Em setembro deste ano da graça de 2014, a taxa de desemprego medida
pela Pesquisa Mensal do Emprego, do IBGE, caiu para 4,9% no conjunto das
seis regiões metropolitanas pesquisadas na série histórica daquela
instituição. Já o salário médio do trabalhador brasileiro subiu para R$
2.067,10 – um aumento de 1,5% em relação a um ano atrás.
No fim deste mês, serão divulgados os números da PME referentes a
outubro, mas já se pode prever que, como vem ocorrendo há mais de uma
década, os números serão ainda melhores. Até porque, no segundo semestre
o desemprego sempre cai mais, historicamente.
Quanto à inflação (terceira perna do tripé do bem-estar social), para
2014, 2015 e 2016 a meta central é de 4,5%, mas o IPCA, que serve de
referência para medir o aumento dos preços, deve oscilar entre 2,5% e
6,5% sem que a meta seja formalmente descumprida.
No acumulado de 12 meses até setembro, o IPCA somou 6,75% – acima do
teto de 6,5% do sistema de metas brasileiro. Entretanto, a meta de
inflação refere-se ao período de janeiro a dezembro de cada ano, não à
comparação de cada mês com o mesmo mês do ano anterior, de forma que,
como ocorre desde que o PT chegou ao poder, a meta de 2014 deve ser
cumprida.
Para fechar esse tópico, a cereja do bolo: o rendimento médio do
trabalhador em agosto foi de R$ 2.055,55, o que representa um aumento de
2,5% acima da inflação comparado a agosto de 2013 (R$ 2.005,72).
O que esses números significam, é espantoso. Significam,
simplesmente, que não há uma razão lógica para que Dilma tenha tido
tanta dificuldade para se reeleger. A população não sente mal-estar.
Pelo contrário, com os salários subindo, o desemprego caindo e a
inflação sob controle, os brasileiros veem suas vidas melhorarem a cada
ano.
Alguns cientistas políticos afirmam que, apesar de a qualidade de
vida do brasileiro não estar piorando nem estar estagnada, o ritmo de
melhora caiu muito – devido à crise internacional, que nos afeta – e,
assim, sob o discurso “certo” esse ritmo mais brando de progresso social
pode ser caracterizado como “piora” pelos adversários políticos do
governo federal.
Além disso, o combate mais intenso à corrupção a partir do governo
Lula – com fortalecimento da Polícia Federal e dos órgãos de controle do
próprio governo federal – deram aos adversários do PT a possibilidade
de confundir a sociedade caracterizando a divulgação de mais casos de
corrupção – decorrentes de mais investigação – com “aumento” da
corrupção.
Se os adversários dos governos petistas e do próprio PT fossem apenas
os partidos políticos, não seria nada. Tivéssemos, no Brasil, uma
imprensa imparcial – ou menos parcial –, que noticiasse de forma
equânime os problemas que todos os governos enfrentam, não pareceria que
tudo caminha às mil maravilhas nos governos estaduais da oposição
enquanto que, no âmbito federal, só há roubalheira e piora da economia.
Composto o quadro socioeconômico atual do Brasil, voltemo-nos à
verdadeira rebelião que tomou a base aliada do governo Dilma no
Congresso logo após a reeleição, com destaque para o PMDB, assustado com
a possível hecatombe que a revelação completa das “delações premiadas”
pode lhe trazer.
A rebelião em curso decorre, em grande medida, de declarações que a
presidente Dilma deu em entrevistas às tevês logo após a reeleição,
quando avisou que, no combate à corrupção, não vai deixar “
pedra sobre pedra”, o que foi entendido como ameaça por políticos – sobretudo do PMDB – que têm consciência pesada.
Ciente disso tudo, o PSDB e seu novo “golden boy”, Aécio Neves,
fizeram um circo no Congresso, com declarações grandiloquentes do novo
“líder da oposição”, que foi recebido no Senado como se tivesse vencido a
eleição enquanto prometia oposição sistemática a quem o derrotou nas
urnas.
Supõe-se, portanto, que a presidente Dilma e seus conselheiros e
assessores devem estar dando tratos à bola para formularem um meio de
garantir governabilidade tendo uma base aliada em pé-de-guerra, sedenta
de cargos e de proteção contra a política do quarto governo consecutivo
do PT de combater sem trégua a corrupção.
Essa fórmula de pacificação da base aliada no Congresso passa,
infelizmente, pela aliança formal com partidos como o PMDB e algumas
legendas de aluguel. Tal fórmula, porém, desagrada profundamente os
partidos de esquerda e os movimentos sociais que ao longo dos governos
Lula e Dilma acabaram servindo, involuntariamente, como linha auxiliar
da direita.
