Mente vazia, oficina do sistema da mídia golpista

Mente vazia, oficina do sistema da mídia golpista

quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Em 2003, SP teve crise hídrica igual; previsão era água acabar em 2010




racionamento capa

A cada mês de janeiro é a mesma coisa: a mídia alardeia que haverá racionamento de energia devido a algum blecaute de alguns minutos em mais de um Estado ao mesmo tempo. Em janeiro de 2013, por exemplo, a presidente Dilma Rousseff teve que ir à tevê desmentir versões nesse sentido.
O ano mal começara e a Folha de São Paulo veiculou em sua primeira página, no dia 7 de janeiro de 2013,“reportagem” da então colunista do jornal Eliane Cantanhede que afirmava que o Palácio do Planalto convocara reunião de “emergência” para discutir “racionamento de energia”.
racionamento 1
Confira, abaixo a matéria alarmista da Folha publicada naquele 7 de janeiro de 2013
racionamento 2
Diante de notícia tão alarmista e divulgada com tanto destaque, o ministro das Minas e Energia, Edison Lobão, ligou para Cantanhêde, autora da matéria em tela, para informar que a reunião não fora convocada por Dilma e nem era de “emergência”, pois integrava um cronograma de reuniões ordinárias do Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE) que acontece todos os meses. E divulgou, no site do Ministério, o cronograma de reuniões para 2013.
Veja, abaixo, o cronograma.
racionamento 3
Contudo, como o alarmismo não parava, a presidente da República teve que convocar rede nacional de rádio e tevê para acalmar a população e para anunciar expressiva redução nas contas de luz.








À época, a redução de preços – que, em alguns casos, chegou a 30% – foi duramente criticada pela imprensa oposicionista. Hoje, com a seca recorde no país, a mídia denuncia “aumento” na conta de luz que, no máximo, será um retorno aos preços pré-redução do preço da energia.

Todo começo de ano é a mesma coisa. A mídia alardeia racionamentos. Quando, a cada grande espaço de tempo, ocorre algum blecaute de alguns minutos, é a mesma cantilena: vai ter racionamento. Como em 2012, 2013, 2014, em 2015 a mídia também trouxe de volta o alarmismo energético devido a um blecaute de 45 minutos por algum acidente nas linhas de transmissão na última segunda-feira (19).

Mas isso não é novidade. A população já conhece essa cantilena e ninguém se preocupa com a hipótese de racionamento de energia. Nem os que dizem que se preocupam.

Esse escarcéu que a mídia está fazendo por conta de 45 minutos de falta de luz em alguns Estados simultaneamente visa esconder o drama do povo de São Paulo, que já enfrenta um duro racionamento, com um aumento exponencial de preços na conta de água (até 100%).

O mais impressionante em tudo isso é que o drama que vive São Paulo, à diferença da questão energética, deve-se, exclusivamente, ao PSDB do Estado, que governa São Paulo desde 1995 e que em 2003, sob o mesmo Geraldo Alckmin, enfrentara uma seca praticamente igual à de hoje enquanto todos os especialistas alertavam que o Estado ficaria sem água em, no máximo, sete anos.

Os analistas erraram. A água não terminou em 2010, mas em 2014, a partir de quando os paulistas passaram a sofrer o pior tipo de racionamento que existe, o racionamento disfarçado, que Globo, Folha,
Veja, Estadão e companhia limitada recusam-se a chamar pelo nome enquanto continuam inventando um racionamento de energia elétrica que anunciaram tantas vezes, que nunca ocorreu e nem irá ocorrer.

Confira, abaixo, reportagem da Folha de São Paulo de 12 de outubro de 2003
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“O Brasil é uma oportunidade excepcional !” Os juros de longo prazo já indicam mais confiança.

 “ O Brasil é uma oportunidade excepcional ! ”

Os juros de longo prazo já indicam mais confiança.


Daniel Rittner, especialista em atrasos de obras de infra-estrutura, e Luciano Máximo, do Valor, entrevistaram Luiz Carlos Trabuco, do Bradesco, em Davos, na Suíça.

Seguem-se algumas considerações do presidente do Bradesco, um pequeno banco do interior de São Paulo, sediado em Marília e cujas opiniões não merecem refletir-se nos colonistas (ver no ABC do C Af) do PiG:

- Alguns investidores aqui (em Davos) já nos disseram que o Brasil tem futuro e é uma possibilidade excepcional para investir;

- O ano de 2015 deverá comemorar o ajuste de dois pilares: o fiscal e o da política monetária;

- Os juros de longo prazo do Tesouro Nacional, NTN-Bs já caíram de 7% para 6%;

- Já é reflexo da mudança de dimensionamento da política econômica;

- Este é um ano de encontro. Atingiremos a competitividade se tivermos uma boa logística;

- Para que o processo de concessões seja mais barato, é preciso haver confiança do (empresario);

- Foi importante aumentar a CIDE (dos combustíveis) porque aumenta a arrecadação e ameniza a crise do setor de etanol;

- A retomada de 2015 se dará com os investimentos em infra-estrutura, que dependem de se virar a pagina do problema da Petrobras e da Lava Jato
(clique aqui para ler “as empreiteiras não podem fechar”.)

(Leia também o que disse o PML sobre a “ideologia” do Dr Moro”; clique aqui para ver que o Dr Moro parece ter saído aos seus, anti-lulistas; e aqui, onde se pergunta se ele leu o Padre Vieira.)

Sobre o apagão do Alckmin, disse Trabuco:

“A solução para a crise hídrica não está em represas construidas há 20, 30 anos, quando a cidade tinha outra densidade populacional. Precisamos ser extremamente arrojados”.

- Já se percebem os reflexos do “choque de credibilidade”.

Ao contrário dos colonistas do PiG, o Conversa Afiada presta muita atenção às serenas palavras do Trabuco.
Lamenta que não tenha sido ele o Ministro – clique aqui para ler ”o Conversa Afiada apoia a preferência por Trabuco”.
O Conversa Afiada acredita que é preciso um ajuste.
Não chamaria de um “choque de credibilidade”, porque o Guido Mantega merece credibilidade e desempenhou seu papel com eficiência e coragem.
Segurou a barra numa situação difícil – especialmente numa eleição em que o Governo ficou sitiado pelo PiG até o início do horário eleitoral: sem poder se defender ou mostrar o que fez.
O Conversa Afiada, porém, leu o Piketty.
Será que a Urubóloga leu ?
E, portanto, tem as suas dúvidas sobre um “ajuste” neolibelês, em que o custo cai no lombo dos mais vulneráveis.
Preferia que o Levy tratasse imediatamente de um imposto sobre grandes fortunas, como sugere o Piketty e repudiam os filhos do Roberto Marinho.
Preferia que o Levy anunciasse um projeto de lei para recriar a CPMF.
E não se contentasse como aumento de impostos que não discriminam ricos de pobres.
Agora, por exemplo, a Presidenta Dilma não corrigiu a tabela do Imposto de Renda, para não perder arrecadação.
Quem mais sofre ?
O coitadinho da classe média, porque os filhos do Roberto Marinho nem se coçarão.



Em tempo: o Trabuco é a única boa notícia no PiG cheiroso (ver no ABC do C Af).

O resto é uma desgraça só.

Imagina, amigo navegante, que a edição impressa do jornal (sic) abre com duas fotografias assustadoras: a do Adriano Pires – ah, quando eu crescer quero ser o Adriano Pires – e do banqueiro Luiz Carlos Mendonça de Barros, que o PiG insiste em tratar como se laureado economista fosse.

É aquele do “se isso der m…”.

Lembram ?

Barros é quem estava do outro lado da linha …

Em tempo2: o Valor não registrou a presença do Aécio Never, que iria a Davos no lugar da Dilma.


Paulo Henrique Amorim



Ao contrário dos colonistas do PiG, o Conversa Afiada presta muita atenção às serenas palavras do Trabuco.
Lamenta que não tenha sido ele o Ministro – clique aqui para ler ”o Conversa Afiada apoia a preferência por Trabuco”.
O Conversa Afiada acredita que é preciso um ajuste.
Não chamaria de um “choque de credibilidade”, porque o Guido Mantega merece credibilidade e desempenhou seu papel com eficiência e coragem.
Segurou a barra numa situação difícil – especialmente numa eleição em que o Governo ficou sitiado pelo PiG até o início do horário eleitoral: sem poder se defender ou mostrar o que fez.
O Conversa Afiada, porém, leu o Piketty.
Será que a Urubóloga leu ?
E, portanto, tem as suas dúvidas sobre um “ajuste” neolibelês, em que o custo cai no lombo dos mais vulneráveis.
Preferia que o Levy tratasse imediatamente de um imposto sobre grandes fortunas, como sugere o Piketty e repudiam os filhos do Roberto Marinho.
Preferia que o Levy anunciasse um projeto de lei para recriar a CPMF.
E não se contentasse como aumento de impostos que não discriminam ricos de pobres.
Agora, por exemplo, a Presidenta Dilma não corrigiu a tabela do Imposto de Renda, para não perder arrecadação.
Quem mais sofre ?
O coitadinho da classe média, porque os filhos do Roberto Marinho nem se coçarão.



