Mente vazia, oficina do sistema da mídia golpista

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terça-feira, 16 de agosto de 2016

Aristocracia de toga

 Pedro Maciel

A ministra Cármen Lúcia, futura presidente do STF, não pode ser lembrada apenas pela sua malcriação recente, pois ela é uma pessoa de idéias interessantes.
Ela já falou sobre a pertinência de um mandato para os ministros da mais alta corte de Justiça do País, com tempo de permanência: nove a 12 anos, talvez ela, como eu, veja que há uma triste e indesejada relação entre a aristocracia e o Poder Judiciário no Brasil.

Isso mesmo. Penso que tanto o Poder Judiciário, quanto outras carreiras de Estado estão contaminados por uma cultura aristocrática de privilégios.

Dos três poderes clássicos do Estado Democrático de Direito apenas o Judiciário não é essencialmente democrático, já que não é submetido ao escrutínio do "demos" (povo) na definição de seu acesso, composição, promoção e acesso às funções de direção dos tribunais, e em pleno século XXI merece reflexão.

E por que não é democrático? Porque o acesso dos membros do Poder Judiciário dá-se com fundamento na meritocracia, na medida em que seus membros são escolhidos com base numa demonstração de mérito técnico, ou profissional, mediante concursos públicos; já no Executivo e no Legislativo os detentores do poder decisório principal são políticos eleitos diretamente pelo povo.

Nos cursos de graduação, aprendemos que a jurisdição é prerrogativa dos membros do Poder Judiciário, mas a hiperconcentração de poder e legitimidade no Poder Judiciário, e mais recentemente no Ministério Público, esvazia os demais Poderes, esvazia o necessário movimento e envolvimento da sociedade civil nas questões políticas e cidadãs.

Um exemplo disso são as decisões que interferem nos orçamentos municipal, estadual e federal, ou seja, decisões monocráticas que alteram leis e políticas públicas de cujo processo construtivo o Judiciário sequer não participou, como escrevi recentemente.

E recupero o conceito também porque acredito que o centro de gravidade do desenvolvimento jurídico não está propriamente na legislação, na burocracia, na ciência do direito ou na jurisprudência, mas na sociedade mesma.

Há na sociedade, entre a ação humana e as estruturas sociais,  uma tensão contínua, pois na primeira a diversidade se contrapõe à unidade da segunda. E as estruturas e instituições nada mais são que artefatos humanos cabendo ao Direito harmonizar a tensão entre ação humana e estruturas sociais, assim como compatibilizar diversidade e unidade. Tanto isso é verdade que podemos afirmar que as estruturas e instituições transformam-se continuamente.

A doutrina faz uma distinção entre agentes públicos e agentes políticos, sendo que os agentes políticos seriam "... os titulares de cargos estruturais à organização política do País, ou seja, ocupantes dos que integram o arcabouço constitucional do Estado, o esquema fundamental do Poder. Daí que se constituem nos formadores da vontade superior do Estado. São agentes políticos apenas o presidente, governadores, prefeitos e respectivos vices, os auxiliares imediatos dos chefes do Executivo, isto é, ministros e secretários das diversas pastas, bem como os senadores, deputados federais e estaduais e vereadores. O vínculo que tais agentes entretêm com o Estado não é de natureza profissional, mas de natureza política. Exercem um múnus público?"
Contudo, a reflexão necessária é a seguinte: sendo os juízes, órgãos do Poder Judiciário ou titulares de cargos estruturais à organização política do País, não deveriam ser tratados como agentes políticos? E os cargos de direção dos diversos tribunais não deveriam ser ocupados através de eleição direta, com participação popular efetiva?

Como escrevi acima penso que há um viés aristocrático na forma de acesso dos juízes à carreira, mas esse não é o maior problema. Acredito que as promoções de juiz substituto para juiz titular de 1ª, 2ª, 3ª entrâncias e entrância especial e depois para desembargador poderiam ocorrer através de outros concursos públicos ou através de eleições. Porque a função jurisdicional torna os magistrados verdadeiros agentes políticos, são profissionais que carregam grande responsabilidade, suas decisões são capazes de influenciar no destino da sociedade à qual eles que devem servir e que os legitima. Não são os magistrados agentes públicos comuns, essa é mais uma razão para, através de Emenda Constitucional, ser revista a forma de promoção e de acesso aos cargos de direção do Poder Judiciário.

