionante nas eleições de 2014, conforme estudo da professora Lígia Bahia, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Mário Scheffer, da USP.
O Viomundo já havia havia revelado isso, inclusive o financiamento dos planos a outros deputados federais, como Manoel Júnior (PMDB-PB) e Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
Manoel chegou a ser indicado pelo PMDB para ministro da Saúde; é o autor da emenda que abriu a saúde ao capital estrangeiro.
Já Eduardo Cunha é o autor da PEC 451 que tentou obrigar todos os empregadores a fornecer planos de saúde a seus funcionários. Fechado o parêntese.
Voltando ao interino Ricardo Barros. Logo que tomou posse, avisou que não vai controlar a qualidade dos planos, em matéria publicada pelo Estadão:
O ministro da Saúde, Ricardo Barros, disse que não irá controlar a qualidade dos serviços de planos de saúde ofertados para os usuários. “Ninguém é obrigado a contratar plano. Não cabe ao ministério controlar isso”, afirmou ao Estado. Embora não esteja preocupado com a qualidade, Barros já avisou que quer quantidade. Nos últimos dias ele vem repetindo a máxima de que, “quantos mais planos, melhor.” No raciocínio do ministro, engenheiro e deputado federal licenciado, quanto mais pessoas estiverem na saúde suplementar, mais recursos sobram para custear o Sistema Único de Saúde.
Por sinal, este foi um um dos assuntos tratados em reunião realizada em 25 de maio, em Brasília, e que o Viomundo denunciou em primeira mão. Foi do ministro Ricardo Barros com entidades médicas e grupos anti-SUS e que apoiaram a derrubada da presidenta Dilma.
Lígia Formenti, em reportagem publicada pelo Estadão em 26 de maio, dá detalhes:
BRASÍLIA – O ministro de Saúde, Ricardo Barros, reuniu-se nesta quarta-feira, 25, em Brasília com grupo que defende a redução do poder de fiscalização da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
(…)
O fato de se dispor a discutir o tema foi considerado por especialistas como um claro indicativo de que Barros não é totalmente avesso à proposta de reduzir a atuação da ANS, sob a justificativa de se combater a “burocracia”.
(…)
Observadores afirmam, no entanto, que a estratégia de se ampliar os planos de saúde esbarra em um problema: a regulamentação da ANS. A expansão somente se daria se houvesse uma oferta de planos de menor valor. Algo difícil, diante da obrigação, imposta pela ANS, de que operadoras ofertem um cardápio mínimo de procedimentos e exames.
“Reduzir as exigências seria muito impopular”, afirma um integrante do ministério, sob condição de anonimato. “A alternativa mais fácil é limitar a fiscalização. Com isso, há um espaço maior para que regras sejam desrespeitadas pelas operadoras. Elas estariam apenas no papel.”
Verdadeiras sinfonias para os ouvidos das operadoras de planos privados de saúde.
O fato é que esse histórico deve ter estimulado as operadoras a levarem adiante a sua mais nova ofensiva: a proposta, tratada na reunião de 3 de junho, de a ANS e o Ministério da Saúde de apoiarem os Núcleos para subsidiar juízes nas decisões sobre planos de saúde.
Trocando em miúdos, o objetivo da tal reunião é óbvio: combater as ações judiciais, com o beneplácito da ANS e do Ministério da Saúde.
ANS CAPTURADA PELOS PLANOS; É COMO COLOCAR RAPOSA PARA TOMAR CONTA DO GALINHEIRO
Em se tratando de ANS, não é novidade. Por conta da sua atuação frouxa e perniciosa, os planos privados deitam e rolam sobre os usuários, já denunciaram aqui Mário Scheffer e Lígia Bahia.
Há tempos o Viomundo vem denunciando também a captura da ANS pelos planos de saúde e a sua “porta giratória” em favor do mercado.
Seus cargos de direção são geralmente ocupados por executivos que atuavam no mercado de planos. Depois, quando eles deixam a ANS, muitas vezes voltam para essas mesmas empresas.
Isso vem desde a época em que o tucano José Serra era ministro da Saúde (1998-2002) e nomeou Solange Beatriz Palheiro Mendes, como diretora da agência (2000 a 2004).
Com passagem pela Superintendência de Seguros Privados (Susep), Solange, depois que saiu da ANS, foi diretora de Saúde (2006 a 2010) da Federação Nacional de Empresas de Seguros Privados e Capitalização (Fenaseg). Atualmente, é presidente da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), que reúne os maiores grupos de planos privados.
Mas o exemplo mais emblemático é o de Maurício Ceschin, até duas semanas atrás diretor-presidente da Qualicorp, empresa que já havia presidido de novembro de 2008 a fevereiro de 2009. Entre a primeira e a segunda passagem pela Qualicorp, ele foi diretor de desenvolvimento setorial da ANS, depois seu diretor-presidente.