Em tempo: o Trabuco é a única boa notícia no PiG cheiroso (ver no ABC do C Af).

O resto é uma desgraça só.

Imagina, amigo navegante, que a edição impressa do jornal (sic) abre com duas fotografias assustadoras: a do Adriano Pires – ah, quando eu crescer quero ser o Adriano Pires – e do banqueiro Luiz Carlos Mendonça de Barros, que o PiG insiste em tratar como se laureado economista fosse.

É aquele do “se isso der m…”.

Lembram ?

Barros é quem estava do outro lado da linha …

Em tempo2: o Valor não registrou a presença do Aécio Never, que iria a Davos no lugar da Dilma.


Paulo Henrique Amorim

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Como o Netflix conquistou Thiago e, aos poucos, com a Amazon, vai matar a Globo

Como o Netflix conquistou Thiago e, aos poucos, com a Amazon, vai matar a Globo



Os filhos do Marinho vamos pegar de surpresa…
filhos do marinho

por Luiz Carlos Azenha, de Nova York

Antes desta minha mais recente viagem encontrei Thiago, que estava animado com sua nova conquista: uma TV que conecta na internet. Ele comprou o aparelho no Black Friday, por menos de mil reais.
Considerando que Thiago e a esposa ascenderam durante os governos Lula e Dilma mas economicamente ainda se encaixam na classe “C”, fiquei surpreso. Por que abandonar as novelas da Globo, das quais o casal, no passado, foi fiel consumidor?

Resposta do Thiago: assinei o Netflix, agora quero ver filmes e series de TV a qualquer hora. Bingo! Menos um para a “grade”  de programas dos Marinho, grade que tem sentido literal para jovens como Thiago, jovens que gostam da liberdade de definir seus próprios horários de entretenimento.

Desembarco em Nova York e aqui só se fala, nos meios televisivos, da disputa entre o Netflix e a Amazon, ambos agora no papel de produtores de conteúdo exclusivo.

Cada vez mais, as redes de TV tradicionais transpiram um cheiro de naftalina.

Com a série Transparent, que retrata um transsexual que aos 68 anos de idade decide viver como mulher, o canal da Amazon na internet ganhou seu primeiro Golden Globe, na categoria melhor comédia. Na internet, o feito antes era exclusivo do Netflix, com suas séries House of Cards e Orange is the new black.

Como resultado do sucesso de suas séries, o Netflix acaba de bater nos 50 milhões de assinantes. Em períodos recentes, mais da metade do crescimento veio do exterior, ou seja, de gente como Thiago.
Visando estimular acesso ao seu canal Prime, a Amazon acaba de assinar contrato com Woody Allen, que produzirá sua primeira série de TV para passar inicialmente… na internet!

A aposta dos dois gigantes se concentra em temas ousados. Nem a Amazon, nem o Netflix buscam o público mediano, como faz a Globo com suas telenovelas. Para fisgar os jovens de até 30 anos faz-se necessário violar todos os tabus de um país puritano.

Por isso, House of Cards viaja pelos corredores corrompidos do poder, num roteiro que jamais caberia nas sisudas ABC, CBS ou NBC.

Desde que a HBO inventou o slogan ” it’s not TV, it’s HBO”, demarcando um  novo território para as séries norte-americanas, os Estados Unidos vivem um boom no setor, produzindo joias como The Sopranos,Breaking Bad e Homeland.

No Brasil, isso seria impensável, por conta do virtual monopólio da Globo. A empresa dos Marinho controla, do Rio, de maneira verticalizada, 80% da capacidade de produzir conteúdo, concentrando atores, diretores, produtores, roteiristas, etc.

Nos Estados Unidos, por lei, nenhuma rede de TV pode produzir tudo o que coloca no ar. Precisa comprar de terceiros. Isso incentivou, ao longo do tempo, o desenvolvimento de uma cadeia de produtoras independentes em praticamente todos os grandes mercados do país.

Agora, com Netflix e Amazon entrando na disputa, esse mercado ficará ainda mais fortalecido. Ambas visam atingir o público através de plataformas móveis, especialmente do celular.

Enquanto no Brasil discutimos se e quando o jornal de papel vai acabar, aqui nos Estados Unidos o debate é sobre quando o computador desktop vai se tornar obsoleto.

Segundo Gian Fulgini, da Comscore, nos últimos 4 anos o tempo de uso de  internet dos norte-americanos teve acréscimo de 157%.
Hoje, os usuários de celular dos Estados Unidos passam mais da metade do tempo… na internet.
Que tal assistir a um capítulo do House of Cards em seu celular, durante uma viagem de trem entre Nova York e Washington?

Para os irmãos Marinho, o problema é que este conteúdo também estará disponível para o motorista preso num congestionamento na Mogi-Bertioga ou bem ali, no Jardim Botânico.

Todo o Brasil vai acabar pagando, para os Estados Unidos, o pesado pedágio por ter mantido um setor tão importante da economia praticamente monopolizado e, portanto, engessado.

Leia também:

O terror, o Ocidente e a semeadura do caos

O terror, o Ocidente e a semeadura do caos

Mauro Santayana 

Há alguns dias, terroristas franceses, ligados, aparentemente, à Al Qaeda, atacaram a redação do jornal satírico parisiense Charlie Hebdo, em represália pela publicação de caricaturas sobre o profeta Maomé.

Doze pessoas foram assassinadas, entre elas alguns dos mais famosos cartunistas e intelectuais do país, e dois cidadãos de origem árabe, um deles, estrangeiro, que trabalhava há pouco tempo na publicação, e um membro das forças de segurança que estava nas imediações.

Logo em seguida, houve, também, outro ataque, a um supermercado kosher na periferia de Paris, em que 4 judeus franceses e estrangeiros morreram.

Dias depois, milhões de pessoas, e personalidades de vários países do mundo, se reuniram nas ruas da capital francesa, para protestar contra o atentado, e se manifestar contra o terrorismo e pela liberdade de expressão.

Na mesma primeira quinzena de janeiro, explodiram carros-bomba, e homens-bomba, também ligados a grupos radicais islâmicos, no Líbano (Beirute), na Síria (Aleppo), na Líbia (Benghazi), e no Iraque (Al-Anbar), com dezenas de mortos, em sua maioria civis.

Mas, como sempre, não seria normal esperar que algum destes fatos tivesse a mesma repercussão do atentado em Paris, capital de um país europeu, ou que a alguém ocorresse produzir cartazes e neles escrever Je suis Ahmed, ou Je suis Ali, ou Je suis Malak, Malak Zahwe, a garota brasileira, paranaense, de 17 anos, que morreu na explosão de um carro-bomba, junto com mais 4 pessoas (20 ficaram feridas), no dia 2 de janeiro, em Beirute.

No entanto, os homens, mulheres e crianças, mortos, todos os dias, no Oriente Médio e no Norte da África, são tão frágeis e preciosos, em sua fugaz condição humana, quanto os que morreram na França, e vítimas dos mesmos criminosos, criados pela onda de radicalização e rápida expansão do fundamentalismo islâmico, nos últimos anos.

Raivosas, autoritárias, intempestivas, numerosas vozes se alçaram, em vários países, incluído o Brasil, para gritar – em raciocínio tão ignorante quanto irascível – que o terrorismo não tem que ser “compreendido” e, sim, “combatido”.

Os filósofos e estrategistas chineses ensinam, há séculos, que sem conhecê-los, não é possível vencer os eventuais adversários, nem mudar o mundo.

Além disso, não podemos, por aqui, por mais que muitos queiram emular os países “ocidentais”, em seu ardoroso “norte-americanismo” e “eurocentrismo”, esquecer que existem diferenças históricas, e de política externa, entre o Brasil, os EUA, e países da OTAN como a França.