Não sendo realizado esse debate estaremos apenas reproduzindo a lógica aristocrática de natureza essencialmente elitista. Acredito na Democracia como um sistema de governo em que o poder de tomar importantes decisões políticas está com os cidadãos, direta ou indiretamente, por meio de representantes eleitos.

Mas e os concursos nesse contexto?

Creio que o acesso de magistrados por concursos não são garantia permanente à sociedade. Afinal, se por um lado os políticos ineficazes ou corruptos são submetidos ao escrutínio popular e podem não voltar a ser eleitos (e hoje existem os controles do Ministério Público, Tribunal de Contas dos Estados e da União. "Ficha Limpa", etc.), por outro os funcionários concursados gozam de estabilidade no emprego, e gozam de vitaliciedade e inamovibilidade, o que os diferencia.

A vitaliciedade e inamovibilidade são condições necessárias ao bom exercício e adequada prestação jurisdicional, pois a sociedade não pode ter juízes receosos de uma eventual demissão, ou de uma transferência involuntária. Contudo, se por um lado tais proteções viabilizam bons julgamentos, por outro criam uma categoria profissional extremamente diferenciada e privilegiada o que pode afastá-la dos anseios sociais. Isto é particularmente grave por se tratar de funcionários do Estado que, diferentemente dos demais burocratas públicos, tomam decisões de especial gravidade para os cidadãos. É necessário pensarmos em anular o caráter aristocrático do Poder Judiciário.

A parte mais simples da solução seria a extinção dos privilégios, como as férias duplas, por exemplo, mas a parte mais complexa é a criação de mecanismos institucionais que torne a magistratura mais adequada ao século XXI e às sociedades democráticas, começando com a existência e manutenção de órgão de controle como o Conselho Nacional de Justiça e com a abertura de um debate amplo sobre formas mais democráticas de promoção e de acesso às funções de direção nos tribunais e quando falo em formas democráticas me refiro a eleições que garantam o respeito à soberania popular.

segunda-feira, 2 de novembro de 2015

PF, MP e Justiça. A classe média deu o Golpe

Lula e Dilma - republicanamente – sempre escolheram (mal) o primeiro da lista tríplice dos procuradores federais.
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Do amigo navegante Marcos Maurilio de Oliveira:
Cada vez eu mais me convenço de que as Instituições do ESTADO estão todas a serviço
das nossas Elites, dos nossos Conservadores e da CASA GRANDE E SENZALA e, por incrível
que possa parecer, contrárias àqueles que sempre lutaram a favor dos pobres e dos menos
favorecidos, pois os acontecimentos vem corroborar essa triste e deprimente situação! Não
há mais como justificar a leniência do PROCURADOR GERAL DA REPÚBLICA - PGR, Rodrigo
Janot, em relação ao MACHÃO DO LEBLON, pois existem provas robustas e consistentes, já
em seu poder, que comprovam que ELE foi o autor intelectual, assim como beneficiário, do esquema de desvio de recursos da Estatal FURNAS!

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

A falsa moralidade de um juiz “coxinha”. O “meritíssimo” debochado tem a quem puxar

