Mente vazia, oficina do sistema da mídia golpista

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segunda-feira, 4 de novembro de 2013

FOLHA CONSEGUIU: OS ESPIÕES AGORA SOMOS NÓS

terça-feira, 12 de março de 2013

Os torturadores do Pentágono



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O nome, curto e típico, faz lembrar os rangers texanos: James Steele. Combatente no Vietnã durante os dez anos de guerra, Steele recebeu as promoções de praxe, fez os cursos adequados e, em 1984, como especialista em contra-insurreição, foi enviado para assessorar a repressão da ditadura em El Salvador. Menor país da América Latina, com 21.040 km2 – menor mesmo do que Sergipe – El Salvador é o mais pungente depoimento humano contra a violência do Império norte-americano em nosso continente, e no mundo.
Durante mais de dez anos – de outubro de 1979 a junho de 1991 – o povo salvadorenho foi submetido a uma provação que não havia sido registrada na história, tendo em vista a sua população, que era de apenas 4 milhões e 500 mil habitantes. É de se lembrar que, já em março de 1980, os cristãos da América Latina tiveram o seu primeiro mártir em Dom Oscar Romero, assassinado quando oficiava uma missa em pequena capela de El Salvador. Muito mais do que Thomas Beckett – o arcebispo de Canterbury assassinado em sua catedral, em 1170, por desentendimentos políticos com o Rei Henrique I e canonizado 3 anos depois por Alexandre III – Oscar Romero foi um mártir do cristianismo.
O Vaticano, sob Wojtyla e Ratzinger preferia considerar santo José Maria Balaguer, o fundador da Opus Dei, e fraterno companheiro de Franco, o tirano do povo espanhol. O processo de beatificação de dom Romero, por iniciativa de cristãos de El Salvador, está devidamente esquecido no Vaticano.
Foi em El Salvador que o coronel James Steele se destacou como um “herói” americano de nossos tempos, assessorando as forças repressivas da ditadura nos métodos da guerra suja, entre eles os da tortura de prisioneiros políticos. Ele foi enviado ao país em 1984, no auge da guerra civil e na aliança dos Estados Unidos, sob Reagan, com a extrema-direita na América Central, e ali serviu durante dois anos.
Nesse período, participou, com o famoso Oliver North, do contrabando de armas para a Nicarágua, pelo aeroporto de Ilopango. De volta aos Estados Unidos em 1986, Steele retornou às suas tarefas rotineiras, até deixar o Exército. Mas em 2003, os seus conhecimentos e a sua experiência em El Salvador recomendam-no a Donald Rumsfeld, secretário de Defesa de Bush, como indispensável na “guerra suja” contra o Iraque, e foi novamente convocado. Steele não se subordinava aos seus mandos naturais no Iraque, mas, sim, diretamente a Rumsfeld. Conforme investigação exaustiva realizada pelo Guardian, e divulgada na semana passada, o general Petraeus, chefe das operações militares em Bagdá, encarregou outro coronel reformado, James Coffman, de acompanhar Steele em suas atividades, talvez para se proteger.
A reportagem do Guardian, com a participação da BBC Arabic, demonstra que o Pentágono determinou e foi cúmplice da prática de tortura no Iraque. Durante sua atuação ali, Steele organizou os grupos xiitas contra os sunitas e supervisionou os centros secretos de detenção de militantes, nos quais a tortura foi sistemática. Os dois coronéis orientaram e supervisionaram os interrogatórios, mediante os métodos conhecidos: choques elétricos, extração de unhas, golpes nos órgãos genitais, empalamento, pau-de-arara.
Em um desses centros secretos, mantidos por fundos também secretos, conforme o depoimento do general iraquiano Muthader al-Samari, que o viu, um menino de 14 anos foi pendurado a uma coluna, com as mãos amarradas acima da cabeça. O corpo estava azulado pelas numerosas equimoses provocadas pelos golpes recebidos.
James Steele é um exemplo de “heroísmo” da sociedade norte-americana de nosso tempo.
O outro exemplo, de dignidade e heroísmo real, que redime o povo americano, é o do soldado Braddley Manning.

quinta-feira, 29 de março de 2012

O infindável horrendo legado da Guerra ao Terror

‘Arapongagem’ generalizada [nos EUA, por enquanto!!]
Karen Greenberg é diretora do Centro de Estudos de Segurança Nacional,
da Faculdade de Direito de Fordham, EUA.

Agora, seria de supor que estivéssemos chegando ao fim da era 11/9. Uma guerra mal acabada no Oriente Médio Expandido, outra que se arrasta desastrosamente rumo ao fim, e a al-Qaeda tão reduzida que nem moveria a agulha do medidor norte-americano de ameaças. Seria de supor, sim, que chegara o momento de os norte-americanos voltarem os olhos, afinal, para seus próprios princípios: a Constituição e a proteção que só ela assegura a direitos e deveres.

Mas o que se vê são abundantes sinais de que 2012 será mais um ano no qual, em nome da segurança nacional, aqueles direitos e liberdades serão ainda mais capados e Guantanamizados. Exemplo disso é que, apesar de ainda haver inimigos poderosos pelo mundo, os EUA só temos olhos agora para ‘candidatos’ da oposição que denunciam ‘vazadores’, acusados de pouco menos que crimes de alta traição, porque revelaram a jornalistas e cidadãos interessados o que faz e como age o governo dos EUA.

Aqui e por todos os cantos, tudo sugere que só possamos esperar que o governo Obama continue a pavimentar o caminho que já nos levou tão longe do país que nos acostumáramos a ser. E ano que vem, se houver outro presidente na Casa Branca, só esperem que nos leve para ainda mais longe.

Com isso em mente, eis aqui cinco categorias na esfera da segurança nacional, nas quais, provavelmente, 2012 será ainda mais tenebroso que 2011.

1. Cada vez mais punições (e menos equilíbrio)
Os que suponham que a era de reações desmedidas em nome da segurança nacional estaria chegando a algum fim próximo, melhor farão se lembrarem dos espetaculosos julgamentos em tribunais de segurança nacional que estão no horizonte – e de que podemos estar-nos aproximando de uma nova era de vingancismo governamental. Dentre os mais espetaculosos: as comissões militares em Guantánamo, que julgarão Khalid Sheikh Mohammed, suposto ‘cérebro’ do ataque de 11/9 e seus co-conspiradores; além de Abd al-Rahim al-Nashiri, suposto ‘cérebro’ dos ataques suicidas de 2000, contra o porta-aviões U.S.S. Cole no porto de Aden. Aí haverá acusações de crimes que preveem execução, a serem julgados em espírito de desforra.