É como se colocasse a raposa para tomar conta do galinheiro.
Em julho de 2013, o advogado Elano Rodrigues Figueiredo foi indicado para ser diretor da ANS. Só que ele omitiu no currículo enviado à presidenta Dilma Rousseff e na sabatina no Senado uma informação crucial: era ex-funcionário de planos de saúde.
O Idec, apoiado pelo Centro Brasileiro de Estudos em Saúde (Cebes) e Abrasco, levou o caso à Comissão de Ética Pública da Presidência da República.
O relator foi o advogado Mauro de Azevedo Menezes. Em seu voto, seguido pelos demais membros da Comissão, recomendou a Dilma a destituição de Elano devido “à existência de graves e reiteradas violações éticas.”
“Foi o único que as entidades de saúde coletiva e de defesa do consumidor conseguiram barrar”, relembra Scheffer.
ABRAHÃO FOI INDICADO POR PLANOS E PMDB; É CITADO NA DELAÇÃO DE DELCÍDIO
O médico José Carlos de Souza Abrahão é o atual diretor-presidente da ANS. Tomou posse em janeiro de 2015.
De 2003 a abril de 2014, ele presidiu a Confederação Nacional de Saúde Hospitais, Estabelecimentos e Serviços (CNS), entidade sindical que representa estabelecimentos de serviços de saúde no País, entre os quais as operadoras de planos de saúde.
Publicamente, se manifestou várias vezes contra o ressarcimento do SUS pelos planos, inclusive em artigo na Folha de S. Paulo, que ele se “esqueceu” de incluir na lista de publicações informadas ao Senado em seu currículo, antes de ser sabatinado.
Idec, Cebes, Abrasco e Abres (Associação Brasileira de Economia da Saúde) denunciaram a indicação, repudiada também pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS).
Mesmo assim, foi mantido o nome de Abrahão, uma indicação da dobradinha planos de saúde-PMDB no Senado.
“Que o Abrahão tinha o apoio dos planos de saúde, nós já sabíamos pela história profissional dele e posições da CNS, que ele presidia”, observa Scheffer. “A novidade foi o apoio dos pesos-pesados do PMDB do Senado, que só ficamos sabendo através da delação premiada do ex-senador Delcídio Amaral.”
Delcídio faz menção explícita aos senadores Eunício Oliveira, Renan Calheiros e Romero Jucá e ao próprio Abrahão, “apadrinhado do PMDB do Senado, para o cargo de Diretor-Presidente da Agência Nacional de Saúde”.
Há cinco trechos em que os planos de saúde e a ANS são mencionados. Destacamos três:
Anexo 9 – Página 74
delação 1-002
Anexo 28 – Página 107
delação 2-001
Anexo 28 – Página 177
delação 3
‘ANS, BARROS E PLANOS QUEREM DERRUBAR TENDÊNCIA DE TRIBUNAIS CONTRA ABUSOS’
Conclusão: o movimento da ANS-Ricardo Barros está cheirando muito mal.
“No caso dos planos de saúde, o motivo não é a falta de diretrizes clínicas baseadas em evidências, não são tratamentos experimentais, como dá a entender o secretário-geral da ANS na nota divulgada no portal da agência”, avisa Scheffer. “Também não é a ausência de conhecimento técnico dos juízes que gera tantas ações judiciais.”
Os dados de suas pesquisas, apresentados no início desta reportagem, mostram claramente que as ações judiciais não têm nada a ver com os motivos discutidos nessa reunião.
“São as práticas abusivas dos planos, as brechas da regulamentação e a ação frouxa da ANS na fiscalização que levaram a essa situação litigiosa”, frisa.
Tanto que mais de 90% das ações no Estado de São Paulo, num universo de mais de 4.000 estudadas, deram ganho de causa ao paciente.
ANS tabela 3-001
Há uma forte jurisprudência a favor do consumidor de planos de saúde. De cada dez ações, nove dão ganho de causa ao paciente.
Desde 2013, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) tem 12 súmulas orientadoras para os juízes, que já decidem, de cara, a favor do usuário, em situações de cobertura assistencial, contratos coletivos, reajuste, rescisão unilateral.
Por exemplo, muitos juízes entendem hoje que os planos de saúde devem cobrir mesmo casos não previstos no Rol de Procedimentos da ANS, sempre defasado.
Ou seja, o TJ-SP tem até súmulas que garantem a jurisprudência.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) também publicou súmulas em que manda aplicar o Código de Defesa do Consumidor nas ações contra planos.
“É justamente essa tendência consolidada dos tribunais contrária aos abusos dos planos que a ANS, que o ministro Ricardo Barros, a ANS e as operadoras parecem querer derrubar”, alerta Mário Scheffer.
Recorrer à Justiça é a última garantia do cidadão lesado pelo plano de saúde, depois de não ter a denúncia resolvida pela ANS ou pelos Procons. Isso é um direito. Não pode ser visto pela ANS como mero problema a ser combatido.
Leia também:
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terça-feira, 21 de outubro de 2014