Podemos dizer que Somos Charlie, porque defendemos a liberdade e a democracia, e não aceitamos que alguém morra por fazer uma caricatura, do mesmo jeito que não podemos aceitar que uma criança pereça bombardeada pela OTAN no Afeganistão ou na Líbia, ou porque estava de passagem, no momento em que explodiu um carro-bomba, por um posto de controle em Aleppo, na Síria.

Mas é preciso lembrar que, ao contrário da França, nunca colonizamos países árabes e africanos, não temos o costume de fazer charges sobre deuses alheios em nossos jornais, não jogamos bombas sobre países como a Líbia, não temos bases militares fora do nosso território, não colaboramos com os EUA em sua política de expansão e manutenção de uma certa “ordem” ocidental e imperial, e, talvez, por isso mesmo – graças a sábia e responsável política de Estado, que inclui o princípio constitucional de não intervenção em assuntos de outros países – não sejamos atacados por terroristas em nosso território.

As raízes dos atentados de Paris, e do mergulho do Oriente Médio na maior, e, com certeza, mais profunda tragédia de sua história, não está no Al Corão ou nas charges contra o Profeta Maomé, embora estas últimas possam ter servido de pretexto para ataques como o que ocorreu em Paris.

Elas começaram a se tornar mais fortes, nos últimos anos, quando o “ocidente”, mais especificamente alguns países da Europa e os EUA, tomaram a iniciativa de apoiar e insuflar, usando também as redes sociais, o “conto do vigário” da Primavera Árabe em diversos países, com a intenção de derrubar regimes nacionalistas que, com todos os seus defeitos, tinham conquistado certo grau de paz, desenvolvimento e estabilidade para seus países nas últimas décadas.

Inicialmente promovida, em 2011, como “libertária”, “revolucionária”, a Primavera Árabe iria, no curto espaço de três anos, desestabilizar totalmente a região, provocar massacres, guerras civis, golpes de Estado, e alcançar, por meio da intervenção militar direta e indireta da OTAN e dos EUA em vários países, a meta de tirar do poder, a qualquer custo, regimes que lutavam para manter um mínimo de independência e soberania em suas relações com os países mais ricos.

Quando os EUA, com suas “primaveras” – que não dão flores, mas são fecundas em crimes e cadáveres – não conseguem colocar no poder um governo alinhado com seus interesses, como na Ucrânia e no Egito, jogam irmão contra irmão e equipam com armas, explosivos, munições, terroristas, bandidos e assassinos para derrubar quem estiver no comando do país.

O objetivo é destruir a unidade nacional, a identidade local, o Estado e as instituições, para que essas nações não possam, pelo menos durante longo período, voltar a organizar-se, a ponto de tentar desafiar, mesmo que em pequena escala, os interesses norte-americanos.

Foi assim que ocorreu com a intervenção dos EUA e de aliados europeus como a Itália e a França – contra a recomendação de Brasil, Rússia, Índia e China, no Conselho de Segurança da ONU – no Iraque, na Líbia e na Síria.

Durante décadas, esses países – com quem o Brasil tinha, desde os anos 1970, boas relações – viveram sob relativa estabilidade, com a economia funcionando, crianças indo para a escola, e diferentes etnias, religiões e culturas, dividindo, com eventuais disputas, o mesmo território.

Estradas, rodovias, sistemas de irrigação, foram construídos – também com a ajuda de técnicos, operários e engenheiros brasileiros – com os recursos do petróleo, e países como o Iraque chegavam a importar automóveis, como no caso de milhares de Volkswagens Passat fabricados no Brasil, para vender aos seus cidadãos de forma subsidiada.

Na Líbia de Muammar Kadafi, segundo o próprio World Factbook da CIA, 95% da população era alfabetizada, a expectativa de vida chegava, para os homens, segundo dados da ONU, a 73 anos, e a renda per capita e o IDH estavam entre os maiores do Terceiro Mundo, mas esses dados nunca foram divulgados normalmente pela imprensa “ocidental”.

Pode-se perguntar a milhares de brasileiros que estiveram no Iraque, que hoje têm entre 50 e 70 anos de idade, se, naquela época, sunitas e xiitas se matavam aos tiros pelas ruas, bombas explodiam em Basra e Bagdá todos os dias, como explodem hoje, a qualquer momento, também em Trípoli ou Damasco, ou milhares de órfãos tentavam atravessar montanhas e rios sozinhos, pisando nos restos de outras crianças, mortas em conflitos incentivados por “potências” estrangeiras, ou tentavam sobreviver caçando, a pedradas, ratos por entre escombros das casas e hospitais em que nasceram.

São, curdos, xiitas, sunitas, drusos, armênios, cristãos maronitas, inimigos?

Antes, trabalhavam nos mesmos escritórios, viviam nas mesmas ruas, seus filhos frequentavam as mesmas salas de aula, mesmo que eles não tivessem escolhido, no início, viver como vizinhos.
Assim como no caso de hutus e tutsis em Ruanda, e em inúmeras ex-colônias asiáticas e africanas, as fronteiras dos países do Oriente Médio foram desenhadas, na ponta do lápis, ao sabor da vontade do 

Ocidente, quando da partilha do continente africano por europeus, obedecendo não apenas ao resultado de Conferências como a de Berlim, em 1884, mas também à máxima de que sempre se deve “dividir para comandar”, mantendo, de preferência, etnias de religiões e idiomas diferentes dentro de um mesmo território ocupado pelo colonizador.

Eram Saddam Hussein e Muammar Kadafi, ditadores? É Bashar Al Assad, um déspota sanguinário?

Quando eles estavam no poder, não havia atentados terroristas em seus países.

E qual é a diferença deles e de seus regimes, para os líderes e regimes fundamentalistas islâmicos comandados por xeques e emires, na mesma região, em que as mulheres – ao contrário dos governos seculares de Saddam, Kadafi e Assad – são obrigadas a usar a burka, não podem sair de casa sem a companhia do irmão ou do marido, se arriscam a ser apedrejadas até a morte ou chicoteadas em caso de adultério, e não há eleições, a não ser o fato de que esses regimes são dóceis aliados do “ocidente” e dos EUA?

Se os líderes ocidentais viam Kadafi como inimigo, bandido, estuprador e assassino, por que ele recebeu a visita do primeiro-ministro britânico Tony Blair, em 2004; do Presidente francês Nicolas Sarkozy – a quem, ao que tudo indica, emprestou 50 milhões de euros para sua campanha de reeleição – em 2007; da Secretária de Estado dos EUA, Condoleeza Rice, em 2008; e do primeiro-ministro italiano Silvio Berlusconi em 2009?

Por que, apenas dois anos depois, em março de 2011 – depois de Kadafi anunciar sua intenção de nacionalizar as companhias estrangeiras de petróleo que operavam, ou estavam se preparando para entrar na Líbia (Shell, ConocoPhillips, ExxonMobil, Marathon Oil Corporation, Hess Company) esses mesmos países e os EUA, atacaram, com a desculpa de criar uma Zona de Exclusão Aérea sobre o país, com 110 mísseis de cruzeiro, apenas nas primeiras horas, Trípoli, a capital líbia, e instalações do governo, e armaram milhares de bandidos – praticamente qualquer um que declarasse ser adversário de Kadafi – para que o derrubassem, o capturassem e finalmente o espancassem, a murros e pontapés, até a morte?

Ora, são esses mesmos bandidos, que, depois de transformar, com armas e veículos fornecidos por estrangeiros, a Líbia em terra de ninguém, invadiram o Iraque e, agora, a Síria, e se uniram para formar o Estado Islâmico, que pretende erigir uma grande nação terrorista juntando o território desses três países, não por acaso os que foram mais devastados e destruídos pela política de intervenção do “ocidente” na região, nos últimos anos.

Foram os EUA e a Europa que geraram e engordaram a cobra que ameaça agora devorar a metade do Oriente Médio, e seus filhotes, que também armam rápidos botes no velho continente. Serpentes que, por incompetência e imprevisibilidade, depois da intervenção na Líbia, a OTAN e os EUA não conseguiram manter sob controle.

Os Estados Unidos podem, pelo arbítrio da força a eles concedida por suas armas e as de aliados – quando não são impedidos pelos BRICS ou pela comunidade internacional – se empenhar em destruir e inviabilizar pequenas nações – que ainda há menos de cem anos lutavam desesperadamente por sua independência – para tentar estabelecer seu controle sobre elas, seu povo e seus recursos, objetivo que, mesmo assim, nunca conseguiram alcançar militarmente.

Mas não podem cometer esses crimes e esses equívocos, diplomáticos e de inteligência, e dizer, cinicamente, que o fizeram em nome da defesa da Liberdade e da Democracia.