Desde as “jornadas de junho” e o movimento “não vai ter Copa”, os
partidos de esquerda e os movimentos sociais – que, no segundo turno,
assustados com a possibilidade de a extrema-direita chegar ao poder
correram para debaixo das asas do PT e de Dilma – ajudaram a produzir a
situação política que vige hoje no Brasil sobretudo por não quererem
aceitar a realidade: o brasileiro é conservador e para fazer um povo
assim votar na centro-esquerda, só com alianças à direita.
Costumo repetir sempre essa história: em 2012, a revista Fórum
entrevistou, via streaming, o então candidato do PSOL a prefeito de São
Paulo, Carlos Giannazi. Este blogueiro foi um dos entrevistadores.
Perguntei ao candidato justamente sobre governabilidade.
Disse a Giannazi que o partido dele repelia alianças com partidos de
direita ou de centro direita não na eleição, mas para governar. Porém,
se fosse eleito prefeito dificilmente o PSOL conseguiria governar, pois
teria uma bancada extremamente pequena que não lhe permitiria aprovar
nada na Câmara Municipal.
A resposta de Giannazi – uma pessoa séria – foi estarrecedora: disse que governaria com pressão popular nas galerias da Câmara.
Trata-se de uma verdadeira loucura. Nem se “as galerias” invadissem o
plenário e espancassem os deputados que votassem contra um hipotético
prefeito do PSOL seria possível aprovar alguma coisa. A Polícia
prenderia os manifestantes e a vida seguiria.
Contudo, mesmo com todos os equívocos da esquerda a partir de junho
do ano passado, partidos como o PSOL, o PSTU, o PCB, o PCO e movimentos
sociais como o MTST, o MST e outros que compactuaram com as “jornadas de
junho” e o “não vai ter Copa” finalmente perceberam que, à diferença do
que diziam, o PT não é “igual ao PSDB”.
Durante o primeiro turno da campanha eleitoral à Presidência, a
brilhante Luciana Genro chegou a dizer isso. Passada a primeira etapa da
eleição, o partido dela e todos os outros grupos de esquerda
supracitados apoiaram Dilma extraoficialmente, convictos de que, não, o
PT não é “igual ao PSDB” coisa nenhuma.
Aliás, quem melhor definiu o que se conseguiu com as “jornadas de
junho” e o “não vai ter Copa” foi o entusiasta de primeira hora desses
movimentos, o professor da USP Wladimir Safatle, que quase foi candidato
a governador de São Paulo pelo PSOL.
Na Folha, Safatle escreveu um artigo desalentado em que reconheceu no
que deu toda a mobilização de seu partido – e da “Rede”, de Marina
Silva – em favor das tais “jornadas de junho”.
A partir dali, as mais importantes lideranças do PSOL acabaram ao
lado de Dilma. O candidato do PSOL a governador de SP neste ano,
Gilberto Maringoni, que passou 2013 e 2014 descendo a lenha no PT,
acabou em uma cerimônia de apoio a Dilma pregando sua reeleição. Jean
Willys e Marcelo Freixo, mais comedidos e lúcidos, idem.
O fato é que o PSOL e outros partidos e movimentos sociais citados
têm boa intenção e foram importantíssimos para a reeleição de Dilma,
mesmo que, no que diz respeito aos partidos de esquerda, não tenha
havido apoio formal.
Mas por que, então, esses grupos de esquerda ajudaram tanto a
fortalecer a direita? Em grande medida, porque não aceitam as alianças
do PT com partidos de direita ou centro-direita. Essa esquerda sempre
rejeitou a tese da governabilidade, apesar de nunca ter dito como fazer
para governar um país conservador só com uma esquerda sem votos.
Note bem, leitor: o PSOL, com tudo que fez em 2013 e 2014, liderando
as massas na rua contra o governo Dilma, elegeu míseros 5 deputados.
Sim, foi um aumento de bancada de 66,66% em relação aos 3 deputados que o
partido elegeu em 2010, mas, ainda assim, uma bancada que não ajuda em
nada.
Nesse ponto, reproduzo, abaixo, outro artigo da Folha que mostra
muito bem no que deu a mobilização de esquerda – inclusive da direita
travestida de esquerda, a “Rede” de Marina Silva – ao longo do último um
ano e tanto.

Eis, aí, a contribuição da esquerda extra-PT para fortalecer a
direita como se viu ao longo do processo eleitoral recém-terminado. Ou
seja: além dos erros do PT e da própria presidente Dilma, a oposição de
esquerda entrou com a parte do leão do processo que quase elegeu
presidente um mero despachante do canibalismo financeiro internacional.
Porém, não se pode atribuir tudo à oposição de esquerda. Dilma e o PT
erraram muito. E o que se teme, agora, é que continuem errando.
