Mente vazia, oficina do sistema da mídia golpista

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segunda-feira, 18 de maio de 2015

Parentes cobram na Assembleia gaúcha punição a deputado fundador do MBL

Wandell-Seixas
O deputado é um dos fundadores do MBL, o Movimento Brasil Livre
Bom pessoal, acredito que todos saibam que o [deputado estadual do PP] MARCEL VAN HATTEN atropelou e meu pai veio a falecer…
Pois então, já se passaram 9 anos… e ontem 08/04/15, fomos à Assembleia Legislativa do RS, pois o deputado não respondeu a processo criminal, o processo ficou 5 anos na delegacia de Ivoti sem serem chamadas testemunhas, perícia e etc.
E, claro, após 5 anos prescreveu.
Não foi divulgada à juíza a morte de meu pai, foi dada como lesão leve.
Abaixo os documentos com os quais formalizamos denúncia à Comissão de Direitos Humanos, passamos estes documentos a todos os deputados das comissões, Manuela D’Ávila, Miriam Marroni, Jorge Pozzobom, missionário Volnei, bombeiro Bianchini, Ronaldo Santini, Pedro Ruas e Jeferson Fernandes.
Por favor repassem, queremos resposta de o porque ele não respondeu, por ser importante, uma pessoa pública?
Queremos resposta, queremos justiça.
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Estou, novamente, sendo vítima de uma tentativa de assassinato de reputação. Dessa vez, meus opositores estão fazendo uso político de um acidente de trânsito – acidente!! – para me atacar.
Como muitos já sabem – e, apesar de ser um assunto muito pessoal e delicado, nunca escondi nem me neguei a falar sobre ele -, em 2006 sofri um acidente de trânsito que resultou infelizmente – e posteriormente – no falecimento de uma pessoa.
Voltando da aula em Porto Alegre, a caminho de Dois Irmãos, fui surpreendido, após uma curva, por uma pessoa que ingressou inadvertidamente na pista da BR-116, na altura da cidade de Ivoti. Infelizmente, não consegui desviar a tempo. Conforme demonstram claramente os autos do inquérito, eu não invadi o acostamento nem me desviei do fluxo normal da pista [veja na imagem deste post a página 24 do inquérito policial escaneada]. Parei o carro e, evidentemente, prestei socorro. Para minha profunda tristeza, o acidente levou a vítima ao hospital e, após pouco mais de meio ano, veio a falecer.
O acidente foi investigado a fundo pelas autoridades competentes. O inquérito policial concluiu que eu não tive culpa alguma pelo acidente e o arquivamento foi solicitado pelo Poder Judiciário. Não fui processado nem, muito menos, condenado por homicídio, lesão corporal ou por qualquer crime. SOU INOCENTE. Apesar disso, as partes interessadas no processo ingressaram com uma ação cível buscando indenização (algo que é seu direito). Essa ação ainda está tramitando, em fase recursal e se alguém quiser acompanhar, o número do processo (apelação cível) é 70039964804.
Nesta semana, contudo, fui informado de que foi protocolado na Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, da qual sou membro, um documento pedindo, quase nove anos depois dos fatos ocorridos, nova apuração. É um pedido descabido sob o ponto de vista das atribuições da Assembleia e do ordenamento jurídico brasileiro, já que o caso foi encerrado por eu ser inocente.
Usar uma tragédia pessoal para fins políticos já é, em si, absolutamente lamentável. Mas está ocorrendo pior do que isso: assessores de deputado do PT e militantes começaram agora a aproveitar-se desta tragédia para espalhar falsas acusações contra mim, o que é uma estratégia baixa, suja e rasteira. Estão fazendo aquilo que se tornou corriqueiro para o PT: tentar assassinar a reputação de quem tem a coragem de ser oposição.
Estou tão indignado quanto triste com tamanha falta de dignidade. Que terrível escassez de meios para me combater!
Portanto, aos opositores políticos que espalham falsas notícias a meu respeito, repito o que já disse outras vezes aqui: não aceitarei e denunciarei sempre as tentativas de me calarem tentando assassinar a minha reputação. Continuarei com minha conduta transparente, combativa e coerente com os meus valores.
Assassinato de reputação, COMIGO, NÃO!
Marcel van Hattem
Deputado Estadual/RS
Leia também:

sexta-feira, 17 de outubro de 2014

Médico gaúcho a Dilma: "procure um cubano, FDP"

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Intolerância pré-eleitoral cobre o Brasil de ódio; ontem, logo após a presidente Dilma se sentir mal, no debate do SBT, o médico gaúcho Milton Pires postou a seguinte mensagem no Facebook: "Tá se sentindo mal? A pressão baixou??? Chama um médico cubano, sua grande filha da puta!"; entre seus seguidores, urros pela agressão; um dos internautas disse que Dilma deveria buscar proteção da Lei Maria da Penha, depois de ter sido espancada; dias atrás, o alvo da violência foi o ator Gregório Duvivier; hoje, é a presidente Dilma; em artigo, colunista Breno Altman alerta para a ascensão de um neofascismo na sociedade brasileira, atiçado por meios de comunicação conservadores; médico intolerante tem sido defendido, na mídia brasileira, pelo extremista Augusto Nunes, de Veja 

247 - "Tá se sentindo mal? A pressão baixou??? Chama um médico cubano, sua grande filha da puta!". A mensagem foi postada no Facebook pelo médico gaúcho Milton Pires, funcionário da prefeitura de Porto Alegre, formado na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e especialista em terapia intensiva, logo após a presidente Dilma Rousseff se sentir mal, com uma queda de pressão, no debate do SBT, ocorrido na tarde de ontem. Entre seus seguidores, urros de ódio. Um deles dizia que a presidente Dilma deveria buscar proteção da Lei Maria da Penha, após ter sido espancada no debate. 

A postagem é mais um exemplo do ódio que se alastra pela sociedade brasileira, às vésperas do segundo turno da eleição presidencial. Ontem, a notícia mais relevante do dia, foi a onda de insultos ao ator Gregório Duvivier, do grupo Porta dos Fundos, motivada por seu apoio declarado à reeleição da presidente Dilma Rousseff (leia aqui). O também ator Dado Dolabella, condenado por agressão a mulheres, comparou Duvivier a alguém contaminado pelo vírus ebola (leia aqui).