Assim como não deveriam armar bandidos sanguinários e assassinos para combater governos que querem derrubar, e depois dizer que são contra o terrorismo que eles mesmos ajudaram a fomentar, quando esses mesmos terroristas, além de explodir bombas e matar pessoas em Bagdá, Damasco ou Trípoli, todos os dias, passam a fazer o mesmo nas ruas das cidades da Europa ou dos próprios Estados Unidos.

O “terrorismo” islâmico não nasceu agora.

Mas antes da balela mortífera da Primavera Árabe, e da Guerra do Iraque, que levou à destruição do país, com a mentirosa desculpa da posse, por Saddam Hussein, de armas de destruição em massa que nunca foram encontradas – tão falsa quanto o pretexto do envolvimento de Bagdá no ataque às Torres Gêmeas, executado por cidadãos sauditas, e não líbios, sírios ou iraquianos – não havia bandos armados à solta, sequestrando, matando e explodindo bombas nesses 3 países.

Hoje, como resultado da desastrada e criminosa intervenção ocidental, o terror do Estado Islâmico, o ISIS, controla boa parte dos territórios e da sofrida população síria, iraquiana e líbia, e, a partir deles, está unindo suas conquistas em torno da construção de uma nação maior, mais poderosa, e extremamente mais radical do ponto de vista da violência e do fundamentalismo, do que qualquer um desses países jamais o foi no passado.

O ataque terrorista à redação e instalações do semanário francês Charlie Hebdo, e do Mercado Kosher, em Vincennes, Paris, foram crimes brutais e estúpidos.

Mas não menos brutais, e estúpidos, do que os atentados cometidos, todos os dias, contra civis inocentes, entre muitos outros lugares, como a Síria, o Iraque, a Líbia, o Afeganistão.

Quem quiser encontrar as sementes do caos que também atingiram, em forma de balas, os corpos dos mortos do Charlie Hebdo poderá procurá-las no racismo de um continente que acostumou-se a pensar que é o centro do mundo, e que discrimina, persegue e despreza, historicamente, o estrangeiro, seja ele árabe, africano ou latino-americano; e no fundamentalismo branco, cristão e rançoso da direita e da extrema direita norte-americanas, cujos membros acreditam piamente que o Deus vingador da Bíblia deu à “América” do Norte o “Destino Manifesto” de dirigir o mundo.

Em nome dessa ilusão, contaminada pela vaidade e a loucura, países que se opuserem a isso, e milhões de seres humanos, devem ser destruídos, mesmo que não haja nada para colocar em seu lugar, a não ser mais caos e mais violência, em uma espiral de destruição e de morte, que ameaça a sobrevivência da própria espécie e explode em ódio, estupidez e sangue, como agora, em Paris, neste começo de ano.

segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

O falso amanhecer da economia mexicana

Alô, Levy: Obama leu Piketty e quer elevar a carga tributária dos endinheirados para arrecadar mais US$ 300 bilhões e aplicar em desenvolvimento. Que tal, isso ou cortar salário desemprego?


Esquerda lidera a sete dias do pleito na Grécia: média de 12 institutos de pesquisas dá ao Syriza a liderança incontestável nas eleições do domingo próximo na Grécia; o partido dirigido por Alexis Tsipras tem 34,7% dos votos, contra 30,2% do conservador Nova Democracia


Stiglitz: 'A queda do PIB grego desde 2010 é muito maior do que a queda enfrentada pelos EUA durante a Grande Depressão na década de 1930'


 Afogada em cinco anos de arrocho neoliberal Espanha lidera a desigualdade na Europa: 1% mais rico concentra mais riqueza que os 70% mais pobres.

Greve vitoriosa dos metalúrgicos da Volks: resistência dos operários faz montadora readmitir 800 trabalhadores e negociar planos alternativos com o sindicato.


Governantes, avaliem isso: a temperatura nos oceanos, que representam 72% da superfície da Terra, atingiu níveis sem precedentes em 2014; ficou 0,57% grau acima da média do século XX; na superfície da terra, o aquecimento subiu um grau na mesma base de comparação. Os dados são da NASA


O falso amanhecer da economia mexicana



Ariel Noyola Rodríguez* - Contralínea

Presidencia de la República Mexicana / Flickr


















Em menos de seis meses, os meios de comunicaçãoenterraram completamente o denominado “momento do México”. Faz alguns dias, em entrevista realizada pelo jornal El Universal, o presidente do Banco Central do México, Agustín Carstens, admitiu pela terceira vez consecutiva que os acontecimentos relacionados à falta de segurança e à violência (como o desaparecimento de 43 estudantes normalistas de Ayotzinapa) influenciam de maneira direta nas expectativas de empresários sobre a economia nacional; a certeza e a confiança, afirmou ele, são os elementos fundamentais na hora de tomar decisões, tanto do lado do investimento quanto do consumo.
 
E, enquanto no começo de 2014, o Ministério da Fazenda e do Crédito Público havia estimado um crescimento de 3.9%, posteriormente, diminuiu esse número para 2.7%, e depois reduziu novamente para uma média entre 2.1 e 2.6%, basicamente a metade da primeira estimativa. De janeiro até novembro, a pesquisa dos analistas do setor privado, aplicada pelo Banco do México baixou as estimativas do crescimento em 10 ocasiões consecutivas e já começa a realizar modificações em seus prognósticos para 2015.
 
Os “motores externos”, por sua vez, já não conseguem até o momento impulsionar a economia mexicana. A política monetária restritiva do Sistema de Reserva Federal dos Estados Unidos; os riscos crescentes de deflação na zona do euro; a queda inesperada da atividade econômica no Japão; o aumento da desaceleração no Continente Asiático e a drástica diminuição dos preços das matérias primas, especialmente as cotações do petróleo, foram extremamente prejudiciais para as economias denominadas “emergentes”. Junto disso, a alta da divisa norte-americana, graças a sua posição privilegiada de “reserva de valor” em momentos críticos para a economia mundial, continuará contribuindo de forma elementar no próximo ano na desvalorização das moedas da periferia capitalista.
 
No final de 2014, o peso mexicano havia perdido 10% de seu valor frente ao dólar para cotação em um mínimo de 14.457 pesos até o fechamento da presente coluna, seu nível mais baixo em mais de dois anos e meio. Surpreendentemente, em 8 de dezembro de 2014, o Banco Central do México e o Ministério da Fazenda e do Crédito Público emitiram um comunicado para detalhar o início de um plano imediato para deter a queda da moeda. “O Banco Central do México oferecerá diariamente 200 milhões de dólares a um tipo de câmbio mínimo equivalente ao tipo de câmbio FIX, determinado no dia útil imediatamente anterior, conforme as disposições do Banco do México, mais 1.5%”, indicou a Comissão de Câmbios. Com isso, o governo mexicano pretende prover de liquidez o mercado de câmbio e reduzir as turbulências do sistema financeiro. A medida se aplicou pela última vez em 30 de novembro de 2011, quando o Banco Central do México começou a injetar 400 milhões de dólares diariamente, a cada vez que o tipo de câmbio caísse 2% em relação ao dia útil anterior. A medida foi cancelada em 9 de abril de 2013.
 
A queda do preço do petróleo, por sua vez, constitui uma grave ameaça para os países com dependência energética pela via das importações e, mais ainda, para economias como a do México, cujas finanças públicas estão estreitamente vinculadas à renda do petróleo. Na primeira semana de dezembro de 2014, o preço do barril em sua modalidade Brent alcançou 66,77 dólares, quando vinculadas a mezcla mexicana (MME) foi cotada em 58 dólares: os níveis mais baixos desde outubro de 2009.
 
De acordo com as estimativas do banco de investimentos americano Morgan Stanley, os preços poderiam cair até um mínimo de 43 dólares. É preciso destacar que a queda das cotações obedece não unicamente à menor demanda das economias asiáticas (China e Índia) e às operações especulativas nos mercados de derivados de petróleo (Nova York, Londres e Dubai), mas fundamentalte, são o resultado de uma tendência deflacionária de enormes proporções e de fôlego que atravessa cada vez mais espaços da economia mundial.
 