Estelionato eleitoral: IDEC acusa Sabesp de sonegar informações ao consumidor


O processo eleitoral de 2014 deixará um saldo trágico para o povo paulista. Vão-se as eleições e fica uma crise de abastecimento de água que poderia ter sido mitigada se o governo do Estado, através da companhia estatal de Saneamento Básico e distribuição de água, a Sabesp, tivesse adotado racionamento e penalização ao desperdício.
Com os olhos postos no período eleitoral, porém, o governador Geraldo Alckmin vem postergando medidas que poderiam causar desconforto agora, mas que evitariam desconforto ainda maior no futuro próximo. Ou seja: passadas as eleições.
Quando começou a se agravar a situação do aquífero Cantareira, porém, o governador paulista continuou negando a necessidade de racionamento, como vinha fazendo desde o ano passado.


Desde então, a situação se agravou sobremaneira. Em julho de 2014, o volume útil do Cantareira, que atende 8,8 milhões de pessoas na Grande SP, esgotou-se. Com o esvaziamento do reservatório e as previsões pessimistas de falta de chuva, São Paulo se afogou na maior crise hídrica dos últimos 80 anos.
O primeiro sinal de problemas surgiu em 2004. Foi nesse ano que a Sabesp conseguiu renovar concessão para administrar a água em São Paulo. A estrutura dos reservatórios já era considerada insuficiente para dar conta da demanda. Ali, na renovação da licença da Sabesp, houve consenso de que seria preciso realizar obras para aumentar a capacidade de armazenamento de água.
De acordo com os planos da Sabesp, a cidade de São Paulo ficaria bastante dependente do Sistema Cantareira, o que era preocupante. Se a água dos tanques do sistema acabasse, seria o caos. E foi.
Não dá para o governo paulista dizer que “não sabia”, portanto. Até por conta disso, Alckmin começou, lá atrás, a fazer obras para garantir por mais alguns meses o abastecimento. Ou seja: o suficiente para que a água não acabasse nas torneiras dos paulistas em pleno período eleitoral, quando o tucano teria que disputar seu cargo com a oposição.
Vendo o estelionato eleitoral em curso, o Ministério Público do Estado (MPE) abriu dois inquéritos para questionar o uso do “volume morto” do Cantareira. De acordo com o promotor de Justiça Ivan Caneiro Castanheiro, do Grupo de Atuação Especial de Defesa do Meio Ambiente (Gaema), professores da Unesp e Unimep concordam em dizer que o uso é temerário.
Os males que a água do Cantareira pode provocar vão desde doenças na tireoide, fígado e rins até o Mal de Parkinson. Para o promotor, o risco está principalmente no interior do Estado, onde há menos recursos para tratar a água de forma adequada.
Ainda assim, as autoridades paulistas não quiseram conversa. Em maio, quando São Paulo ainda não estava explorando o “volume morto” do Cantareira, a crise iminente requeria um racionamento brando. Com uma interrupção do abastecimento por semana em cada região da capital paulista, a economia seria brutal e o incômodo seria contornável.
Contudo, o governo do Estado decidiu gastar OITENTA MILHÕES DE REAIS para não ter que adotar medida sem custo que poderia evitar que os paulistanos tivessem que usar as águas poluídas do “volume morto” do reservatório exaurido.
O que chega a ser cômico, se não fosse trágico, é que o governador tucano ainda fez inauguração dos milhões que estava literalmente atirando no esgoto.
Confira, abaixo, matéria do portal IG publicada em 5 de maio deste ano.
Por iG São Paulo | 15/05/2014 17:28 – Atualizada às 15/05/2014 17:39
Texto
Orçada em R$ 80 milhões pela Sabesp, obra deve garantir o abastecimento de quase 10 milhões de pessoas até novembro
O governador do Estado de São Paulo, Geraldo Alckmin, inaugurou a primeira obra para captar água do chamado volume morto concentrado na represa Jaguari/Jacareí, em Joanópolis, na manhã desta quinta-feira (15). A barragem, que inicia o processo para evitar a falta d´água para quase 10 milhões de pessoas na Grande São Paulo e em outras cidades do interior paulista em 2014, é a de estado mais crítico do Sistema Cantareira, com menos de 2% de volume útil disponível.
O início do processo de captação se deu com gesto simbólico de Alckmin, que acionou o mecanismo responsável por bombear a água da reserva técnica para levá-la à estação de tratamento de Guaraú, responsável pelo tratamento do sistema.
Em discurso, ele exaltou a qualidade da água do volume morto, aquela localizada sob o nível de captação das comportas das represas, cujo uso é visto com ressalvas por especialistas devido à necessidade de maior cuidado em seu tratamento: “É uma água totalmente testada e aprovada pela Cetesb (Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambienta), igual as demais águas.”
A obra, orçada pela Companhia de Saneamento do Estado de São Paulo (Sabesp) em R$ 80 milhões, prevê a retirada de 182,5 bilhões de litros de água do volume morto das represas do Cantareira, pouco menos da metade do total disponível sob as barragens – 400 bilhões de litros. Destes, cerca de 133 bilhões de litros devem ser usados até o final de novembro, mês em que historicamente volta a chover consideravelmente na região. 
A Associação Nacional das Águas (ANA, responsável por regular o volume do sistema junto ao DEAA) não descarta diminuir a distribuição à população atendida pelo sistema, já que pode haver déficit de 10 m3/s de água principalmente durante os meses em que chove menos na região das represas, em agosto e setembro. A Sabesp e Governo do Estado, no entanto, seguem negando essa possibilidade.
[...] 
Trata-se de dinheiro jogado fora. E que ainda tem cerimônia de inauguração. Será que a “inauguração do volume morto” teve banda de música e fogos de artifício?
Solução muito mais barata para o povo paulista seria racionar e penalizar o desperdício. Sobretudo penalizar o desperdício, que há muito em São Paulo. É o que mostra reportagem da Folha de São Paulo divulgada no último final de semana.