As duas agressões, a Duvivier e à presidente Dilma Rousseff, fazem parte do mesmo fenômeno: o neofascismo que se alastra pela sociedade brasileira. Em artigo publicado ontem no 247, o colunista Breno Altman afirma que os "conservadores perderam a vergonha na cara" e que o ódio ao PT retirou do armário todos os demônios da sociedade brasileira, como o racismo, a homofobia, o culto à desigualdade e o preconceito regional (leia aqui).

Extremista radical, o gaúcho Milton Pires tem um aliado na mídia conservadora, que há vários anos vem preparando o terreno para esse neofascismo. Trata-se do jornalista Augusto Nunes, de Veja.com, que o defendeu quando ele foi suspenso por 60 dias do trabalho em um hospital.

Leia, abaixo, o post de Nunes, em setembro deste ano:

Médico é suspenso por dois meses pelo crime de discordar dos jalecos estatizados que controlam um hospital em Porto Alegre

O médico Milton Pires enviou à coluna, nesta terça-feira a carta abaixo reproduzida. É um relato sucinto das perseguições movidas pela direção do Hospital Nossa Senhora da Conceição, em Porto Alegre, contra um profissional que pensar com independência — e dizer sem medo o que pensa. A mais recente abjeção foi consumada neste 22 de setembro: baseados em acusações difusas, inconsistentes ou mesquinhas, formuladas por testemunhas anônimas, os comandantes da instituição comunicaram a Milton Pires a decisão de suspendê-lo por 60 dias. Confiram:

O SILÊNCIO DE TODOS NÓS
Milton Pires

Meus amigos:  

Trabalhando desde junho de 2010 na UTI do Hospital Nossa Senhora da Conceição em Porto Alegre, minha contínua luta contra as barbaridades feitas contra a saúde pública no Brasil são do conhecimento de todos. No início de 2013, Ricardo Setti publicou em seu blog no site de VEJA o artigo com o título “Santa Maria e a Guerra do Vietnam”, uma séria advertência sobre a vinda dos médicos cubanos. Depois de “Carta à Presidente Dilma” e de outros textos publicados tanto no meu blog “Ataque Aberto” quanto no grupo de Facebook “Inglourious Doctor”, comecei a pagar, pessoalmente e profissionalmente, o preço das minhas opiniões políticas.

Assassinar reputações de inimigos não é uma prática nova da esquerda brasileira. O doutor Romeu 
Tuma Júnior provou isso em seu livro. Trabalhando num grupo hospitalar que atende 100% dos pacientes pelo SUS, no qual entrei por concurso público e que é controlado por gente do PC do B, não é necessário ser um teórico da conspiração para compreender e admitir o que acontece quem se opõe ao modelo de gestão de saúde no Brasil. Antiga, mas eficiente, a tática é sempre a mesma – mau desempenho nas avaliações funcionais e relatos de conflitos e dificuldade de relacionamento no local de trabalho funcionam como estopim dos processos administrativos em que se pretende “limpar” o serviço público dos opositores.
Neste 22 de setembro, chegando ao Hospital Conceição para trabalhar na UTI, fui notificado de que meu ponto estava “suspenso”. Encaminhado ao setor de RH, fui informado de que eu mesmo, como médico, estou suspenso do hospital por 60 dias, sem perda de remuneração. Argumenta a instituição que isso visa não prejudicar o processo administrativo disciplinar (PAD número 51/14, que tem como objetivo a minha exoneração. Desconheço os termos de acusação. Não sei ao que respondo e não tive, até agora, nenhuma chance de defesa.

Em apelação administrativa de avaliação funcional prévia considerada muito insuficiente, testemunhas identificadas como “trabalhador da saúde 1,2,3,4..etc..” me acusam de “não examinar os pacientes, não lavar as mãos, de conflitos com familiares de pacientes da UTI , de jogar equipamentos no chão e não usar equipamentos de proteção individual”. Não sei, oficialmente, o nome de NENHUMA das pessoas que disseram isso naquele processo. Não lhes foi exigida prova alguma para que declarações que acabaram com a minha vida funcional se transformassem em VERDADES corroboradas por meus chefes.

O que está acontecendo comigo não é exceção; é a regra aplicada aos médicos brasileiros que decidem contestar a maneira com que essa gente conduz a saúde pública. Minhas chances no processo administrativo, do qual sequer tenho cópia, não são muitas. Acredito que haja alguma alternativa na Justiça comum. Neste momento, resta-me apelar àquilo que essa gente mais teme: a publicidade, a divulgação em massa pela imprensa do que se pretende fazer em silêncio. Eles são especialistas em assassinar reputações, apoiados no total aparelhamento do serviço público e terror infundido nos seus subordinados. Os efeitos são garantidos por por lei. A Lei do Silêncio de todos nós.

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Gramado monta um santuário do gauchismo de espetáculo