Esse espírito de desforra não se saciará com linchar chefetes e operadores da al-Qaeda. Vários casos que não envolvem nem ataque a nem morte de norte-americanos também chegarão aos tribunais em nome da segurança nacional e, em todos, reinará o mesmo espírito de desforra. Para começar, está em pauta a corte marcial do cabo Bradley Manning, acusado de copiar documentos secretos do governo dos EUA e entregá-los a WikiLeaks. E, claro, há também o possível julgamento de Julian Assange, fundador de WikiLeaks, por uma corte federal – uma corte federal analisa atualmente se acolhe a denúncia contra ele – por suposta colaboração com Manning.

Os dois casos tem sido apresentados em tom de ira viciosa que, aos olhos de outros povos deve soar como um murro na boca. Altos funcionários insistem em que os materiais publicados por WikiLeaks ameaçaram vidas de norte-americanos, o que teria “manchado de sangue” as mãos de ambos, Assange e Manning (embora até hoje ninguém tenha apresentado prova de que um único ser humano foi fisicamente agredido em consequência da publicação daqueles documentos).

No polo mais sanguinolento do espectro político nos EUA, o ex-governador do Arkansas e aspirante a candidato presidencial, Mike Huckabee, e o deputado Mike Rogers (R-MI), dentre outros, já clamaram pela execução de Manning. Nas palavras de Rogers, “insisto em que se considere a pena capital nesse caso, dado que [Manning] claramente colaborou com o inimigo, no que pode resultar em morte de soldados dos EUA e aliados. Se isso não é crime capital, não sei o que é.”

Desejo semelhante, embora talvez menos assassino, oculta-se na determinação com que o governo Obama persegue e pune qualquer tipo de vazamento de informações, do interior do governo para a imprensa, mesmo quando não envolve roubo de documentos oficiais. Obama, como se sabe, entrou na Casa Branca proclamando uma política “Raio de Sol”, em matéria de transparência nos serviços públicos e governamentais. Hoje, já ultrapassou George W. Bush nas tentativas de punir ‘vazadores’.

Dois julgamentos em andamento, de dois ex-agentes da CIA, exemplificam esse padrão. Jeffrey Sterling foi acusado de vazar documentos secretos para James Risen do New York Times sobre planos para dar informações falsas ao Irã, num esforço contraproducente para subverter o programa nuclear iraniano; e John Kiriakou acaba de declarar-se inocente da acusação de ter entregado à mídia informações sobre práticas de tortura na era Bush. Tudo somado, o governo dos EUA está caçando seis supostos ‘vazadores’ – mais do que todos os casos desse tipo, em todas os governos dos EUA – servindo-se para isso da lei “Antiespionagem”, Espionage Act, draconiana.

No que tenha a ver com ‘vazadores’, a mensagem não poderia ser mais clara, nem mais vingancista. O estado, nos EUA, mantém-se na seguinte posição: exponha o Estado, e cairemos sobre você com fúria inimaginável. Assim como os terroristas foram avisados de que se criariam novas leis e sistemas legais específicos para eles, assim também os acusados de vazar informações (mesmo que verídicas!) para a mídia estão sendo avisados de nem toda a lei vigente limitará o castigo que desabará sobre eles.

Basta considerar o tratamento dado a Bradley Manning no primeiro ano de prisão, quando ainda sequer estava acusado de qualquer crime: foi mantido numa masmorra da Marinha, em total isolamento, obrigado a dormir nu. Ou considere-se a tentativa, não de fazer justiça, mas de destruir a vida de Thomas Drake, ex-funcionário da Agência Nacional de Segurança. Drake foi acusado de vazar informação sigilosa de caso que, para Drake, não passava de programa no qual havia desperdício devastador de recursos da Agência. No fim, embora acusado nos termos da Lei Antiespionagem, Drake declarou-se culpado da contravenção de ter tomado emprestado um computador do Estado – mas, isso, depois de sua vida ter sido destruída, sua carreira arruinada e já demitido.

2. Um limbo ‘legal-ilegal’ cada vez mais sombrio (e cada vez menos consideração à Constituição)
Hoje, denúncias da ilegalidade da detenção indefinida dos acusados de “combater pelo inimigo”, já denominados “inimigos beligerantes sem privilégios”, já viraram normais. É tema considerado tão tipicamente norte-americano quanto a torta de maçã. Como, antes, o governo Bush, o governo Obama insiste na necessidade de manter presos em Guantánamo cerca de 50 homens, contra os quais não há qualquer acusação formal.

Em maio de 2009, em discurso nos National Archives, o presidente Obama não poderia ter sido mais claro: a detenção indefinida, disse ele, continua a ser utensílio para uso do aparelho da segurança nacional, também em seu governo. Assim, garantiu que uma versão norte-americana da (in)justiça além fronteiras, e traço essencial de Guantánamo – que, em campanha, Obama prometera fechar – continuaria intocada.

Mas em 2012, está surgindo outra categoria de gente que também pode ser presa sem acusação e por tempo indefinido: cidadãos norte-americanos. Antes, os norte-americanos estavam isentos do risco de serem encarcerados em Guantánamo e, portanto, da política de prender sem julgamento, sem sentença e sem, sequer, acusação. Em 2002, descobriu-se que Yaser Hamdi, cidadão norte-americano-saudita, estava também preso em Guantánamo Bay; foi imediatamente removido, de avião, na calada da noite, e encarcerado noutro lugar, sinal de que o Estado, nos EUA, ainda reconhece direitos aos cidadãos norte-americanos. E o mesmo aconteceu ao “Talibã norte-americano”, John Walker Lindh, preso no Afeganistão, no campo de batalha, e encarcerado no sistema prisional oficial dos EUA.

Depois disso, contudo, o Congresso mostrou bem menos respeito à diferença entre direitos garantidos aos cidadãos e aos não cidadãos norte-americanos. Mês passado, o Congresso aprovou a Lei de Defesa Nacional 2012 (2012 National Defense Authorization Act, NDAA). Os debates parlamentares refletiram empenho ativo em converter cidadãos norte-americanos, assim como cidadãos não norte-americanos, em alvos de detenção militar por tempo ilimitado.

No fim dos debates, concluiu-se que os cidadãos continuariam supostamente protegidos contra o ataque da nova lei, mas, foi sinal bem claro da direção na qual podemos estar caminhando. Como recente relatório do Serviço de Pesquisas do Congresso explicou, sobre a lei NDAA: a lei “não visa a afetar poderes relacionados à detenção de cidadãos ou residentes estrangeiros ilegais, nem qualquer pessoa capturada ou presa nos EUA.”

Ainda assim, restam muitos justificados temores e grande confusão sobre que proteções ainda existem aos direitos dos cidadãos norte-americanos, depois da aprovação da lei NDAA. Nem a declaração assinada pelo presidente Obama, garantindo que o presidente “não autorizaria a detenção militar indefinida sem julgamento e sentença de cidadãos norte-americanos” ajudou a aplacar aqueles temores ou a diminuir a confusão. Se os cidadãos norte-americanos continuavam a gozar de proteção legal contra detenção indefinida, depois de aprovada a nova lei... que necessidade haveria de o presidente divulgar aquela declaração assinada?