Combater o desperdício e interromper o abastecimento evitaria milhões jogados no esgoto e um racionamento velado e pouco eficiente – por velado – que tem sido feito. Alckmin poderia ter feito como na Califórnia (Estados Unidos), que vive crise de água parecida com a de São Paulo.
Como por lá, nos EUA, estelionato eleitoral não costuma dar tão certo quanto em São Paulo, o governo californiano declarou estado de emergência e começou a tomar medidas para preservar os recursos e evitar desperdício.
A Califórnia entrou em um regime de racionamento de água parecido com o de energia que o Brasil viveu em 2001. Quem fosse flagrado desperdiçando água, como no condomínio de Alckmin, recebia multa de 500 dólares.
Aliás, desde abril deste ano só a cidade californiana de Santa Bárbara já arrecadou mais de 1 milhão de dólares em multas. E é possível aos cidadãos acessarem informações sobre desperdício de água e conferir o nível dos reservatórios em tempo real.
O mais incrível é que a previsão para o fim da água por lá vai de um ano a um ano e meio. Um horizonte de exaustão da reserva aquífera bem mais distante que o daqui, aliás.
Além de todas as barbeiragens tucanas em São Paulo, há uma outra diferença para o que faz o governo californiano, que disponibiliza informações precisas aos cidadãos. No Tucanistão (São Paulo), em vez de informar a população o governo do Estado esconde informações.
Não é por outra razão que, agora, o IDEC acaba de denunciar a Sabesp ao Ministério Público do Estado de São Paulo e ao Procon-SP. O Instituto de Defesa do Consumidor acusa a Sabesp de não estar dando informações ao consumidor sobre a situação do abastecimento.
Confira, abaixo, matéria publicada no portal do IDEC na última segunda-feira.
20/10/2014
Expectativa é ter acesso ao mapa de redução de pressão noturna de água e mais informações para disponibilizar ao cidadão a situação real do abastecimento
O Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) envia hoje, 20/10, uma representação ao Ministério Público e um ofício ao Procon de São Paulo contra a Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo). Com essa iniciativa, o Instituto espera que o MP determine para a Sabesp a divulgação do mapa de diminuição de pressão noturna. A Sabesp tinha prazo legal até 19/10 para enviar o mapa ao Idec. Entretanto, o Instituto não recebeu o material. A iniciativa do Idec tem como base o Código de Defesa do Consumidor (Lei n° 8.078/90) e a Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/2011), que regulamenta o direito de acesso a dados públicos. No documento do Idec ao MP e Procon-SP, o instituto vem “requerer as providências cabíveis diante da omissão de informação relevante ao cidadão paulistano em relação à atual crise do serviço de abastecimento de água (…)”.
Para Elici Maria Checchin Bueno, coordenadora-executiva do Idec, além dessas iniciativas adotadas, há necessidade da sociedade civil encontrar alternativas a curto, médio e logo prazo para interferir na construção de um cenário de sustentabilidade. “Tanto fornecedores quanto consumidores devem atuar no sentido da mudança de atitude e refletir sobre como criar opções que propiciem o consumo sustentável. Os órgãos responsáveis pelo sistema de abastecimento precisam alavancar um comportamento de cidadania por meio das informações que possuem. É tratar o consumidor com o respeito que ele merece. Não é mais questão de ‘dicas contra desperdício’, pois estamos diante de uma crise hídrica”, enfatiza Elici Bueno.