Depois não entendem por que somos motivo de gozação no Brasil inteiro
 
Em setembro de 2004 eu escrevi um pequeno artigo que chamei de “A Disneylândia de bombacha”, publicado no portal da Agência Carta Maior (leia aqui).
Neste artigo, eu brincava que se o movimento tradicionalista gaúcho (MTG) “tivesse bala na agulha, ousadia, empreendedorismo, poderia associar-se à Walt Disney Corporation no sentido de negociar o direito de ser objeto da dramaturgia materializada em parques temáticos e embalsamar mitologias e histórias”. O MTG, assim, “poderia montar uma mega Disneylandia de bombachas, que é a aspiração mais legítima do tradicionalismo de espetáculo”.
Pois, ontem, lendo o jornal Zero Hora, noto que esse artigo despretensioso foi uma espécie de vaticínio. Em Gramado, segundo o jornal do bairro Azenha, alguém montou uma Disneylândia mirim com temática baseada no mito do gaúcho. O jornal não identifica os “vivarachos”, responsáveis por esse caça-níqueis para arrancar dinheiro de turista desavisado.
Gramado e Canela viraram a sede de oportunistas que montaram uma usina de tradições inventadas. Eles exploram vários imaginários visando transformá-los em mercadorias para a demanda turística: o Natal cristão, o mundo do chocolate, uma ideia de cultura europeia transplantada, uma estética arquitetônica germano-suíça, uma confusa gastronomia da quantidade e do entulho (vide o chamado café-colonial), e a estética do frio, que nos últimos anos exagerou na dose a ponto de inventar a virtualidade da neve (em combinação com a mídia regional).
Todos esses elementos são - evidentemente - fakes, conscientemente falsificados, um simulacro mal ajambrado de um fantasmático imaginário de classe média calcado em ícones da infância-adolescência dos indivíduos. Mas um elemento se destaca pela autenticidade e uma certa originalidade: o festival de cinema, com altos e baixos na organização das edições anuais. Mas isso é outra história, e merece uma análise própria.
Gramadocanela (a conurbação-grife) se transformou numa linha de montagem de produtos turísticos voltados para iludir um público ingênuo e predisposto ao autoengano.
O mito do gaúcho ainda estava de fora deste cenário de espetáculo. Agora não está mais. Foi inaugurado ontem (17/8) o Parque do Gaúcho, que segundo o jornal ZH, “é um santuário de estancieiros e indígenas”.
A matéria vai mais além na confusão e na mistura de conceitos tomados emprestados da biologia (“miscigenação”), da antropologia (etnias autóctones), da economia regional da Campanha (a unidade produtiva da estância latifundiária, voltada para a economia mercantil de exportação, subordinado ao circuito mercantil inglês do século 19), e da sociologia (o gaúcho, como constructo mítico do homem-síntese do Rio Grande do Sul, outrora um tipo socialmente marginal, hoje, um gentílico aceito quase universalmente).
O jornal garante que o gaúcho resulta da miscigenação do estancieiro com o indígena. Ora, isso é de uma impossibilidade total. Zero Hora quer cruzar biologicamente - vejam só - um sujeito econômico (estancieiro) com um sujeito étnico-autóctone (índio) e garantir que o resultado disso é o constructo ideológico chamado “gaúcho”. Nem o mais fértil dos mentirosos (ou ficcionista) poderia conceber tal sujeito, fruto híbrido de uma “bricolage” improvável - a combinação não entre seres biológicos - mas entre o tipo ideal (Weber) da economia e o tipo ideal da etnia, que lograram parir o tipo ideal ideológico - o gaúcho. Sem esquecer que esse tipo ideal ideológico ainda sofreu uma completa repaginação moral, que o transformou no seu contrário, uma vez que originalmente era tido como um pária social e passou a ser o gentílico ufanista de todo um povo.
Não satisfeita com esse insólita unidade de materiais tão distintos, numa bricolage que não para de pé, o jornal Zero Hora ousa agregar outra dimensão cultural para sustentar a narrativa do nosso improvável “gaúcho”: refiro-me à religião, uma vez que ao festejado Parque do Gaúcho de Gramado está sendo conferido o grau de “santuário”. É isso mesmo, o gaúcho está sendo entronizado em um santuário em Gramado, ou seja, o antigo andarilho guasca (“sem rei, sem lei e sem fé”), sempre vivendo no limite da lei, da ordem, e da moral vigente, hoje ascende à condição do sagrado, do augusto e do divino.
Eu suspeito mesmo que essa gente desconhece o alcance da tolice que acabaram de cometer e que pode colocar o estado do Rio Grande do Sul e sua gente como objeto de deboche e escárnio dos demais "gauchos" do Uruguai e da Argentina, bem como dos demais brasileiros.
Inventar tradições é uma prática cultural admitida no mundo todo, especialmente depois que o turismo virou uma grande indústria que gera emprego e renda para milhões de pessoas em todos os lugares onde é incentivado. Mas como na arte da literatura de ficção, no Direito e na ciência Estatística não se pode violar um atributo intocável, o da verossimilhança. A narrativa do tal “gaúcho” não pode estar divorciada da realidade, é necessário que haja uma probabilidade de verdade na relação entre ideia e imagem.
Ademais essa súbita divinização do “gaúcho”, além de constituir um exagero passível de troça e riso viral, é um fator de exclusão de tudo quanto a cultura sul-rio-grandense tem de rica e variada. O RS tem certamente o mais colorido mosaico étnico-cultural do Brasil, somos imbatíveis neste quesito. Temos uma coleção de contribuições de nacionalidades e etnias europeias, de etnias autóctones, de afrodescendentes (Porto Alegre é a cidade brasileira com o maior número de manifestações ativas das religiões africanas, mais do que Salvador da Bahia.), etc. Por que, então, representar o sul-rio-grandense somente através do unidimensional “gaúcho”? Está certo, a expressão “gaúcho” virou um gentílico (como carioca, por exemplo), mas daí a garantir que esta projeção idealizada se transforme no sagrado (com direito a santuário), vamos convir, é encaminhar requerimento urbi et orbi para que sejamos motivo de raro estranhamento. De zombaria, mesmo.


P.S.: Alô, editores de Zero Hora, a palavra cacimba se escreve assim: cacimba, e não cassimba, como vocês permitiram escrever e publicar, em claro desrespeito ao público leitor. Ou “consumidor”, como vocês dizem nas internas. Ver fac-símile ao lado.




 

 

 

Recebo mensagem do santuário gaucheiro


A resposta está aqui abaixo:


Aguardemos, pois. E puxem um banco.

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

SEM COMENTÁRIO, GAUCHADA



CLASSE MÉDIA GOLPISTA GAUCHA REUNIDA. SÃO REALMENTE DIFERENCIADOS.......
CASO SE COLOCASSE UM UNIFORME E , UM SUÁSTICA ...LEMBRARIA ALGO, TALVEZ COM ORGULHO PARA ALGUNS DOS PARTICIPANTES.  LÁSTIMA......


A RESPOSTA.



POR UMA EDUCAÇÃO EM CONDIÇÕES IGUALITÁRIAS, PÚBLICA E DE QUALIDADE.

terça-feira, 19 de junho de 2012

Cunha e as verrugas da história mal contada

“Pinte-me como eu sou, com verrugas e tudo.”