Há ainda outro campo em que a lei parece mergulhada no mais sombrio limbo, sem nada que dê proteção aos cidadãos: em águas internacionais. No início desse ano, o governo Obama anunciou que mantinha sob detenção 15 piratas capturados na costa da Somália – e que não havia qualquer fundamento legal para aquela decisão. Nas palavras de C.J. Chivers do New York Times: “onde a lei acaba começa um problema sem solução: o que fazer com piratas capturados por barcos estrangeiros?”

Segundo o Departamento de Estado, os piratas serão julgados. Mas onde? Nas palavras do vice-almirante Mark I. Fox, “Falta-nos uma cobertura prática e legal confiável.” Em outras palavras, os EUA ainda não encontraram país sob cujas leis possam levar os piratas a julgamento legal. Enquanto procuram, segundo relatórios recentes, a Marinha dos EUA mantém os detidos em celas em navios. Quer dizer: em termos conceituais, é uma Guantánamo flutuante, para inimigos da rede ‘para fins lucrativos’.

3. Cada vez mais sigilo (e menos transparência)
“Sigilo necessário” é a sempre repetida explicação para a informação mantida longe do escrutínio dos eleitores desde 11/9. As comissões militares em Guantánamo prosseguem, por exemplo, em parte sob a alegação de que, se os acusados, muitos dos quais já detidos há uma década, forem julgados por corte federal, surgirão revelações que, de algum modo, comprometerão a segurança nacional.

Para responder às declarações dos grupos de defesa de direitos civis, segundo os quais o sigilo serve exclusivamente para tentar esconder comportamento desviante ou criminoso das autoridades, o governo Obama prometeu “transparência” na atuação das comissões militares agendadas para começar a julgar os acusados no final de 2012. Entre os esforços de transparência anunciados no outono passado, havia uma página na internet, na qual documentos – cobertos de tarjas negras – ficariam acessíveis ao público; e outros documentos, com delay de 40 segundos, em circuito para leitura controlada, para a mídia e para as famílias das vítimas.

Mas durou pouco. Imediatamente o governo suspendeu os anseios de transparência, porque, nas palavras polidas de Spencer Ackerman, do blog “Danger Room”, da revista Wired, Guantánamo “não é lugar para aberturas”. Toda a correspondência entre os detidos e seus advogados (militares) de defesa é examinada e censurada, prática que, compreensivelmente, tem provocado a indignação (até) dos advogados militares.

Na categoria transparência-zero e crescente obscuridade como princípio básico do governo Obama, há também a elaborada dança de ocultamento de um memorando produzido pelo Gabinete de Assessoramento Legal (Office of Legal Counsel, OLC) do Departamento de Justiça. Foi evidentemente redigido para justificar o assassinato, em que os assassinos usaram como arma um avião-robô, drone, no Iêmen, em setembro passado, de um cidadão norte-americano, Anwar al-Awlaki, que seria “o bin Laden da Internet.”[1]

Até recentemente, o governo evita perguntas sobre o assassinato de al-Awlaki, e de outro cidadão norte-americano, Samir Khan, editor da revista Inspire, da al-Qaeda. Em janeiro, o governo anunciou que o Advogado Geral Eric Holder divulgaria o memorando do Office of Legal Counsel (OLC), que legalizava o assassinato, mas adiou a divulgação da explicação da Advocacia Geral dos EUA até o início de março. Enquanto isso, o New York Times e a American Civil Liberties Union (ACLU) requereram oficialmente a divulgação do documento, amparados na Lei da Liberdade de Informação (Freedom of Information Act, FOIA). Dia 5/3/2012, Holder finalmente divulgou explicação detalhada do tortuoso argumento que justificaria o assassinado pré-determinado [orig. targeted killing] de al-Awlaki, mas, até hoje, nem sinal do documento oficial o OLC que o legalizaria.

Durante o ano passado, a imposição de cerrado sigilo a todos os tipos de atividades do governo só se tornou cada vez mais acentuada (...), sempre em nome da “segurança nacional”.

Passada uma década, os americanos sabemos cada vez menos sobre os atos do governo que elegemos. (...) Não fossem as reclamações oficiais permitidas pela Lei de Liberdade de Informação, impetradas pela ACLU e outras organizações, bem pouco do pouco que se sabe sobre tortura, vigilância ilegal e outras práticas ilegais do governo Obama teria vindo à tona. E o número sempre crescente de processos contra ‘vazadores’ é apenas mais um modo de tornar invisíveis as ações do estado, ocultado do olhar dos cidadãos.

4. Cada vez mais suspeitas (e menos privacidade)

Durante anos, a perspectiva de gravações ilegais, feitas ilegalmente, em nome da segurança nacional, vem aterrorizando os americanos que fazem oposição às políticas do estado norte-americano na guerra ao terror. Em 2008, o presidente Bush assinou nova lei da Civil Aviation Safety Authority (agência de segurança da aviação civil), FISA, que autoriza o estado a escanear corpo e bagagem de cidadãos nos aeroportos, com praticamente nenhuma fiscalização assegurada, pelo menos, por outra instância legal também carregada de sigilos, as Cortes de Vigilância da Inteligência Estrangeira (Foreign Intelligence Surveillance Courts, instaladas em 1978 para legalizar a vigilância sobre suspeitos de espionar a serviço de outros países.) O governo Obama jamais abriu mão do poder de gravar comunicações eletrônicas entre pessoas fora dos EUA e pessoas em território norte-americano, em nome da segurança nacional.

As mais recentes revelações, de casos de cada vez menos privacidade e mais suspeitas, têm a ver com programas que teriam sido implementados pelo Departamento de Polícia Municipal de New York (New York City Police Department, NYPD), para vigiar cidadãos norte-americanos de religião muçulmana que vivem na cidade. A NYPD infiltra agentes em mesquitas e universidade, recolhe informes sobre cidadãos sobre os quais não há nenhum tipo de denúncia ou suspeita, em associação com a CIA, que treina policiais em métodos e técnicas que tradicionalmente são recursos exclusivos daquela agência.

Há aí flagrante violação da lei que rege a CIA, autorizada a fazer a vigilância de suspeitos exclusivamente em países estrangeiros; e não se vê qualquer sinal de que algum agente da CIA corra risco de ser processado. Não bastasse, a própria polícia de New York tem investigado e vigiado cidadãos norte-americanos, de religião muçulmana, bem longe dos limites de sua jurisdição – de New Haven, Connecticut, a Newark, New Jersey.

Para piorar, o governo Obama acaba de aprovar o uso de aviões-robôs, drones, como parte do arsenal de armas para recolher informação nos EUA. Dia 14/2, o presidente Obama sancionou lei que autoriza o uso dos drones em vários espaços, de atividades comerciais a investigação de crimes civis.