O envio das cartas ao MP e ao Procon-SP é mais um passo do Idec no sentido de ter uma posição da Sabesp sobre o assunto. No dia 8/09, o Idec havia formalizado um pedido de informação à empresa, requisitando o mapa de diminuição de pressão noturna de água. A redução da pressão é realizada pela Sabesp no contexto da crise de abastecimento. A concessionária estadual nega que haja qualquer tipo de racionamento, isto é, corte de fornecimento de água, e também alega que a diminuição da pressão não traz consequências aos consumidores, mas não é o que se vê na prática. A Sabesp não atendeu à solicitação do instituto.
O acesso a este mapa e sua divulgação contribuiriam para sinalizar aos consumidores os locais onde a diminuição da pressão pode causar eventual falta de água. “Não admitir oficialmente o racionamento impede, inclusive, que medidas para punir desperdício de água sejam aplicadas”, argumenta Carlos Thadeu de Oliveira, gerente técnico do Idec.
Entenda o caso
A Lei de Acesso à Informação prevê que a solicitação de acesso à informação deveria ser respondida em até 20 (vinte) dias, prazo que terminou em 27/09. Contudo, na véspera dessa data, o Sistema de Informações ao Cidadão do Governo do Estado de São Paulo (SIC.SP) enviou resposta com o comunicado de que o prazo de resposta seria prorrogado por mais 10 dias, conforme permitido na legislação. A Sabesp teve até 7/10 para dar a resposta, o que não ocorreu.
Vale lembrar que o mesmo pedido de informações já havia sido feito em reunião presencial que o Idec teve com a Sabesp, na sede do instituto, em 29/08, quando o diretor Paulo Massato e a gerente de departamento Samanta Oliveira se comprometeram a levar a demanda à presidência da companhia.
“Não entendemos que a informação seja de difícil elaboração por parte da Sabesp, uma vez que na reunião que tivemos aqui nos foi dito que a empresa tem dados do perfil diário de consumo de cada microrregião da cidade, inclusive com a variação do consumo de hora em hora, e que as válvulas de redução de pressão estão ligadas a um sistema informatizado e automatizado”, afirma Carlos Thadeu.
A atuação do Idec nesta crise de água teve início quando o Governo do Estado de São Paulo anunciou, em 21/04, que a partir de maio, os consumidores que elevassem seu consumo de água acima da média poderiam ser multados entre 30% e 35%.
O Idec entendeu que tal medida era abusiva e, portanto, ilegal, primeiramente porque contraria o CDC (Código de Defesa do Consumidor) em seu artigo 39: “É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: (…) inciso X – elevar sem justa causa o preço de produtos ou serviços”. Na medida anunciada pelo governo não estava caracterizada a “justa causa”, já que para tanto seria necessária a declaração da situação de racionamento, o que não havia sido feito.
Após o Instituto apontar a ilegalidade da cobrança de multa para os consumidores, o governo estadual voltou atrás dessa proposta. Em seguida, em 29/07, o Idec enviou uma carta para a Arsesp (Agência Reguladora de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo), para o governador do Estado de São Paulo e para a Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo), com dados dos relatos de falta de água recebidos em sua campanha “Tô sem água”. A campanha, que ainda está no ar, tem a finalidade de mapear as localidades que estão sofrendo com esse fato.