Amaral de Souza: retocado... e Lorde Cromwell: com verrugas e tudo



O Conversa Afiada reproduz imperdível artigo de Luiz Claudio Cunha sobre as verrugas de um leal servidor dos militares, extraído da Sul21:



Amaral de Souza (1929-2012): As verrugas da história mal contada da ditadura

Por Luiz Cláudio Cunha
Especial para o Sul21
Pinte-me como eu sou, com verrugas e tudo.
(Oliver Cromwell, 1599-1658, Lorde Protetor do
Reino Unido, ao pintor oficial da corte, Peter Lely)
Um jovem mal informado ou desatento imaginaria que o Rio Grande do Sul perdeu um gigante, na quarta-feira (13), quando morreu o ex-governador gaúcho José Augusto Amaral de Souza, dois meses antes de completar 83 anos, vítima de complicações de um AVC que desde 2006 o confinava a uma cadeira de rodas. Ele ganhou honras de Estado, luto oficial de três dias e os discursos e elogios de praxe da generosa tradição brasileira, que cobre qualquer morto com a pátina da complacência e repinta biografias sem as cicatrizes, espinhas e rugas conferidas pela vida política.
“Um líder importante do Rio Grande”, definiu, com exagero, o governador Tarso Genro. Foi desenhado com linhas ainda mais indulgentes pelos sete políticos de partidos e tendências diversas que o sucederam no Palácio Piratini, a partir de 1982, por decisão exclusiva do voto popular: Jair Soares (PP), Pedro Simon (PMDB), Alceu Collares (PDT), Antônio Britto (PMDB), Olívio Dutra (PT), Germano Rigotto (PMDB) e Yeda Crusius (PSDB). No limite da fidalguia, uns e outros louvaram Amaral pelos adjetivos piedosos que ocultam a rugosidade natural do último governador indicado pela ditadura dos generais de 1964: “conciliador, absoluto respeito pelos adversários, afável, vida pública sem máculas, atuação importante na política, administrador sério, importância fundamental na transição para a democracia, um amigo, grande companheiro”, e coisas do gênero.
Os sete sucessores de Amaral de Souza que alcançaram pelo voto popular o palácio que Amaral ocupou sem nenhum voto do eleitor gaúcho não cometeriam a deselegância de admitir publicamente o que muitos deles reconhecem mas ninguém diz: Amaral de Souza conseguiu ser a figura mais medíocre da safra dos quatro apagados governadores indiretos, escolhidos pelos quartéis, no período sem povo e sem liberdade que marcou o Piratini e o Rio Grande do Sul entre 1966 (dois anos após o golpe) e 1983 (dois anos antes da queda da ditadura). Ildo Meneghetti (PSD) só escapou dessa sina porque foi eleito pelo voto popular em 1962, quando o país ainda era uma democracia, e sobreviveu ao golpe militar até o final de seu mandato, em 1966, simplesmente porque era um dos golpistas embebido até a medula na conspiração contra o Governo Goulart.
A partir de Meneghetti, com o advento do bipartidarismo imposto pela nova ordem, só a legenda da ditadura podia chegar ao poder. Assim foi com os quatro governadores biônicos da ARENA, elevados sucessivamente ao poder com o indispensável beneplácito dos generais: Peracchi Barcelos (1966-1971), Euclides Triches (1971-1975), Synval Guazzelli (1975-1979) e Amaral de Souza (1979-1983). Só um regime de força pode explicar a inusitada aparição de um político de biografia tão pífia na galeria de 37 governadores do Rio Grande do Sul a partir da proclamação da República em 1889 — 19 deles eleitos pelo povo gaúcho. Amaral estreou na política partidária aos 30 anos, eleito vereador em sua terra natal, Palmeira das Missões, pelo velho PSD, partido conservador ligado às oligarquias rurais.
Virou deputado estadual em 1962, na chapa que elegeu Meneghetti governador, e deu sua tacada certeira dois anos depois, apoiando o golpe que seria a alavanca de sua improvável carreira. Com a extinção dos partidos em 1965, pulou para o barco da ARENA, sucessora do PSD e sigla de confiança dos generais. Amaral elegeu-se deputado federal em 1966, cultivou as estrelas certas em Brasília e ganhou em 1974 o posto sem voto de vice-governador na chapa de Synval Guazzelli. Não era uma homenagem a ele, mas um prêmio de consolação a seu padrinho político do ex-PSD, senador Tarso Dutra, frustrado pelo revés sofrido ante o adversário da ex-UDN, senador Daniel Krieger, que tinha emplacado o afilhado Guazzelli como governador.
Só o forçado atalho dos quartéis é que pode explicar, quatro anos depois, a surpreendente escolha do opaco Amaral como sucessor de Guazzelli. Seu cabo eleitoral tinha todas as luzes que ele necessitava: era o general quatro estrelas Fernando Belfort Bethlem, comandante do poderoso III Exército, a maior força terrestre do país, que reunia as tropas do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Seu cacife melhorou ainda mais, em outubro de 1977, quando Bethlem trocou Porto Alegre por Brasília, para assumir o ministério do Exército, na crise que levou à demissão do ministro linha-dura Sylvio Frota pelo duríssimo presidente Ernesto Geisel.
Amaral tinha os amigos certos e os inimigos ideais para aqueles tempos verde-oliva. Seu adversário dentro da ARENA, na disputa sem voto pelo Piratini, era o deputado federal gaúcho Nelson Marchezan, um parlamentar de origem democrata-cristã que cometia um pecado mortal para os mandamentos da ditadura: flertava demais com a oposição, que fizera um esforço quase subversivo em 1966 para eleger um professor liberal, Ruy Cirne Lima, como governador por via indireta, na Assembleia gaúcha. A coligação antigolpe tinha 31 das 55 cadeiras, mas a cassação preventiva de oito deputados transformou a minoria arenista em maioria, a conta exata dos quartéis para eleger o coronel Peracchi Barcellos.
Marchezan ficou marcado pela ousadia. E piorou suas chances, em 1967, quando integrou a oposição na CPI que investigava o aparecimento do cadáver de um ex-sargento do Exército, ligado a Leonel Brizola, boiando nas águas do rio Jacuí, com marcas de torturas e as mãos atadas às costas. O assassinato do sargento Manoel Raimundo Soares — o ‘Caso das Mãos Amarradas’ — virou um escândalo internacional e serviu para Amaral amarrar politicamente as mãos de Marchezan e Guazzelli no decisivo colégio eleitoral dos generais que escolhiam com exclusividade os governantes.
O então vice-governador, com o olho e a ideia fixa na cadeira de titular do Piratini, cultivava com cálculo político os amigos militares que garantiam seu emprego, sua sobrevivência e seu futuro no regime. Nunca recusava o convite para uma partida camarada de cartas com o sucessor do padrinho Bethlem no comando do III Exército, o general Oscar Luís da Silva. Amaral e sua mulher, dona Miriam, eram parceiros fieis no joguinho de biriba com o casal Oscar e Marina na residência oficial do general, na mansão bem vigiada de uma esquina da avenida Cristóvão Colombo, no bairro Higienópolis.
Em março de 1976, o olho atento e o ouvido alerta de Amaral perceberam uma oportunidade preciosa para melhorar seu ibope no exclusivo colégio eleitoral dos generais. Numa sexta-feira, 19 de março, o MDB fez uma reunião política no maior produtor de soja do Estado, Palmeira das Missões, cidade de 65 mil habitantes, 374 km a noroeste da capital. Menos de mil pessoas lotaram o cine Gaúcho para ouvir uma dúzia de deputados estaduais e federais, comandados pelo líder do MDB gaúcho, deputado Pedro Simon. As duas figuras mais animadas da noite eram os federais gaúchos Nadyr Rossetti e Amaury Muller, destaques do bloco dos Autênticos, a ala mais radical do MDB. Nadyr Rossetti mandou brasa:
— A queda do regime é coisa certa. Se não for por podre, será pela corrupção.
Amaury Muller ecoou:
— Somos governados não pela vontade do povo, mas pela força das armas. Estamos em um regime de golpe, não de revolução, dominados pela aristocracia fardada.