juiz
Vocês pensam que, ao escrever aqui, não é forte a tentação de abordar os assuntos que estão em evidência e atraem a atenção?
É, e muito, porque faz parte do próprio senso jornalístico de tratar do que atrai atenção.
Raul Azêdo, um craque do jornalismo popular, ensinava que um Fusca que caísse no Canal do Mangue era mais matéria do que um Boeing que caísse no Japão.
Mas quando se escreve com causa, não para vender, deixo de lado a lição do Azêdo e fico com a que aprendi do velho Briza.
Austeridade, sempre.
A história do juiz “pirado” que postou suas fotos na praia na internet esta semana, dizendo que “não era fácil trabalhar no Brasil”  e que estava “dois anos e três meses sem trabalhar, mais 106 dias de férias que ainda terei que usufruir” era, estava na cara, um picaretagem.
Na qual a mídia embarcou sem qualquer critério.
A gente esperou, para ver qual era essa história.
E era feia, muito feia.
Está forçando a barra para que saia sua aposentadoria por invalidez.
Invalidez que não o impede de circular por “Washington, Orlando e Miami, onde se ocupava de festas e passeios num Mustang preto alugado.”
Vai continuar ganhando R$ 24 mil por mês, escarnecendo do povo brasileiro.
A matéria do Estadão sobre o personagem é risível, tanto pelo que o personagem diz quanto pela comparação absurda que faz o jornalista com Napoleão, sobre quem parece que o conhecimento do repórter se limita a considerá-lo, ao imperador francês, como “louco de hospício”.
Um espetáculo dantesco, que só o corporativismo absurdo do Judiciário mantém sustentado pelo Erário.
A Justiça brasileira, que manda às favas o formalismo para inovar com coisas do tipo do “domínio do fato” para os seus desafetos políticos e totalmente “formal” quando se trata de assegurar privilégios aos  da “tchurma”.
Manda pagar super-salários aos servidores do Legislativo, manda soltar um médico estuprador porque é da “society” e acha que é irrelevante seu chefe maior forjar uma empresa em seu apartamento funcional para evitar impostos na compra de um apartamento em Miami.
O meritíssimo pateta das fotos merece suporte psiquiátrico e a compaixão, mas não a vida nababesca que ele próprio reconhece ser escandalosa.
Mas escandaloso, mesmo, é a condição deprimente a que está sendo conduzido o Judiciário brasileiro, a partir dos exemplos que lhe vem de cima, de sua mais alta Corte, onde o narcisismo, a vaidade, o exibicionismo, a grosseria e, sobretudo, a falta de austeridade vão transformando os que deveriam ser discretos guardiães das leis e da Constituição.
Antes do juiz Marcelo Antonio Cesca, o simpático gordinho da praia, já se firmara uma “jurisprudência” de usar a condição de magistrado para “aparecer”  e tirar disso vantagens pessoais.
Cesca diz que está se preparando para ser candidato a “Presidente Tampinha”, por conta de seu 1,68 metros de altura. Moralmente, já merece o título.
Outros, em instâncias superiores, se preparam para aventuras semelhantes, mais cedo.
Mas com estatura moral idêntica.

sábado, 14 de dezembro de 2013

MÉDICA A MÃE DE PACIENTE: 'MACACA, SUJA, POBRETONA'

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Quem são os médicos de Barbosa que examinaram Genoíno.

Miguel do Rosário
O Cafezinho foi investigar quem são os médicos selecionados por Barbosa para fazer um laudo médico que justifique trazer Genoíno de volta para Papuda. Todos os laudos anteriores indicavam que seria muito mais seguro para Genoíno se tratar em casa. Barbosa não se deu por satisfeito e pediu um último laudo, feito com médicos mais velhos, a maioria professores, acadêmicos, ou empresários da saúde, que aceitaram o jogo de Barbosa e prepararam um documento que prima por ser “contra” o réu.  É a primeira vez que eu vejo uma junta médica agir, deliberadamente, com apavorante frieza, com vistas à sabotar qualquer tratamento à Genoíno. 
Vê-se que Barbosa foi cuidadoso. Depois de trocar o juiz, escolheu cinco médicos perfeitos para executar sua missão. A maioria são médicos já maduros, com longa carreira acadêmica e donos de clínicas particulares. Barbosa não se arriscou com nenhum jovem idealista. Chamou só macaco velho.
Vamos a eles. Os nomes são: Luiz Fernando Junqueira Júnior, Cantídio Lima Vieira, Fernando Antibas Atik, Alexandre Visconti Brick, e Hilda Maria Benevides da Silva de Arruda.
Segue a ficha cada um:

  • Luiz Fernando Junqueira Júnior, professor de cardiologia da Universidade de Brasília e presidente da junta:
Consegui reunir pouco material sobre sua pessoa, mas obtive indícios do ambiente em que vive. Há uma página no Facebook dedicada à turma Luiz Fernando Junqueira Junior – Medicina UNB.
O administrador é Paulo Machado Ribeiro Junior.
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página de Ribeiro Junior é repleta de acusações contra médicos cubanos, ódio contra o PT, festejos pela prisão dos “mensaleiros”.  Essa é a turma do chefe da junta que foi examinar Genoíno.
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Cantídio Lima Vieira, cardiologista e especialista em perícia médica:
Esse aí tem uma história interessante. É um dos “marajás de jaleco” do Senado Federal. Médico do serviço público do Senado, Cantídio Lima Vieira possui clínicas privadas que oferecem serviços aos… senadores. Denúncia da Istoé foi logo abafada.
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Trecho da matéria: “Duas unidades médicas dos funcionários operam no Sudoeste, outro bairro nobre de Brasília. Uma delas pertence ao médico Cantídio Lima Vieira (foto). Ele tem participação em mais quatro clínicas. Duas delas, a Policlínica Planalto e a Cordis são prestadoras de serviço da mesma associação de médicos contratada pelo Senado.”
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Fernando Antibas Atik, especialista em cirurgia cardiovascular:
Fernando Atik tem um Twitter, no qual tem 16 seguidores e segue 33 arrobas. Destas 33, as únicas fontes de informação são Jornal Nacional, Globo, G1, Globonews, CBN, Veja e Conselho Federal de Medicina. Seus últimos 2 tweets aconteceram no dia 16 de novembro, quando respondeu a uma pergunta da Veja a seus leitores:
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Alexandre Visconti Brick, professor de cirurgia cardiovascular:
Esse aí tem um histórico legal. Ganhou o título de cidadão honorário de Brasília por indicação do deputado distrital Junior Brunelli. Brunelli é o deputado da “oração da propina”, religioso exemplar.

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Hilda Maria Benevides da Silva de Arruda é mais nova e tem atuação mais discreta. Como a maior parte dos médicos brasileiros, odeia o programa Mais Médicos. E faz questão de deixar isso bem claro em sua página no Facebook.
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Claro que a suposição de que Barbosa escolheu a dedo médicos com antipatias políticas fortes contra José Genoíno é apenas isso, uma suposição. Entretanto, o laudo médico me parece negligente, porque aponta algumas condições extremamente frágeis do paciente mas conclui que ele pode continuar numa prisão.  Por exemplo, o primeito item da conclusão diz, textualmente, que o paciente deve se submeter a acompanhamento ambulatorial periódico da sua condição pós-cirúrgica.

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A má fé dos médicos aparece latente já no segundo item, onde se nota uma contradição que não pode ser inspirada em outra coisa, a meu ver, senão na maldade. Os médicos concluem que o réu, portador de hipertensão, deve usar medicamento de uso contínuo, e o tratamento deve incluir “dieta hipossódica, restrição de atividade física vigorosa, prática regular de leve a moderada atividade física aeróbica e  restrição de fatores psicológicos estressantes”. Repito a frase final: “restrição de fatores psicológicos estressantes”. Mesmo assim, os médicos concluem que não há necessidade do tratamento ser feito em domicílio. Ora, concluir que um homem idoso, sob exposição pública tão pesada, num processo tão polêmico, no qual se autoconsidera inocente, não vai ficar “estressado” dentro da cadeia é ser o que eu chamo, datavenia, de coxinha desalmado e psicótico. E se este stress se dá num homem que acabou de sair de uma cirurgia cujas chances de sobrevivência são de menos de 10%, a orientação de que ele pode se tratar na prisão me parece negligente e criminosa.

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Todas as concluões são relativamente iguais, sempre repetindo expressões assim:
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Não quero acusar nenhum médico. Vivemos uma democracia e cada um pode escrever o que quiser nas paredes virtuais de suas próprias redes.
Não consigo me livrar, porém, da impressão de que Barbosa catou médicos antipáticos aos réus apenas para que emitissem um laudo que chancelasse suas intenções de humilhar ainda mais José Genoíno. O laudo pode trazer informações verdadeiras, mas a conclusão me parece politicamente tendenciosa, contra o réu, contra a vida, contra o ser humano.
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domingo, 1 de setembro de 2013