A mensagem é bem clara: esse ano (e o seguinte e o seguinte e o seguinte) serão anos de arapongagem generalizada. Para os agentes da lei, ao que parece, a vida privada dos cidadãos deve ser um livro aberto.

5. Cada vez mais matança (e menos paz)
Não passa um dia, sem notícias de que drones Predator e Reaper mataram gente em países estrangeiros – nos anos recentes, predominantemente no Afeganistão, Paquistão, Iraque, Iêmen, Somália, Líbia e Filipinas. É como se a CIA e os militares tivessem posto as mãos num brinquedo novo, que não se cansam de usar, ou de propagandear. Segundo Atlantic, “Estimativas tímidas sugerem que centenas de civis não combatentes foram motos, só no Paquistão.”

E seguem os tambores de guerra, clamando por ataque militar ao Irã. Ante a possibilidade de ataque israelense à República Islâmica do Irã, o governo Obama continua a recusar-se a rejeitar com clareza a possibilidade de ser parte de mais essa guerra.

“Os líderes iranianos devem sabem que não tenho qualquer política de contenção” – disse o presidente Obama. “Tenho uma política para impedir o Irã de obter uma arma nuclear. E já deixei claro várias vezes, ao longo do meu governo, que não hesitarei em usar a força quando necessária para defender os EUA e seus interesses.”[2]

De fato, a urgente necessidade de impedir um confronto potencialmente desastroso, que afetaria gravemente o preço do petróleo e a economia global, já pôs a cúpula dos militares e altos funcionários do governo a voar, de um lado para outro, entre Israel e os EUA, com alertas contra qualquer ataque ao Irã. Apesar disso, diplomatas e outros especialistas continuam a discutir a questão como se a guerra já fosse evento decidido.

O futuro é certamente sombrio, todos andando claramente na mesma direção – usar a lei, ou, pelo menos, o que o Departamento de Estado supõe que seja a lei nos EUA, para justificar qualquer tipo de ação que o governo Obama considere necessária, contra quem quer que o governo decida que seja o inimigo. O Advogado Geral Holder resumiu claramente a situação, na defesa que apresentou do assassinado de al-Awlaki.

Holder explicou, com detalhes significativos, que o assassinato de um cidadão norte-americano (e suspeito de ser terrorista) seria legal, embora obrigasse a discutir o próprio sentido do que seja “o devido processo legal” nos termos da 5ª Emenda, e apesar da proteção que a lei da guerra assegura também aos inimigos. “Devido processo legal”, disse ele, “não significa processo judicial”. Espantosa teoria essa, de algo absolutamente inexistente na lei! Agora, “devido processo legal” é o que o presidente e seu círculo mais íntimo decidam que é! Recriação do direito constitucional, para justificar o assassinato premeditado (“targeted killing”) de um cidadão norte-americano.

Em resumo, a zona nebulosa em que Washington, ao longo de uma década, lançou a lei norte-americana – e todas as consequências que daí advêm, inclusive medidas punitivas, tentativas de burlar garantias constitucionais, o sigilo que tudo encobre e acoberta, a desconfiança cada vez maior, que torna suspeitos todos nós, e o assassinato – não são coisas que veremos desaparecer tão cedo. É bem claro o movimento pelo qual estamos nos afastando cada vez mais dos direitos e liberdades que temos, enquanto a Constituição for respeitada, e que os norte-americanos estamos perdendo rapidamente, nessa nova era em que mergulhamos, uma era de inimigos.

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[1] Sobre o caso, ver 7/11/2010, Ocidente em pânico: uma voz norte-americana pró-“Jihad”, Patrick Cockburn, The Independent, UK, em português em http://redecastorphoto.blogspot.com.br/2010/11/ocidente-em-panico-uma-voz-norte.html; e “Assassinato de Awlaki: Obama mata quem bem entenda”, 1/10/2011, Robert Dreyfuss, The Nation, em português em http://redecastorphoto.blogspot.com.br/2011/10/assassinato-de-awlaki-obama-mata-quem.html [NTs].
[2] O discurso (ao AIPAC, dia 4/3/2012, pode ser lido em http://www.cfr.org/united-states/obamas-speech-aipac-march-2012/p27549?cid=rss-americas-obama_s_speech_at_aipac,_march-030412. Sobre o discurso, ver “ ‘Bibi’ continua a sacudir o cachorro americano?”, 4/3/2012, Pepe Escobar, em http://redecastorphoto.blogspot.com.br/2012/03/pepe-escobar-bibi-continua-sacudir-o.html [NTs].

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Supostamente monstros, supostamente vis








A rede de televisão CNN divulgou o vídeo em que, segundo a Associated Press “supostos membros do corpo de fuzileiros navais americanos uniformizados supostamente urinam sobre cadáveres de militantes do grupo radical Taleban”.
Supostamente talibãs, devemos supor, com tanto suposto que se coloca diante do evidente.
O comando dos fuzileiros navais diz que está investigando e – pasmem – limita-se a dizer que isso não condiz com os “valores das Forças Armadas dos EUA”.
Que valores esperam de pessoas que são mandadas matar outras do outro lado do planeta, que jamais lhes fizeram coisa alguma? Nem mesmo no Afeganistão estava Osama Bin Ladem, mas no aliado Paquistão!
É essa a civilização ocidental que lá foi para tirar os “bárbaros fanáticos” da vida primitiva com aviões, mísseis, lasers, escudos, radares, quase invulneráveis?
Haverá uma indignação mundial, em poucas horas.
Porque já é criminoso que se produzam cadáveres. Profaná-los, é mais que isso, é monstruoso.
E agora não há George Bush a quem atribuir isso.
Barbárie é uma palavra por demais gentil para definir isto.
Monstruosidade é o nome, e nada suposto, disso.
E pensar que um soldado dos Estados Unidos, Bradley Manning, está sendo condenado por deixar vazar as provas dos atos criminosos do exército americano no Afeganistão e no Iraque.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Santayana: Manning, Tiradentes. Traidor ? Herói ?

Manning e o video-game americano no Iraque
O soldado Manning e o problema da lealdade


por Mauro Santayana


Os Estados Unidos se preparam para o julgamento do soldado Bradley Manning, que entregou ao WikiLeaks a correspondência diplomática secreta de seu país. A discussão transcende as leis penais, para situar-se na definição ética do que é lealdade e do que é traição.


É difícil estabelecer o ato de traição, sem que se identifique profundamente as razões do traidor e do traído, associadas aos sentimentos de um e de outro. Quando o traído é uma pessoa, é mais fácil entender as razões ou desrazões morais do ato. As traições amorosas se situam nesse campo. Até faz pouco tempo, em muitos países e no Brasil, o adultério era punido pela lei, mas a realidade superou o Código Penal. Só as sociedades teocráticas, como as islamitas, mantêm o rigor da lei, mas, no caso, só contra as mulheres.