A reunião acabou, sem maiores sobressaltos. Afinal, parecia apenas uma justa e previsível lambada de uma oposição sufocada, desabafando num cinema empoeirado do interior distante. Três dias depois, 22, uma segunda-feira, o encontro irrelevante num grotão gaúcho pipocou de repente em Brasília, na tribuna da Câmara dos Deputados, pela palavra veemente do deputado federal gaúcho Fernando Gonçalves, da ARENA, que deu relevo nacional ao encontro da província. Tudo ali tinha o olho, o ouvido e o dedo rígido de Amaral.
Por acaso, o deputado Gonçalves era o cunhado do vice-governador. Por fatalidade, Palmeira das Missões era a terra natal de Amaral. Por gentileza, um assessor do vice-governador conseguiu uma cópia da gravação com todos os discursos daquela noite no cinema. Por patriotismo, a fita do assessor de Amaral caiu nas mãos do parceiro de biriba, o comandante do III Exército. Na quarta-feira, 24, o agradecido general Oscar Luís da Silva embarcou para a reunião do Alto Comando do Exército em Brasília levando na pasta o mimo gravado pela turma de Amaral. Na quinta, 25, a manchete do jornal Correio do Povo dava a crônica da morte anunciada: “Discursos do MDB levados por Oscar Luís a Brasília”.
Rossetti e Muller foram cassados pelo AI-5 na segunda-feira, 29 de março. Graças ao ouvido sensível, ao olho bom e ao dedo ruim de Amaral de Souza, louvado na morte pelos seus sucessores no Piratini e seus esquecidos opositores na ditadura como “um amigo, grande companheiro, afável, conciliador, vida pública sem máculas e absoluto respeito pelos adversários…”.
Em setembro de 1977, um mês antes de assumir o ministério em Brasília, o general Bethlem operava em Porto Alegre como o cabo eleitoral mais graduado e decisivo para as pretensões futura de Amaral. Chamou ao QG do III Exército, na rua da Praia, o homem mais poderoso e influente da comunicação gaúcha — Breno Caldas, dono da Caldas Júnior, a empresa jornalística que, além do prestigiado Correio do Povo, tinha outros dois diários e uma rádio. No ranking de 1969 da revista Visão, o empresário despontava como o sexto homem mais rico do país. Na ficha dos militares, Breno Caldas era lembrado pelo apoio que dera ao golpe de 1964 e no enfrentamento diário a Leonel Brizola. Ao final do almoço, em pé para o cafezinho, cercado por meia dúzia de generais, Bethlem entrou de coturno no assunto:
— Dr. Breno, nós o convidamos para vir aqui pois queríamos ouvir sua opinião sobre o convite que desejamos fazer ao vice-governador Amaral de Souza para ser o próximo governador…
A democracia sem sutileza daqueles tempos era assim. General, e não o povo, é que ‘convidava’ alguém para ser governador. O Dr. Breno ficou surpreso.
— Como assim? A minha opinião?… Não conheço essa pessoa o suficiente para dar uma opinião, isto é, para emitir um conceito. Não tenho opinião formada a seu respeito. Poderia quando muito dar uma impressão… E que não é favorável!
Os generais se empertigaram, ainda mais curiosos.
— Mas… Qual é a sua impressão? Nós gostaríamos de saber…
Breno Caldas não se acuou diante das estrelas que o cercavam.
— A minha impressão é que ele está abaixo do nível necessário… Falta-lhe pelo menos um palmo e meio.
— Como assim? – perguntou o comandante do III Exército, espantado diante da inusitada régua de medição do empresário. – Em que sentido, Dr. Breno?
— Em todos os sentidos. Ele não tem estatura física, nem pessoal, nem moral…
Apesar do palmo e meio a menos, Amaral subiu as escadarias sem povo do Palácio Piratini em março de 1979, numa cerimônia que mais parecia um velório do que a festiva transmissão de posse entre dois companheiros de legenda. As fotos da época mostram a derrota fragorosa estampada na cara funérea de Guazzelli, fisionomia cerrada, cenho franzido, incapaz de esconder o constrangimento que teve de engolir — pela escolha dos quartéis e pela decisão irrecorrível do general Ernesto Geisel, o gaúcho de Bento Gonçalves cujo voto solitário prevaleceu sobre a vontade soberana de 6 milhões de gaúchos.
Esta, afinal, é a lógica das ditaduras.
O espantoso diálogo de Breno Caldas com os generais só vazou porque o próprio jornalista resolveu relembrar tudo aquilo, em fevereiro de 1983, em editorial por ele escrito e publicado na edição dominical do Correio do Povo para seus 100 mil assinantes, intitulado “Palmo e meio”. O empresário reagia à péssima notícia que recebera ainda na festa de inauguração do Polo Petroquímico do Sul, em Triunfo, a 52 km de Porto Alegre. O Banrisul, banco oficial do Estado, subordinado ao ainda governador Amaral de Souza, tinha entrado naquele dia na Justiça com uma ação executiva pela dívida da Caldas Júnior.
Mais de cinco anos após aquela esquisita conversa no QG, Breno Caldas resolveu contar ao mundo o que costumava circular apenas nas dobras mais íntimas do poder discricionário da época. Convertido de repente às virtudes do regime democrático que ajudou a derrubar em 1964, o Breno Caldas endividado de 1983 agora lamentava os pecados da escolha autocrática dos generais. Escreveu ele no editorial:
“Como o personagem em causa [Amaral de Souza] não foi submetido ao teste de uma eleição direta, mediante a qual existisse a possibilidade de consenso amplo, não sei se minha impressão, que depois se tornou opinião consistente, seria, ou não, aprovada pelo grande número. Não sei. Para mim, o que se viu não deixa dúvidas”.
Amaral de Souza, o personagem em causa, só chegou ao Piratini pela via oblíqua dos quartéis porque a ditadura sempre dispensa o ‘consenso amplo’ típico das democracias, tardiamente lembrado pelo nostálgico Breno Caldas. Apesar da falta de ‘estatura física, pessoal e moral’ anotada pelo mais importante jornalista gaúcho da época, Amaral escalou o Palácio Piratini com o braço amigo e a mão forte do Exército, que compensou sem sobressaltos o palmo e meio de sua escassa biografia política. Conseguiu ser o menor dos 36 homens e uma mulher que governaram o Estado, desde a República.
Com seus ralos 1m58, Amaral de Souza conseguia ser ainda mais baixinho do que Getúlio Vargas, que saiu da vida e entrou na história como líder de massas, regente por um quarto de século de um país redesenhado politicamente à sombra descomunal que se projetava de seu parco 1m60 de altura.
Amaral não correu jamais esse risco de grandeza, até porque ganhou notoriedade na política como um mero Amaralzinho, o diminutivo que explica melhor sua miúda passagem pela história.
Amigos apressados e adversários educados tentaram dourar sua morte com encômios pela conquista do Polo Petroquímico, de tão amarga memória para o desafeto Breno Caldas. Mas não passa de uma inverdade histórica, que tenta dar algum lustro ao reles mandato de Amaralzinho. A construção do terceiro polo petroquímico do país, que o Rio Grande do Sul disputava com São Paulo, Pernambuco e a Bahia do poderoso Antônio Carlos Magalhães, então presidente da Eletrobras, foi decidida em agosto de 1977 pelo general Ernesto Geisel, convencido por uma inédita união entre governo e oposição no sul.
De um lado, a ARENA do governador Synval Guazzelli e, de outro, o MDB de Pedro Simon, que controlava uma folgada maioria de 31 das 56 cadeiras da Assembleia Legislativa, onde se criou uma Comissão Especial. Pelo Polo de Triunfo, Guazzelli e Simon foram a uma inédita, rara reunião com Geisel em Santana do Livramento, na fronteira com o Uruguai. A vitória gaúcha ficou evidente quando Geisel reagiu, animado, diante da presença inesperada do MDB: “Como não aceitar um pedido de uma composição tão exemplar que a política do Rio Grande está dando como exemplo para todo o Brasil?”.