Por que os médicos estrangeiros não podem fazer o Revalida

A discurseira do corporativismo médico tupiniquim contra o programa Mais Médicos, antes de ser mesquinha, arrogante e preconceituosa, é assustadora. O que assusta é a má-fé de hordas de médicos que tentam fazer um país inteiro de trouxa enquanto lutam para manter uma reserva de mercado que permite a quem estuda medicina (no Brasil) enriquecer rapidamente.
Além dos médicos espertalhões e mercenários – que, como se vê, existem às pencas –, os Conselhos Regionais de Medicina (CRM’s), o Conselho Federal de Medicina (CFM) e a Federação Nacional dos Médicos (Fenam) têm desempenhado um papel de estelionatários, enganando a sociedade brasileira.
Primeiro, essa horda corporativista e estelionatária tentou vender ao país a teoria absurda de que um médico não pode fazer nada se não tiver à sua disposição equipamentos de última geração como tomógrafos e outros avanços da medicina, quando qualquer pessoa minimamente lúcida sabe que tal premissa não é só falsa, mas criminosa, porque incontáveis enfermidades podem ser eliminadas com uma simples consulta e alguns exames básicos.
Nesse aspecto, é imprescindível a leitura, logo abaixo, de artigo do médico brasileiro David Oliveira de Souza, professor do Instituto de Pesquisa do Hospital Sírio-Libanês e ex-diretor da ONG Médicos Sem Fronteiras no Brasil (2007-2010) publicado pela Folha de São Paulo neste sábado (31.8). O post prossegue em seguida
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FOLHA DE SÃO PAULO
31 de agosto de 2013
David Oliveira de Souza
TENDÊNCIAS/DEBATES
A vinda de médicos cubanos ao Brasil é irregular?
Não
Bem-vindos, médicos cubanos. Vocês serão muito importantes para o Brasil. A falta de médicos em áreas remotas e periféricas tem deixado nossa população em situação difícil. Não se preocupem com a hostilidade de parte de nossos colegas. Ela será amplamente compensada pela acolhida calorosa nas comunidades das quais vocês vieram cuidar.
A sua chegada responde a um imperativo humanitário que não pode esperar. Em Sergipe, por exemplo, o menor Estado do Brasil, é fácil se deslocar da capital para o interior. Ainda assim, há centenas de postos de trabalho ociosos, mesmo em unidades de saúde equipadas e em boas condições.
Caros colegas de Cuba, é correto que nós médicos brasileiros lutemos por carreira de Estado, melhor estrutura de trabalho e mais financiamento para a saúde. É compreensível que muitos optemos por viver em grandes centros urbanos, e não em áreas rurais sem os mesmos atrativos. É aceitável que parte de nós não deseje transitar nas periferias inseguras e sem saneamento. O que não é justo é tentar impedir que vocês e outros colegas brasileiros que podem e desejam cuidar dessas pessoas façam isso. Essa postura nos diminui como corporação, causa vergonha e enfraquece nossas bandeiras junto à sociedade.
Talvez vocês já saibam que a principal causa de morte no Brasil são as doenças do aparelho circulatório. Temos um alto índice de internações hospitalares sensíveis à atenção primária, ou seja, que poderiam ter sido evitadas por um atendimento simples caso houvesse médico no posto de saúde.
Será bom vê-los diagnosticar apenas com estetoscópio, aparelho de pressão e exames básicos pais e mães de família hipertensos ou diabéticos e evitar, assim, que deixem seus filhos precocemente por derrame ou por infarto.
Será bom vê-los prevenindo a sífilis congênita, causa de graves sequelas em tantos bebês brasileiros somente porque suas mães não tiveram acesso a um médico que as tratasse com a secular penicilina.
Será bom ver o alívio que mães ribeirinhas ou das favelas sentirão ao vê-los prescrever antibiótico a seus filhos após diagnosticar uma pneumonia. O mesmo vale para gastroenterites, crises de asma e tantos diagnósticos para os quais bastam o médico e seu estetoscópio.
Não se pode negar que vocês também enfrentarão problemas. A chamada “atenção especializada de média complexidade” é um grande gargalo na saúde pública brasileira. A depender do local onde estejam, a dificuldade de se conseguir exame de imagem, cirurgias eletivas e consultas com especialista para casos mais complicados será imensa. Que isso não seja razão para desânimo. A presença de vocês criará demandas antes inexistentes e os governos serão mais pressionados pelas populações.
Para os que ainda não falam o português com perfeição, um consolo. Um médico paulistano ou carioca em certos locais do Nordeste também terá problemas. Vai precisar aprender que quando alguém diz que está com a testa “xuxando” tem, na verdade, uma dor de cabeça que pulsa. Ou ainda que um peito “afulviando” nada mais é do que asia. O útero é chamado de “dona do corpo”. A dor em pontada é uma dor “abiudando” (derivado de abelha).
Já atuei como médico estrangeiro em diversos países e vi muitas vezes a expressão de alívio no rosto de pessoas para as quais eu não sabia dizer sequer bom dia –situação muito diferente da de vocês, já que nossos idiomas são similares.
O mais recente argumento contra sua vinda ao nosso país é o fato de que estariam sendo explorados. Falou-se até em trabalho escravo. A Organização Pan-americana de Saúde (Opas) com um século de experiência, seria cúmplice, já que assinou termo de cooperação com o governo brasileiro.