Quando se trata da traição às comunidades nacionais, a situação é mais difícil


As traições pessoais, menos aquelas que envolvam dinheiro, e podem ser levadas aos tribunais, são resolvidas no mesmo plano. Os traídos perdoam ou não os traidores; os que se sentem mais feridos alimentam o ódio ou se refugiam no desprezo ao traidor. Mas quando se trata da traição às comunidades nacionais, a situação é de análise muito mais difícil.

O que separa o herói do traidor? Borges tem um conto muito interessante sobre o tema, com hipotética situação na Irlanda do século 19, que Bertolucci aproveitou, atualizando-o para os tempos de Mussolini, com o filme A estratégia da aranha. O escritor não toma partido, e deixa a dúvida se Fergus Kilpatrick fora herói ou traidor, mas deixa entender que na face do herói podem estar as marcas do traidor — ou o contrário.


Será traidor aquele que se orienta por sua consciência, e considera necessário sacrificar os planos de ação a fim de evitar o sacrifício inútil de vidas? Como estabelecer essa diferença dramática entre o traidor e o herói?


Tomemos dois casos conhecidos, o de Calabar, que ficou ao lado dos holandeses, e o de Tiradentes. Os defensores da memória de Calabar afirmam que, para o Brasil, melhor teria sido a colonização holandesa. A história lhes retira a razão: se os holandeses houvessem expandido sua presença a todo o país, o nosso destino teria sido, provavelmente, o da Indonésia. E outros seriam os habitantes de nosso país, não exatamente nós mesmos.


Tiradentes era suboficial da Cavalaria da Tropa Paga das Minas. Servia, assim, às forças armadas da Coroa Portuguesa. Para os julgadores de seu tempo, ele traíra a rainha de Portugal e os seus companheiros de farda, ao participar da Conjuração que tinha como objetivo final a independência das Minas e do Brasil, e, como objetivo imediato, a prisão e a possível execução do governador da Capitania, o visconde de Barbacena.


Poucos foram os habitantes da Capitania que, naquele momento, o viram como herói. Além dos intelectuais, sacerdotes e comerciantes que participaram da Conspiração, só lamentaram, no momento dos fatos, sua prisão e sua morte, com os requintes de crueldade física e moral conhecidos, homens do povo, que dele se lembravam em sua pregação nacionalista em suas viagens pelos sertões. O reconhecimento público do heroísmo de Tiradentes e de sua profunda razão ética na busca da independência, como realização da solidariedade nacional, só viria muitos anos depois.


O primeiro ato de reabilitação se deve a José Benedito Ottoni, pai dos irmãos Ottoni que, logo depois da Independência, e como vereador em Vila Rica, sugeriu e obteve a retirada do padrão de ignomínia que havia sido erguido na cidade, como repúdio à “traição” de Tiradentes. Recorde-se que a cabeça do Alferes, que deveria permanecer no alto desse poste, “até que a consumisse o tempo”, foi retirada de lá, poucos dias depois de colocada, por mãos até hoje desconhecidas e corajosas, e enterrada em algum lugar de Ouro Preto, não se sabe onde.


No raciocínio dos partidários de Portugal, o herói fora Joaquim Silvério dos Reis, que mantivera (pouco importa conhecer as suas razões) fidelidade à rainha, em carta manuscrita de denúncia da conspiração, enviada ao governador da Capitania. A reabilitação oficial da memória de Tiradentes viria, com a iniciativa de Mário Soares, que, presidente de Portugal — e em cerimônia no Palácio da Liberdade, em Belo Horizonte — decretou o fim do labéu de ignomínia que, imposto pelo Estado monárquico português, ainda pesava sobre o Alferes e seus descendentes.


Uma visão pragmática da História mostra que os heróis estão sempre no campo vitorioso, ainda que a vitória, como a liberdade que Tiradentes pretendia, tardasse no tempo. Os americanos têm um traidor exemplar, na figura de Benedict Arnold, que desertou das tropas revolucionárias, passando ao inimigo britânico. Os norte-americanos não conseguiram prendê-lo e enforcá-lo, mas os próprios britânicos, passada a sua utilidade, deixaram-no morrer quase à míngua em Londres. É certo que, se os britânicos houvessem sido vitoriosos, o busto de Arnold estaria em algum lugar de Londres, como se encontram as estátuas de Nelson e Wellington.


Bradley traiu quem? O governo belicista dos Estados Unidos, servidor do famoso Complexo Industrial-Militar, denunciado pelo presidente Eisenhower, herói da 2ª Guerra Mundial, ou a nação americana que, em tese, o julgará? Traiu os seus companheiros de farda, ou um sistema de poder mundial responsável pela morte de centenas de milhares de pessoas inocentes, nos países mais pobres do mundo, mediante as guerras de conquista, os golpes de Estado, como os que sofremos na América Latina?


Quem trai, trai sempre em troca de algum benefício. Bradley não agiu em benefício de si mesmo, desde que não recebeu qualquer compensação pelos seus atos, nem se pode dizer que tenha passado as informações de que dispunha, diretamente, para os “inimigos” escolhidos pelo governo de seu país.


Um juízo rápido, provavelmente superficial mas indicado pelas informações disponíveis, pode identificar Bradley como um jovem inquieto, preocupado com as crueldades da guerra de que participava, com a segurança real e a felicidade de seu povo. Em favor da nação — essa é a ideia que se impõe no exame de seu caso — ele se colocou contra o Pentágono e contra a diplomacia cínica, hipócrita e prepotente de seu governo.


De acordo com os observadores, ele poderá ser condenado à prisão perpétua, mas, provavelmente, um dia, seus atos serão vistos como heróicos.

domingo, 8 de maio de 2011

Carta de um Nobel da Paz a Barack Obama



Quando te outorgaram o Prêmio Nobel da Paz, do qual somos depositários, te enviei uma carta que dizia: “Barack, me surpreendeu muito que tenham te outorgado o Nobel da Paz, mas agora que o recebeu deve colocá-lo a serviço da paz entre os povos; tens toda a possibilidade de fazê-lo, de terminar as guerras e começar a reverter a situação que viveu teu país e o mundo”. No entanto, ao invés disso, você incrementou o ódio e traiu os princípios assumidos na campanha eleitoral frente ao teu povo, como terminar com as guerras no Afeganistão e no Iraque e fechar as prisões em Guantánamo e Abu Graib no Iraque. O artigo é de Adolfo Pérez Esquivel.

Estimado Barack, ao dirigir-te esta carta o faço fraternalmente para, ao mesmo tempo, expressar-te a preocupação e indignação de ver como a destruição e a morte semeada em vários países, em nome da “liberdade e da democracia”, duas palavras prostituídas e esvaziadas de conteúdo, termina justificando o assassinato e é festejada como se tratasse de um acontecimento desportivo.