No caso do México, as conseqüências de uma queda de mais de 40% do preço do barril já saltam à vista. Em primeiro lugar, os preços atuais do combustível estão muito abaixo de 83 dólares, a base tomada para o Plano Orçamentário 2015. Os programas de cobertura, assim como os fundos de capitalização são insuficientes para conter as violentas flutuações dos preços em médio prazo. Em segundo lugar, as perspectivas de alta rentabilidade dos empresários (nacionais e estrangeiros), como conseqüência das reformas constitucionais e secundárias em matéria energética, colocaram em uma situação grave e, com isso, os projetos de investimento que eventualmente emanaria da Ronda I poderiam ficar no esquecimento.  
 
Em suma, a campanha midiática em torno de um novo amanhecer da economia mexicana, impulsionada em um primeiro momento pelos conglomerados do capital transnacional, se mostrou uma farsa absoluta. A “disciplina fiscal” e o alto nível de “confiança macroeconômica” contrastam com a queda nas expectativas de crescimento, extrema volatilidade do tipo de cambio e o aumento exponencial da dívida pública há mais de dois anos do início da gestão de Enrique Peña Nieto. Se não houver uma mobilização popular organizada a favor de uma mudança de rumo em matéria econômica, os custos do ajuste pesarão outra vez sobre os ombros do povo do México.
 
*Colunista da revista Contralínea (México). Contatonoyolara@gmail.com.

sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

Não é só entregar o petróleo. Querem entregar o negócio de sondas de R$ 20 bi por ano

sondas

É duro conseguir quem queira fazer investimentos de longo prazo no Brasil e foi assim ao longo de toda a nossa história moderna.

Não apenas porque um país em perdas permanentes como o nosso não acumula capitais para isso, como há no Brasil uma elite servil, incapaz de pensar qualquer futuro para si senão o de gerente local do capital internacional.

A decisão da Petrobras de estimular, com garantias de compra (enquanto o Governo dava a garantia de financiamentos), a construção de sondas de perfuração de poços de petróleo em águas ultraprofundas é, guardadas as proporções e características, muito mais “capitalista” do que as que a ela podem se comparar, como a construção da siderúrgica de Volta Redonda ou das hidrelétricas que – apesar da seca – nos produzem energia numa das matrizes mais limpas do mundo.

Porque, embora com as carências tecnológicas que as quase quatro décadas de paralisia da indústria naval nos impuseram, ela traz para o país a construção de algo tão imprescindível à exploração do petróleo quanto são o aço e a energia para a atividade econômica.

Não se acha petróleo – nem se coloca o petróleo que é achado em condições de ser explorado – sem estas sondas.

E a alternativa a fazê-las aqui é alugar no mercado internacional.

Onde um navio-sonda com capacidade para operar em profundidades de lâmina d’água superiores a 4 mil pés ( pouco mais de 1.300 metros, a partir do qual se considera “águas profundas”) custa, por dia, em média, a bagatela de US$ 516 mil dólares.

Por dia, notem bem.

Como, no pico da atividade do pré-sal, a Petrobras terá de usar, por anos a fio, 40 destas sondas, é coisa de mais de US$ 20 milhões de dólares a cada vez que o sol nasce.

Ou quase US$ 8 bilhões a cada ano.

Em reais, uns R$ 20 bilhões cada vez que se trocar a folhinha.

Tratar isto como uma  como ima irrelevância para o país, ou como se fosse destinado a negociatas um empréstimo de R$ 9 bilhões – empréstimo, não doação – para que não se comprometa o programa de construção da metade – só a metade – dos navios-sonda de que a Petrobras precisará, como faz hoje a

Folha de S. Paulo, não pode ser só falta de noção de sua importância.

Ninguém pensou em inviabilizar a Siemens porque um – ou vários – de seus dirigentes se meteram em falcatruas. Nem os franceses a Alstom porque andou subornando e fazendo cartéis, um deles aqui pertinho, na Paulicéia.

Obama comprou as ações da GM, na crise de 2008 por US$ 49 bilhões de dólares e as vendeu, há menos de dois anos, por US$ 39 bilhões, um subsídio do Tesouro norte-americano de US$ 10 bilhões para que não quebrasse a maior montadora de veículos dos EUA.

E olhem que eram automóveis, que podem ser importados de qualquer baiúca, em qualquer parte do mundo, não um equipamento de altíssima tecnologia.

A imprensa brasileira divide-se em um sabujismo total aos interesses estrangeiros e uma lapidar ignorância.
Gênio mesmo é o Roger Agnelli, que pegou US$ 1,3 bilhão com os chineses, para comprar navios chineses, para levar minério para a China.

E, pior, que viraram “micos” navais, que a empresa agora tenta vender, com prejuízo.

Quem precisa de vento é a Urubóloga

Por que as perguntas da Urubóloga valem mais do que as do repórter de Parintins, ministro Braga ?



O Brasil tem uma Belo Monte em energia eólica.

E outra Belo Monte em biomassa.


(Por isso não vai ter aquele apagão que a Urubóloga prometeu à Dilma, desde que era Ministra das Minas e Energia.

Está devendo …)

As afirmações acima foram feitas pelo novo Ministro das Minas e Energia, Eduardo Braga, numa daquelas inúteis entrevistas à Urubóloga na GloboNews.

Para espectador, é uma experiência tão gratificante quanto se submeter a uma ressonância magnética com contraste na veia !

Não tem talento, humor, brilho – ou novidades !

Foi o que aconteceu na entrevista que o Levy lhe deu.

Por exemplo, dessa entrevista do Braga, o PiG saiu a trombetear que a Graça não sai da Petrobras.

Como se fosse uma bomba !

Isso já se sabe, desde que o Ataulfo Merval (ver no ABC do C Af) e o Dr Janot disseram que ela teria que sair.

A Graça está mais firme que os dois nos cargos que provisoriamente ocupam.

(Embora ela mesma, Graça, se tenha submetido a uma cadeira do dragão diante de um repórter terciário da Globo, sobre as “denúncias” daquela – cadê ela ?  Levina, Vernina, Venilica ? – , testemunha-bomba da Gloria Maria !).

Nessas “entrevistas”, o importante é o que a Urubóloga esconde, ou tenta esconder.

Por exemplo: o Brasil tem energia eólica do tamanho de Belo Monte, ou seja, 11.233 MW, a terceira maior do mundo depois de Três Gargantas e Itaipu.

Como tem vento o Brasil !

O Brasil é o segundo maior – depois da Alemanha – produtor de energia eólica do mundo !

O Rio Grande do Norte, o Ceará e a Bahia são os campeões da energia eólica, que leva progresso e renda ao interior de estados (provisoriamente) pobres !

Quem precisa de energia, quer dizer, de vento é a Urubóloga.

Quem precisa de Energia são PiG e os interesses que seus colonistas (ver no ABC do C Af) defendem com ardor – mas sem brilho !


Recomenda-se ao Ministro Braga e a todos os outros que sigam o salutar caminho do Ministro Dias, do Trabalho.
Essa história de dar “exclusiva” à GloboNews é uma bajulação provinciana e discriminatória.
O distinto público – e cidadão, que contribui com impostos – tem o direito de que outras perguntas, outros temas sejam submetidos às autoridades.
Por que o Brasil tem que se sujeitar às perguntas e à pauta da Globo sobre Minas, Energia, Fazenda, “Ajuste”, “Superávit Primário”, “Base Monetária”… e o diabo a quatro ?
(Só falta o Berzoini repetir o Plim-Plim e dar uma entrevista “amarela” ao detrito sólido de maré baixa, para dizer que o projeto do Franklin é um tipo de detrito sólido.)
Por que as perguntas da Urubóloga – inclinadas, tortas, vesgas como o Cerveró – tem que prevalecer sobre as dos repórteres do “A Crítica”, de Humaitá, ou do “Repórter”, de Parintins, para ficar no glorioso Estado do Amazonas, que o ministro defende com tanto orgulho.
Em tempo: o Conversa Afiada não tem nenhuma pergunta exclusiva a fazer ao Ministro Braga. O ansioso blogueiro não está minimamente preocupado com o apagão da Urubóloga.




Paulo Henrique Amorim

quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

O PSDB e sua obra-prima de gestão: o racionamento em SP


 

'Estamos fechando a torneira porque em março, no mais tardar em junho, SP fica sem água', admitiu presidente da Sabesp. Esse é o legado do choque de gestão?

por: Saul Leblon


 
Após um ano de dissimulações, o PSDB oficializou o racionamento de água em SP nesta 4ª feira.

O novo presidente da Sabesp , Jerson Kelman, em entrevista ao SPTV, da Globo, anunciou um corte  drástico no fornecimento, que caiu de 16 mil litros/s na 3ª feira, para 13 mil l/s a partir de agora.