As digitais do pequeno Governo Amaralzinho se percebem com a aparição do inquieto CPERS, o Centro de Professores do Estado, que ocupou a praça da Matriz e infernizou a vida do governador ao longo de 13 dias de uma greve barulhenta pelo piso de 2,5 salários mínimos. A partir de Amaralzinho, nenhum governador mais pode festejar o silêncio do CPERS. Como uma maldição de Breno Caldas, morto em 1989 aos 79 anos, Amaral também deixou o governo endividado, com um aumento de 79,1% no rombo das contas públicas, obrigando o Estado a buscar recursos no Banrisul e no BRDE para cobrir o déficit operacional.
No final de 1980, Amaral promoveu o policial mais famoso do sul, Pedro Carlos Seelig, a delegado de quarta classe, o ponto mais alto da hierarquia da segurança. Era o contraponto ao crepúsculo do homem mais temido do DOPS gaúcho, cuja carreira entrou em declínio após o fiasco do sequestro dos ativistas de esquerda uruguaios Universindo Díaz e Lílian Celiberti e seus dois filhos, presos numa ação clandestina da Operação Condor, em novembro de 1978 em Porto Alegre, executada por agentes de Seelig e militares da repressão do Uruguai. Braço longo da repressão no sul, onde era conhecido como “o Fleury dos Pampas”, Seelig tinha a proteção incondicional da área militar, que sempre merecia atenção especial de Amaral.
Isso não impediu que, em maio de 1982, um ano após o frustrado atentado do Riocentro que escancarou a ação terrorista do DOI-CODI, Amaral tomasse uma ousada decisão: extinguiu o DOPS de Seelig. O secretário de Segurança, João Leivas Job, explicou o ato: “Como consequência do processo de abertura, o DOPS não é mais necessário”. Na verdade, era o sistema repressivo da ditadura se preparando para o advento das eleições diretas, em outubro daquele ano, que poderia abrir documentos incômodos aos governantes eleitos pela oposição. Uma decisão reservada de Brasília estava transferindo preventivamente as ações de repressão política dos Estados para a área mais confiável da Polícia Federal.
Dois dias depois, uma quinta-feira, 27 de maio de 1982, Amaral aumentou sua aposta, determinando a incineração dos preciosos arquivos do DOPS. Quatro caminhões de mudança levaram toneladas de documentos do DOPS da avenida Ipiranga para os fornos de uma olaria da Brigada Militar em Gravataí, na Grande Porto Alegre, onde queimaram durante oito horas. Viraram cinzas os papéis que contavam 44 anos de repressão política do DOPS gaúcho, criado na ditadura do Estado Novo de Vargas.
O ativista Jair Krischke, presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos (MJDH), qualificou a pirotecnia de Amaral como uma ‘farsa’, pois parte dos documentos supostamente destruídos foi localizada anos mais tarde em Montevidéu. “Os documentos foram microfilmados. O arquivo do DOPS foi modernizado e entregue ao Comando Militar do Sul”, diz Krischke, referindo-se à nova denominação do III Exército. Ele diz que, nos arquivos do MJDH em Porto Alegre, existem documentos do extinto DOPS com anotações de datas posteriores à queima pública. “Se essas fichas foram queimadas, como aparecem aqui com atualizações?”, pergunta ele.
Na época da fogueira, o então candidato do PT a governador, Olívio Dutra, resumia assim a questão: “O Governo já perdeu as eleições no Rio Grande e quer evitar que os arquivos caiam nas mãos da oposição”. Amaralzinho, muito precavido, parecia também acreditar nisso. Como se sabe, porém, o Governo não perdeu. Dividida entre PMDB, PT e PDT, a Oposição deixou de ganhar uma eleição que parecia líquida e certa. O candidato de Amaral, Jair Soares, da ARENA rebatizada como PDS, venceu o favorito Pedro Simon, do PMDB, por apenas 22.373 votos, cerca de 0,6% do eleitorado gaúcho, numa apuração controversa contaminada pela suspeita de fraudes — nunca provada e estimulada pelo precoce reconhecimento da derrota pelo PMDB, o que desativou todo o mecanismo de fiscalização do pleito.
Assim, com tantos serviços prestados ao regime que serviu com fidelidade canina, Amaralzinho pode enfim passar o cargo em 1983 a um governador eleito diretamente pelo povo, algo que não acontecia no Estado há 21 anos — o tempo de vida da ditadura (1964-1985). A ironia é que, depois de duas décadas sem o ‘consenso amplo’ da democracia, a primeira eleição direta no Rio Grande consagrou um legítimo herdeiro da ARENA da ditadura que cassou o voto popular e que gerou governantes com palmo e meio de legitimidade política. Esta, talvez, tenha sido a marca mais expressiva daquele governo pontuado pela inexpressividade.
Resta lamentar que um Estado um dia conhecido por sua cultura e coragem política não consiga, em plena democracia, pintar o justo retrato, com verrugas e tudo, que nos revelam os homens e suas imperfeições perante a História. Esta é uma tarefa indelegável das lideranças políticas, uma obrigação permanente da imprensa e seria uma reação previsível de seu braço mais militante — os blogs e sites combativos que, estranhamento, engoliram em seco a visão adocicada sobre Amaralzinho e seu legado político. Um país maduro e informado se constrói todo dia pelo retrato sem retoque daquilo que é, daquilo que se faz e daquilo que se vê.
Até um gênio da pintura pode errar a mão. O alemão Hans Holbein (1498-1543), o Jovem, um dos mestres do retrato no Renascimento, em tempos sem Internet e sem Photoshop, foi contratado pela Corte inglesa para fazer o retrato prévio de Ana de Cleves, filha do duque alemão de Dusseldorf que atraía os olhares gulosos do rei inglês Henrique VIII (1491-1547).
Holbein se esmerou e retratou uma jovem que ficou mais bonita na moldura da parede do que na cama do rei. Chegou ao requinte de ocultar as cicatrizes de varíola na face que poderiam assustar o real pretendente. Quando enfim foi apresentado à noiva, o rei conferiu pessoalmente o engano. Ainda assim, Henrique VIII conseguiu aguentar seis meses de casamento em 1540 com Ana, a quarta rainha de sua coleção de seis mulheres.
Quase um século depois, Oliver Cromwell, o líder puritano que decapitou o rei Charles I (1600-1649), revogou a monarquia absoluta e estabeleceu uma fugaz República em Londres 140 anos antes da queda da Bastilha, não perdeu a cabeça ao encomendar seu retrato ao mestre Peter Lely (1618-1680). Com o desprendimento que seria útil a qualquer político ou repórter diante das verrugas de Amaralzinho, o temido Cromwell, Lorde Protetor do Reino Unido, isentou o pintor oficial da corte de qualquer autocensura.
Peter Lely, de origem holandesa, era o retratista particular de Charles I, mas sobreviveu ao rei pelo talento e obediência às ordens de Cromwell em 1635: “Mr. Lely, eu desejo que você use toda a sua habilidade ao pintar o meu retrato verdadeiramente como sou, sem lisonjas. Observe todas essas rugosidades, espinhas, verrugas e tudo como você me vê. Se não for assim, não pagarei um centavo por ele”.
A máscara mortuária de Cromwell comprova que Lely foi fiel às determinações do retratado, preservado as duas enormes verrugas que marcam o rosto do Lorde — uma no queixo, abaixo do lábio, outra sobre o supercílio direito, próxima ao nariz. A lição de honestidade imposta por Cromwell fez escola, como se pode ver em retratos semelhantes pintados por outros artistas, todos preservando as rugas, espinhas e verrugas da vida real.
Quase quatro séculos depois, o retrato público de Amaralzinho retocado pela indulgência plenária de seus crédulos simpatizantes prova que o exemplo de Cromwell continua necessário. Afinal, o pentimento da história não se resgata com o fingimento da política.