Indignação pela atitude de setores da população dos Estados Unidos, de chefes de Estado europeus e de outros países que saíram a apoiar o assassinato de Bin Laden, ordenado por teu governo e tua complacência em nome de uma suposta justiça. Não procuraram detê-lo e julgá-lo pelos crimes supostamente cometidos, o que gera maior dúvida: o objetivo foi assassiná-lo.

Os mortos não falam e o medo do justiçado, que poderia dizer coisas inconvenientes para os EUA, resultou no assassinato e na tentativa de assegurar que “morto o cão, terminou a raiva”, sem levar em conta que não fazem outra coisa que incrementá-la.

Quando te outorgaram o Prêmio Nobel da Paz, do qual somos depositários, te enviei uma carta que dizia: “Barack, me surpreendeu muito que tenham te outorgado o Nobel da Paz, mas agora que o recebeu deve colocá-lo a serviço da paz entre os povos; tens toda a possibilidade de fazê-lo, de terminar as guerras e começar a reverter a situação que viveu teu país e o mundo”.

No entanto, ao invés disso, você incrementou o ódio e traiu os princípios assumidos na campanha eleitoral frente ao teu povo, como terminar com as guerras no Afeganistão e no Iraque e fechar as prisões em Guantánamo e Abu Graib no Iraque. Não fez nada disso. Pelo contrário, decidiu começar outra guerra contra a Líbia, apoiada pela OTAM e por uma vergonhosa resolução das Nações Unidas. Esse alto organismo, apequenado e sem pensamento próprio, perdeu o rumo e está submetido às veleidades e interesses das potências dominantes.

A base fundacional da ONU é a defesa e promoção da paz e da dignidade entre os povos. Seu preâmbulo diz: “Nós os povos do mundo...”, hoje ausentes deste alto organismo.

Quero recordar um místico e mestre que tem uma grande influência em minha vida, o monge trapense da Abadia de Getsemani, em Kentucky, Tomás Merton, que diz: “a maior necessidade de nosso tempo é limpar a enorme massa de lixo mental e emocional que entope nossas mentes e converte toda vida política e social em uma enfermidade de massas. Sem essa limpeza doméstica não podemos começar a ver. E se não vemos não podemos pensar”.

Você era muito jovem, Barack, durante a guerra do Vietnã e talvez não lembre a luta do povo norteamericano para opor-se à guerra. Os mortos, feridos e mutilados no Vietnã até o dia de hoje sofrem as consequências dessa guerra.

Tomás Merton dizia, frente a um carimbo do Correio que acabava de chegar, “The U.S. Army, key to Peace” (O Exército dos EUA, chave da paz): “Nenhum exército é chave da paz. Nenhuma nação tem a chave de nada que não seja a guerra. O poder não tem nada a ver com paz. Quanto mais os homens aumentam o poder militar, mais violam e destroem a paz”.
Acompanhei e compartilhei com os veteranos da guerra do Vietnã, em particular Brian Wilson e seus companheiros que foram vítimas dessa guerra e de todas as guerras.

A vida tem esse não sei o quê do imprevisto e surpreendente fragrância e beleza que Deus nos deu para toda a humanidade e que devemos proteger para deixar às gerações futuras uma vida mais justa e fraterna, reestabelecendo o equilíbrio com a Mãe Terra.

Se não reagirmos para mudar a situação atual de soberba suicida que está arrastando os povos a abismos profundos onde morre a esperança, será difícil sair e ver a luz; a humanidade merece um destino melhor. Você sabe que a esperança é como o lótus que cresce no barro e floresce em todo seu esplendor mostrando sua beleza.

Leopoldo Marechal, esse grande escritor argentino, dizia que: “do labirinto, se sai por cima”.

E creio, Barack, que depois de seguir tua rota errando caminhos, você se encontra em um labirinto sem poder encontrar a saída e te enterra cada vez mais na violência, na incerteza, devorado pelo poder da dominação, arrastado pelas grandes corporações, pelo complexo industrial militar, e acredita ter todo o poder e que o mundo está aos pés dos EUA porque impõem a força das armas e invade países com total impunidade. É uma realidade dolorosa, mas também existe a resistência dos povos que não claudicam frente aos poderosos.

As atrocidades cometidas por teu país no mundo são tão grandes que dariam assunto para muita conversa. Isso é um desafio para os historiadores que deverão investigar e saber dos comportamentos, políticas, grandezas e mesquinharias que levaram os EUA á monocultura das mentes que não permite ver outras realidades.

A Bin Laden, suposto autor ideológico do ataque às torres gêmeas, o identificam como o Satã encarnado que aterrorizava o mundo e a propaganda do teu governo o apontava como “o eixo do mal”. Isso serviu de pretexto para declarar as guerras desejadas que o complexo industrial militar necessitava para vender seus produtos de morte.

Você sabe que investigadores do trágico 11 de setembro assinalam que o atentado teve muito de “auto golpe”, como o avião contra o Pentágono e o esvaziamento prévios de escritórios das torres; atentado que deu motivo para desatar a guerra contra o Iraque e o Afeganistão, argumentando com a mentira e a soberba do poder que estão fazendo isso para salvar o povo, em nome da “liberdade e defesa da democracia”, com o cinismo de dizer que a morte de mulheres e crianças são “danos colaterais”. Vivi isso no Iraque, em Bagdá, com os bombardeios na cidade, no hospital pediátrico e no refúgio de crianças que foram vítimas desses “danos colaterais”.

A palavra é esvaziada de valores e conteúdo, razão pela qual chamas o assassinato de “morte” e que, por fim, os EUA “mataram” Bin Laden. Não trato de justificá-lo sob nenhum conceito, sou contra todas as formas de terrorismo, desde a praticada por esses grupos armados até o terrorismo de Estado que o teu país exerce em diversas partes do mundo apoiando ditadores, impondo bases militares e intervenção armada, exercendo a violência para manter-se pelo terror no eixo do poder mundial. Há um só eixo do mal? Como o chamarias?

Será que é por esse motivo que o povo dos EUA vive com tanto medo de represálias daqueles que chamam de “eixo do mal”? É simplismo e hipocrisia querer justificar o injustificável.

A Paz é uma dinâmica de vida nas relações entre as pessoas e os povos; é um desafio à consciência da humanidade, seu caminho é trabalhoso, cotidiano e portador de esperança, onde os povos são construtores de sua própria vida e de sua própria história. A Paz não é dada de presente, ela se constrói e isso é o que te falta meu caro, coragem para assumir a responsabilidade histórica com teu povo e a humanidade.

Não podes viver no labirinto do medo e da dominação daqueles que governam os EUA, desconhecendo os tratados internacionais, os pactos e protocolos, de governos que assinam, mas não ratificam nada e não cumprem nenhum dos acordos, mas pretendem falar em nome da liberdade e do direito. Como pode falar de Paz se não quer assumir nenhum compromisso, a não ser com os interesses de teu país?