O racionamento anunciado  oficializa uma realidade que já atinge mais de seis milhões de habitantes, cujo abastecimento declina há um ano acumulando um corte de 60% no fornecimento padrão da Sabesp às suas torneiras (de 33 mil l/s para 13 mil l/s).

E isso é só o começo.

 'Estamos fechando a torneira porque em março, no mais tardar em junho, SP fica sem água', admitiu presidente da Sabesp na entrevista.

Nada como um copo após o outro.

Na reta final da campanha presidencial de 2014, quando o então diretor-presidente da Agência Nacional de Águas (ANA), Vicente Andreu, advertiu na Assembleia Legislativa de São Paulo, que o abastecimento da cidade estava, literalmente, por um fio de água, foi chamado de ‘bandido’ pelo grão tucano, vereador Andrea Matarazzo.

Ele disse aquilo que o PSDB se recusava a admitir: restavam apenas 200 bilhões de litros do volume morto do sistema Cantareira, que provê boa parte da água consumida na cidade.

O pior de tudo: a derradeira reserva de água da cidade encontra-se disponível na forma de lodo.

E será com isso que a sede paulistana terá que ser mitigada caso não chova o suficiente até o final de março.

Como de fato não tem chovido nos mananciais, nem há expectativa séria de que isso ocorra suficientemente até o final da estação das águas, avizinha-se  o que o novo presidente da Sabesp finalmente admitiu: ‘em março, no mais tardar em junho, SP fica sem água'.

Corta e volta para a campanha eleitoral de Aécio Neves em 2014.

O estandarte da eficiência tucana era martelado diuturnamente como um tridente contra aquilo que se acusa de obras e planos nunca realizados por culpa da (Aécio enchia a boca para escandir as sílabas) ‘má go-ver-nan-ça’.

Corta de novo e volta para o presente com o foco na contagem regressiva anunciada por Jerson Kelman, o novo titular do espólio da Cantareira e da Sabesp.

Vamos falar um pouco de governança?

Atribuir tudo à  ingratidão a São Pedro é um pedaço da verdade.

Num sugestivo contorcionismo eleitoral, Aécio negou a esse pedaço da verdade a explicação para a alta nos preços dos alimentos afetados pela seca.

Ou isso ou aquilo.

Estocar comida, que não grãos, caso do vilão tomate, por exemplo, que pressionou os índices de alimentos no período eleitoral,  está longe de ser uma opção exequível em larga escala no enfrentamento de uma seca.

Mas estocar água e planejar dutos interligados a mananciais alternativos, calculados para enfrentar situações limite, mesmo que de ocorrência secular, é uma obrigação primária de quem tem a responsabilidade pelo suprimento de grandes concentrações urbanas.

A Sabesp sob o comando do PSDB detém essa responsabilidade há 20 anos em São Paulo.

Omitiu-se, com as consequências previsíveis que agora assombram o horizonte de milhões de moradores da Grande São Paulo.

Carta Maior lembrou no período eleitoral --enquanto Geraldo Alckmin fazia expressão corporal de seriedade, que Nova Iorque e o seu entorno, com uma população bem inferior a de São Paulo (nove milhões de habitantes), nunca parou de redimensionar a rede de abastecimento da metrópole  movida por uma regra básica de gestão na área: expansão acima e à frente do crescimento populacional.

Tubulações estendidas desde as montanhas de Catskill, mencionou-se então, situadas a cerca de 200 kms e 1200 m de altitude oferecem ao novaiorquino água pura, dispensada de tratamento e potável direto da torneira.

Terras e mananciais distantes são periodicamente adquiridos pelos poderes públicos de NY  para garantir a qualidade e novas fontes de reforço da oferta.

O sistema de abastecimento da cidade reúne três grandes reservatórios que captam bacias hidrográficas preservadas em uma área de quase 2.000 km2.

A adutora original foi inaugurada em 1890; em 1916 começou a funcionar outro ramal a leste da cidade; em 1945 foi concluída a obra de captação a oeste, que garante 50% do consumo atual.

Mesmo com folga na oferta e a excelente qualidade oferecida, um novo braço de 97 kms de extensão está sendo construído há 20 anos.

Para reforçar o abastecimento e prevenir colapsos em áreas de expansão prevista da metrópole.

Em 1993 foi concluída a primeira fase desse novo plano.

Em 1998 mais um trecho ficou pronto.

Em 2020, entra em operação um terceiro ramal em obras desde o final dos anos 90. Seu objetivo é dar maior pressão ao conjunto do sistema e servir como opção aos ramais de Delaware e Catskill, que estão longe de secar.

Uma quarta galeria percorrerá mais 14 kms para se superpor ao abastecimento atual do Bronx e Queens.

Tudo isso destoa de forma superlativa da esférica omissão registrada em duas décadas ininterruptas de gestão do PSDB no Estado de São Paulo, objeto de crítica até de um relatório da ONU, contestado exclamativamente pelo governador reeleito, Geraldo Alckmin.

Se em vez do mantra do choque de gestão, os sucessivos governos de Covas, Ackmin, Serra e Alckmin tivessem reconhecido o papel do planejamento público, São Paulo hoje não estaria na iminência de beber lodo.

Ou nem isso ter  para matar a sede.

Pergunta aos sábios tucanos: caiu a ficha?

É verdade que o Brasil todo desidrata sob o maçarico de um evento climático extremo.

Sinal robusto dos tempos.

 Mas desde os alertas ambientais dos anos 90 (a Rio 92, como indica o nome, aconteceu no Brasil há 22 anos) essa é uma probabilidade que deveria estar no monitor estratégico de governantes esclarecidos.

Definitivamente não se inclui nessa categoria o tucanato brasileiro: em 2001 ele já havia propiciado ao país um apagão de energia elétrica pela falta de obras e a renúncia deliberada ao planejamento público.

Os mercados cuidariam disso com mais eficiência e menor preço –ou não era isso que se falava e se volta a ouvir agora sobre todos os impasses do desenvolvimento brasileiro?

Ademais de imprevidente, o PSDB desta vez mostrou-se mefistofelicamente oportunista na mitigação dos seus próprios erros.

Ou seja, preferiu comprometer o abastecimento futuro de milhões de pessoas, a adotar um racionamento preventivo que alongaria a vida útil das torneiras, mas poria em risco o seu quinto mandato em São Paulo.

É importante lembrar em nome da tão evocada liberdade de imprensa: a dissimulação tucana não conseguiria concluir a travessia eleitoral sem a cumplicidade da mídia conservadora que, mais uma vez, dispensou a um descalabro do PSDB uma cobertura sóbria o suficiente para fingir isenção, sem colocar em risco o continuísmo no estado.

É o roteiro pronto de um filme de Costa Gavras: as interações entre o poder, a mídia, o alarme ambiental e o colapso de um serviço essencial, que deixa  uma das maiores metrópoles do mundo no rumo de uma seca épica.

O PSDB que hoje simula chiliques com o que acusa de ‘uso político da água’, preferiu ao longo das últimas duas décadas privatizar a Sabesp, vender suas ações nas bolsas dos EUA e priorizar o pagamento de dividendos a investir em novos mananciais.

Há nesse episódio referencial um outro subtexto para o filme de Costa Gavras: a captura dos serviços essenciais pela lógica do capital financeiro.


Enquanto coloca em risco o abastecimento de 20 milhões de pessoas, revelando-se uma ameaça à população, a Sabesp foi eleita uma das empresas de maior prestígio entre os acionistas estrangeiros.

Mérito justo.

Como em um sistema hidráulico, o dinheiro que deveria financiar a expansão do abastecimento, vazou no ralo da captura financeira. Encheu bolsos endinheirados às custas de esvaziar as caixas d’água dos consumidores.

Não é uma metáfora destes tempos. É a síntese brutal da sua dominância.
 
Mesmo que a pluviometria do verão fique em 70% da média para a estação, o sistema Cantareira - segundo os cálculos da ANA - ingressará agora no segundo trimestre de 2015 com praticamente 5% de estoque (hoje está com algo em torno de 6%).
 
Ou seja, São Paulo chegará no início da estação seca de 2015 com a metade da reserva que dispunha em período equivalente de 2014 e muito perto da marca desesperadora do início deste  verão,quando ainda apostava no alívio da estação das chuvas --inexistente no inverno.

A seca que espreita as goelas paulistanas não pode ser vista como uma fatalidade.

Dois anos é o tempo médio calculado pelos especialistas para a realização de obras que poderiam tirar São Paulo da lógica do lodo.