Luiz Cláudio Cunha é jornalista
[cunha.luizclaudio@gmail.com]

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Inês Nassif:Congresso do PT deixa o ar entrar

O Conversa Afiada reproduz texto de Maria Inês Nassif extraído da Carta Maior:

Um sopro de vida orgânica no PT


O documento aprovado no Congresso do PT é uma tentativa de resgatar a organicidade política do partido que, depois de oito anos de governo Lula (e oito meses de Dilma) acabou se conformando como uma mera unidade pró-governo. É uma tentativa de sair da arena da luta meramente institucional com os partidos aliados e ganhar a opinião pública para suas bandeiras.


Maria Inês Nassif


Não se recomenda reduzir o Congresso do PT, realizado no final de semana, a um mero jogo de cena. A ausência de debates acalorados ou a não explicitação de grandes divergências internas dizem mais do que isso. Ao longo de oito anos de governo, e no início de um terceiro mandato na Presidência, era inevitável que mudanças se produzissem num partido que sempre funcionou como uma frente de tendências de esquerda, setores sindicais e grupos ligados à Igreja Progressista.


O PT passa por um processo de mudança que se iniciou em 1998, após a terceira derrota de Luiz Inácio Lula da Silva na disputa pela Presidência. Ao longo do tempo, sofreu defecções próprias de um partido que se consolidou na oposição e como partido de esquerda que, uma vez no poder, não teria condições de governabilidade se não optasse por uma política de alianças mais ampla e maleável.


Muita água rolou debaixo da ponte desde a formação do PT, em 1980. Sofreu rachas que resultaram no PSTU e no PSol; não apenas perdeu setores ligados à Teologia da Libertação, como os que lá permaneceram vivem o ostracismo a eles imposto nos dois últimos papados (de João Paulo II e de Bento XVI); amargou as crises do chamado Mensalão e dos “Aloprados”, que resultaram não apenas em desgaste popular, mas em perdas de quadros importantes para a dinâmica interna, sangria iniciada na formação do Ministério petista; foi de alguma forma redimido pelo sucesso dos governos Lula, mas para isso teve que pegar carona na popularidade de um líder carismático que detinha o poder do presidencialismo.


O resultado foi um esvaziamento de quadros dirigentes, uma crise interna que se estendeu no tempo, inclusive pela falta de mediadores com o peso de Lula, e uma perda de peso relativo em relação aos demais partidos da base aliada, embora permaneça com uma grande bancada no Congresso.


