Lida a mensagem presidencial propondo o plebiscito, a impressão que fica é a de que a Presidenta Dilma quer ir à luta, mas seu Governo prefere um bom conchavo, que faça as coisas “esfriarem” e ir “gastando o tempo” para o final de um jogo que acham que está ganho.
Quem gosta de futebol, sabe o que isso acaba por ocasionar, não é?
Quem olha a política no campo popular, também, porque “os brancos” se entendem e a política fica sendo o que as elites decidem que seja.
O resultado que isso dá está na rua, para quem quiser ver.
Digo que o Governo não quer deixar Dilma falar, porque tudo parece estar sendo dirigido assim. Faz lembrar o Marshall McLuhan, o teórico da comunicação que tornou famosa a tese de que “o meio é a mensagem”, afirmando que a forma do discurso, em lugar de mero veículo de transmissão da mensagem, é um elemento determinante do conteúdo (e seu efeito) da comunicação.
Até mesmo o que ela diz na mensagem às duas Casas do Congresso, para ser lido, depende de “transcrição” da mídia, como faz a Folha: a Presidenta “fala” um parágrafo, o jornal, outro.
Se Dilma não for à TV, falar ao povo, vai continuar “em pdf“, como sua estrutura de comunicação a colocou.
E o que diz a Presidenta, quase desaparecida em meio às imagens e salamaleques das figuras da foto (que vale por mil palavras)?Não resisto a colocar outra semelhante, para que a gente sinta mesmo como será (ou seria) uma reforma política na mãos dessa gente.
Bem, primeiro é preciso vencer a dificuldade de que o texto dela só está disponível, na íntegra, no PDF da Câmara, legível apenas como imagem, que coloquei no post anterior.
Feito isso, a mensagem se inicia com uma avaliação das manifestações de rua, com a Presidenta apoiando as reivindicações de melhores serviços de transporte, saúde, educação, mais combate à corrupção e mudança na representação política.
E diz que a reforma política “é imprescidível” e que o plebiscito é a consulta popular “recomendável quando as formas de representação política dão sinais de que precisam ser renovadas”.
Ataca a ideia de fazer isso por referendo em lugar de plebiscito: “ A simples manifestação de concordância ou discordância popular com um modelo já predefinido pode afastar a sociedade da ampla discussão dos alicerces e princípios que deverão orientar a renovação do sistema de representação política”.
Repele a afirmação de Aécio Neves e outros tucanos de que o plebiscito “é uma construção muito complexa”: “”Argumentos que buscam imputar ao povo a uma impossibilidade de compreensão da melhor forma de representação não podem prevalecer em um estado democrático de direito como o nosso”.
E elenca os pontos que quer ver no plebiscito:
- “a forma de financiamento das campanhas eleitorais, de modo a permitir uma avaliação do modelo atual que o povo possa comparar suas vantagens e desvantagens com relação ao financiamento exclusivamente público, que o povo possa fazer comparação semelhante com o modelo misto, em que os candidatos recebem recursos públicos e recursos de fontes privadas, com ou sem restrições”;
- “ a definição do sistema eleitoral, em que se faça uma opção entre o sistema proporcional como é voto majoritário para a eleição de parlamentares, o voto em lista fechada ou flexível ou então o voto em dois turnos como propõem entidades da sociedade civil”;
- “a continuidade ou não da existência de suplência nas eleições para o Senado Federal”;
- “a manutenção ou não da existência de coligação partidárias para a eleição de deputados e vereadores”;
- “o fim ou não do voto secreto no parlamento”.
A mensagem termina com um “recado” aos presidentes da Câmara e do Senado: “Aproveito para informar a Vossa Excelência que formulei consulta à Presidenta do Tribunal Superior Eleitoral sobre prazos e procedimentos para a realização do plebiscito aqui proposto”.
Bom, terminada a proeza de ler, sem intermediários o que a Presidenta disse – a Helena Chagas não deve ter datilógrafo na Secom, mas a gentejá cola o texto aqui ao final, com nossos cumprimentos a Secom – o que fica é: o plebiscito é o debate público, mais do que o que o Congresso vá fazer.
Porque o Congresso não fará nada se não houver pressão política, como nunca fez.
Ou, se fizer algo, fará o nada, que é sua mais frequente obra.
A mensagem
“Sr. Presidente,
Nas últimas semanas, milhões de brasileiros e brasileiras, em particular os jovens, saíam as ruas reivindicando a melhoria dos serviços públicos, do transporte urbano, na saúda, na Educação, no combate à corrupção e mudanças no sistema de representação política.