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Câmara retoma polêmico 'AI-5 digital': direitos ou punições primeiro?


Numa tensa audiência pública, três comissões da Câmara dos Deputados debatem projeto que tenta transformar em crime atos praticados na internet. Batizada de 'AI-5 digital' ao ser aprovada no Senado, em 2008, proposta é polêmica e tem poucas chances de consenso. Para defensores de que internet é espaço livre, Congresso deveria aprovar antes um 'marco civil' que garanta os direitos dos usuários. Governo concorda, mas enfrenta impaciência do relator, Eduardo Azeredo (PSDB-MG).

BRASÍLIA – A proposta de tornar crimes previstos em lei, com punições bem definidas, certos atos praticados na internet voltou a esquentar o Congresso. Três anos depois de o Senado ter aprovado a tipificação de crimes cibernéticos, batizada de AI-5 digital, alguns deputados lutam para votá-la pela última vez em agosto, na volta do recesso parlamentar.

O projeto foi debatido nesta quarta-feira (13/07) por três comissões da Câmara, numa audiência pública tensa. Ficou claro que a chance de consenso é nula. De um lado, com apoio do governo, há os defensores de que primeiro uma lei estabeleça os direitos do usuário de internet. De outro, os que querem punições já.

Para o primeiro grupo, criminalizar atos e práticas na internet seria um atentado contra a liberdade de expressão e um espaço que é anárquico por natureza e que retira daí sua criatividade. “A liberdade na internet é que permitiu uma produção de conteúdo e de diversidade cultural jamais vistos”, disse Sérgio Amadeu, ex-presidente do Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI).

A criminalização também prejudicaria os usuários enquanto consumidores, na avaliação do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC). Segundo Guilherme Varela, representante do IDEC no debate, a internet é uma ferramenta que faz intermediação de relações de consumo e que garante “protagonismo” e “privacidade” ao consumidor, sempre a parte mais fraca. “O consumidor não precisa de uma lei de crimes cibernéticos, precisa antes de uma lei de direitos e de proteção de dados”, afirmou.

A “lei de direitos” a que se referiu Varela é conhecida como “marco civil” e está sendo preparada pelo governo. O marco civil, na visão de seus defensores e do governo, é necessário para assegurar tudo o que os internautas podem fazer e como eles se protegeriam de provedores e servidores, por exemplo. “Deveríamos começar com a delimitação de direitos e deveres. Só depois, identificar violações e, se houver, tipificar como crime”, disse na audiência Demi Getschko, do Comitê Gestor da Internet (CGI).

Para ele, a tecnologia poderia ajudar a resolver problemas que ela mesmo cria e que estão na mira de punições. É o caso de invasão de sites por hackers.

O diretor-presidente do Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro), Marcos Vinícius Mazoni, concorda que a habilidade tecnológica é suficiente para evitar crimes. “Não temos nenhum site operado pelo Serpro invadido. As invasões citadas pela mídia não foram verdadeiras”, disse Manzoni, em referência a recentes ataques sofridos por sites oficiais que são administrados pelo Serpro.

Os ataques foram citados na audiência pública como fatos que exigiriam uma lei a tipificá-los como crimes.

Integrante da primeira Promotoria Pública do Brasil dedicada a cibercrimes, criada em 2008 em Minas Gerais, a promotora Vanessa Fusco disse que metade dos casos que lhe chegam têm de ser arquivados por falta de uma lei que sustente uma acusação perante a Justiça. A invasão das contas correntes das pessoas que usam banco pela internet cairia nesta situação, por exemplo. “Há uma dificuldade imensa dos promotores de Justiça hoje”, afirmou.

Advogada especializada em casos cibernéticos, Patricia Peck Pinheiro expressou a mesma opinião no debate. “Hoje estamos protegendo criminosos no Brasil”, declarou.

Relator do projeto na Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara, uma das promotoras da audiência pública e cujos membros fizeram um acordo para votar o projeto em agosto, Eduardo Azeredo (PSDB-MG) é mais sensível aos argumentos dos defensores da criminalização. Até por ter sido, três anos atrás, relator do projeto no Senado – foi senador até 2010. “Não dá mais para o país ficar omisso. E há omissão do governo federal, com a demora no envio do marco civil”, disse.

Segundo Carta Maior apurou, a proposta de marco civil já foi encaminhada pelo ministério da Justiça e está no Palácio do Planalto para ser submetida à presidenta Dilma Rousseff. Mas não há prazo para que isso aconteça.

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