Como pode falar da liberdade quanto tem na prisão pessoas inocentes em Guantánamo, nos EUA e nas prisões do Iraque, como a de Abu Graib e do Afeganistão?

Como pode falar de direitos humanos e da dignidade dos povos quando viola ambos permanentemente e bloqueia quem não compartilha tua ideologia, obrigando-o a suportar teus abusos?

Como pode enviar forças militares ao Haiti, depois do terremoto devastador, e não ajuda humanitária a esse povo sofrido?

Como pode falar de liberdade quando massacra povos no Oriente Médio e propaga guerras e tortura, em conflitos intermináveis que sangram palestinos e israelenses?

Barack, olha para cima de teu labirinto e poderá encontrar a estrela para te guiar, ainda que saiba que nunca poderá alcançá-la, como bem diz Eduardo Galeano. Busca a coerência entre o que diz e faz, essa é a única forma de não perder o rumo. É um desafio da vida.

O Nobel da Paz é um instrumento ao serviço dos povos, nunca para a vaidade pessoal.

Te desejo muita força e esperança e esperamos que tenha a coragem de corrigir o caminho e encontrar a sabedoria da Paz.

Adolfo Pérez Esquivel, Nobel da Paz 1980.
Buenos Aires, 5 de maio de 2011

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Puta falta de sacanagem!


Ativistas fazem acordo para perseguir ex-presidente Bush

 

ONGs de direitos humanos prometem não dar sossego ao ex-presidente dos Estados Unidos, George W. Bush (2001-2009). Ativistas de vários países fizeram um acordo para perseguir o ex-líder americano, responsável pela invasão do Iraque, em suas viagens pelo mundo. Eles irão entrar com processos na Justiça dos países pedindo investigação sobre violações de direitos durante seu governo.

A atuação das ONGs já fez o ex-presidente cancelar uma viagem à Suíça na última semana, por temer uma ordem de prisão. Katherine Gallagher, advogada da ONG Centro para os Direitos Constitucionais disse ao jornal britânico The Guardian que as associações querem lançar mão das convenções internacionais sobre tortura.

Bush é responsabilizado, especificamente, por violações de direitos humanos na prisão de Guantánamo, para onde foram mandados acusados de terrorismo.

Katherine diz que “torturadores, mesmo que sejam ex-presidentes dos Estados Unidos, devem ser presos para serem processados”.

Embora o ex-presidente viaje pelo mundo desde que deixou a Casa Branca, em 2009, os ativistas agora usam declarações feitas por Bush em seu livro de memória, no qual ele diz que autorizou técnicas de depoimento que são consideradas tortura – como mergulhar a cabeça do preso em água.


Leia mais em: O Esquerdopata 

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Um Belo Depoimento

Do urânio empobrecido em Faluja, Iraque


Em Faluja, no Iraque, uma quantidade bem acima do comum dos bebês nascem com deformidades. A causa suposta é o urânio empobrecido usado nas munições das forças de ocupação estadunidenses. (Imagens perturbadoras das deformidades em bebês causadas por urânio empobrecidoaqui.)


É o que diz a Hora do povo (via Blog do velho comunista), mencionando oInternational Journal of Environmental Research and Public Health.

Recentemente, esta revista publicou um número especial sobre metais pesados e saúde.

No artigo "Cancer, Infant Mortality and Birth Sex-Ratio in Fallujah, Iraq 2005–2009", citado na CMI, os autores de uma pesquisa feita no local dizem relatam "a existência de sérios efeitos de mutação relacionados à saúde em Faluja".

Há outras informações importantes e perturbadoras sobre o urânio empobrecido na revista.

  • O urânio empobrecido é um novo poluente que vem sendo introduzido no ambiente
  • O principal modo de introdução é a atividade militar
  • O urânio empobrecido é menos radioativo do que o urânio natural, mas é igualmente tóxico
  • O urânio empobrecido altera de maneira persistente o comportamento e o cérebro de adultos

Quem nos diz isso é o cientista Wayne Briner no seu artigo sobre a toxicidade do urânio empobrecido.

Assim, ao que parece, uma bala estadunidense mata um nascido, deforma um de cada x não nascidos, e compromete a saúde de diversos outros animais, incluindo humanos, além de poluir o ambiente com radiação. E Faluja, celebrada em videogames e seriadinhos de TV, é o campo onde se brincou com tudo isso. 

aNImOt

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

A bandeira errada e a bandeira certa

DEBATE ABERTO

Na falta de um verdadeiro confronto militar na tomada de Bagdá, o embate se deu sob forma simbólica, através da derrubada de uma estátua de Saddam. Um militar pendurou uma bandeira dos EUA na cabeça da estátua, logo substituída por uma bandeira iraquiana. Era uma tentativa de projetar um fundo histórico que engrandecesse aquela cena ridícula.
Na manhã do dia 09/04/2003 eu estava sentado diante da televisão, em meu apartamento no bairro do Butantã, em São Paulo. Assistia ao vivo a entrada triunfal (à tarde lá, pela diferença de horário) das tropas norte-americanas em Bagdá. À noite, assisti as reportagens sobre o evento em vários canais de TV, nacionais e estrangeiros.

No dia seguinte, 10/04/2003, publiquei um artigo nesta Carta Maior (quando minha coluna ainda tinha o nome de “Cartas Ácidas”, pois eu substituía interinamente Bernardo Kucinski, convocado a colaborar com o Presidente Lula) chamado “A bandeira errada”, sobre a diferença entre o que eu vira à tarde e o que vira à noite.

O foco do título era uma atitude precipitada, descrita como “ato falho” de um militar norte-americano. Na falta de um verdadeiro confronto militar na tomada de Bagdá, o embate se deu sob forma simbólica, através da derrubada de uma estátua de Saddam Hussein, na praça Fildos. Um dos militares – que hoje sei se chamar o Cabo Edward Chin – pendurou uma bandeira norte-americana na cabeça da estátua. Ajudada pelo vento, ela se plantou em seu alvo de cabeça para baixo, o que, na linguagem internacional, é aviso de situação difícil e de pedido de socorro. A bandeira pertencia a outro militar – Tim Maclaughlin – que a levara com a esperança algo obsessiva de hasteá-la em algum lugar para compor uma cena histórica. Talvez o que o inspirasse fosse a famosa cena (montada e remontada algumas vezes) dos soldados soviéticos hasteando a bandeira vermelha no alto do Reichstag, em Berlim, no gesto que simbolizaria o fim da Segunda Guerra Mundial. Ou ainda a foto (também construída e reconstruída) dos soldados norte-americanos hasteando a bandeira de seu país em Iwo Jima.

A bandeira ficou naquele alvo pouco mais de um minuto. O suficiente para oficiais no local e até em Washington, que assistiam ao vivo a invasão, que nem eu, perceberem o “erro” que aquilo significava. A bandeira dos EUA foi retirada, e em seu lugar colocou-se uma do Iraque, na posição certa. Seguiu-se a derrubada da estátua, proeza feita por um buldozer do Exército norte-americano, puxando uma corda atada à sua cabeça.