As manifestações demonstraram, de forma inequívoca, a força e o caráter irreversível do processo de consolidação de uma democracia participativa em nosso país.
Assinalaram também que, apesar de termos vivido um período inédito de crescimento econômico com inclusão social nos últimos 10 anos, nossa sociedade exige hoje novas formas de atuação dos poderes do Estado, em todos os níveis federativos, seja para a satisfação e ampliação de direitos individuais e coletivos, seja para garantir plena cidadania a todos.
Cabe às instituições representativas não só comemorar mais esse avanço democrático, mas também dar adequada resposta à voz das ruas, buscando o diálogo e a celebração de pactos que possibilitem a construção de caminhos para o atendimento das demandas apresentadas.
Foi com esse objetivo que iniciamos um processo de diálogo com os chefes dos demais poderes, com governadores, prefeitos e representantes dos mais diversos segmentos da sociedade civil. Como decorrência desse processo, um amplo entendimento foi esboçado entre os entes federativos, permitindo a conjugação de esforços para o enfrentamento dos graves problemas existentes nas áreas da mobilidade urbana, da Saúde e da Educação.
É nessa mesma perspectiva que julgamos imprescindível um amplo e imediato esforço conjunto para renovação do sistema político brasileiro. Muito empenho já houve par que esse sistema fosse reformulado. Mas, até o momento, todos os esforços, lamentavelmente, não produziram resultados significativos.
Por isso, considerando a necessidade de fortalecer o nosso sistema político, sugerimos à vossa Excelência que submeta ao Congresso Nacional a realização de uma consulta popular, na forma de Plebiscito, para que o povo se pronuncie sobre as linhas mestras que devem balizar a Reforma Política que o país tanto necessita.
A consulta popular é recomendável quando as formas de representação política dão sinais de que precisam ser renovadas.
A adoção de forma plebiscitária para essa consulta popular nos parece a melhor dentre as alternativas admitidas pela constituição. A simples manifestação de concordância ou discordância popular com modelo já pré-definido pode afastar a sociedade da ampla discussão dos alicerces e princípios que deverão orientar a renovação do sistema de representação política.
Argumentos que buscam imputar ao povo uma impossibilidade de compreensão da melhor forma de representação não podem prevalecer em um estado democrático de Direito como o nosso. Do mesmo modo, é importante observar a realização de uma consulta plebiscitária em nada colide ou inviabiliza a iniciativa popular de projetos de lei que tenham por objetivo a reforma do nosso sistema político, como vem sendo realizada por diversas entidades da sociedade civil.
Apesar de garantidas no texto da Constituição de 1988, temos utilizado muito pouco as medidas democráticas que permitem a manifestação direta da vontade popular.
Finalmente, julgo oportuno ponderar à Vossa Excelência que a realização de um Plebiscito nos termos propostos deveria singir-se a questões que definam aspectos centrais do futuro modelo de representação política a ser elaborado pelo Congresso Nacional.
A nosso ver, ao lado de outros ítens que poderão vir a se oportunamente apontados por deputados e Senadores, em princípio, merecem ser considerados alguns pontos de fundamental importância:
A) A forma de financiamento das campanhas eleitorais, de modo a permitir uma avaliação do modelo atual. Que o povo possa comparar suas vantagens e desvantagens com relação ao financiamento exclusivamente público. Que o povo possa fazer comparação semelhante com modelo nisto, em que os candidatos recebem recursos públicos e recursos de fontes privadas, com ou sem restrições;
B) A definição do sistema eleitoral, em que se faz como opção entre o sistema proporcional como é hoje, o voto distrital puro ou misto, o voto majoritário para a eleição de parlamentares, o voto em lista fechado ou flexível, ou, então, o voto em dois turnos como propõem entidades da sociedade civil;
C)A continuidade ou não da existência de suplência nas eleições para o Senado Federal;
D) A manutenção ou não da existência de coligações partidárias para a eleição de deputados e vereadores;
E) O fim ou não do voto secreto no Parlamento.
São estas, Sr. Presidente, as sugestões que coloco à alta apreciação de Vossa Excelência e do Congresso Nacional para serem levadas à Consideração popular, se o Legislativo decidir-se pelo Plebiscito.
Aproveito para informar à Vossa Excelência que formulei consulta à presidente do Tribunal Superior Eleitoral sobre prazos e procedimentos para a realização do Plebiscito aqui proposto.
Reitero à Vossa Excelência meus protestos de elevada estima e consideração”.
(assinado) Dilma Roussef
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