Seus rostos sorridentes nos aeroportos negam com veemência essas hipóteses. Em nome de nosso povo e de boa parte de nossos médicos, só me resta dizer com convicção: Um abraço fraterno e muchas gracias.
DAVID OLIVEIRA DE SOUZA, 38, é médico e professor do Instituto de Pesquisa do Hospital Sírio-Libanês. Foi diretor médico do Médicos Sem Fronteiras no Brasil (2007-2010)
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Como se vê, é uma verdadeira safadeza tentar induzir as pessoas a acreditarem que médico só é útil se estiver em um hospital com equipamentos de última geração.
Vendo, portanto, que tal premissa não colou, os “nossos” médicos e entidades médicas espertalhões vieram com aquela história de “trabalho escravo”, por conta de um modelo de relação de trabalho dos médicos cubanos que existe inclusive no Brasil em cooperativas que não pagam direito trabalhista algum aos médicos cooperados.
Isso sem falar de que o modelo de contratação de cubanos que está sendo aplicado no Brasil é aceito até por países da União Europeia, para que se tenha uma ideia do nível de ridicularia desse discurso cretino.
Aliás, alguém já se perguntou por que, até agora, a parte da mídia que dá vazão a esse discurso criminoso sobre “escravidão” eximiu-se de ouvir os supostos “escravizados”? Não ouviu porque tem medo de que vejam que os médicos cubanos são pessoas preparadas, cultas e que, muito pelo contrário, estão felizes com o trabalho que farão no país.
Mas talvez o pior cavalo-de-batalha criado para cercear a vinda de médicos estrangeiros ao Brasil seja estarem exigindo que façam uma prova criada em 2011 para validar diplomas de profissionais formados no exterior que peca por ter um nível de dificuldade que mesmo os médicos formados aqui não conseguem superar.
Recentemente, apesar de incentivo de R$ 400 prometido pelo governo a estudantes de medicina brasileiros que quisessem participar do pré-teste do Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos (Revalida), o Ministério da Educação não conseguiu o mínimo de participantes e adiou a realização da prova.
O pré-teste seria aplicado a concluintes do 6º ano de medicina a fim de “calibrar” o Revalida aplicado aos diplomados no exterior, mas o teste não ocorreu porque os estudantes brasileiros fugiram da raia. Assim, o Ministério da Educação tentará de novo no primeiro semestre do ano que vem.
As 32 faculdades de Medicina escolhidas pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), que organiza o exame Revalida, inscreveram 2.353 alunos, mas, como a participação é voluntária, somente 505 deles confirmaram a participação e o número foi considerado insuficiente para uma amostragem eficiente.
Isso ocorre devido ao grau de dificuldade do Revalida. Recentemente, o portal Terra publicou matéria que mostra que nem os médicos brasileiros formados seriam capazes de passar em bom contingente em um teste elaborado para reprovar. Leia, abaixo, trecho da reportagem.
O Revalida é alvo de uma série de polêmicas. A mais antiga delas é a de ser um exame fora da realidade, de muito difícil aprovação, voltado para manter a reserva de mercado para médicos formados no Brasil. Coincidência ou não, a média de aprovação em 2012 foi de 10%. ‘Os maus resultados pioram ainda mais a reputação dos médicos formados fora, mas os professores do meu curso passaram provas do ano passado para médicos brasileiros com CRM que não conseguiram acertar nem a metade’, critica Daniel (os candidatos ao Revalida pediram para ter seus nomes alterados pela reportagem)
Mas o pior é um fato que vem sendo escandalosamente escamoteado pelos médicos e entidades médicas brasileiros que querem manter essa reserva de mercado para si. O Revalida não está sendo exigido pelo programa Mais Médicos porque se os médicos estrangeiros fizessem o teste, o programa fracassaria. Mas não por falta de conhecimentos deles.
O que ocorre é que todo estrangeiro que se submeter ao Revalida e for aprovado ganhará o direito de exercer a medicina no Brasil. Ora, se um médico cubano, espanhol, chinês ou seja de onde for tiver direito de atuar em nosso país, poderá dar uma banana ao Mais Médicos e passar a atuar onde achar melhor e não onde faltam médicos.
A segurança do governo brasileiro de que os médicos estrangeiros não tentarão usar o programa Mais Médicos como porta de entrada para se estabelecerem em um mercado em que não terão dificuldades para encontrar empregos porque faltam médicos no país, pois, é justamente a falta de permissão para exercerem a profissão como e onde quiserem.
Mas, pelo jeito, o país ainda terá que aturar essa polêmica imoral por muito tempo – ou enquanto durar o Mais Médicos. As entidades médicas, a mídia e a oposição ao governo Dilma sabem que o programa fará muito bem ao Brasil e, portanto, temem o efeito eleitoral que deverá provocar.
Contudo, a gritaria tende a diminuir conforme a Justiça for rejeitando as medidas que estão sendo interpostas pelas entidades médicas. Conforme o Judiciário for mandando os doutores se catarem por tentarem impedir medida crucial para a sociedade visando só seus interesses corporativos, a essa gente só restará a sabotagem. E ela ocorrerá, isso é certeza