O feito nada tivera de heróico, ao contrário, para quem o vira ao vivo soava e ainda soa como, sobretudo, ridículo. Mas o noticiário à noite apresentava a derrubada com ares épicos de uma guerra de libertação, no Ocidente; como uma invasão de conquista, no mundo árabe, como na Al Jazzeera. No primeiro, preferia-se a versão com a bandeira iraquiana na cabeça; no segundo, a imagem da bandeira norte-americana era incluída.

No primeiro, havia uma epopéia redentora de um povo; no segundo, uma manipulação grosseira de imagens, planejada desde o começo.

Pulemos 8 anos. Ao entardecer de 09/01/2011, navegando na internet a partir de meu apartamento em Berlim, deparei com interessante artigo do colunista de assuntos internacionais Marcos Guterman, do Estadão (publicado em 06/01). Nele o colunista reporta sob o título “A gênese de um factóide de guerra”, o conteúdo de outro artigo, desta vez do norte-americano Peter Maass, publicado no New Yorker (“The Toppling. How the media inflated a minor moment in a long war”).

Peter Maass estava lá, no dia 09/04/2003, em Bagdá, na praça Firdos. Talvez eu até o tenha visto, quem sabe? Fui até o seu artigo. De modo muito interessante, ele confirma a leitura do meu modesto “A bandeira errada”, mas acrescenta dados muito significativos. A tese principal de Maass é a de desmontar a argumentação, por exemplo, da Al Jazzeera, de que aquilo fora um factóide planejado e montado a priori pelas forças norte-americanas. Não: para ele, o que houve foi um suceder de fatos independentes um do outro. A obsessão do dono da bandeira; o impulso de fazer algo que desse significado a um ato, no fundo, decepcionante, para quem esperava um rude combate que glorificasse a “ação épica” de um exército “libertador”; a leitura do erro, in loco e à distância, que significara a cobertura da cabeça de Saddam com a bandeira norte-americana; sua substituição pela bandeira iraquiana. Para o repórter norte-americano, inclusive, a passagem pela praça Fildos foram inteiramente ocasional; o comandante da coluna blindada norte-americana procurava o Hotel Palestina, onde se concentrava a mídia internacional, e na busca de informações, já que não tinha um mapa detalhado daquele bairro em Bagdá, desembocara na praça onde estava a estátua. E tudo isso vem muito bem documentado e corroborado por entrevistas, testemunhos, etc.

Só que, ao fazer isso, Peter Maass torna explicitamente claro o papel da mídia ocidental, então 99% aderente, senão sua incitadora, à campanha invasora do Iraque, e à tese da posse, por Saddam Hussein, de armas de destruição em massa, tese que se comprovou fictícia e manipulada a partir da própria mídia e do governo Bush Filho. É discutível, mesmo lendo o artigo do New Yorker, que tudo tenha sido tão completamente fruto do acaso. Fica evidente que, no meio do tumulto, tanto na mídia como no escalão militar houve quem percebesse, no instante e a posteriori, o valor simbólico daquilo. Prova disso é o relato de alguns repórteres sobre como suas reportagens foram modificadas pelos editores, back home, para dar-lhe o realce épico que nossa mídia pró-ocidente no Brasil, provinciana e canhestramente ecoou.

Oito anos depois, o Estadão, mesmo inadvertidamente, dá o chapeau à Carta Maior. Mérito pessoal? Sim, guardo um, e com muita satisfação. O de ter assistido, ao vivo, aquelas transmissões, e ter podido, dessa forma, senão fazer um juízo preciso sobre os acontecimentos, detectar a exata medida sobre como as versões construídas depois eram deveras enganosas. Eram montadas para enganar, num crime jornalisticamente doloso, do lado do Ocidente.

Mas uma coisa é certa. Ainda me aferro à convicção de que o “ato falho” do cabo Edward Chin, hasteando a bandeira que o então soldado Maclaughlin levara, tinha em si a chave para o âmago do espetáculo, tenha sido ele planejado antes ou não: projetar um fundo histórico (advindo da Segunda Guerra, seja a soviética no Reichstag ou a norte-americana em Iwo Jima) que engrandecesse aquela cena ridícula.

Ou seja, para o olhar investigativo, a bandeira errada era a bandeira certa. Inclusive por estar de cabeça para baixo.

Flávio Aguiar é correspondente internacional da Carta Maior em Berlim.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Força e fragilidade do Ciberativismo

Este blog saiu do ar da madrugada até o meio da manhã desta quinta-feira. O fato ocorreu por razõe$ que nada têm que ver com ataques cibernéticos de hackers, crackers ou coisa que o valha, e muito menos devido a retaliações de qualquer tipo, mas a inacessibilidade desta página de ativismo político gerou reflexão ao seu editor sobre um fato que está ocorrendo agora mesmo e que simboliza, na prática, uma grave ameaça ao ciberativismo.
Tal reflexão decorre, como deve ter ficado óbvio a alguns, das retaliações que o ciberativista australiano Julian Assange vem sofrendo por conta dos constrangimentos que vem gerando ao governo dos Estados Unidos desde que desencadeou uma onda de denúncias em seu site, o WikiLeaks (vazamentos rápidos ou abundantes, em tradução livre), a partir de setembro, quando a página denunciou abusos que os americanos cometeram contra os direitos humanos de civis inocentes na guerra do Iraque.
Os documentos vazados pela página wiki de Assange denunciaram, primeiro, a política sanguinolenta que os EUA impuseram ao Iraque, com literal assassinato em massa de dezenas de milhares de homens, mulheres, crianças e velhos – e sem que a nossa boa e velha mídia tenha dito sobre os ianques qualquer coisa sequer parecida com o que diz sobre o regime iraniano –, e, agora, o WikiLeaks denunciou os constrangedores telegramas confidenciais da diplomacia americana.
Em que pese a duvida sobre a motivação de Assange para ir tão longe – seria um idealista, alguém em busca de notoriedade, um louco ou um vigarista? –, o que sua prisão, as acusações que vem sofrendo e o estrangulamento financeiro e estrutural de sua organização mostram é como alguém pode incomodar até os mais poderosos entre os poderosos valendo-se apenas de uma mísera página na internet e como essa pessoa pode se tornar alvo de uma campanha de destruição rápida, implacável e eficiente.
Se alguém como Assange, com seus contatos, fontes secretas, doações e patrocínios milionários pode ser anulado com a facilidade que se viu no âmbito de um processo escandalosamente casuísta – ou alguém acredita que as acusações de “estupro” contra si, surgidas logo após as denúncias, foram coincidências? –, o que é possível fazer contra um pobre diabo como o ciberativista autor deste blog e outros como ele?