Em junho/julho deste ano, a maioria dos brasileiros achava que o
desemprego, então no patamar mais baixo da história brasileira, iria
aumentar. Três meses depois, apenas 26% acreditavam nisso devido à
propaganda eleitoral da reeleição de Dilma, que mostrou um Brasil que o
povo não vê na mídia.
Mas como foi que a mídia conseguiu fazer crer aos brasileiros que o
país estava afundando e que todos iriam ficar desempregados se a
realidade era – e continua sendo – diametralmente oposta?
Em primeiro lugar, as “jornadas de junho” fizeram o país crer que as
coisas iam muito mal. Ora, como é possível que tanta gente vá à rua
protestar se o país vai bem? Depois, o “não vai ter Copa”, que muitos
dos esquerdistas que apoiaram Dilma endossaram aos berros até
junho/julho, convenceu o país de que o governo estaria jogando fora o
dinheiro da saúde e da educação, o que era – e é – uma balela.
E, a isso, somou-se o envenenamento diário da sociedade pela mídia,
com seu noticiário seletivo sobre corrupção e seu terrorismo econômico,
que contaram com a colaboração da presidente da República e de seu
partido, que passaram quatro anos apanhando calados.
Aliás, em 26 de setembro último este blogueiro, entre outros,
entrevistou a presidente no Palácio da Alvorada e lhe fez uma pergunta
que estava na cabeça de todos, mas que jamais havia sido feita a ela:
perguntei por que o governo Dilma apanhou calado desde janeiro de 2011
até havia pouco e se iria continuar apanhando calado.
Dilma respondeu que não queria “ir por esse caminho” – do confronto
–, mas que havia concluído que “não teria outro jeito”, o que permite
supor que ela e seu partido não repetirão o erro de permitir que a mídia
continue envenenando a sociedade contra o governo federal, um
envenenamento que se dá em pequenas e ininterruptas doses diárias.
Todo santo dia sai uma notícia envenenadora da sociedade, seja sobre
corrupção ou sobre terrorismo econômico. Parece aquela novela recente da
Globo em que um rico dono de hospital abandou a esposa pela amante, que
depois o cegou envenenando-o paulatinamente, dia após dia.
A fórmula para Dilma nem terminar seu 2º mandato, pois, será repetir o
primeiro, deixando que a mídia vá envenenando a população contra si.
Isso além de desprezar os movimentos sociais e sindicais e os partidos
de esquerda que podem até não ter voto, mas têm muita capacidade de pôr
gente na rua.
Na entrevista com a presidente, este blogueiro lhe disse que ela
deveria usar o “púlpito” natural que o cargo lhe confere para responder
aos ataques da mídia oposicionista. Ela respondeu que, em campanha
eleitoral, dá para responder devido ao horário eleitoral, mas que, fora
desse período, não dá para ficar indo à teve responder a cada ataque.
Dilma tem razão. Se ficar convocando redes nacionais para rebater os
ataques da oposição ela correria até o risco de cometer crime de
responsabilidade por usar um equipamento público (rede nacional) para
fazer política. Mas a presidente pode convocar entrevistas coletivas. A
mídia não poderá deixar de reproduzir o que uma presidente da República
disser.
Por fim, os partidos de esquerda que já descobriram que o PT não é
igual ao PSDB precisam pensar em crescer. Só assim um governo de
esquerda como o de Dilma não precisará se aliar a partidos como PMDB,
PP, PSD e outros lixos que, apesar de serem o que são, dispõem-se a dar
sustentação ao governo, ainda que em troca de cargos.
Como pode um partido como o PSOL – que, nas “jornadas de junho”,
ajudou a levar dezenas de milhares às ruas – só conseguir eleger míseros
5 deputados? O problema está na visão de partidos como esse de que têm
que dizer tudo independentemente do efeito eleitoral que isso vier a
causar.
Darei um exemplo. Luciana Genro, ex-candidata do PSOL a presidente, é
uma mulher brilhante. Sua oratória é um show – se Dilma falasse como
ela, teria triturado Aécio. Porém, no início da campanha eleitoral, em
um dos debates entre os candidatos, atacou as religiões em um país em
que cerca de 90% do povo é religioso.
É ou não é uma espécie de haraquiri político?
Esses partidos de esquerda precisam fazer cálculos políticos. Não há
outro jeito. Ou melhor, há: ficarem no “honestismo” infantil enquanto a
direita domina tudo e joga o povo na miséria, na desigualdade e na
ignorância.
Fica aqui, pois, o vaticínio de alguém que alguns julgam que costuma
acertar: Dilma só termina seu governo se impedir que o envenenamento
diário da mídia atue solto e se se mantiver próxima dos movimentos
sociais e sindicais, chamando para seu governo partidos de esquerda e,
eventualmente, oferecendo-lhes cargos.