sexta-feira, 12 de julho de 2013

SANTAYANA E O MÉDICO: DAR UM POUCO DE SI AO OUTRO Os dois anos de SUS e o depoimento de Jatene, um exemplo.

Tolentino: "aos pobres não cobramos nada"


Conversa Afiada reproduz artigo de Mauro Santayana no JB online:

O MÉDICO E SUA ÉTICA



por Mauro Santayana

Em 1956, conheci, na cidade do Serro, em Minas, o médico Antonio Tolentino, que era o profissional mais idoso ainda em atividade no Brasil. Ele chamava a atenção por dois motivos: coubera-lhe assistir ao parto de Juscelino, em 1902, e não alterara o valor da consulta, que equivalia,  então, a cinco cruzeiros. Entrevistei-o, então, para a Revista Alterosa, editada em Minas e já desaparecida.

Em razão da matéria, o deputado federal Vasconcelos Costa obteve, da Câmara, uma pensão vitalícia da União para o médico, que morreu logo depois. Ele tinha, na época, 94 anos – e setenta de atividade. Seus descendentes criaram um museu, em sua casa e consultório. Uma das peças é o anúncio que fez, logo no início da carreira: “aos pobres, não cobramos a consulta”.

Confesso o meu constrangimento. Estou em  idade em que dependo, e a cada dia mais, de médicos, e de bons médicos, é claro. Tenho, entre eles, bons e velhos amigos. O que me consola é que os meus amigos estão mais próximos da filosofia de vida do médico Antonio Tolentino, do que dos que saíram em passeata, em nome de seus direitos, digamos, humanos. 

Mais do que outros profissionais, os médicos lidam com o único e absoluto bem dos seres, que é a vida. Os enfermos a eles levam as suas dores e a sua esperança. É da razão comum que eles estejam onde se encontram os pacientes – e não que eles tenham que viver onde os  médicos prefiram estar. 