Essa conjunção de desgraças poderia ter reduzido o partido a pó, à semelhança do que acontece com o desidratado DEM, ex-PFL. Não foi o que aconteceu. Primeiro, porque continua partido do governo – e num sistema presidencialista, isto não é pouco, nem para o PT (embora, por justiça, é preciso lembrar que o partido, desde a sua criação, teve um crescimento eleitoral contínuo, mesmo na oposição, e apenas sofreu uma queda eleitoral em 2006, quando era governo e apesar da reeleição de Lula). Em segundo lugar, porque a sangria de quadros não alterou a realidade de que o partido ainda é o único que dispõe de quadros, não apenas os nascidos de sua organização mas também os originários da esquerda pré-redemocratização.


A vantagem disso é que, mesmo com a proliferação de grupos articulados em torno de líderes paroquiais (isso também existe no PT), prevalece, inclusive numericamente, a ideia de que a organicidade partidária é a grande vantagem de que desfruta em relação aos partidos da base aliada, nas contendas com o governo.


As dificuldades que o governo Lula e o PT enfrentaram a partir de 2005 também colocaram como questão eleitoral para o partido a atração dos movimentos sociais, afastados nos primeiros anos de governo petista, e a inclusão dos setores que ascenderam à sociedade de consumo nesse período graças às políticas de inclusão do governo petista. Se o partido não capitalizar esses setores agora, não conseguirá dividir esse legado com Lula. Ou o perderá para o PSDB, que investe na “nova classe média” partindo do conceito clássico de que esse setor social tem grande tendência ao conservadorismo. O PSDB quer conquistar os setores que emergiram no governo petista pela direita; o PT tenta fidelizá-lo com um discurso mais progressista, para não perder o apoio das classes mais baixas que, se não chegaram às classes médias, ascenderam à sociedade de consumo nos governos petistas.


A defecção de grupos de esquerda e a divisão das responsabilidades de governo com tendências que se desentendiam internamente permitiram o milagre da unidade, num momento de crise em que se apostaria na fatalidade da desunião. A saída de Lula do governo e uma aposta na incapacidade da presidenta Dilma Rousseff nas questões de natureza política reiteravam essa previsão. Não foi tão ruim assim. E, pensando bem, pode ser uma grande chance para o PT encontrar o equilíbrio entre os interesses do partido e as exigências do governo.


O documento do PT, aprovado no encontro, é uma tentativa de resgatar a organicidade política do partido que, depois de oito anos de governo Lula (mais oito meses de Dilma) acabou se conformando como uma mera unidade pró-governo. É uma tentativa de ter suas próprias bandeiras, no suposto de que o partido deve assumir o papel de abrir espaço, na sociedade, para medidas de caráter mais progressista. Entenda-se a manifestação política do Congresso do PT como uma tentativa de sair da arena da luta meramente institucional com os partidos aliados e ganhar a opinião pública para suas bandeiras. Por enquanto, o único mérito é tentar retomar o seu papel de intelectual orgânico. Será um grande mérito, contudo, se conseguir levar essa missão a bom termo.


Clique aqui para ler “Dirceu: Congresso é que vai promover a Ley de Medios”.

E aqui para ler “Reaproximação com movimentos sociais reúne aliados do PT”.

BREVE, NOS PORÕES DA PRIVATRIA DEMO TUCANA. A ERA DO FAMIGERADO FHC. NÃO PERCAM A LEITURA.

Privatas do Caribe


A fantástica viagem das fortunas tucanas desde os porões da privataria até o paraíso fiscal das Ilhas Virgens Britânicas


Amaury Ribeiro Jr.

Prepare-se: o que está logo adiante não é uma narrativa qualquer. Você está embarcando em uma grande reportagem que vai devassar os subterrâneos da privatização realizada no Brasil sob FHC. Os porões da privataria. É, talvez, a mais profunda e abrangente abordagem jamais feita deste tema. Mas que não se limita a resgatar a selvageria neoliberal dos anos 1990, que dizimou o patrimônio público nacional, deixando o país mais pobre e os ricos mais ricos. Se fosse apenas isso, o livro já se justificaria. Mas vai além ao perseguir a conexão entre a onda privatizante e a abertura de contas sigilosas e de empresas de fachada nos paraísos fiscais da Améri ca Central. Onde se lava mais branco não somente o dinheiro sujo da corrupção, mas também o do narcotráfico, do contrabando de armas e do terrorismo. Um ervanário que, após a assepsia, retorna limpo ao Brasil. Resultado de uma busca incansável de mais de dez anos do autor, Amaury Ribeiro Jr. — um dos mais importantes e premiados repórteres investigativos do país, com passagens por IstoÉ, O Globo, Correio Braziliense entre outras redações — o livro registra as relações históricas de altos próceres do tucanato com a realização de depósitos e a abertura de empresas de fachada no exterior. Devota-se particularmente a perscrutar as atividades do clã do ex-governador paulista José Serra nesse vaivem entre o Brasil e os paraísos caribenhos. Sempre calcado em documentos oficiais, obtidos em juntas comerciais, cartórios, no ministério público e na Justiça. Assim, comprova as movimentações da filha do ex-candidato do PSDB à Presidência, Verônica, e as de seu marido, o empresário Alexandre Bourgeois. Que seguiram, no Caribe, as lições do ex-tesoureiro de Serra e eminência parda das privatizações, Ricardo Sérgio de Oliveira. Descreve ainda suas ligações perigosas com o banqueiro Daniel Dantas. Detém-se na impressionante trajetória do primo político de Serra, o empresário Gregório Marin Preciado que, mesmo na bancarrota, conseguiu participar do leilão das estatais. E arrematar empresas públicas ! Estas páginas também revelarão que o então governador Serra contratou, com o aporte dos cofres paulistas, um renomado araponga antes sediado no setor mais implacável do Serviço Nacional de Informações, o extinto SNI. E que Verônica Serra foi indiciada sob a acusação de praticar o crime que, na disputa eleitoral de 2010, acusou os adversários políticos de seu pai de terem praticado. Desvinculado de qualquer filiação partidária, militante do jornalismo, Ribeiro Jr. do mesmo modo como rastreou o dinheir o dos privatas do Caribe, esteve na linha de frente das averiguações cobre o “Mensalão”. Seu olhar também visitou os bastidores da campanha do PT para averiguar os vazamentos de informações que perturbaram a candidatura presidencial em 2010. E sustenta que, na luta por ocupar espaço a qualquer preço, companheiros abriram fogo amigo contra companheiros, traficando intrigas para adversários políticos incrustados na mídia mais hostil à Dilma Rousseff. É isso e muito mais. À leitura.


O Editor