 Portanto, se ao longo dos 20 anos de reinado tucano em São Paulo, o PSDB de FH e Aécio Neves, tivesse dedicado 10% do tempo a planejar a provisão de água, nada disso estaria acontecendo.

Deu-se o oposto.

 De 1980 para cá, a população de São Paulo mais que dobrou. A oferta se manteve a mesma com avanços pontuais.

O choque de gestão tucano preferiu se concentrar em mananciais de maior liquidez, digamos assim.

Entre eles, compartilhar os frutos das licitações do metrô de SP com fornecedores de trens e equipamentos. A lambança comprovada e documentada sugestivamente pela polícia suíça, até agora não gerou nenhum abate de monta no poleiro dos bicos longos.

‘Todos soltos’, como diz a presidenta Dilma.

A rede metroviária de São Paulo, embora imune a desequilíbrios climáticos, de certa forma padece da mesma incúria que hoje ameaça as caixas d’agua dos paulistanos.

Avulta daí um método – o jeito tucano de governar não pode ser debitado na conta de São Pedro.

O salvacionismo tucano em São Paulo não conseguiu fazer mais que 1,9 km de metrô em média por ano, reunindo assim uma rede inferior a 80 kms, a menor entre as grandes capitais do mundo.

A da cidade do México, por exemplo, que começou a ser construída junto com a de São Paulo, tem 210 kms.

Não deixa de ser potencialmente devastador para quem acusa agora o PT de jogar o país num abismo de má gestão só ter a oferecer à população de SP a seguinte progressão: racionamento drástico imediato, seguido de seca de consequências imponderáveis navida de uma das maiores manchas urbanas do mundo.

É essa a perspectiva para um serviço essencial na capital do estado onde o festejado choque de gestão está no poder há 20 anos.

Ininterruptos.

Uma questão para refletir:

O legado recomenda uma recidiva da receita para todo o Brasil, como exigem os centuriões do mercado e alguns cristãos novos petistas?

A ver.

quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Como o politicamente incorreto chegou de forma perversa ao Brasil

marinho

por Luiz Carlos Azenha

Eu desconfio do politicamente correto. Às vezes imagino que se trata apenas de transpor, para o campo da linguagem, a tentativa neurótica de controlar o discurso em um mundo caótico, governado pelas coincidências.

Admiro o politicamente incorreto, mas nunca a ponto de rejeitar a Nota Fiscal Paulista.

No século passado, quando minhas filhas ainda cresciam em Nova York, um dos grandes sucessos da TV local era o South Park, com suas piadas escatológicas.

Inadvertidamente, dei de presente a elas South Park, o longa metragem, mas a sessão teve de ser interrompida pela metade quando passei pela sala justamente na cena em que Saddam Hussein fumava um cigarro, depois de transar com o diabo.

O sinal mais claro de que foi uma cena perturbadora é que ambas rejeitam, nos dias de hoje, por motivos obscuros, a Nota Fiscal Paulista.

O South Park marcou um momento de inflexão da indústria de entretenimento nos Estados Unidos. Depois dele, abundaram os programas politicamente incorretos.

Nos talk shows, o pioneiro foi Howard Stern, que transformou as multas que recebeu da Federal Communications Comission — por linguagem que transgredia o politicamente correto — no passaporte para novos e lucrativos contratos.

Na escala de valores dos americanos, afinal, o dólar está sempre acima da vaidade.

Na TV, eu estava lá quando surgiu Lou Dobbs, na CNN. Podemos dizer que ele foi um dos predecessores do twitter. Com um cérebro binário, Dobbs investia contra os imigrantes usando frases de efeito com a nuance dos 140 caracteres.

Posso dizer que vi nascer, nos anos 80 e 90, a indústria do politicamente incorreto nos Estados Unidos.

A fórmula era razoavelmente simples: apelo ao senso comum, maniqueísmo e muita estridência.

Boa parte era marquetagem, mas aqui ou ali se via um discurso verdadeiramente desafiador.

Mais tarde, com algumas décadas de atraso, essa indústria se instalou no Brasil, mas com uma peculiaridade: os politicamente incorretos, aqui, zombam exclusivamente dos mais frágeis!

Parafraseando o Chico Buarque, a Sheherazade é desbocada com a Bolívia mas fala fino com os Estados Unidos.

Tudo isso me ocorreu ao ler o texto da blogueira de O Globo que, presumivelmente, tentou fazer uma brincadeira com as manias de doença dos pobres.

Mas, como ela mesma admitiu, os leitores não entenderam o que ela escreveu como “humor cáustico”.

O blog da autora é nomeado “Zona de Desconforto” e um texto do Facebook, atribuído ao jornal O Globo, diz que a escritora é assim mesmo, fala o que pensa, rema contra a corrente, é politicamente incorreta a ponto de achar o papai-mamãe subvalorizado.

Para os que se assustam com o fato de uma jovem como ela merecer um perfil de O Globo, fique registrado o que diz uma de minhas filhas definitivamente lesadas pelo South Park: “Pai, o Brasil é o único país do mundo em que jovem de 30 anos já pensa na própria biografia”.

Se posso colaborar com a promissora carreira da blogueira, sugiro que ela leia A Fogueira das Vaidades,

de Tom Wolfe, que retrata justamente a Nova York dos anos 80.

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A certa altura, Wolfe faz uma descrição magnífica — e politicamente incorreta — de um líder negro que se posicionava milimetricamente para aparecer nas imagens de protestos contra o racismo que apareceriam à noite no noticiário das emissoras de TV da cidade.

Todos sabem que ele se referia a Al Sharpton, que na foto acima aparece na segunda fila, pendurado no ombro de Joe Biden. Não me lembro de ter conhecido melhor papagaio de pirata.

Mas os relativamente “pobres”, como Sharpton, ocupam Wolfe por poucas páginas. A crítica devastadora do autor se volta, acima de tudo, à ambição dos poderosos de Nova York, num período em que a ganância era oficialmente encorajada pelo governo direitista de Ronald Reagan.

Silvia Pilz, o politicamente incorreto só tem graça, mesmo, quando o autor desafia o discurso dominante e zomba de quem se acha.

Chutar pobre desdentado caído na calçada é covardia e, na verdade, nem é original — já que por linhas tortas é ao que se dedicam os seus patrões diuturnamente.

Cáustico de verdade seria você observar, em O Globo, de forma bem humorada, que os bilionários irmãos Marinho demitem trabalhadores num ano em que as Organizações Globo batem recorde de faturamento.

Não precisa escrever como eu, de forma deselegante e sem talento.

Tente fazer como o Tom Wolfe.

Leia também:

Colunista de O Globo ensina quem são “eles”, os pobres

Je suis Haiti

haiti

Fala-se francês, ou uma derivação dele, o creole.

Tiveram uma ditadura sangrenta, a de Papa Doc, François Duvalier, e a de seu filho, Jean Claude, o Baby Doc.

Foram de lá os ton-ton macoute, literalmente os  “homem do saco” ou “bicho papão”, como o personagem infantil de terror, a mais brutal polícia (ou milícia) política da história recente.

Quando derrubaram a ditadura e elegeram um presidente, ele foi deposto e o país entrou em conflito armado.

E, num destes fatos que põem à prova a existência de um Deus, logo veio um terremoto dantesco, que matou mais de 200 mil e destruiu o que restava do pais conflagrado.

E o Haiti virou a terra dos “rest avec”, onde pais miseráveis entregam seus filhos a quem pode, para serem escravos, quase, simplesmente para que não morram de fome.

Um castigo para um país que ficou independente antes de nós, que aboliu a escravatura cem anos, quase, antes de nós e que, por estes “crimes”, tiveram de pagar uma pesadíssima indenização aos seus ex-senhores franceses, embora os tivessem derrotado no campo de batalha.

Milhares deles estão no Brasil.

Trabalhando duro.

Aqui, perto de casa, dez deles trabalham numa obra de construção de um prédio.

Severos, de pouca conversa – como conversar, com seu ralo português? – são considerados e respeitados pelos outros trabalhadores.

Não se debocha deles, de sua cor, de sua origem, de sua religião, o vudu.
Sei lá se por medo, até.

A nossa elite acha o Brasil um país de bárbaros, daqueles que teriam de ajoelhar-se diante do rafinessment francês.

Mas, olhem, que maravilha.

A Universidade Federal da Fronteira Sul, com campus no Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul,  estados brancos, conservadores, abriu ontem uma inscrição especial para imigrantes haitianos fazerem, aqui, seu curso superior.