De todos os que trataram do assunto, a opinião que me pareceu mais justa foi a de Adib Jatene. Um dos profissionais mais respeitados do Brasil, Jatene acresce à sua autoridade o fato de ter sido, por duas vezes, Ministro da Saúde. Ele está preocupado, acima de tudo, com a qualidade do ensino médico no Brasil. Se houvesse para os médicos exames de avaliação, como o dos bacharéis em direito, exigido pela OAB para o exercício profissional, o resultado seria catastrófico. 

Jatene recomenda a formação de bons clínicos e, só a partir disso, a especialização médica. Os médicos de hoje estão dependentes, e a cada dia mais, dos instrumentos tecnológicos sofisticados de diagnóstico, e  cada vez menos de seu próprio saber. O vínculo humano entre médico e paciente – salvo onde a medicina é estatizada – é a cada dia menor. Assim, Jatene defende o sistema do médico de família. Esse sistema permite o acompanhamento dos mesmos pacientes ao longo do tempo, e a prática de medidas preventivas, o que traz mais benefícios para todos.

Entre outras distorções da visão humanística do Ocidente, provocadas pela avassaladora influência do capitalismo norte-americano, está a de certo exercício da medicina e da terapêutica. A indústria farmacêutica passou a ditar a ciência médica, a escolher as patologias em que concentrar as pesquisas e a produção de medicamentos. A orientação do capitalismo, baseada no maior lucro, é a de que se deve investir em produtos de grande procura, ou, seja, para o tratamento de doenças que atinjam o maior número de compradores. Dentro desse espírito, a medicina, em grande parte,  passou a ser especulação estatística e probabilística.

Os médicos protestam contra a contratação de profissionais estrangeiros, pelo prazo de três anos, para servir em cidades do interior, onde há carência absoluta de profissionais. Não seriam necessários, se os médicos brasileiros fossem bem distribuídos no território nacional, mesmo considerando a má preparação dos formados em escolas privadas de péssima qualidade, que funcionam em todo o país. 

Ora, o governo oferece condições excepcionais para os que queiram trabalhar no interior. O salário é elevado, de dez mil reais, mais moradia para a família, e alimentação. É muitíssimo mais elevado do que o salário oferecido aos engenheiros e outros profissionais no início de carreira. Ainda assim, não os atraem. E quando o governo acrescenta ao currículo dois anos de prática no SUS, no interior e na periferia das grandes cidades, vem a grita geral.

Formar-se em uma universidade é, ainda hoje, um privilégio de poucos. Os ricos são privilegiados pelo nascimento; os pais podem oferecer-lhe os melhores colégios e os cursos privados de excelência, mas quase sempre vão para as melhores universidades públicas,  bem preparados que se encontram para vencer a seleção dos vestibulares. Os pobres, com a ilusão do crescimento pessoal, sacrificam os pais e pagam caro a fim de obter um diploma universitário que pouco lhes serve na dura competição do mercado de trabalho.

Um médico sugeriu que a profissão se tornasse uma “carreira de estado”, como o Ministério Público e o Poder Judiciário. Não é má a idéia, mas só exeqüível com a total estatização da medicina. Estariam todos os seus colegas de acordo? Nesse caso não poderiam recusar-se a servir onde fossem necessários. 

Temos, no Brasil, o serviço civil alternativo que substitui o serviço militar obrigatório, e é prestado pelos que se negam a portar armas. Embora a objeção possa ser respeitada em tempos de paz, ela não deve ser aceita na eventualidade da guerra: a defesa da nação deve prevalecer. Mas seria justo que não só os pacifistas fossem obrigados, pela lei,depois de formados pelos esforços da sociedade como um todo, a dar um ou dois anos de seu trabalho à comunidade nacional, ali e onde sejam necessários. Nós tivemos uma boa experiência, com o Projeto Rondon, que deveria ser mais extenso e permanente como instituição no Brasil.

As manifestações recentes mostram que todos, em seus conjuntos de interesses, querem mais do Estado em seu favor. Não seria o caso de oferecerem alguma coisa de si mesmos à sociedade nacional? Dois anos dos jovens médicos trabalhando no SUS – remunerados modestamente e com os gastos pagos pelo Erário – seriam um bom começo para esse costume. E a oportunidade de aprenderem, com os desafios de cada hora, a arte e o humanismo que as más escolas de medicina lhes negaram.