135 vagas, distribuídas em cinco campi da UFFS: Chapecó (68), Laranjeiras do Sul (11), Realeza (12), Cerro Largo (16) e Erechim (28).

A maioria  para cursos que “não dão dinheiro” e têm procura mais baixa.

Mas, para eles, um maná dos céus.

Não se tem notícia de que tenha havido na França um “Je suis Haiti” em  um mea-culpa pelo que fizeram àqueles negros.

Talvez fosse bom exemplo aos franceses.

Devolver, corrigida, a indenização de 90 mil francos que deles se exigiu para renunciar ao seu direito de Metrópole sobre a antiga e rebelde colônia. por exemplo.

Sei, porém, que isso me orgulha de meu país.

A grande maioria de nossos antepassados também veio de fora, um dia. Fugiam da miséria, da perseguição ou, simplesmente, vieram à força, para serem escravos.

Não quero saber de onde, nem sei se o “cristão novo” de meu Nogueira era antes árabe ou judeu.
Embora tenha horror e nojo de que se assassine alguém, como fizeram aos cartunistas do Charlie Hebdo, não aderi à a hipocrisia de muitos que andaram publicando o “Je suis Charlie” sem nunca terem, quando era necessário, tido um dedo sequer levantado pela liberdade de expressão.

Não se trata de ser condescendente com atos de terror, porque não é a bala e covardia que se age ou reage contra ofensas, as mais graves que sejam.

Mas não é porque devam ser repudiados os que fizeram aquelas monstruosidades que devamos deixar de entender e de lutar para corrigir todas as outras violências que, ao longo da história, a Europa cometeu e comete na África, na Ásia e na América.

Não é porque amo a França e tudo o que ela me deu com sua Revolução, com Napoleão, com  Hugo, Diderot, Stendhal, Zola e uma lista infinda de grandes homens e mulheres, que posso achar “normal” e “democrático” que se proclame o direito de debochar e agredir a qualquer um ser humano.

Embora, para muitos, pelo fato de serem muçulmanos, possam achá-los “menos humanos”, como já acharam (ou acham) os negros, os índios, os amarelos, como fez o general americano William Westmoreland, na Guerra do Vietnã, ao “explicar” que  “os orientais não dão tanto valor à vida quanto nós”.

Meu direito de dizer o que penso tem um limite: o de ofender o outro, qualquer outro.Não se ofende a dignidade de alguém, sim, e muito menos se ofende a dignidade coletiva.

Algo tão simples que aprendi ainda garoto, no ditado repetido por minha avó: o seu direito acaba onde começa o direito do seu vizinho.

E poucos anos depois, fazendo o que todo guri que se encantou com o Monteiro Lobato para crianças, fazia quando ficava mais taludinho: lendo seus escritos adultos.

Trago um, que deveria ser lido por quem acha que não dói a ofensa:

O drama do brio

Monteiro Lobato (em 1933)

Há dezesseis anos ocorreu em São Paulo um crime singular.

Estava de guarda no quartel da Luz um soldado pernambucano de nome José Rodrigues Melo.

Era um homem. Embora rude, ninguém no regimento o vencia em firmeza de caráter. Melo personificava o brio militar — mais que isso, Melo personificava a dignidade humana.

Estava de guarda, embora tivesse a mão direita enferma. Os pernambucanos são rijos, e um simples ferimento não bastava para arredar aquele do serviço.

Começa aqui a tragédia do Brio. O Brio o impediu de ir vadiar à enfermaria. O Brio iria inutilizá-lo para sempre.

Passou por Melo um oficial francês.

Nesse tempo São Paulo vivia cheio de oficiais franceses, contratados para amestrar nossa gente na arte de matar pela escola de Saint-Cyr. E como para bem ensinar a arte de bem matar o primeiro passo é domesticar o aluno, os professores de França não largavam o instrumento clássico da domesticação: o chicote. E ninguém lhes fosse lembrar uma tal lei de 13 de Maio, etc., etc.; rir-se-iam com superioridade metropolitana, silvando: “Fí, donc”!

Ao passar o francês, nosso soldadinho pernambucano perfilou-se na continência do estilo. Acontece, todavia, que isto de continência é a colocação do pronome dos militares — coisa seríssima. Melo errou num pronome. Em vez de fazer a continência com a mão direita, impedida pela enfermidade, fê-la com a esquerda sã.

Ai! O lambe-feras avança para Melo e chicoteia-o impiedosamente na cara.

— Sale négre!

E a tragédia explode. Tudo quanto havia em Melo de dignidade humana faz-se maremoto incoercível. Não era mais um homem quem recebia a afronta, era a raça. Era essa coisa enorme e brutal que se chama pátria e borbulha dentro do peito de certas criaturas sob forma de sentimentos explosivos como a nitroglicerina.

As mãos de Melo crisparam-se na Mauser… e lá partiu a bala certeira que iria privar Damasco de mais um perito bombardeador.

Negrel morreu ao lado do chicote infamante — e parece que o chicote em São Paulo morreu com Negrel.

Foi esse o drama. Positivamente drama da raça. Drama da honra. Drama do brio. Drama da dignidade humana.

Ia começar a comédia da covardia.

Não houve em São Paulo um nacional que não fremisse de entusiasmo diante do revide de Melo.

Minto. Houve doze homens que destoaram do coro unânime. Eram homens que, chicoteados na cara, em vez de reagir meteriam a cauda entre as pernas e iriam, ganindo, beijar as mãos do lambe-feras. Nenhum deles tinha dentro de si a raça. Nenhum deles chegava a homem; meros sub-homens à tout faire.

Pois a coincidência quis que tal dúzia fosse constituir o conselho julgador do honroso crime.

Condenaram-no. E nada mais lógico, nada mais canino do que essa condenação a trinta anos de prisão celular infligida ao Brio. Condenaram-no só a trinta porque a lei não admitia penas de cinqüenta; nem permitia a aplicação das engenhosas torturas com que Luiz XV, o rei Bien Aimé, durante um dia inteiro divertiu Paris com o espantoso suplício de Damiens.

O crime de Melo era gravíssimo. Era crime de lesa-galicidade. E como o medo à França fez calar a imprensa, sofreando no nascedouro a onda de simpatia nacional, Melo foi apodrecer em vida num cubículo penitenciário.

E lá vegeta há quinze anos.

Nesse intervalo, quantos criminosos repugnantes não obtiveram perdão? Quanto cangaceiro que mata pelo prazer de matar não se gozou duma sólida impunidade? E também, quantos marroquinos e quantos sírios não foram trucidados cientificamente pelos franceses, por terem no peito o sentimento de raça que perdeu Melo?

Nossos “dúzias” perdoam tudo menos a dignidade, e o ensino inoculado pela missão do chicote calou fundo. Se lá na Síria os mestres bombardeiam os criminosos desse crime, aqui os alunos os fazem apodrecer nos ergástulos.

Há dias um repórter carioca, em visita à penitenciária de São Paulo, teve ocasião de falar com Rodrigues Melo.

— Está arrependido do que fez? Perguntou-lhe.

— Não! retrucou firmemente aquele brio de aço. E diga-me o senhor: se fosse iniquamente chicoteado na cara por um estrangeiro só porque lhe fez continência com a mão esquerda, visto ter a direita enferma, não faria a mesma coisa? Confesso que pratiquei o crime fora de mim; mas a privação de sentidos não foi inventada para nós…
E suspirou com os olhos brilhantes de lágrimas.

— Por que chora?

— Saudades de minha mãe, uma pobre velhinha que vive a esperar por mim, lá no fundo de Pernambuco. Oitenta e seis anos!… Vê-la-ei ainda?

Melo não se arrepende, e é diante de firmeza assim que nos renasce a fé na raça.

O desfibramento atual tem que ser passageiro. Eclipse momentâneo. Nem todos os Melos estão encarcerados; há de havê-los soltos, e por escassa que seja a semente, a espécie há de proliferar um dia.

O “não” de Melo ao jornalista é sublime. Diz “não!” após quinze anos de cárcere. Dirá “não!” ao cabo dos trinta anos da pena. E se no dia seguinte à soltura um francês o chicotear de novo, a raça incoercível, transfeita em diamante dentro desse homem, fá-lo-á matar de novo.

Os anos e as torturas são impotentes para quebrar a dignidade em quem a recebeu do berço — como coisa nenhuma a dará a quem dele saiu eunuco.

PS. Há um lindo filme que assisti na TV, de Henrique Maffei, sobre o drama dos haitianos. Não o achei na net inteiro, mas posto o trailler, um primor.